Clara
Quando sair da floricultura, parei em um bar familiar e tomei algumas cervejas, já que eu volto sozinha. Tenho uma dor absurda na alma e sinto como se tivesse um buraco enorme nela, mas, quando Jason está por perto, eu me sinto... protegida. Quando cheguei em casa, minha madrinha havia saído com suas amigas e Jason estava sozinho em casa. Subi para meu quarto e me despi, quando de repetente, ele invadiu o quarto sem aviso. Jason estava perto, mais perto do que eu jamais imaginaria que estaria novamente. A chuva lá fora continuava caindo em um ritmo suave, enquanto dentro do quarto, o silêncio entre nós era denso e carregado de tensão. Eu não sabia se deveria me afastar ou simplesmente ceder. As memórias daquele primeiro beijo, quando eu tinha 17 anos, ressurgiram como uma maré que engoliu qualquer lógica que eu ainda tentava manter. — Jason... — sussurrei, a voz vacilando. Ele não disse nada. Seus olhos cinzentos me encaravam intensamente, como se estivesse lutando com algo dentro de si. Então, devagar, ele fechou a distância entre nós. Aquele beijo. Delicado no início, mas cheio de urgência contida. Os lábios dele eram firmes e frios, mas o gesto em si era quente e carregado de significado, como se ele estivesse tentando dizer algo que não conseguia colocar em palavras. Eu não resisti. Meus dedos se entrelaçaram em seus cabelos, e ele me puxou ainda mais para perto, segurando minha cintura como se eu fosse escapar se ele afrouxasse o toque. Aquele beijo era diferente do primeiro, mas o impacto foi o mesmo — avassalador e inesquecível. Quando ele se afastou por um momento, respirando pesado, seu olhar parecia distante e ao mesmo tempo fixo em mim. Será que é real? Ou seria apenas mais um pouco de imaginação minha? — Você bebeu? Onde estava? — Não era hora de cobrar ciúmes, já é tarde demais para isso. — Por que agora? — perguntei, sentindo a emoção na garganta. — Por que depois de tudo? Sabe que o que a gente fez é errado, não é? E não pense que vai ficar se aproveitando de mim quando eu estiver bêbada. Jason balançou a cabeça, como se não tivesse a resposta para a pergunta. Ou talvez tivesse, mas não quisesse dizer. — Eu não sei, Clara. Só... aconteceu. E você precisa parar com isso. Você não é assim, não deveria agir como uma garota. Você não tem mais 17 anos, Clara. Por que não continuamos como sempre foi? Você me deixa eu te proteger, em troca, você se comporta. Como sempre foi. Então, o que me diz? Eu senti meu coração acelerado, a mente confusa. Era isso que eu sempre quis? Talvez. Mas ao mesmo tempo, a sensação de que algo estava errado não me deixava em paz. Antes que eu pudesse perguntar mais alguma coisa, o celular dele vibrou no bolso. Meu coração estremeceu junto com a vibração. Não era coisa boa que estava por vir. Jason piscou, como se tivesse sido arrancado daquele momento íntimo. Com um suspiro pesado, ele pegou o celular e olhou a tela. Seus olhos endureceram imediatamente, e eu soube que algo estava acontecendo. — O que foi? — perguntei, ainda tentando recuperar o fôlego. Parecendo que aquilo foi uma despedida dolorosa. — Nada. — Ele desligou a tela rapidamente e enfiou o telefone no bolso de volta. Mas eu vi. Vi o suficiente. O nome de uma mulher apareceu na tela antes que ele pudesse esconder. “Amélia”. — Quem é Amélia? — perguntei, tentando manter a voz firme, mas falhando miseravelmente. Aquilo é um golpe baixo, ele não deveria me tratar como lixo. — Você não muda nunca mesmo. Jason evitou meu olhar, ajeitando-se de pé ao lado da cama. — É só... alguém. Alguém que não é tão importante quanto como. Só alguém. Claro. Como se aquilo fizesse algum sentido. Antes que eu pudesse questioná-lo mais, o celular dele vibrou novamente. Desta vez, ele não teve tempo de esconder a notificação. A mensagem dizia que Amélia estava chegando e perguntava onde ele estava. Maldito canalha. — Jason? — Minha voz soou baixa, mas carregada de tensão. — Sente prazer em me fazer de idiota? Ele passou a mão pelo rosto, como se estivesse tentando pensar no que dizer. — Eu não queria que você soubesse assim. E não, eu não sinto me sinto nenhum pouco bem fazendo isso com você, Clara. — Saber o quê? — O peso na boca do meu estômago cresceu, como se eu já soubesse a resposta. — Até porque, você mesmo já disse que eu não tenho a ver com a sua vida. Jason respirou fundo, finalmente olhando para mim com uma expressão que misturava arrependimento e frustração. — Amélia é minha noiva. — Sua voz estava carregada de algo que eu não sei descrever. Por um segundo, o chão pareceu desaparecer debaixo dos meus pés. Noiva? A palavra ecoava na minha mente, esmagando qualquer resquício do momento que acabamos de compartilhar. — Você vai se casar? — sussurrei, sentindo a traição arder no peito. — E só agora está me dizendo? Ele não respondeu imediatamente. Apenas me olhou com aqueles olhos cinzentos que agora pareciam tão distantes. — Eu ia contar, mas... não queria que fosse assim. Eu não queria que fosse dessa forma. — Você ia contar? Quando? — Minha voz aumentou de tom, a raiva misturada com a mágoa. — Antes ou depois de me beijar de novo? Por que fez isso? Para que eu me sinta uma traidora? Jason fechou os olhos por um momento, como se estivesse tentando se recompor. — Clara, eu não sei o que está acontecendo. Eu não planejei nada disso. É claro que a culpa é minha. — Suas mãos tentaram alcançar meu rosto, mas eu desviei rápido o suficiente para impedir. — Não planejou? — Eu ri, um riso amargo e doloroso. — Claro que não. Porque você nunca planeja nada. Só faz o que quer, quando quer. E quem sobra para juntar os pedaços sou eu. Antes que ele pudesse responder, ouvimos o som de passos na escada. Amélia estava aqui. Jason se afastou de mim como se tivesse sido queimado. — Preciso descer. Eu o encarei, sentindo meu coração partir um pouco mais a cada segundo. — Vai lá, Jason. Sua noiva está esperando. E vê se não invade mais essa porra de quarto. Jason Desci as escadas com o coração pesado, sentindo a culpa pesar sobre mim como uma m*****a âncora. Amélia estava na sala de estar, sorrindo como se não houvesse nada errado no mundo. — Surpresa! — disse ela, se aproximando para me abraçar. Mas minha alma ainda está no quarto da Clara. Tentei retribuir o gesto, mas minha mente ainda estava presa em Clara. No beijo. Na maneira como ela olhou para mim, magoada e confusa. — Jason, está tudo bem? — Amélia perguntou, preocupada. — Parece preocupar e tenso... Eu forcei um sorriso. — Sim. Só... cansado da viagem. E como está você? Minha mãe apareceu na porta da cozinha, surpresa ao ver Amélia. — Quem é essa, Jason? — Surpresa e com um enorme desdém. Eu hesitei por um momento, mas sabia que não poderia mais evitar. — Mãe, essa é Amélia. Minha noiva. — Forcei um sorriso, enquanto minha mãe estava em sua cintura. A expressão de minha mãe congelou por um segundo, mas logo se recompos. — Noiva? — ela repetiu, lançando um olhar de dúvida. — Por que você nunca mencionou isso antes? Eu iria ficar contente em saber que meu filho está noivo, agora me sinto chateada por não saber que meu filho está prestes a se casar. — Foi recente — menti, tentando acabar com a conversa. — Precisamos conversar depois, mãe. Ela assentiu lentamente, mas algo em seu olhar dizia que não estava convencida. Enquanto Amélia seguia para a cozinha, animada para conhecer minha mãe, eu parei na escada. Eu não sabia como encarar Clara depois disso. E a verdade era que, por mais que tentasse negar, parte de mim não queria. Porque sabia que, naquele momento, algo tinha mudado para sempre.ClaraA floricultura era o único lugar onde eu conseguia respirar. O cheiro de rosas, lírios e jasmim me envolvia como uma manta de conforto, afastando a sensação sufocante que Jason havia deixado para trás. Eu precisava de espaço, precisava fugir das memórias daquele beijo e da revelação devastadora sobre Amélia.Alex me mandou uma mensagem no caminho para o trabalho: decidir trabalhar até às 23:00. Alex: "E então? Que tal jantar hoje à noite? Só nós dois." E só então, quase às 19:00 foi que eu vi sua mensagem, que ele enviou mais cedo. A tentação de aceitar surgiu imediatamente. Eu sabia que ele estava tentando ser gentil e que sua companhia poderia me ajudar a esquecer, ao menos por algumas horas, o desastre que minha vida havia se tornado.Clara: "Ok. Às nove?"Ele respondeu com um emoji sorridente e um simples “Combinado”, e foi isso.Passei restante do tempo que falava cercada pelas flores, mas a paz que tanto buscava parecia fora de alcance. O beijo de Jason ainda queimava me
JasonA casa estava envolta em silêncio. Minha mãe dormia profundamente, e as luzes estavam apagadas. Mas eu não conseguia descansar. O jantar com Alex mexeu comigo de um jeito que eu não queria admitir. Cada minuto em que Clara esteve longe parecia uma afronta, uma confirmação de que ela estava escapando de mim, novamente e agora eu já não posso fazer mais nada. Quando ouvi o som suave da porta se fechando, soube que era ela. Levantei da cama sem pensar, guiado por um impulso que eu não entendia bem. Eu precisava vê-la. Precisava entender por que, mesmo depois de tudo, ela ainda conseguia me deixar assim: inquieto, confuso e com raiva ao mesmo tempo. Porém, a necessidade de senti-la novamente é mais forte que eu. Abri a porta do quarto dela sem bater, como sempre fazia. O direito de invadir o espaço dela havia se tornado um hábito difícil de largar. Mas, dessa vez, o que vi me tirou o fôlego.Clara estava sentada na cama, uma mala aberta ao lado. Que porra é está acontecendo? — O
Clara Não conseguir dormir, os pensamentos sempre se voltam para Jason e acabam me quebrando ainda mais. Quando sair do quarto, minha madrinha já havia colocado a mesa para o café da manhã. Por um momento, senti meu peito doer por saber que essa será a última vez que estaremos nos sentando juntos para um café da manhã. — Bom dia, madrinha. — Lhe dei um beijo no rosto e um abraço em seguida. Não era surpresa alguma, mas de alguma forma diferente, Jason mexeu ainda um pouco mais comigo hoje. Ele estava descendo as escadas vestido com um roupão. Por um momento, imaginei que Amélia fosse descer também, mas nada disso aconteceu e por um instante, nosso olhares se cruzaram. — Sentem-se, ou estão esperando que eu também o façam sentar? — Como sempre, ela é receptiva demais em tudo que faz e isso, de certa forma, faz eu me sentir como se eu fosse uma ingrata. Nos sentamos e o clima não era o mesmo. Havia uma nuvem de sobrecarga ali, entre mim e Jason, como se alguma coisa nos impedisse
Alguns dias depois... Jason Amélia estava deitada na minha cama, mexendo no celular e rindo sozinha de alguma mensagem que havia recebido. Eu, encostado na porta do quarto, não conseguia tirar Clara da cabeça. A cena dela saindo com Alex no bingo havia acendido uma raiva que eu mal conseguia controlar. Não sei até quando irei com seguir controlar tudo isso, alguma hora vou acabar explodindo. — Jason? — Amélia chamou, sem tirar os olhos da tela. — Preciso voltar para Nova York amanhã. Tenho um projeto importante na faculdade e não posso faltar. Já tirei mais dias do que eu deveria para vir te ver. — Não precisava fazer isso por mim. — Ela me olhou de relance, mas voltou a olhar para gela do celular novamente. — Jason... não precisa ser assim, quando eu estiver formada em direito, vamos ter mais tempo para nós dois. Mas estarei fazendo o que puder para que nosso casamento seja perfeito. Eu assenti, como se isso importasse. — Tudo bem. Vou resolver as coisas do casamento daqui
JasonOs dias seguintes foram confusos. Clara nunca tinha sido fácil de decifrar, mas agora, parecia impossível. Desde o momento em que saiu da casa de Helena, rindo como se nada importasse, algo começou a me incomodar mais do que eu queria admitir. Amélia percebia minha distração, mas não dizia nada. Talvez ela soubesse que não adiantaria tentar arrancar de mim o que estava preso na minha mente.Hoje, eu estava voltando à casa de Helena para resolver algumas pendências com a mudança. Amélia já havia começado a organizar as coisas, e eu sabia que não teria como evitar Clara para sempre.Quando estacionei em frente à casa, Clara estava lá. Sentada na varanda com Helena, tomando chá como se nada tivesse mudado. Elas riam de algo, uma cena tão familiar que me fez hesitar antes de descer do carro.Respirei fundo e fui em direção à entrada.— Jason! — Helena me cumprimentou com o mesmo entusiasmo de sempre. — Já terminou tudo na nova casa? — O entusiasmo da minha mãe deveria me deixar empo
ClaraOs sons da festa ecoavam em minha cabeça enquanto eu cambaleava pelas ruas. A música pulsava, mas eu só sentia um vazio. O álcool havia me tomado por completo, e eu precisava de algo que não fosse um copo na mão. Não costume beber ao ponto de sentir meu corpo adormecer, mas hoje, acho que a única coisa de que eu preciso é exatamente disso. Mas por ora, Icy já não era mais o meu lugar. Caminhei pela ruas desertas e frias, sentindo meu corpo suplicando por ajuda em silêncio, foi quando entrei no bar, reconheci alguns rostos familiares. Alex estava lá, acompanhado com alguns de seus amigos, mas meu olhar foi direto para Jason. Ele estava em uma mesa, rindo, mas logo seu sorriso desapareceu quando me viu. As lembranças do nosso último encontro ainda estavam frescas.— Clara! — Ele chamou, levantando-se e vindo em minha direção. Como se eu fosse sua prole. — Não, Jason. Hoje não, por favor. Vamos manter a distância necessária — gritei, tentando me afastar. A pressão em meu peito au
ClaraA manhã chegou com o brilho cruel do sol invadindo a sala. Meu corpo estava pesado, mas minha mente, ainda mais. Jason estava sentado na poltrona ao lado, o rosto cansado, mas atento. Quando percebi, ele já tinha preparado um chá e deixado na mesinha à minha frente. — Como você está? — ele perguntou, quebrando o silêncio e surgindo do nada, me dando um enorme susto.— Melhor, eu acho — respondi, a voz ainda rouca da noite anterior.Ele parecia aliviado, mas ainda carregava aquela tensão que vinha se tornando constante entre nós. Antes que pudesse dizer algo mais, meu celular vibrou no bolso do meu casaco. Era Helena, minha madrinha.— Bom dia, querida! Preciso de sua ajuda hoje — disse ela, com seu tom animado. — Vou escolher as rosas para o casamento do Jason e da Amélia.Meu corpo congelou. Jason desviou o olhar, claramente desconfortável.— Claro, Helena. Onde e que horas? — respondi, tentando manter minha voz neutra.— Nos encontramos na floricultura às dez.Desliguei, tent
ClaraO vento fresco da tarde batia contra meu rosto enquanto eu encarava a estrada através da janela do carro. Minha madrinha, Helena, estava ao meu lado, falando sobre os detalhes do casamento, mas suas palavras soavam distantes, abafadas pelo caos em minha mente. Como se eu pudesse fugir disso. — Você fez um gesto lindo, sabia? — Helena comentou, desviando os olhos da estrada para mim. — Mas, confesso que aí da estou impressionada com tanta... tanta disponibilidade da sua parte. — Só estou tentando ajudar — respondi, com um sorriso forçado. — Aliás, são só flores para o casamento do seu filho. — Ajudar ou se punir? — A pergunta dela veio como uma faca afiada. — E não são somente flores, são as flores que você cultiva. — Eu sei, madrinha. Mas qual diferença iria fazer se eu aceitasse o dinheiro dela? Que sejam felizes, como desejam. Eu só fiz a minha parte, não por eles, mas porque a senhora me ensinou valores que não podem ser pagos com dinheiro. — E esse valor aplica-se també