CLARAAs horas que se seguiram à saída de Henrique pareciam se arrastar. O silêncio era diferente agora — não mais sufocante, mas cheio de reflexões. Cada memória, cada detalhe dos últimos dias, das últimas revelações, passava pela minha mente como um filme que eu não conseguia pausar. Tudo parecia estar em câmera lenta, mas, ao mesmo tempo, meu coração batia acelerado, tentando encontrar um caminho claro em meio a tanto caos.Minha mãe, sempre cuidadosa em me dar espaço, sentou-se ao meu lado na cozinha enquanto eu terminava meu café.— Você parece distante, — comentou ela suavemente, mexendo na própria xícara. — Quer conversar sobre o que está acontecendo?Eu respirei fundo, apoiando as mãos no colo. A verdade era que, mais do que nunca, eu precisava de orientação. Não sabia se estava pronta para tomar uma decisão tão grande, mas ao mesmo tempo sabia que não podia continuar na incerteza.— Mãe, eu... estou tão confusa, — comecei, minha voz trêmula. — Eu amo o Henrique, mas depois de
HENRIQUEAs semanas após nossa última conversa foram diferentes, mas tranquilas. Clara e eu estávamos reconstruindo as coisas, pouco a pouco. Eu sabia que não seria fácil, que a confiança não voltaria de uma hora para outra, mas havia algo reconfortante no fato de que estávamos tentando. Estávamos indo devagar, um passo de cada vez. Ela ainda estava machucada, e eu estava determinado a mostrar que eu mudaria — por ela, por Sofia, por nossa família.Mas, enquanto tentávamos recomeçar, uma sombra começava a pairar sobre nós. Algo que Clara não sabia, e que eu preferia que continuasse assim.No fundo da minha mente, havia sempre aquela pequena voz me lembrando do que deixei para trás. Sabia que não podia fugir do passado para sempre, mas tentei ao máximo fingir que tudo estava enterrado. Alberto “O Cobra” era o pesadelo que eu sempre temi que voltasse. E, nas últimas semanas, as ameaças que eu tanto esperava começaram a se tornar mais reais.A primeira vez que percebi algo errado foi na
CLARANos últimos dias, Henrique parecia cada vez mais distante. Desde aquela manhã em que ele alegou estar “apenas estressado com o trabalho”, notei pequenas mudanças. Ele estava mais reservado, saindo mais cedo e voltando mais tarde, sempre com desculpas prontas. Eu queria acreditar que era apenas o estresse, que era só ele tentando colocar as coisas nos eixos depois de tudo o que passamos, mas uma parte de mim sabia que tinha algo muito mais sério acontecendo.Naquela tarde, enquanto Sofia dormia, me peguei olhando pela janela, esperando por Henrique. O relógio marcava quase seis da tarde, mas ele não estava em casa. Não era a primeira vez que isso acontecia nas últimas semanas, mas a sensação de que ele estava escondendo algo crescia a cada dia.Eu queria confiar nele. Queria acreditar que ele estava mantendo sua promessa de ser transparente comigo, de deixar o passado para trás e focar em reconstruir o nosso casamento. Mas as ausências inexplicáveis e o silêncio cada vez mais pre
CLARAEu olhava para Henrique, esperando que ele dissesse algo que fizesse tudo fazer sentido. Alberto "O Cobra". Eu já havia ouvido esse nome antes, nas histórias veladas sobre o passado de Henrique, mas sempre foi algo distante, algo que não me atingia diretamente. Agora, era real. Alberto estava de volta, e o pavor começou a tomar conta de mim.— Você não pode estar falando sério, Henrique, — murmurei, sentindo um nó apertar meu estômago. — Você disse que tinha deixado esse mundo para trás. Como pode estar de volta a isso agora?Henrique passou as mãos pelos cabelos, claramente frustrado. Ele se levantou e começou a andar pela sala, evitando meu olhar.— Eu tentei, Clara. Tentei de todas as maneiras. — A voz dele estava cheia de desespero contido. — Mas o Cobra não esquece. Ele nunca esquece. E agora ele está me pressionando, ameaçando vocês. Não posso deixá-lo machucar você ou Sofia.Eu me levantei, o pânico começando a me dominar.— Então você voltou para o submundo para resolver
HENRIQUEA raiva queimava dentro de mim de uma forma que eu não conseguia controlar. Alberto havia ameaçado minha filha. Sofia, minha pequena menina, agora estava no centro dessa guerra que eu nunca quis que ela visse. Eu olhava para Clara, seus olhos inchados de lágrimas, o medo estampado em cada traço de seu rosto, e algo dentro de mim se partiu.— Isso foi longe demais, Clara, — disse, a voz baixa, mas carregada de ódio. — Ele passou dos limites. Agora, vou acabar com isso.— O que você vai fazer, Henrique? — Clara me perguntou, sua voz trêmula. — Você não pode simplesmente enfrentá-lo de frente, isso vai colocar todos nós em mais perigo.Eu sabia que ela estava certa, mas, ao mesmo tempo, não conseguia pensar em outra coisa a não ser encontrar Alberto e resolver isso de uma vez por todas. Eu não podia mais me esconder, fingir que isso poderia ser resolvido com palavras. O Cobra queria sangue, queria vingança, e eu não podia mais recuar.— Eu vou lidar com isso da única maneira que
CLARADepois que Henrique desligou o telefone, fiquei imóvel por alguns segundos, encarando o vazio. Ele estava indo atrás de Alberto sozinho. E eu sabia que isso só traria mais destruição para nossa vida. O pânico crescia dentro de mim como uma onda gigante prestes a me engolir. Eu não podia mais esperar, não podia mais ficar parada.Sofia estava na sala, brincando inocentemente com seus brinquedos, alheia a tudo. Eu a observei por um instante, tentando controlar o impulso de chorar. Ela era tudo o que eu tinha. Tudo o que nós tínhamos. E agora, nossa filha estava no meio de algo muito maior e mais perigoso do que qualquer coisa que eu pudesse imaginar.Peguei meu telefone e, sem pensar duas vezes, disquei o número da minha mãe. Eu precisava tirá-la daqui, precisava manter Sofia em segurança.— Alô? Clara? — A voz da minha mãe soou do outro lado da linha, suave e calma, como sempre.— Mãe, preciso que venha até aqui agora, — respondi rapidamente, minha voz apressada e cheia de ansied
HENRIQUEO sorriso de Alberto era cruel e frio, como se ele já soubesse que estava ganhando. A cada palavra dele, eu sentia o nó no meu estômago apertar ainda mais. Voltar para o submundo? Trabalhar para ele? Se eu aceitasse, estaria entregando minha vida para o Cobra, de uma vez por todas. Mas, se recusasse… Clara e Sofia estariam em perigo.Eu respirei fundo, tentando pensar em uma saída, mas a sensação de estar encurralado era sufocante. Eu não podia deixá-lo vencer.— Eu sei o que você está pensando, Henrique, — disse Alberto, como se lesse meus pensamentos. — Está tentando encontrar uma maneira de sair disso, mas a verdade é que não há escapatória. Você voltou para o meu mundo e agora é meu. E sua família… — Ele fez uma pausa, seu sorriso se alargando. — Eles são a garantia de que você vai fazer exatamente o que eu mandar.Minha raiva estava fervendo, mas o medo por Clara e Sofia era maior. Eu sabia que não podia agir impulsivamente, não com Alberto. Cada passo tinha que ser calc
CLARAO som do motor do carro era a única coisa que preenchia o silêncio pesado entre mim e Henrique. Meus dedos ainda tremiam, e meu coração batia rápido, mas tentei focar em uma única coisa: Sofia estava segura. Mesmo depois de toda a loucura, depois de quase ter sido pega no meio daquele caos, eu sabia que minha filha estava longe de tudo isso, com minha mãe. Era o único pensamento que me mantinha sã.Mas, ao mesmo tempo, a adrenalina começava a desaparecer, e o medo cravava garras profundas em mim. Henrique havia se colocado no meio de algo muito maior do que nós dois.— Isso acabou? — minha voz finalmente saiu, baixa e trêmula, enquanto olhava para a estrada à frente.Henrique, ao meu lado, manteve os olhos fixos no caminho, o rosto tenso. Ele sabia que não. Eu também sabia.— Ainda não, — ele respondeu, sem rodeios. — Alberto perdeu o controle hoje, mas ele não vai desistir tão fácil. Não agora.Eu fechei os olhos por um segundo, tentando controlar a onda de pavor que subia pelo