Clara Os dias seguintes foram uma mistura de monotonia e tensão. A conversa com Amélia ainda ecoava na minha mente, e cada palavra que ela dizia parecia ter sido calculada para me desestabilizar. Mas, por mais que quisesse me livrar dessa situação, Jason continuava me prendendo de alguma forma, mesmo sem querer. Na floricultura, tentei me ocupar com as encomendas de fim de ano. Trabalhar com flores sempre foi uma forma de aliviar a mente, mas nem mesmo o perfume das rosas ou o toque das pétalas macias me acalmavam. Até que Alex apareceu. — Clara, você está bem? — Ele perguntou, entrando com o ar casual de sempre, mas os olhos carregados de preocupação. — Estou. Por que a pergunta? — No fundo, eu ainda estava brava por ele não ter me contado que era primo de Amélia. Ele se aproximou do balcão e apoiou os cotovelos, como fazia quando queria ter uma conversa séria. — Fiquei sabendo que Amélia foi até sua casa. — Seu olhar de pena sobre mim, me fazia querer dizer algo a ele, mas m
Clara Não demoramos muito no rinque. Jason e eu bebemos alguns drinks antes de cada um tomar seu próprio rumo novamente. Ele me deixou na floricultura e foi embora com seu carro, andando devagar até desaparecer entre a neblina. A noite estava estranhamente silenciosa depois que Jason foi embora. O vento sussurrava pelos galhos das árvores, e o som distante dos carros na avenida parecia um eco de tudo o que eu tentava ignorar. Mas a verdade era que o silêncio externo não refletia o caos dentro de mim. Minha mente era um turbilhão de emoções, meámórias e dúvidas. Voltei para dentro da floricultura, trancando a porta como se isso pudesse proteger meu coração de novos ataques. Sentei-me atrás do balcão, olhando para as flores que tinham sido deixadas para trás no final do dia. Rosas, lírios, girassóis. Cada uma delas carregava um significado, mas todas pareciam desbotadas diante do que eu sentia. Jason sempre teve esse poder sobre mim. Mesmo quando estávamos longe, ele conseguia fazer
Clara Eu não queria mais pensar. Não queria mais refletir sobre a dor que estava martelando minha mente. Depois que Jason foi embora, meu coração ainda batia acelerado, mas meu corpo estava exausto. Eu sentia que estava à beira de um colapso, sem mais forças para lutar contra a tempestade emocional que me consumia. Então, tomei uma decisão impulsiva. Após encerrar o atendimento na floricultura, peguei meu casaco e fui embora da floricultura, sem rumo certo. As ruas da cidade estavam vazias, e as luzes dos postes iluminavam o caminho solitário à minha frente. Não havia uma razão específica para ir, exceto a necessidade de afastar a angústia que me sufocava. Entrei em um bar, quase sem perceber o lugar onde estava. A música alta e as conversas distantes me cercaram, mas eu só consegui focar no bar. Sentei no banco e pedi uma dose forte, algo que queimasse minha garganta e apagasse os pensamentos que se repetiam em minha mente. O primeiro gole foi amargo, mas eficaz. Uma sensação de a
Clara Acordei sozinha, com a luz suave da manhã filtrando pelas cortinas. A cama ao meu lado estava vazia, e uma sensação de vazio se instalou no meu peito. Fiquei ali por um momento, imóvel, tentando processar a noite anterior. As lembranças estavam confusas, entrelaçadas com os flashes do beijo, os toques, a sensação de estar em algo muito mais profundo do que eu poderia entender. Mas, a sensação que eu fiz errado também estava me consumindo e eu não que não é certo. Jason. Ele havia me deixado antes que eu acordasse, sem uma palavra de despedida, sem qualquer explicação. Talvez fosse o melhor, pensei. Nada entre nós dois fazia sentido, mas havia algo em meu coração que me dizia que ainda precisávamos lidar com tudo o que acontecera. Ainda em choque com a reviravolta dos últimos dias, me levantei e tentei me arrumar para o que o dia me traria. Não demorou muito para que meu celular vibrasse na mesa de cabeceira. Era uma mensagem de minha madrinha. "Clara, querida, após o bingo
ClaraAcordei sobressaltada com o toque insistente do celular ao meu lado. Meus olhos estavam pesados, e minha mente demorou alguns segundos para entender onde estava. O quarto ainda tinha o cheiro aconchegante dos lençóis limpos de Helena, e eu adoro esse cheiro. Me faz lembrar meus melhores momentos.Peguei o celular com os olhos semicerrados e vi o nome de Amélia brilhando na tela. Meu coração acelerou. Por que ela me ligaria tão cedo? Enfim... eu não posso perder essa oportunidade incrível de ouví-la. — Alô? — Atendi com a voz sonolenta, sentindo um arrepio percorrer meu corpo. Eu precisei respirar fundo para não perder o controle da coisa. — Clara? — A voz dela soou surpresa, quase como se não esperasse que eu atendesse. — Eu... bom dia. Espero que não esteja incomodando.— O que você quer, Amélia? — suspirei, tentando controlar a irritação que começava a subir. — E você sempre está me incomodando. — Eu queria falar sobre Jason. Sobre o que aconteceu ontem. Eu não sou nenhuma
Clara A campainha da floricultura soou quando a porta se abriu, mas eu estava concentrada demais equilibrando um vaso pesado na prateleira para olhar quem era, talvez fosse um dos clientes de sempre. — Bom dia! — disse automaticamente, ajeitando as folhas que estavam tortas. — Bom dia, Clara. Meu corpo travou no mesmo instante. Aquela voz... eu nunca esqueceria aquela voz. Devagar, girei nos calcanhares, e meu coração quase parou ao ver quem estava ali. Caio. Ele estava mais alto, mais maduro, mas o sorriso torto ainda era o mesmo. O cabelo mais curto do que eu lembrava, os olhos castanhos brilhando como antes. Por um momento, tudo ao meu redor desapareceu. Eu tinha quatorze anos de novo, olhando para o meu melhor amigo e lutando contra a paixão boba que sentia por ele. — Caio? — minha voz saiu quase num sussurro. O espanto me tomou aquele momento e eu estava feliz em vê-lo novamente. Ele sorriu, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans. — Achei que você fosse demorar m
JasonO aroma familiar de lavanda e terra molhada da floricultura encheu meus pulmões assim que abri a porta. Fazia cinco anos que eu não pisava aqui. A casa estava quase idêntica ao que eu lembrava – acolhedora, cheia de flores por todos os lados. Mas o ar, aquele que me envolvia agora, era mais denso. Parecia que estava voltando no tempo, parece até... com o dia que Clara chegou para morar conosco. Minha mãe estava ao telefone no balcão da loja, sem perceber minha presença. Seus cachos loiros balançavam conforme ela gesticulava, provavelmente organizando mais uma das suas festas sociais. Minhas amigas de infância estavam ali, rindo, distraídas com alguma conversa animada. Ninguém sabia que eu voltaria hoje. Afinal, elas sempre vem visitar minha mãe, mas o que me intriga é: por quê? "Surpresa", pensei, deixando um sorriso discreto se formar nos lábios. Embora não fosse sincero. Antes que eu pudesse me anunciar, ouvi passos leves vindo do corredor. Quando me virei, meu olhar encont
JasonEu deveria estar em casa agora, ouvindo as risadas falsas das minhas antigas amigas e assistindo minha mãe se desdobrar para fazer o jantar perfeito. Era o mínimo que ela podia fazer depois de cinco anos sem saber se eu voltaria vivo. Mas, claro, havia um problema: Clara. Ela não tinha voltado para casa, e minha mãe insistiu para que eu fosse atrás dela no rinque. "Hoje é o aniversário dela, Jason", minha mãe disse com um suspiro pesado. "Só você e eu lembramos, e eu queria que ela estivesse aqui. Aquela menina já passou por muita coisa sozinha. Não merece passar seu aniversário na solidão mais uma vez". Mais uma vez? Então, quer dizer que os anos que eu passei longe, ela também passou sozinha? Era difícil dizer não para minha mãe, principalmente quando se tratava de Clara. Suspirei e peguei as chaves. As amigas dela nunca foram muitas, e as minhas — as que estavam em casa agora — eram justamente a razão de Clara preferir fugir em vez de comemorar. Eu sabia disso. Sempre soube