CLARAO som do motor do carro era a única coisa que preenchia o silêncio pesado entre mim e Henrique. Meus dedos ainda tremiam, e meu coração batia rápido, mas tentei focar em uma única coisa: Sofia estava segura. Mesmo depois de toda a loucura, depois de quase ter sido pega no meio daquele caos, eu sabia que minha filha estava longe de tudo isso, com minha mãe. Era o único pensamento que me mantinha sã.Mas, ao mesmo tempo, a adrenalina começava a desaparecer, e o medo cravava garras profundas em mim. Henrique havia se colocado no meio de algo muito maior do que nós dois.— Isso acabou? — minha voz finalmente saiu, baixa e trêmula, enquanto olhava para a estrada à frente.Henrique, ao meu lado, manteve os olhos fixos no caminho, o rosto tenso. Ele sabia que não. Eu também sabia.— Ainda não, — ele respondeu, sem rodeios. — Alberto perdeu o controle hoje, mas ele não vai desistir tão fácil. Não agora.Eu fechei os olhos por um segundo, tentando controlar a onda de pavor que subia pelo
HENRIQUEA escuridão da noite pesava sobre meus ombros enquanto dirigia até o local onde Tito havia marcado o encontro com Vicente. Minha mente fervilhava com pensamentos de Clara e Sofia. Cada quilômetro que eu percorria me levava para mais longe do que eu havia prometido ser, para mais perto daquele velho eu que tanto tentava enterrar. Mas eu não tinha escolha.Se havia uma chance de acabar com Alberto, era com Vicente. Mas o problema com homens como ele é que nada vinha de graça. Eu sabia que, ao fazer esse acordo, estaria trocando uma dívida por outra, mas se isso significava manter minha família a salvo, eu pagaria o preço que fosse.O ar no local do encontro era pesado, cheio de um silêncio que só aumentava a tensão. Estacionei o carro e saí, avistando Tito logo à frente, conversando com um homem alto e de cabelos grisalhos. Vicente.Ele se virou ao me ver, o rosto marcado pelo tempo e pela crueldade de seu passado. Seus olhos eram frios, e um sorriso quase desinteressado aparec
HENRIQUEOs dias que seguiram ao acordo com Vicente foram uma sucessão de reuniões secretas, esquemas traçados em becos e corredores mal iluminados. O plano estava em movimento, e Vicente não perdia tempo. Como um jogador experiente, ele sabia exatamente onde atacar para causar o máximo de dano ao Cobra. O objetivo era simples: destruir Alberto antes que ele tivesse chance de contra-atacar.Nós começamos a atingir as bases financeiras de Alberto, desmantelando seus negócios sujos, cortando suas rotas de dinheiro e enfraquecendo sua rede de aliados. Cada movimento era calculado, e Vicente estava no controle de cada passo. Quanto mais avançávamos, mais eu via Alberto perder poder. Mas, ao mesmo tempo, sabia que isso o estava deixando mais perigoso.Sentado em uma sala escura com Vicente e Tito, analisando mapas e relatórios, pude sentir o peso de tudo aquilo. Eu não sabia por quanto tempo mais poderia esconder isso de Clara, o quanto mais poderia fingir que não estávamos em uma guerra.
CLARAAcordei naquela manhã com uma sensação estranha, como se algo estivesse fora do lugar. O ar na casa parecia pesado, opressor. Henrique já havia saído, como fazia quase todos os dias agora, e a casa estava quieta demais. Silenciosa demais.Levantei-me, ainda sentindo o peso do cansaço e da tensão acumulada nas últimas semanas. A constante vigilância, o medo de que algo pudesse acontecer a qualquer momento... era como se eu vivesse em um estado de alerta permanente. Tudo o que eu queria era normalidade, um retorno à vida que tínhamos antes desse pesadelo começar.Eu estava prestes a chamar Sofia para o café da manhã quando ouvi um barulho na porta da frente. Um clique, suave demais para ser um erro.Meu coração disparou. Quem estava ali?Parei no meio da sala, o corpo congelado pelo medo, e, sem pensar duas vezes, corri em direção ao quarto de Sofia. Quando abri a porta, ela ainda estava dormindo tranquilamente, sem a menor ideia do que estava acontecendo.Eu me aproximei dela, pe
CLARAAs batidas do meu coração pareciam ecoar na minha cabeça, cada pulsação mais forte que a anterior. Eu ainda estava no chão do banheiro, segurando Sofia com todas as minhas forças, enquanto Henrique me abraçava. O terror do que quase aconteceu ainda me paralisava.Eu não sabia por quanto tempo ficamos ali, apenas sentindo a respiração dele contra o meu rosto, mas parecia que o tempo havia parado. Meus músculos estavam tensos, como se eu ainda estivesse presa naquele momento de puro pânico.Finalmente, Henrique se afastou um pouco, seus olhos me observando com uma mistura de alívio e preocupação.— Clara, — ele começou, a voz mais suave do que eu esperava. — Eu sinto muito. Isso não deveria ter acontecido.— Eu achei que ele ia… — minha voz falhou. Achei que íamos morrer.Henrique balançou a cabeça com firmeza, segurando meu rosto entre suas mãos.— Eu não vou deixar isso acontecer, — disse ele, com uma determinação inabalável. — Não vou deixar Alberto chegar perto de vocês de nov
HENRIQUEO silêncio no armazém era pesado, cortado apenas pela respiração ofegante de Alberto e minha própria tensão. O Cobra, o homem que havia atormentado minha família por tanto tempo, agora estava encurralado, sem saída. Mas ele não ia se render sem lutar.Alberto deu mais um passo à frente, os olhos ardendo de raiva e desespero. O sorriso arrogante havia desaparecido, substituído por algo muito mais sombrio.— Você acha que isso acaba aqui, Henrique? — disse ele, com a voz carregada de ódio. — Você pode até me derrotar, mas não pode escapar desse mundo. Ninguém sai.Aquelas palavras tocaram fundo, como se tentassem puxar a parte de mim que eu estava tentando enterrar. Alberto estava tentando me desestabilizar, e ele sabia exatamente onde atacar. O submundo tinha suas garras em mim por anos, e o medo de não conseguir escapar sempre esteve presente.— Eu não sou você, Alberto, — respondi, com a voz firme. Minha vida não está presa nesse ciclo. — Mas, no fundo, eu sabia que não seri
CLARAA noite estava estranhamente silenciosa depois de tudo. O tipo de silêncio que deveria trazer paz, mas, em vez disso, deixava uma sensação de vazio. Henrique estava em casa, Sofia estava dormindo no quarto ao lado, mas minha mente não conseguia parar de correr. A tensão dos últimos meses ainda estava viva em mim, como um nó que eu não conseguia desfazer.Olhei para Henrique, que estava sentado no sofá, com os olhos fixos em um ponto qualquer da sala. Ele parecia estar aqui, mas, ao mesmo tempo, tão distante. O peso do que aconteceu ainda pairava entre nós, como uma sombra difícil de afastar.— Você está bem? — perguntei, sentindo que a pergunta era tão necessária quanto insuficiente. Claro que ele não estava bem. Nenhum de nós estava.Ele piscou, saindo de seus pensamentos, e me olhou com um sorriso cansado, aquele que ele sempre dava quando tentava esconder o que realmente estava sentindo.— Estou, sim, — ele disse baixinho. Mas eu sabia que era uma meia-verdade.Me aproximei d
CLARAOs primeiros dias após o confronto com Alberto foram estranhamente tranquilos. Tranquilidade demais, talvez. As rotinas voltaram lentamente ao normal — eu levando Sofia ao parquinho, Henrique tentando passar mais tempo em casa — mas o peso do que aconteceu ainda pairava sobre nós.Eu sabia que Henrique estava tentando seguir em frente, mas havia algo diferente nele, algo que não conseguia mais esconder. O submundo havia deixado marcas profundas, mesmo que ele tentasse se afastar de tudo.Naquela manhã, enquanto eu preparava o café, olhei para ele do outro lado da mesa, distraído com o jornal aberto. Seus olhos, embora focados nas palavras impressas, pareciam estar em outro lugar. Havia um vazio ali, uma distância que me preocupava.— Você quer mais café? — perguntei, tentando romper o silêncio.Henrique levantou os olhos lentamente, como se fosse puxado de volta à realidade. Ele sorriu de leve, mas era aquele sorriso cansado que eu já havia visto tantas vezes.— Não, estou bem.