Capítulo 4. Elle

Quando minha irmã ligou, eu já estava em casa, de banho tomado, com uma taça de vinho na mão, pensando sobre o que tinha acontecido. Menti, dizendo que nada de anormal havia ocorrido. Mais um dia igual aos outros. Ainda estava entorpecida pelo reencontro com Diego e pretendia beber a garrafa inteira antes de dormir zonza de tanto vinho.

Fiz uma busca na internet. Eu sabia que não deveria fazer isso, mas não conseguia evitar, era mais forte do que eu. Procurei por casos policiais. Nada. Ampliei a busca, até nos registros de criminosos mais procurados, mas nada batia com a descrição dele. Poderia ser algo pior: gangues? Ele foi atacado por alguém. Um mafioso? Socorro. Enquanto esses pensamentos me consumiam, esvaziava a garrafa de vinho. Dormi bêbada e acordei perdida, com uma ressaca terrível.

No meio do movimento do dia na galeria, na fase final da inauguração da próxima exposição, Diego não saía da minha mente. Sua explicação sobre ter ido embora e como era melhor acabar com o nosso namoro sem futuro me doía de uma forma que não esperava, depois de 7 anos.  O fato de ele ter virado as costas sem pensar duas vezes me causava uma mágoa imensa. Será que ele estava bem? Qual era o meu problema?

Fiquei até mais tarde tentando me afundar no trabalho. O pessoal saiu mais cedo para uma comemoração, mas eu recusei educadamente. Já arrumava minhas coisas para ir embora quando ouvi um barulho de porta abrindo e fechando. Alguém tinha entrado pela porta dos fundos da galeria.

Meu avô adorava caçar, e quando eu era pequena, às vezes me levava junto. Alguma coisa eu tinha aprendido, dentre elas, a rastrear a caça. Foi nisso que pensei naquele momento. Como uma mudança sutil no ar, eu podia sentir a presença do perigo e perceber que, naquela situação, eu era a caça dentro da galeria.

Apaguei a luz, tirei a sandália e peguei uma estatueta de ferro que ficava na minha mesa. No silêncio do escritório, podia ouvir os passos de dois homens. A galeria tinha três saídas: a porta da frente e duas atrás, uma para carga e descarga e outra para os funcionários. Devagar, tranquei a porta e me escondi embaixo da mesa, que tinha a frente fechada, de modo que me protegia caso alguém entrasse de repente.

Tremendo, peguei o celular para ligar para a polícia, mas não consegui terminar de digitar. A porta do escritório veio abaixo com um chute. No susto, gritei, entregando minha posição. Ouvi passos apressados e duas sombras surgiram na minha frente. Com a luz apagada e eles vestidos de preto, tudo o que eu conseguia entender era que estava sendo puxada para a escuridão.

Tentei gritar, mas um deles tapou minha boca.

Senti quando fui amarrada, com as mãos para trás, e a outra sombra colocou uma fita adesiva sobre meus lábios. Minhas lágrimas molhavam meu rosto e embaçavam ainda mais minha visão. Eu estava sendo arrastada. Sabia que para a parte de trás da galeria, que àquela hora estava completamente vazia. Era um local apenas para carga e descarga, com um único acesso à rua.

Percebi que morrer talvez fosse o menor dos meus problemas. Rezei por um milagre, uma chance, qualquer coisa. Os homens não falavam entre si. Eu só ouvia suas respirações pesadas enquanto me carregavam sem esforço em direção à porta de carga e descarga. Imaginei que me jogariam dentro de algum veículo e me levariam para um destino desconhecido.

Tentei me soltar do homem que me segurava, mas era inútil. Quando abriram a porta para a rua, entrei em desespero. Me debati com toda a força de anos de academia, mas eles eram mais fortes. Vi quando abriram a porta de um furgão preto.

E o mundo a partir dai se descontrolou muito rápido.

Um barulho seguido de um som ensurdecedor deu início a uma confusão. Alguém, ou várias pessoas, começaram uma briga com os homens que me levavam. O grandão que me segurava tomou um soco na cara de alguém que apareceu na lateral e me soltou. Sem equilíbrio, caí de joelhos no chão e, sem as mãos para me apoiar, tive dificuldade ao tentar me levantar. Minha única ideia era correr pelo beco para chegara até a rua.

Mas a confusão ao meu redor era generalizada. Resolvi permanecer no chão e abaixar a cabeça, com medo de ser atingida. Não sei quanto tempo durou. Podem ter sido segundos, mas naquele momento eu já não conseguia pensar direito.

Foi quando senti alguém me envolver em um abraço firme e protetor. O cheiro de Diego me invadiu, e eu soube que estava salva.

Ele tirou a fita adesiva da minha boca e desamarrou minhas mãos.

Eu ainda chorava compulsivamente. Quando me vi livre, abracei Diego com todas as minhas forças. Com o rosto encostado em seu pescoço, pude sentir seu cheiro. Um conforto que eu buscava para me acalmar.

Eu vivi minha vida. Fiz terapia, estudei, noivei e quase casei. Mas ali, mesmo com a sensação de perigo iminente, sem saber no que Diego estava envolvido, eu só conseguia pensar que o amava, nunca tinha deixado de amar.  

E nunca mais queria deixar seus braços.

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