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Capítulo 3 — ÉMIE

Émie Carter:

A dor não me permitiu dormir. Esperei meus pais saírem e fui até o banheiro ver o tamanho do estrago que ficou meu corpo…

Olhava fixamente para meu reflexo no espelho e estava horrível. O lado esquerdo do meu rosto estava roxo e levemente inchado, mas nada que uma bolsa de gelo não resolvesse. Minhas coxas também estavam feridas e meu corpo inteiro doía. Para minha sorte, estava chovendo e eu poderia me agasalhar bem, assim cobriria melhor meu corpo. Por um momento me peguei pensando no cara do carro, se bem que eu poderia ter aceitado a sua ajuda, pois estou me sentindo péssima. Após um banho rápido, fiz um sanduíche, enfiei dentro da minha bolsa. Soltei meus cabelos, peguei meu casaco e fui para o trabalho.

— Bom dia, Srta. Carter. Bem… como já está aqui, pensamos se hoje não podes ficar após o fechamento para retirar a poeiras dos livros e das estantes. O pagamento será efetuado agora mesmo. — bem, ao menos eu iria ganhar um extra hoje.

— Claro que eu quero, aliás, sempre que precisar sabe que eu estou aqui. — Dona Emília era generosa comigo, era uma mulher misteriosa e com cara de mau, porém era um doce.

Era a primeira vez que ela me pagava tão bem por um trabalho mais ou menos. Ali estava dois envelopes com 200 dólares cada um deles, isso era quase metade do meu salário, e se eu economizar bem dá pra sair de casa logo em breve.

— Seu salário também irá aumentar, querida. Você faz o trabalho árduo com amor, como se ficar enfiada aqui dentro o dia inteiro fosse a melhor coisa do mundo. Não conheço ninguém melhor para zelar desta biblioteca que não seja você. — seus olhos pequenos sumiram quando ela sorria.

De fato, ali era o melhor lugar onde eu poderia estar nos momentos atuais. Mas, não era onde eu queria estar para sempre, não perdia a esperança de receber uma resposta positiva de uma das universidades, uma bolsa seria o suficiente para mim, não pensaria duas vezes…

O dia chuvoso atraia muitas pessoas, e como cortesia, eu fazia café e chá para servir quem quisesse tomar. Estava pegando uma xícara de chá quando virei e tive sobre mim aquele par de olhos verdes, perfeitos.

— Bom dia. — meus olhos leram seu bom dia diante dos lábios, era perturbador, mas eu estava mesmo dopada dos remédios que tomei antes de sair de casa. — O que me recomendaria para hoje?

— Suponho que tenha bom gosto, mas se quer algo para chorar num dia chuvoso, releia Romeu e Julieta, sei que já leu! — ele tinha cara de inteligente e isso era sexy, além da sua voz suave, rouca e grossa, excitante também.

— Por que a chuva desperta tristeza em você?

— Não é a chuva, é a vida mesmo. — coloquei o livro em sua frente e parei diante o balcão, observando o movimento de pessoas que entravam e saíam a todo instante. — Aceita um chá? Ou um café?

— Um chá, por favor!

Enquanto estava colocando a água quente na xícara, olhei para onde ele estava sentado e vi que estava lendo as primeiras páginas, afinal, quem é esse homem? Seus óculos o deixavam ainda mais sexy, cara de intelectual e… enfim, ele era bonito.

Coloquei a xícara em um pirex e levei até ele.

— Aqui está! — coloquei em cima da mesa e lhe dei às costas, sentindo sua mão segurando a minha no momento seguinte.

— Faça-me companhia! Se não for lhe incomodar, é claro.

Sentei na cadeira ao seu lado e peguei um livro aleatório, pois sem dúvidas, seria impossível ler perto de alguém, isso era uma insegurança terrível que eu sempre tive. O cheiro dele era bom, uma mistura de madeira com álcool. Finalmente alguém queria alugar um livro e precisavam do selo, e eu quem tinha que fazer isso. Levantei rápido e antes que me afastasse, senti ele tocar em uma mexa do meu cabelo, levando a mesma até o seu nariz, foi tudo muito rápido. Segui andando até o balcão e selei o livro para a moça que estava com uma cara péssima.

— Aqui está, faça bom proveito! — ela sorriu, agradeceu e foi embora.

Olhei em volta e ele já não estava mais ali, o livro estava na estante e sua xícara na pia, como ele fez tudo isso tão rápido?

(...)

O dia parecia não passar, pela tarde poucas pessoas vieram, após às 15:00 ninguém mais apareceu. Era uma quinta-feira, iguais às outras e tão melancólicas.

Fechei as portas e agradeci por ter fechado, está feio e o vento ao me deixava congelando cada vez mais. Acendi a lareira e pude sentir o ambiente ficar quentinho. Sem pressa fui retirando o livro por livro, os colocando dentro de uma caixa em ordem e colocando ao lado estante. Cerca de meia hora depois havia cerca de cinco estantes vazias, e ao todo haviam 17 estantes, sem contar com outras peças antigas que também armazenavam livros. Respirei fundo e fui à luta. Meu nariz coçava a cada segundo que sentia a poeira entrar nas narinas, para que isso não fosse um problema, coloquei minha blusa como marcará e assim pude limpar a maior parte das estantes, sem espirros e sem poeira. Depois de algumas horas, tudo estava em seus devidos lugares, por fim eu olhei as horas e já passavam-se das 23:20. — Droga! — pestanejei e tinha certeza que havia perdido o último ônibus, ir a pé para casa até que não é ruim… quando você está totalmente bem fisicamente, e eu estou me sentindo "quebrada".

Havia começado a chover, mesmo fraco, estava me molhando. Não tinha como ir embora desse jeito. Sem escolhas fui para o ponto, era o único lugar que eu poderia me amparar da chuva.

Trovejava sem parar, o vento forte estava quase derrubando as árvores e sem agasalho, estava me tremendo de frio. Havia acabado de cair um raio bem próximo da onde eu estava, e isso me deixou com medo, pois além do barulho dos trovões, ainda tinha os raios e agora granizo.

O carro que estava vindo em direção ao ponto, me fez tremer por inteiro, mas ao abaixar o vidro e se mostrar, senti um alívio e agradeci internamente por não ser nenhuma outra pessoa.

— Entra no carro, eu levo você em casa. — pensei em hesitar e dizer não, mas já não suportava mais o frio e estava com muita fome.

Atravessei e entrei, sentada no banco de trás com bastante cuidado para não molhar o banco do carro, eu apoiei minha bolsa em minhas pernas e ele seguiu adiante, calado…

— Eu não fui legal aquele dia, estava com dor e estressada. Obrigada por ter me levado em casa e não ao hospital. — disse em um baixo tom de voz, de verdade, não esperava que ele respondesse, porém me surpreendi!

— Eu fiz o mínimo, aliás, nem isso! — discorreu com um leve desgosto em seu tom. — Deveria tê-la levado a um hospital, imagino que as dores não diminuíram, estou certo, Émie?

— Não. Elas diminuíram um pouco. É que, eu passo tantas horas distraída em meio aos livros que nem mesmo noto algo diferente em meu dia a dia.

— Deve ser um ótimo trabalho o seu, mas não tão bom quando se deveria aproveitar um pouco a vida. O que a levou a trabalhar naquela biblioteca? — sua pergunta era um tanto sem resposta, porque eu nunca pensei no porquê, só juntei o útil ao agradável quando fui contratada.

— Eu precisava de um emprego, e me deram um. — ele me olhou e negou com a cabeça em seguida, como se eu estivesse lhe contando algo engraçado.

— Sem tom de voz entrega que você mente! — o carro freou bruscamente, levando meu corpo para trás e para frente com o impulso. Tive sobre mim seu par de olhos cuidadoso e intimidador ao mesmo tempo. — Esses desgraçados deveriam olhar para trás ao invés de parar de uma vez. — retrucou baixinho, mas foi possível ouvir devido ao silêncio que estava entre nós.

— Não estou mentindo… eu realmente precisava de um emprego, e para minha sorte, lá estava precisando de uma pessoa que pudesse fazer as horas extras também e aqui estou eu.

— Por que não procurou alguma outra coisa? — além de ser curioso, ele era também arrogante e eu nem sabia seu nome.

— Acha que alguém daria emprego a uma pessoa problemática? Acho que não…

— Você não me parece problemática, pode ser que eu esteja enganado, porém é o que eu vejo quando olho para você. — o que era isso? Um elogio ou algo do tipo?

— De fato eu não sou, mas meus pais sim! — ao virar a esquina percebi que ele não parava, então decidi falar, não queria chegar em casa tarde. Não queria mais ouvir coisas inúteis. — Se não se importa, pode parar aqui mesmo, por favor! — antes de abrir a porta, senti seu toque em minha mão e rapidamente virei para ele.

— Se não se importa eu prefiro deixá-la em casa. Você pode pegar pneumonia e morrer.

— Isso não é nada convincente.

— A Srta. está em busca de palavras que a convençam, Srta. Carter?

— Não. Nem mesmo sei qual seu nome. Não deveria nem estar aqui dentro. Se não se incomoda, eu tenho que ir. Obrigada pela carona!

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