“Que Deus, em sua infinita misericórdia, dê o rumo para os que foram, e conforte o peito dos que permaneceram. De um livro retirei a frase: “A fé dá-nos respostas quando a razão falha”, que a palavra e as lembranças confortem o peito de cada um presente...”
— Ei, rapaz! — Chamou alguém próximo. — Heitor Newman, certo? Poderia dar uma palavrinha para o jornal “NovaEncomenda”?
— Desculpe, tenho um compromisso agora. — Disse entrando no carro e, virando-se para o motorista: — Para a comissão dos direitos e deveres, por favor.
Chegou cedo, atravessou a multidão que se sentava ao longo do anfiteatro e apontavam para o centro do palco e sentou-se logo à frente
O clima gelado era cada vez mais notável. O velho ônibus bufava uma fumaça acinzentada muito densa e, com certeza, qualquer um que viesse atrás não poderia enxergar um palmo à frente do para-brisa. A vegetação era muito diferente de onde os dois estavam saindo. O que antes era verde-vivo, agora beirava o preto e branco da neve e das folhas murchas. Um sol fraco beijava as copas das árvores que pareciam não se incomodar e só faziam acumular mais neve.Heitor e sua mãe vinham de um país vizinho, um país mais verde e mais quente. Mais aconchegante, talvez. Chamava-se: Brigada e em nada se parecia com o lugar que atravessavam agora. Por mais que fossem vizinhos, os dois países eram totalmente diferentes. Heitor notou que, enquanto saíam de Brigada, a vegetação tornara-se escassa e que o clima desértico perdeu espaço mais à
O dia clareou, mais frio que o dia anterior e Heitor mal conseguiu abrir os olhos devido à luz do dia que escorregava dentre a janela redonda e pousava sobre suas pálpebras. Coçou o cabelo perfeitamente alinhado que, mesmo depois do sono, acordara com o topete completamente submisso. Ergueu o tronco e notou algumas vozes vindas do andar de baixo onde, provavelmente, Antonella conversava com alguma visita. Meio sem jeito pela sonolência vestiu sua jaqueta de couro-brigiano e sua boina inseparável e partiu degraus abaixo, rumo à cozinha. As vozes foram subitamente ofuscadas pelos ruídos dos degraus e madeira velha, mas logo voltaram à tona quando o garoto surgiu do corredor. — Querido, você tem uma visita. — Antonella, que agora cortava algumas cebolas sobre o balcão, fez um aceno com a cabeça para que Heitor olhasse à volta. — Dona Valentina! — Disse o menino — A senhora está magnífica! E não pude deixar de notar as belas lantejoulas em seu cabe
Os dois outros dias passaram como um sopro forte, Heitor começara a acostumar-se com o frio e, como se o clima tentasse pregar-lhe uma peça, o sol nasceu maior e mais quente que nunca. Ao debruçar-se para ficar sentado em sua cama Heitor notou que o gelo acumulado do lado de fora da janela redonda agora derretia. Um sorriso quase involuntário imprimiu-se em seus lábios. Não precisaria mais andar embrulhado em camadas de panos como fizera desde que chegara.Levantou-se e rumou para a cômoda ao lado da janela, pegou sua velha boina e pôs-se à frente do espelho na porta do guarda roupa.“Não” — Pensou o menino passando as mãos pelos grossos fios de seu cabelo escuro. — “Desculpe, velha amiga.”Posou-a de volta acima da cômoda e vestiu sua velha jaqueta de couro preta. Seguiu, então, para o corredor e desceu os degraus que rangiam como se senti
— Sim? — Disse o garoto, num espanto.— Você vai responder ou só sabe sair por aí quebrando vidraças?Heitor apertou as mãos, era um absurdo o professor falar com ele daquela maneira, sem nunca tê-lo visto antes.— Qual a pergunta?O professor mordeu os lábios, mas pareceu respirar fundo e acalmar-se antes de prosseguir:— Qual o país que tem a maior fronteira com São Havier?— Brigada. — Heitor respondeu voltando os olhares para a garota, que em momento algum tirou os olhos do caderno, ao qual parecia desenhar alguma coisa. O professor ficou calado por alguns segundos, provavelmente incrédulo pela resposta correta.— Um ponto à menos na média.— O quê? Mas eu respondi certo! — Heitor disse, desviando os olhares da menina.— Mas estava babando pela srta. Delamare durant
Os garotos seguiram a pé para o grande lago, não demorou apenas quinze minutos como dissera Ícaro. Heitor teve a impressão de caminhar por no mínimo uma hora, talvez fosse o peso das bebidas em sua mochila, mas dali alguns minutos o garoto não aguentaria mais andar. Logo pode enxergar o azul à frente. O lago parecia calmo, e era realmente muito grande; quase não se via a outra margem, exceto por uma linha finíssima traçada sob o horizonte. — Aqui está ótimo. — Afonso disse, largando a mochila sobre a grama muito verde. — Parece que estamos sozinhos, ótimo! Heitor não conseguiu nem raciocinar, no que pareceram segundos, Marcus havia colocado uma música altíssima para tocar. Algo parecido com punk-rock socou os tímpanos do menino e todos os três largaram as camisetas e calças e se lançaram ao rio. Heitor ficou parado, sem compreender. — Vem, idiota! — Heitor viu as mãos dos garotos chacoalhando para cima e não pensou duas vezes. Deu um último go
O clima quente arrancava toda a energia de Heitor enquanto ele varria toda a padaria. Seu Omar já havia ido embora e sua mãe estava preparando a primeira fornada para entregas. Alguns minutos depois Antonella surgiu atrás do balcão estendendo-lhe a cesta com os pães.— Estes são para seu Héctor, o bibliotecário. Quando voltar tem outra entrega para o sr. Tirante. — O garoto fez uma cara de tédio e ela acrescentou, rapidamente — É aqui do lado.O sorriso da mulher melhorou, de certa forma, o seu dia. Heitor recolheu a cesta de pães e pôs-se à caminhar pela calçada que, sem a neve, parecia menos abandonada. Agora haviam mais pessoas na rua, do outro lado da calçada Heitor viu a velha sra. Joel carregando algumas batatas; andava tão devagar que parecia em câmera lenta. Acenou para Heitor e entrou na pequena casa que morava com sua neta.Heitor seguiu caminhando, a biblioteca não ficava tão perto da padaria de sua mãe. Heitor percebeu isso quando precisou ir pela primeira vez,
Heitor seguiu então para o outro lado, haviam centenas de prateleiras e o garoto começou a pensar o porquê de nunca ter entrado ali. Conseguiu ver títulos de todos os tipos, desde: “Uma viajem com gigantes” à “No pico da neblina” e até alguns livros mais velhos; depois de tirar a espessa camada de poeira pôde ler: “O príncipe Levi e suas estrelas”. Mas uma pessoa sentada em uma das mesas lhe chamou a atenção e, ao aproximar-se um pouco mais, conseguiu reconhece-la.— Quer dizer que a senhorita Áurea passa os intervalos aqui? — Berrou Afonso às costas de Heitor, enquanto corria para sentar-se com ela.— Eu não passo os intervalos aqui. — A menina respondeu com uma voz suave e tímida.— Claro, claro. Que merda você está lendo? — Afonso tentou puxar o livro mas a menina esquivou.Heitor conseguiu ler o título do livro enquanto sentava-se do outro lado da mesa, de frente para os dois.— O que são “Os ideais turcanos”? — O garoto perguntou para a menina e Afonso girou os o
Chegou mais de duas horas atrasado em casa e Antonella já estava dormindo em seu quarto. O menino pôs-se à subir os degraus até seu quarto e largou-se na cama meia iluminada pela luz que aparecia timidamente na janela redonda ao lado da velha cômoda de madeira escura.Quando acordou na manhã seguinte sua mãe não estava em casa, o garoto não se preocupou, sabia que provavelmente a mulher estaria na padaria, adiantando algumas tarefas. Comeu algumas torradas que Antonella deixara para o ele e partiu para o colégio, dessa vez sabia que não chegaria atrasado. Um carro muito bonito; de cor vermelho-azulado atravessou a estrada à toda velocidade, levantando poeira à uns dois metros de altura. Mas Heitor não se deixaria levar por nenhuma distração, chegaria no horário hoje, se não...Mas alguém chamou sua atenção do outro lado da rua