Fiquei sem ação, olhando para meu pai, certa de que era uma brincadeira de muito mal gosto. Ele olhou no relógio:
- O tempo está passando, Danna. Quanto mais demorar, menos tempo terá para pensar no que levar.
- Eu... Sei que isto não é verdade... É uma brincadeira! Quer ver como reagirei ou o que botarei na mala, não é mesmo? Faz parte da terapia... Tipo, o que é mais importante para mim? Pois saiba que... Você não cabe na mala, papai. Então... Não posso botar nelas o que tenho de mais importante. – Falei com doçura, tentando convencê-lo a mudar de ideia.
- Não faz parte da terapia, Danna. Faz parte do que eu desejo para você a partir de agora: responsabilidade e juízo. E pode achar que o que lhe direi é ridículo, mas é o melhor presente que eu poderia lhe dar de aniversário.
- Danna, p
- Saia da minha casa! – meu pai disse entredentes.Entrei no elevador e subi olhando os dois ficarem ali, me observando deixar minha casa, meu lar, como se fosse algo absolutamente normal.O motorista embarcou minhas malas e recostei-me no banco de couro enquanto ele dava a ré pela garagem de vidro, saindo diretamente na autoestrada, pouco movimentada àquela hora da noite.- Para onde iremos, senhorita Dave? – Ele perguntou, me olhando pelo retrovisor.- Pode... Ir dirigindo... Enquanto eu decido. – Minha voz não soou tão decidida, como sempre.A única pessoa que talvez me ajudasse seria Moana. Mas depois do que eu havia feito, pondo o nome dela dentro do caso do professor Gatti, ela jamais me deixaria ficar em sua casa ou mesmo me daria dinheiro. Tinha Lucas... Ele havia deixado bem claro que queria dormir comigo. Mas ficar com ele faria de mim uma viciada em cocaína, algo que eu tentava
Ela me abraçou com força, com se me conhecesse há uma vida inteira. Não consegui mover meus braços em sua direção. Eu era uma pessoa que sabia dar afeto... Tampouco receber. A última pessoa que me deu um abraço daqueles foi... Aquela mesma mulher, no funeral de minha mãe.Mas eu não podia negar que aquele abraço era muito parecido com o de Celli Dave: quente, espontâneo, com tanto afeto que chegava a me dar medo.Isla não era muito alta, talvez um pouco mais baixa do que eu. Magra, morena, com a pele um tom mais claro que a minha. Os cabelos escuros estavam levemente ondulados e ficavam na altura do meio de suas costas. Vestia um conjunto de calça e blusa de mesma cor, de tecido confortável. Os olhos eram castanhos, o nariz fino e alongado e os lábios pequenos. Era bonita, embora minha mãe fosse mais.- Esta é sua prima, Vanessa.
Vanessa me olhou de forma confusa e depois carregou minhas malas até um canto, deixando-as próximas do armário:- Não sei se caberão todas as suas roupas aqui. Então... Tentarei arranjar mais espaço para você assim que der.Ela pegou um colchão e pôs no chão:- Talvez queira conversar, mas estou cansada e preciso dormir. Amanhã... Ou melhor, hoje, preciso trabalhar. – Olhou no relógio de pulso.- Mas você não estava dormindo?- Estava... Na cama da minha mãe.- E sua mãe?- Ela estava fazendo algumas coisas do trabalho, esperando por você. Estava ansiosa e tinha medo que chegasse e não percebêssemos. Eu acabei adormecendo.- Vocês... Estavam na mesma cama?Vanessa riu:- Sim... Ela é minha mãe! Vez ou outra dormimos na mesma cama. – Arqueou a sobranc
- A conversa dele foi com minha mãe, mas acabei sabendo alguma coisa. E confesso que quase não acreditei que você tinha 21 anos.- Na verdade 22. – Fui sarcástica – Quantos anos você tem?- Vinte e dois.- E por que nunca nos conhecemos se nossas mães eram irmãs? – Sentei-me na cama, curiosa – Você sabe desta história? Porque deve imaginar que tem um segredo aí, não é mesmo?- Certamente sim... Mas não estou interessada em saber. Não me diz respeito.Revirei os olhos:- O que você faz? Onde trabalha?- No cartório da cidade.- Tem um cartório aqui?Ela riu:- Claro que tem. Embora aqui pareça o fim do mundo, não é.Peguei meu celular, na esperança de que meu pai tivesse me mandado uma mensagem. Mas não havia nada.- Celulares n&a
Olhei para minhas roupas, imaginando que vestir-me daquele jeito faria com que pensassem que eu fosse uma “nativa”. Mas pelo visto todo mundo ali se conhecia e sabiam quem era de fora da cidade.- Não... Sou só uma turista.- Quer ver o padre Killian? – Ele quis saber.Então ele não era o padre Killian?- Não! – Respondi com firmeza e subi os degraus estreitos, me firmando na parede em espiral até chegar ao último, onde deparei-me com o sino gigantesco.Nunca vi um sino de perto e jamais imaginei que fosse tão grande. Toquei o objeto de ferro, que era quase do meu tamanho. Olhei em volta e percebi que dali dava para ver toda Machia. Fui andando em direção à parte da frente, me surpreendendo com a quantidade de verde que havia, por conta das árvores que praticamente estavam por toda a cidade.Eu não sabia que Machia tinha matas ou florestas. E era claro dali qual era o morro ao qual Vanessa tinha se referido, que pegava sinal de internet e celular. Não parecia muito longe dali.- Bela
- Bem... – ela sorriu e sorveu o restante do café de sua xícara – Não sou um bom hotel, mas ofereço um ambiente familiar. E quem preferiria um lugar tão impessoal quanto um hotel à uma casa convivendo com sua família de sangue, tendo a oportunidade de estar rodeada de carinho?Eu! Pensei de imediato. Mas eu já tinha cometido tantas atrocidades que fiquei com medo de aquela mulher me mandar embora e eu ficar naquela cidadela sem ter para onde ir, nem como sobreviver.Apesar de tudo eu precisava dela e da filha, mesmo que fosse morando naquela espelunca.Tinha certeza de que meu pai se arrependeria e viria me buscar em breve. E caso não viesse, eu iria lhe telefonar e explicar que estava arrependida de tudo que fiz e inclusive disposta a aceitar a vagabunda da Nadine na nossa casa, tentando ocupar o espaço de minha mãe.- Não precisa tentar encontrar um emprego hoje – ela levantou-se e foi até a pia, lavando a xícara e a colher que usou - Aproveite o dia para conhecer a cidade.- E há o
Aproximei meu rosto do dele, tentando beijá-lo. O homem imediatamente se afastou, soltando-me e dando um passo para trás, atordoado. Nossos olhos ficaram imersos um no outro por um breve instante e eu poderia ter feito qualquer coisa, menos virado as costas e descido correndo as escadas, fugindo de uma forma como nunca fiz na vida.Não tive coragem de olhar para trás ou mesmo parar de correr um minuto sequer. Mesmo de salto, só me detive quando abri a porta e entrei na casa de Isla. Meu coração estava acelerado e o ar me faltava. Escorei-me na parede e fiquei ali, imóvel por um bom tempo até que conseguisse me recuperar da porra que tinha acontecido comigo.Balancei a cabeça, aturdida, completamente confusa com minha atitude. E não me referia a ter tentado beijar aquele homem, mas ao fato de ter fugido feito uma menininha indefesa e inocente.Eu não lembrava de ter visto um homem
Soltei os dedos, fazendo com que a colher de servir caísse sobre a panela, fazendo um som estranho. Olhei para Vanessa, que estava com as mãos juntas, em sinal de prece e aquilo me remeteu à vez em que fiz aquele gesto, na capela do hospital, quando pedi a Deus pela vida de minha mãe, já que me disseram que ele era o único que poderia salvá-la... E ironicamente até o Ser divino e que concedia milagres virou as costas para mim naquele dia.Minha tia fez o mesmo que Vanessa e ambas fecharam os olhos, com os cotovelos apoiados na mesa. Mantive-me ereta e com as mãos para baixo, me recusando a fazer algo em que eu não acreditava.- Senhor, abençoai esta comida que está em nossa mesa e faça com que sempre a tenhamos, assim como não a deixe faltar nas mesas de todas as pessoas. – Falou Isla, de olhos fechados.- Amém. – Vanessa completou.- Am&ea