Jason
Quando ela me soltou, senti que estávamos mais próximos que nunca. A verdade é que, sempre pertencemos um ao outro de alguma forma. — Feliz aniversário, Clara. — Minha voz saiu baixa, quase um sussurro, enquanto eu segurava o cupcake na frente dela. A vela acesa tremulava com o ar úmido da chuva que vinha de fora, iluminando por um instante o rosto cansado e os olhos marejados dela. Me vi perdido naquele olhar, como se estivesse olhando para Clara de anos atrás, quando chegou sozinha e desolada pelo luto. Clara piscou, confusa e ainda meio fora de si, mas suas mãos trêmulas tocaram o pequeno bolinho. Por um segundo, ela pareceu frágil, como se estivesse tentando se agarrar a qualquer migalha de carinho. — Sopra a vela — murmurei. — Você merece pelo menos isso. É seu aniversário. — Obrigada, Jason. Por tudo. Ela fechou os olhos e soprou, e o mundo pareceu parar. Era um momento pequeno, mas por algum motivo, pesado e cheio de significado. Eu não tinha ideia de como remediar o passado entre nós, mas ali estava eu, tentando. Pela primeira vez, estava tentando consertar alguma coisa que realmente me importava de verdade. Meus dedos escorregaram pelo braço dela, descendo até sua mão. A proximidade era inevitável, e pela primeira vez, Clara não se afastou. Inclinei-me devagar, quase sem respirar, como se temesse que qualquer movimento brusco pudesse quebrar o que quer que fosse isso entre nós. Estava prestes a beijá-la quando a porta da floricultura se abriu com um rangido. — Clara! — Uma voz familiar atravessou o silêncio. Virei o rosto com um estalo, e lá estava ele: o tal amigo presente. Um buquê de flores em uma mão e uma sacola de presente na outra, parecendo satisfeito consigo mesmo pelo esforço que fez. Meu corpo ficou tenso, e o calor do ciúme subiu pelo meu peito como uma labareda incontrolável. Me senti fora de mim pra alguns segundos, mas mantive a calma por fora, mesmo que por dentro, eu esteja em chamas. Clara piscou, surpresa, enquanto o idiota se aproximava com um sorriso. — Achei que ia estar sozinha. — Ele parou ao lado dela, oferecendo o buquê e a sacola. — Feliz aniversário, Clara. Eu não disse nada, mas a tensão no ar era quase palpável. Meu maxilar doía de tanto apertar os dentes. O cara a olhava como se eu não existisse, e Clara… Clara parecia perdida entre a confusão do momento e o álcool que ainda a dominava. Então, de repente, ela cambaleou e apagou, desmaiando em meus braços. O deixando ali, parado e sem reação diante de tudo que estava acontecendo. Clara Eu não lembro muito bem como tudo aconteceu. Só me lembro do cheiro das rosas, do gosto amargo do vinho na boca e da sensação do corpo leve demais para suportar o peso das emoções. Quando abri os olhos por um instante, vi Jason me segurando firme, e a última coisa que escutei foi a voz do meu amigo, preocupada e distante. Depois disso, tudo ficou escuro... Jason Segurei Clara firme, impedindo que ela caísse no chão. — Eu ajudo — disse o amigo, estendendo as mãos, como se eu precisasse de algo vindo dele. — Não precisa — cortei, curto e direto. — Eu a levo. E vê se dá o fora. A expressão dele ficou tensa, mas não insisti. Peguei Clara no colo, ignorando o buquê e o presente dele jogados de lado. Não ia deixar aquele idiota bancar o herói. Clara era problema meu, e eu cuidaria dela, como sempre fiz. A chuva continuava forte enquanto eu a levava até o carro. Quando chegamos em casa, minha mãe estava na porta, o rosto preocupado. — Jason, o que aconteceu? — perguntou, correndo até nós. — O que houve com ela? — Ela permaneceu perguntado rapidamente, na espera de uma resposta. — Ela bebeu demais, mãe — respondi, sem deixar transparecer nada além de frieza. — Vou colocá-la na cama, conversamos depois. Minha mãe me olhou com preocupação genuína. Ela sempre tratou Clara como uma filha, e era a primeira vez que a via assim, tão vulnerável. Bêbada, essa era palavra que ela nunca ouviu quando se tratava de Clara. — Ela nunca fez isso antes... — comentou, preocupada. — Eu sei. Vou cuidar dela. Eu prometo. Entrei na casa com Clara ainda nos braços. Minhas amigas estavam na sala, conversando alto e rindo, mas minha paciência com elas já tinha acabado, assim como há muito tempos atrás. — Jantar cancelado. Podem ir embora — disse, sem rodeios. — E por favor, não venham mais aqui. — O quê? Jason, nós... — uma delas tentou protestar. — A gente... — Agora. — Disse firme apontando para porta. Não esperei mais. Elas saíram, resmungando entre si, mas não me importei. Levei Clara até o quarto dela e a deitei na cama com cuidado. Ela se mexeu um pouco, murmurando algo incompreensível, mas não acordou. Fiquei ali por um momento, olhando para ela. O rosto adormecido parecia tão diferente daquele que ela sempre mostrava: forte, distante. Pela primeira vez em muito tempo, Clara parecia… frágil. E algo dentro de mim se remexeu, uma coisa que eu não sabia nomear. Talvez arrependimento de tudo que lhe causou no passado ou talvez, eu esteja apenas tentando me redimi. Clara Quando acordei, o quarto estava escuro, exceto por um feixe de luz fraca vindo do corredor. Minha cabeça latejava, e meu estômago se revirava. Pisquei algumas vezes, tentando me lembrar do que tinha acontecido. Jason. As rosas. O vinho. E depois... nada. Levantei-me devagar, ignorando a tontura, e fui até o banheiro. Joguei água no rosto, mas o enjoo não cedia. Precisava ir trabalhar, mesmo assim. Não podia me dar ao luxo de faltar. Mesmo que seja na floricultura e que minha madrinha iria preferir que eu fique em casa, não consigo ficar muito perto do Jason sem sentir o fogo do desejo me consumindo. Coloquei uma roupa simples e saí do quarto, na esperança de passar despercebida. Mas, é claro, Jason estava na cozinha, como se estivesse esperando por mim. — Vai a algum lugar? — perguntou, a voz baixa, mas firme. — Como está se sentindo? — Trabalho — respondi sem olhar para ele. — Preciso ocupar minha mente um pouco. — Clara, você mal consegue ficar de pé. — Ele encostou-se na bancada e ficou seus olhos nos meus. — Não é da sua conta. — Rebati, remexendo em minha bolsa. Ele me encarou por um momento, os olhos impassíveis. — É, sim. — Desde quando? — perguntei, finalmente o encarando dessa vez. Jason não respondeu de imediato. Apenas me olhou, como se estivesse pesando as palavras. — Desde sempre — disse por fim, a voz tão baixa que mal consegui ouvir. Falou mais para ele do que para mim. Meu coração deu um salto estranho, mas eu o ignorei, deve ser efeito do vinho ainda. — Não precisa fingir que se importa, Jason. Estou bem, sempre estive bem. Ele se aproximou, os olhos fixos nos meus, parecendo que ele vê além do que eu posso demonstrar. — Clara, você não está bem. Pode mentir para você mesma, mas para mim não. Havia algo na voz dele, uma mistura de frustração e preocupação que me pegou de surpresa. Mas eu não ia ceder. Não podia. — Só preciso ir trabalhar. Até mais... Passei por ele, tentando ignorar a sensação de seu olhar queimando minhas costas. Mas, no fundo, eu sabia que ele não deixaria as coisas assim. Não desta vez. Mas por quê? Ele nunca se importou, pelo contrário, sempre demonstrou que não dava a mínima para mim.ClaraQuando sair da floricultura, parei em um bar familiar e tomei algumas cervejas, já que eu volto sozinha. Tenho uma dor absurda na alma e sinto como se tivesse um buraco enorme nela, mas, quando Jason está por perto, eu me sinto... protegida. Quando cheguei em casa, minha madrinha havia saído com suas amigas e Jason estava sozinho em casa. Subi para meu quarto e me despi, quando de repetente, ele invadiu o quarto sem aviso.Jason estava perto, mais perto do que eu jamais imaginaria que estaria novamente. A chuva lá fora continuava caindo em um ritmo suave, enquanto dentro do quarto, o silêncio entre nós era denso e carregado de tensão. Eu não sabia se deveria me afastar ou simplesmente ceder. As memórias daquele primeiro beijo, quando eu tinha 17 anos, ressurgiram como uma maré que engoliu qualquer lógica que eu ainda tentava manter.— Jason... — sussurrei, a voz vacilando.Ele não disse nada. Seus olhos cinzentos me encaravam intensamente, como se estivesse lutando com algo den
ClaraA floricultura era o único lugar onde eu conseguia respirar. O cheiro de rosas, lírios e jasmim me envolvia como uma manta de conforto, afastando a sensação sufocante que Jason havia deixado para trás. Eu precisava de espaço, precisava fugir das memórias daquele beijo e da revelação devastadora sobre Amélia.Alex me mandou uma mensagem no caminho para o trabalho: decidir trabalhar até às 23:00. Alex: "E então? Que tal jantar hoje à noite? Só nós dois." E só então, quase às 19:00 foi que eu vi sua mensagem, que ele enviou mais cedo. A tentação de aceitar surgiu imediatamente. Eu sabia que ele estava tentando ser gentil e que sua companhia poderia me ajudar a esquecer, ao menos por algumas horas, o desastre que minha vida havia se tornado.Clara: "Ok. Às nove?"Ele respondeu com um emoji sorridente e um simples “Combinado”, e foi isso.Passei restante do tempo que falava cercada pelas flores, mas a paz que tanto buscava parecia fora de alcance. O beijo de Jason ainda queimava me
JasonA casa estava envolta em silêncio. Minha mãe dormia profundamente, e as luzes estavam apagadas. Mas eu não conseguia descansar. O jantar com Alex mexeu comigo de um jeito que eu não queria admitir. Cada minuto em que Clara esteve longe parecia uma afronta, uma confirmação de que ela estava escapando de mim, novamente e agora eu já não posso fazer mais nada. Quando ouvi o som suave da porta se fechando, soube que era ela. Levantei da cama sem pensar, guiado por um impulso que eu não entendia bem. Eu precisava vê-la. Precisava entender por que, mesmo depois de tudo, ela ainda conseguia me deixar assim: inquieto, confuso e com raiva ao mesmo tempo. Porém, a necessidade de senti-la novamente é mais forte que eu. Abri a porta do quarto dela sem bater, como sempre fazia. O direito de invadir o espaço dela havia se tornado um hábito difícil de largar. Mas, dessa vez, o que vi me tirou o fôlego.Clara estava sentada na cama, uma mala aberta ao lado. Que porra é está acontecendo? — O
Clara Não conseguir dormir, os pensamentos sempre se voltam para Jason e acabam me quebrando ainda mais. Quando sair do quarto, minha madrinha já havia colocado a mesa para o café da manhã. Por um momento, senti meu peito doer por saber que essa será a última vez que estaremos nos sentando juntos para um café da manhã. — Bom dia, madrinha. — Lhe dei um beijo no rosto e um abraço em seguida. Não era surpresa alguma, mas de alguma forma diferente, Jason mexeu ainda um pouco mais comigo hoje. Ele estava descendo as escadas vestido com um roupão. Por um momento, imaginei que Amélia fosse descer também, mas nada disso aconteceu e por um instante, nosso olhares se cruzaram. — Sentem-se, ou estão esperando que eu também o façam sentar? — Como sempre, ela é receptiva demais em tudo que faz e isso, de certa forma, faz eu me sentir como se eu fosse uma ingrata. Nos sentamos e o clima não era o mesmo. Havia uma nuvem de sobrecarga ali, entre mim e Jason, como se alguma coisa nos impedisse
Alguns dias depois... Jason Amélia estava deitada na minha cama, mexendo no celular e rindo sozinha de alguma mensagem que havia recebido. Eu, encostado na porta do quarto, não conseguia tirar Clara da cabeça. A cena dela saindo com Alex no bingo havia acendido uma raiva que eu mal conseguia controlar. Não sei até quando irei com seguir controlar tudo isso, alguma hora vou acabar explodindo. — Jason? — Amélia chamou, sem tirar os olhos da tela. — Preciso voltar para Nova York amanhã. Tenho um projeto importante na faculdade e não posso faltar. Já tirei mais dias do que eu deveria para vir te ver. — Não precisava fazer isso por mim. — Ela me olhou de relance, mas voltou a olhar para gela do celular novamente. — Jason... não precisa ser assim, quando eu estiver formada em direito, vamos ter mais tempo para nós dois. Mas estarei fazendo o que puder para que nosso casamento seja perfeito. Eu assenti, como se isso importasse. — Tudo bem. Vou resolver as coisas do casamento daqui
JasonOs dias seguintes foram confusos. Clara nunca tinha sido fácil de decifrar, mas agora, parecia impossível. Desde o momento em que saiu da casa de Helena, rindo como se nada importasse, algo começou a me incomodar mais do que eu queria admitir. Amélia percebia minha distração, mas não dizia nada. Talvez ela soubesse que não adiantaria tentar arrancar de mim o que estava preso na minha mente.Hoje, eu estava voltando à casa de Helena para resolver algumas pendências com a mudança. Amélia já havia começado a organizar as coisas, e eu sabia que não teria como evitar Clara para sempre.Quando estacionei em frente à casa, Clara estava lá. Sentada na varanda com Helena, tomando chá como se nada tivesse mudado. Elas riam de algo, uma cena tão familiar que me fez hesitar antes de descer do carro.Respirei fundo e fui em direção à entrada.— Jason! — Helena me cumprimentou com o mesmo entusiasmo de sempre. — Já terminou tudo na nova casa? — O entusiasmo da minha mãe deveria me deixar empo
ClaraOs sons da festa ecoavam em minha cabeça enquanto eu cambaleava pelas ruas. A música pulsava, mas eu só sentia um vazio. O álcool havia me tomado por completo, e eu precisava de algo que não fosse um copo na mão. Não costume beber ao ponto de sentir meu corpo adormecer, mas hoje, acho que a única coisa de que eu preciso é exatamente disso. Mas por ora, Icy já não era mais o meu lugar. Caminhei pela ruas desertas e frias, sentindo meu corpo suplicando por ajuda em silêncio, foi quando entrei no bar, reconheci alguns rostos familiares. Alex estava lá, acompanhado com alguns de seus amigos, mas meu olhar foi direto para Jason. Ele estava em uma mesa, rindo, mas logo seu sorriso desapareceu quando me viu. As lembranças do nosso último encontro ainda estavam frescas.— Clara! — Ele chamou, levantando-se e vindo em minha direção. Como se eu fosse sua prole. — Não, Jason. Hoje não, por favor. Vamos manter a distância necessária — gritei, tentando me afastar. A pressão em meu peito au
ClaraA manhã chegou com o brilho cruel do sol invadindo a sala. Meu corpo estava pesado, mas minha mente, ainda mais. Jason estava sentado na poltrona ao lado, o rosto cansado, mas atento. Quando percebi, ele já tinha preparado um chá e deixado na mesinha à minha frente. — Como você está? — ele perguntou, quebrando o silêncio e surgindo do nada, me dando um enorme susto.— Melhor, eu acho — respondi, a voz ainda rouca da noite anterior.Ele parecia aliviado, mas ainda carregava aquela tensão que vinha se tornando constante entre nós. Antes que pudesse dizer algo mais, meu celular vibrou no bolso do meu casaco. Era Helena, minha madrinha.— Bom dia, querida! Preciso de sua ajuda hoje — disse ela, com seu tom animado. — Vou escolher as rosas para o casamento do Jason e da Amélia.Meu corpo congelou. Jason desviou o olhar, claramente desconfortável.— Claro, Helena. Onde e que horas? — respondi, tentando manter minha voz neutra.— Nos encontramos na floricultura às dez.Desliguei, tent