Capítulo 3

O choque em seus olhos era notório. Não tinha se recuperado da surpresa de ver aquele homem ali, e logo recebeu outra ainda mais forte.

O que tinha que fazer, sorrir?

O que Vicent queria? Oferecer dinheiro para que ela fosse embora como nos doramas? Lhe ameaçar jogando toda sua família na rua da amargura até se mudarem para longe como nos livros de romance?

Voltou a respirar sem nem mesmo notar que havia prendido a respiração. Encarar aquele homem parecia no momento um desafio grande. Sabia que ele não gostava de sua presença, mas seu olhar… O olhar de desejo que sentia vir dele era promíscuo, não parecia ser real ao mesmo tempo que lhe dava curiosidade. 

— Um café… Com você? – Gaguejou pelo menos duas vezes antes de seus pensamentos se formarem naquela pergunta engraçada. — Quer que eu tome café com você?

— Podemos conversar em um lugar melhor. Gostaria de fazer um pedido. – Ele foi cordial, muito educado até para sua pessoa. Evitou olhá-la de verdade ainda que estivesse lhe observando do lado de fora desde que chegou.

Ela parecia feliz dentro daquela livraria. Era seu lugar preferido? Gostava de livros tanto assim? E as aulas? Vinha porque era obrigada? Precisava ser tão estudiosa? Até isso era atraente, seu jeito simples de viver. 

— Eu presumo que não tenho nada para falar com o senhor – disse de uma forma tão calma. Parecia realmente saber o que dizer, e quando dizer.

— Eu prometi ao Ronny que falaria contigo. Podemos conversar em um lugar melhor? – Insistiu em sair dali, fazer o pedido, dar um convite, tudo tinha que ser em lugar público. Talvez o silêncio e o cômodo pequeno o levasse para outros caminhos. Seus pensamentos e desejos poderiam o trair.

— Ronny? Ah, tudo bem. Saio em 10 minutos.

Virou para ir terminar seus afazeres deixando o homem sozinho. Claro… agradar a garota parecia ser mesmo um desafio, no entanto, prometeu ao filho que faria isso. Deu alguns passos para dentro do lugar e não pode evitar sentir o cheiro dela. Era doce e sagaz, tudo combinava perfeitamente. Andou mais entre os corredores até vê-la novamente.

Os cabelos amarrados para trás e o olhar concentrado em fazer seu trabalho, como era bonita.

Não. Ele não podia ter esses pensamentos. Quando acordou naquela manhã de outro sonho quente justamente com Clarisse, ele só conseguia pensar em como iria fazer com que ela aceitasse o convite para a festa, precisava de Ronny lá. Ele tinha que manter sua cabeça no lugar.

Como prometido, 10 minutos depois Clarisse adentrou o carro de Vicent junto ao motorista. Assim que a porta fechou, ela pôde sentir o aroma vindo dele e não mentiria dizendo que não gostou.

Nunca pode pensar naquele homem do mal como uma pessoa legal. Só de estar no mesmo ambiente que ele, notava-se o descontentamento vindo de sua parte, lhe passava desconforto e a vontade de ir para qualquer lugar longe dele era grandiosa.

— O que é tão importante que não poderíamos ter conversado na livraria? – Ela quebrou o silêncio. Vicent a olhou de relance — Vai me mandar embora da vida de seu filho? 

— Se eu pedisse isso, você iria?

— Por dinheiro no mundo, eu deixaria o Ronny. – Eles se encararam — Pode se adiantar se o assunto for esse.

Ela sabia que não era bem-vinda, que tinha ódio, que havia desprezo, mas porque não conseguia enxergar nada disso no olhar dele? Seus olhos claros e cinzas brilhavam em sua direção. Que tipo de ódio era aquele? Pois podia jurar que conhecia aquele mesmo desejo dos olhos de Ronny.

— Chegamos. – O motorista avisou fazendo com que ambos quebrassem aquele contato visual e saiu do carro para abrir a porta. Primeiro para a dama que gostou do lugar escolhido. Já tinha vindo algumas vezes, afinal, como uma boa apreciadora de café, seria um erro não ter visitado todas da cidade.

Foi bem recebida pelos atendentes e colocada em uma mesa bonita e organizada. Sentou-se com toda sua elegância agradecendo ao garçom educado. Todos seus movimentos eram assistidos pelo homem mais velho.

O coração acelerado podia ser um problema, até mesmo suas mãos trêmulas lhe incomodavam. O que os pais não fazem por seus filhos? Pois estava ali diante de seu maior deseja, na esperança dela acompanhar seu filho numa festa de família.

— Agradeço por ter vindo. Sei que não nos damos muito bem. – Seu tom era baixo junto aos lábios que se moviam lentamente, aquilo era charmoso, ela não ia negar. 

— Você não gosta de mim. E só vim, porque se o Ronny concordou então deve ser algo bom. Não que eu espere algo bom vindo de você.

— Eu não sou um monstro como acha, só não concordo com esse namoro. 

— Porque sou pobre? – Uma pergunta como aquela num lugar público, poderia ser motivo de ofensa, olhares feios dentre outras coisas. Sorte que as mesas eram afastadas, e o garçom que se aproximava com o pedido feito pouco antes ainda estava longe.

Os olhares estavam vidrados um no outro e talvez avançassem um no outro a qualquer momento, porém com vontades diferentes, enquanto um arranharia o rosto do homem, o outro agarraria os cabelos longos agora soltos e a traria para mais perto. 

Levantaria o vestido longo até poder ver tudo que havia escondido, a beijaria com força, sugaria sua pele, a teria para si em qualquer lugar, até mesmo o chão sujo da livraria, ou numa mesa recheada de café e doces. Ele não iria se importar, apenas iria tê-la.

— Está me escutando? – Ele despertou dos sonhos tornando a encarar a moça — Não sou boa para seu filho porque sou pobre?

— Não vim aqui para falar sobre isso. Mas para lhe fazer um convite, pessoalmente – Clarisse piscou algumas vezes, aquilo era sério? — Estarei oferecendo uma festa de Natal para meus amigos e nessa festa irei apresentar Ronny como meu novo sócio e herdeiro. 

— Uau! – Sorriu orgulhosa. — Pode não parecer, mas o Ronny te respeita muito, ele te admira como o homem mais incrível do mundo… Isso vai dei-

— E você… me admira de algum jeito? – O sorriso que Clarisse dava se desmanchou sem saber da onde veio a pergunta, tão pouco como daria aquela resposta. — Essa apresentação só vai acontecer se o Ronny for, e ele só vai, se você estiver presente

 

— A última festa sua em que estive presente, você me ignorou e me tratou mal, apresentou outra garota ao seu filho como se eu não estivesse ali. Não quero passar por isso novamente.

— Se você ama o Ronny como diz que o ama, faça isso pelo futuro dele, se não, não precisa voltar a pisar na minha casa.

— Está duvidando do meu amor?

— Duvido sim. Você é bonita demais para amar o meu filho – Sem filtrar suas palavras, soltou o que seus pensamentos informam como resposta. E na mesma hora, se arrependeu.

O olhar dela de surpresa, a xícara parada no ar. Ele tinha mesmo que chamá-la de bonita? Não era uma mentira, mas soou estranho.

Sem dizer nada, tirou do bolso de seu paletó um envelope vermelho com enfeites natalinos e o empurrou em sua direção.

— Gostaria que estivesse na festa. Sua presença será apreciada.

E levantou deixado a conta paga e foi embora, abandonando uma garota perplexissa e atordoada.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo