Viver em um internato não era ruim, Helena tinha amigas, tinha uma educação exemplar e contava com as regalias que o dinheiro podia pagar.
Helena entrou no internato com apenas 10 anos, seus pais queriam preservá-la para um futuro casamento, para que quando adulta ela soubesse obedecer seu marido e encontraram ali uma solução.Os pais de Helena tinham posses. Não eram podres de ricos, mas o que tinham, lhes permitia certas extravagâncias, como uma escola cara.Para eles aquilo era comum, as filhas eram moedas de troca, eram preservadas para no futuro se casarem com pessoas que lhe dariam riquezas e poder. E aquele internato era famoso por preservar as meninas até a idade adulta, assim elas saíram de seus muros direto para um casamento e na maioria das vezes um casamento sem amor.Helena achava o prédio do internato sombrio, as paredes eram frias e a noite não tinha coragem de sair do dormitório, pois a escuridão, o breu era denso demais. Mas o que mais assustava Helena eram os sons, os barulhos, choros, gritos noturnos, faziam ela e outras garotas tremerem de medo.O lugar era imenso, contava com quartos e mais quartos, salas de aula, cozinhas e na parte externa, havia até mesmo um lugar com animais, um estábulo, que Helena adorava, pois sua paixão eram os cavalos. Havia também uma ala que as meninas não podiam entrar, as professoras diziam que era uma ala de funcionários, mas elas suspeitavam que não.O anexo ficava quase fora do internato,era necessário cruzar um longo corredor externo para chegar até lá, era grande e ainda mais sombrio.Algumas meninas juravam que dali vinham os sons que as assustavam à noite, mas Helena não tinha certeza.Um dia, uma menina mais velha, jurou ter visto um menino, um menino tentando fugir dali, mas que ele rapidamente foi pego e que ela correu para que ninguém a visse.Helena não acreditou e assim cresceu dentro dos muros daquele internato.-----------Helena havia acabado de fazer 18 anos e seus pais estavam a procura de um noivo, alguém rico que pudesse se casar com Helena, sendo ela pura, virgem e bela, tinha todos os atributos que um homem de poder desejava.Já formada em seus estudos, Helena fazia aulas extras, esportes, ballet, aulas de costuras e equitação, amava andar a cavalo, dizia que a sensação era de liberdade.Naquele dia Helena foi até os estábulos, queria montar e correr a cavalo por entre as árvores.— Que linda! Qual o seu nome? — Helena disse e tentou aproximar sua mão da égua recém adquirida a sua frente. O animal se afastou e se agitou um pouco. — Ei, eu sou amiga, fique calma.Helena não se assustou, não seria a primeira vez que montara um animal arisco.— Helena, tudo bem? — O cavalariço que cuidava dos animais se aproximou. Ele sorriu e estendeu uma maçã ao animal. — Helena, ela é nova, ainda não está domana, nessa não pode montar.Helena cruzou os braços e sorriu. Ela gostava de ajudar na adequação dos cavalos novos, gostava de montá-los e amansá-los, para no futuro ter a confiança do animal.— Helena, estou lhe avisando essa é muito arisca.— Como se eu fosse ingênua, eu sei lidar com animais.O rapaz concordou vencido, tirou a égua da baía, celou e deixou Helena se aproximar. Não foi uma tarefa fácil, pois a égua não queria a aproximação de ninguém.Helena conseguiu montá-la, fez um carinho em sua crina marrom e brilhante e sorriu. Saiu para dar algumas voltas com sua nova amiga.— Vamos garota, vou te mostrar meu lugar preferido. — Helena disse guiando o animal para a floresta.Ali ela andou entre as flores, ouviu o cantar dos pássaros e suspirou com o ar puro.Apesar da beleza, o lugar tinha seus perigos, perigo esse que Helena não notou.Helena passou próxima a uma colmeia de abelhas e nem ao menos sentiu quando uma se aproximou e picou o animal.A égua saiu em disparada.— Devagar! Devagar, amiguinha! — Helena dizia tentando controlar o animal.Ela dava os comandos através das rédeas e nada acontecia, a égua corria como se não houvesse amanhã.Helena começou a sentir medo, não conseguia parar o animal e estava muito rápido para tentar descer.— Socorro! Socorro! — Ela gritou sentindo-se em perigo, pois um acidente poderia acontecer ali.De repente, um homem pulou na frente da égua, ela levantou as patas dianteiras em direção do homem, fazendo Helena ir ao chão.Helena ficou desacordada, com o susto, com a queda, por sorte não havia se ferido.O homem amarrou as rédeas da égua em uma árvore, depois foi até Helena e a segurou em seus braços.Ele sentou-se no chão, encostado em uma pedra grande, ali ele encostou Helena em seu corpo e organizou como pôde seus cabelos.Ela só abriu os olhos, quando estava gentilmente encostada no peitoral forte e grande do homem que parou o cavalo.— Vocêe salvou! — Helena disse desperta com a voz ainda fraca, ela sorriu para ele, um sorriso tão puro e genuíno que o fez balançar.Ela notou os cabelos grandes, a barba por fazer e na cicatriz na bochecha bem próxima do olho castanho escuro como a noite, notou que as roupas dele estavam velhas e pequenas, como se ele não tivesse outras faz muito tempo.— Eu me chamo Helena... — Ela disse e esperou uma apresentação que não veio. — Está com fome? — Ela mexeu na bolsa transversal e dali tirou um sanduíche.O homem pegou e primeiro cheirou o alimento. Ele virou de costas e em segundos devorou o sanduíche, se voltou para Helena como quem pedia por mais.Ela colocou a mão na bolsa e tirou dali uma maçã.— Agora só tem isso...O homem pegou a fruta da mão delicada de Helena, sentiu por um milésimo sua pele macia, ele deu a égua e depois acaricio a crina do animal.O homem olhou Helena, achou-a diferente de tudo que já viu. Bonita, gentil, delicada, uma mulher encantadora com um perfume silvestre que se misturava com o cheiro das árvores.Reparou que ela estava de calças, botas e o que parecia uma capa, cinza e bonita, provavelmente para protegê-la dos ventos gelados daquela região.O momento de descoberta foi quebrado por um estopim. Um som alto de tiro ecoou não muito longe dali.— Cerberus! Cerberus! — Uma voz enraivecida gritava. — Hoje será seu fim seu maldito.Helena viu o homem mostrar os dentes em um rosnado forte e assustador.— Vou te matar Cerberus! Apareça para o seu fim. — A voz estava cada vez mais próxima.— Cerberus... — Helena o chamou e o homem olhou-a estreitando os olhos. — Fuja, leve o meu cavalo, mas fuja... Você salvou a minha vida, agora estou salvando a sua.Cerberus engoliu seco, montou no cavalo e olhou Helena antes de partir. Ela sentou-se na pedra grande e aguardou, até que outro homem apareceu.— Senhorita, o que faz aqui? — Ele perguntou guardando a arma.— Eu caí do cavalo e ele fugiu, acho que torcí meu pé, pois dói para andar.O homem prontamente foi até ela e a amparou, a levara de volta para o internato. Todos ali sabiam que as moças do internato eram valiosas, nunca se atreveria a fazer algo contra alguma.— Ouvi que o senhor chamava por Cerberus, quem é? — Helena perguntou, queria saber se o homem mentiria ou não.— Meu cachorro, ele fugiu pela manhã, mas ainda vou achá-lo.Helena pensou que fez bem, deixou Cerberus fugir, provavelmente a vida dele era bem diferente da calmaria que ela vivia.Cerberus finalmente estava livre, depois de anos na solidão, na angústia e nos maus tratos, ele agora era um homem livre, bom... Ele tinha certeza de que era livre, mas talvez não fosse exatamente um homem.Cerberus também cresceu no internato, sua ida para lá foi conturbada e triste. Ele foi arrancado de seu lar quando tinha apenas 13 anos, trancado por dias sem água, comida ou luz, sentiu medo, fome e vontade de morrer. Depois ele foi transferido para uma sala que possuía uma cadeira, um colchonete e uma pequena janela com grades e claro, correntes, ele foi mantido acorrentado por muito tempo. Sempre que gritava, que batia em quem entrava na sala era punido, lhe tiravam a comida ou o colchonete.Ele passou a odiar tomar banho, não era uma prática muito frequente, mas sabia que era um banho quando o caçador, como era chamado, entrava com um balde frio, jogava sobre ele e saía. O caçador era o pior de todos, gostava de torturar Cerberus e não sabia o motivo. Cerberus não teve amigos
Cerberus resolveu ir mais longe, sairia da floresta para a cidade, buscaria refúgio entre os homens, homens esses que ele odiava, pois só lembrava da maldade causada por eles.Ele pensou se alguém o reconheceria, se reencontraria alguém de seu sangue, sua mãe, pai ou talvez quem ele mais amava, seu irmão. O irmão mais velho, era seu exemplo, Cerberus desejava ser como Hades quando crescesse, não esperava ser afastado dele por tanto tempo.Cerberus chegou a parte mais movimentada da cidade, era na verdade um pequeno vilarejo, onde as pessoas passeavam pelo centro da cidade.Parecia improvável alguém o socorrer, mas ele precisava de ajuda e aprendeu a acreditar no improvável... Pois também era improvável que conseguisse fugir, mas ali estava ele.Cerberus perambulou pela cidade até o anoitecer, com o cair da noite, ele estava com fome e frio, precisava se alimentar, e de um lugar para deixar a égua que lhe ajudou na fuga.Ele passava na frente de um restaurante muito elegante, as pessoa
Cerberus surgiu do meio das árvores, e Helena sorriu, ficou feliz de ver Cerberus bem.— Eu disse que voltaria e você está lindo! Seu cabelo está muito bonito... — Ela estendeu a mão para tocar, mas Cerberus recuou um passo.Helena pegou o sanduíche e deu a ele, Cerberus comeu de costas como sempre, limpou a boca com o braço e seu olhar se voltou para ela.— Cerberus, onde está o meu cavalo? Você a perdeu? — Helena perguntou com as mãos na cintura.— Em casa... — Aquilo era bom, Cerberus agora tinha uma casa, um lar.Um barulho foi ouvido dentre as árvores e Helena se assustou, ela pulou para trás de Cerberus no mesmo momento em que Apollo surgiu a sua frente.— Calma moça, não precisa ter medo de mim. — Apollo disse de onde estava, não se aproximou muito para não assustar Helena.— Amigo, Apollo é amigo. — Cerberus disse e Helena relaxou.— Se conhecem faz muito tempo? — Apollo perguntou.— Faz algumas semanas, nos conhecemos aqui... Eu sempre venho e agora tenho um ótimo motivo. — O
O restante do dia, Helena passou em seu quarto, não teve fome ou vontade de nada, passou seus dias isolada no lugar destinada a ela.— Ela está aqui, a isolamos para que as outras internas não pensem em fazer o mesmo, sua filha é uma má influência para as outras. — A diretora dizia ao abrir a porta.Logo em seguida, passaram a mãe e o pai de Helena. Ela se levantou prontamente e tentou abraçar a mãe, mas o pai a impediu.— Não toque em sua mãe, garota imunda! Se deitou com um rapaz qualquer e carrega agora o preço de sua vergonha. Diga Helena, quem? Com quem se deitou? — O pai gritou cada palavra, deixando Helena assustada.— Com ninguém papai, eu juro! — Ele dizia a verdade, mas em sua condição era difícil acreditar.— Acha que é uma virgem santa? Que vou acreditar que esse bebê é um milagre? Não sou bobo Helena, se está grávida é porque um homem teve, diga quem é para que eu exija uma reparação.Helena chorou alto, ninguém acreditaria nela, nem mesmo seus pais. Como explicar uma gra
Cerberus chegou bravo, mais bravo e inquieto do que nos últimos meses. Diferente dos outros dias ele se trancou no quarto, não comeu e mal dormiu.No dia seguinte, nem mesmo Apollo conseguiu fazê-lo abrir a porta, bateu e até ameaçou arrombar, mas nada fez Cerberus ceder.Por fim, o irmão de Cerberus foi chamado. Hades se manteve distante, não interferia no tratamento ou nas atitudes do irmão, pensara até que o carinho outrora nutrido por ele estava também perdido.— Cerberus, é o Hades... Abra e converse comigo! — Hades tinha nas mãos uma garrafa de vodka, se o irmão nunca tinha bebido, hoje teria o seu primeiro porre.Cerberus abriu e antes que Apollo também passasse, Hades fechou a porta.— O que quer? — Cerberus disse e voltou para sacada, sentou-se no chão e olhava o horizonte, na verdade, olhava em direção ao internato, sentindo-se ferido por Helena.Hades não respondeu, ele abriu a garrafa e deu um gole longo, sentou-se na cadeira ao lado de Cerberus que estava no chão. Estende
Morar em um lugar afastado era bom, ninguém o viu chegar coberto de sangue, ser levado por Apollo para um banho e depois se deitar exausto em seu tapete.Apollo por um momento ficou preocupado, o olhar perdido de Cerberus o lembrou os primeiros dias sem Helena, parecia um animal, alguém sem alma vagando em busca de consolo.Seria muito ruim se esse consolo fosse matar, se Cerberus encontrasse sua alma arrancando as dos outros.Por sorte, não foi assim que as coisas aconteceram. Cerberus aprendeu sim a matar em meses e tinha agora uma profissão, um ganha pão, não dependeria da família rica, apenas de si e das armas que aprendeu a usar.------Durante esses meses em que Cerberus exercia sua maldade, Helena vivia alheia e solitária, voltava algumas vezes a floresta disposta a implorar que Cerberus a levasse com ele caso ele aparecesse, mas ele não apareceu.Com a chegada do inverno, chegou também o fim da gestação de Helena, era hora de uma criança vir ao mundo.Era cedo e Helena estava
Enquanto isso o homem alto e forte que acompanhava as consultas de Helena estava lá, ele foi avisado pela diretora do nascimento e precisava ter certeza de que a criança era saudável.— Deixe-me vê-lo! — O homem pediu.Ele segurou o bebê em seus braços e sorriu, sorriu pensando que seu plano estava completo, que aquele menino belo e pequeno lhe daria tudo que um dia ele quis.— Senhor, e agora? O que fazemos com a mãe? As mensalidades pagas pelos pais já acabaram. — A diretora perguntou.— A jogue na rua, o bebê fica, pois preciso dele.— Terá que pagar alguém para cuidar da criança aqui.— Faça o que tem que fazer, esse menino não vai viver muito tempo, tenho apenas uma ponta solta e depois poderei executar meu plano como se deve. — Ele devolveu a criança a enfermeira e depois partiu.Helena recebeu de volta seu filho, mas tinha que se recuperar rápido, pois sua estadia ali estavam com os dias contados.-------O primeiro mês de Helena foi uma tormenta. A diretora não a mandou embora
Na semana seguinte tudo estava pronto, Helena tinha sua documentação em dia e estava casada com Cerberus sem nenhum dos dois saberem.Hera foi pessoalmente no sítio e o fez assinar diversos documentos, alguns dizia ser referente a empresa, outros de cunho pessoal, pois o filho perdido ainda tinha documentos pendentes. Entre eles estava lá papéis do casamento, Cerberus confiava demais na mãe para ler antes de assinar.Helena foi forçada a assinar o documento de sua parte, primeiro a diretora disse que era um contrato de trabalho, mas assim que iniciou a leitura soube que se tratava de um casamento. Por fim, Helena tinha que escolher, ou se casava ou era jogada no olho da rua.A tarde Hera estava lá, na porta do internato, pronta para levar a esposa de Cerberus para o seu destino.— Helena, isso não faz parte do contrato, já disse! O bebê fica! — Era a voz da diretora, alterada esbravejando.Hera se aproximava do quarto quando ouviu a gritaria.— É meu filho, meu! Não posso deixá-lo.—