A batida leve na porta parecia um eco distante para Aline, ainda envolta no calor do sono tranquilo e da cama que parecia abraçá-la. Mas o som insistente logo trouxe-a de volta à realidade. Ela se remexeu lentamente, ainda lutando contra a preguiça que a mantinha imóvel, até que abriu os olhos. A luz suave que entrava pelas cortinas bem-posicionadas a fez semicerrar os olhos enquanto seu corpo despertava aos poucos.
Por um breve momento, ela deixou-se relaxar, aproveitando a maciez dos lençóis e a calma daquele espaço. Mas, como uma corrente elétrica, as lembranças da noite anterior começaram a invadi-la, abruptas e intensas. Subitamente, ela pulou da cama, o coração disparado, enquanto agarrava o lençol para cobrir o corpo desnudo.
O movimento brusco fez algo cair no chão com um leve som abafado. Aline olhou rapidamente na direção do barulho, mas antes que pudesse examinar o que havia caído, seus olhos foram atraídos para o pequeno sofá no canto do quarto. Lá estavam suas roupas, dobradas cuidadosamente, quase como um gesto delicado de despedida.
Foi só então que ela notou, de fato, o ambiente à sua volta. Aline percorreu o quarto com o olhar, absorvendo cada detalhe. Era um espaço luxuoso, com uma cama imensa de lençóis brancos impecáveis, um sofá de um e dois lugares, uma bancada elegante de madeira escura e espelhos estrategicamente posicionados que amplificavam a luz do sol, fazendo o quarto brilhar em um tom quente e acolhedor.
— Meu Deus... Onde eu estou? — sussurrou, levando a mão à boca, como se dizer em voz alta fosse confirmar que aquilo não era um sonho.
Enquanto tentava processar a situação, uma voz feminina veio do outro cômodo, fazendo-a congelar no lugar.
— Senhorita, trouxe seu café. Vou deixá-la sozinha para desfrutar da refeição. Tenha um bom dia.
Era a camareira. Aline permaneceu imóvel, segurando o lençol firmemente contra o peito, enquanto ouvia os passos leves da mulher e, em seguida, o som da porta se fechando suavemente.
Assim que se deu conta de que estava sozinha novamente, soltou o ar que nem percebera estar prendendo. Respirando fundo, correu até o sofá e começou a vestir suas roupas o mais rápido que podia. A cada peça ajustada, sua mente era um turbilhão de pensamentos.
“Quem era ele?”
“Como vim parar aqui?”
“Por que isso parece tão... surreal?”
“E que homem maravilhoso era ele...”
Enquanto colocava a blusa, um aroma marcante invadiu seus sentidos: o perfume dele ainda impregnava sua pele. Era um cheiro intenso, um misto de madeira e algo levemente adocicado, um aroma que parecia tão único quanto ele. Aline fechou os olhos por um instante, como se pudesse capturar aquele momento em sua memória.
De repente, lembrou-se do que a camareira havia dito sobre o café. Curiosa, caminhou em direção ao outro cômodo. Era uma sala ampla, igualmente sofisticada, com móveis que pareciam sair de uma revista de decoração. Sobre uma pequena mesa de centro, repousava uma bandeja impecavelmente arrumada com frutas, croissants, suco fresco e uma xícara de café fumegante.
Aline aproximou-se devagar e, ao lado da bandeja, notou um pedaço de papel dobrado. Pegou-o com cuidado, e ao abrir, deparou-se com uma caligrafia impecável que dizia:
“Espero que seu dia comece tão bem quanto o meu terminou. – Clark.”
Ela piscou, surpresa. Clark. Esse era o nome dele. O som ecoou em sua mente enquanto ela repetia baixinho:
— Clark...
Era um nome forte, simples, mas carregado de mistério, assim como o homem que a havia arrebatado na noite anterior. As memórias voltavam em flashes confusos: olhares intensos, toques que a faziam arrepiar, a conexão instantânea que os havia envolvido como uma tempestade... Mas tudo ainda parecia nebuloso, quase irreal.
Aline olhou para o bilhete mais uma vez antes de dobrá-lo cuidadosamente e guardá-lo no bolso da calça. Seu coração ainda batia rápido, mas dessa vez, não era por medo ou confusão — era por algo mais profundo, uma curiosidade inquietante e uma sensação de que algo havia mudado em sua vida.
Ela não tocou na bandeja de café da manhã. Não tinha fome, nem ânimo para ficar naquele lugar por mais um minuto. Vestida e com os pensamentos girando como um redemoinho, Aline saiu do quarto com passos apressados.
Enquanto caminhava pelo corredor, decidiu que, pelo menos naquele instante, não iria pensar na traição de Fred e Isadora. Essa dor ela deixaria para mais tarde. Agora, tudo o que queria lembrar era do momento maravilhoso que vivera com aquele desconhecido chamado Clark.
E com isso, um pequeno sorriso escapou de seus lábios enquanto a porta do elevador se fechava atrás dela.
Ao sair do hotel, Aline foi imediatamente envolvida pelo vento fresco daquela manhã. O ar parecia mais leve, mas sua mente estava pesada, confusa. Enquanto caminhava, percebeu a realidade à sua frente: dividia o apartamento com Isadora, sua amiga e cúmplice por tantos anos. No entanto, depois do que havia acontecido, encará-la parecia impossível. "Como vou lidar com isso? Onde eu estava com a cabeça?", pensava enquanto seus passos a levavam, quase automaticamente, em direção ao apartamento. A cada esquina que se aproximava de seu prédio, sua mente formulava cenários diferentes, estratégias para uma conversa que sabia ser inevitável. Mas, na verdade, nenhuma solução parecia satisfatória. Quando chegou à entrada do prédio, avistou o porteiro, seu Alfredo, sentado em sua cadeira habitual. Ele a reconheceu de imediato, levantando-se com um sorriso amigável. — Bom dia, senhorita Aline! — cumprimentou ele, ajeitando o boné. Aline retribuiu o sorriso com gentileza, embora estivesse dist
Aline apertou o casaco ao redor do corpo enquanto o vento gelado cortava a manhã cinzenta. O parque florestal estava praticamente vazio, salvo por alguns corredores dedicados e um ou outro cão passeando com seus donos. Ela escolheu um banco de madeira desgastado pela umidade e se sentou, deixando a mala ao lado. Seus pensamentos estavam desordenados, como as folhas secas espalhadas pelo chão. "Para a casa da tia? Nem pensar," concluiu, cruzando os braços como se defendesse a ideia absurda de voltar para aquela prisão. A convivência com a tia sempre fora insuportável. Aline sabia que sua tia jamais permitiria que ela tivesse paz — cada erro, cada decisão seria questionada e julgada sem piedade. Ela suspirou, encarando os galhos nus das árvores. Precisava de um apartamento.— Tenho o suficiente para começar, — pensou, lembrando do dinheiro que conseguiu juntar com esforço ao longo dos anos.— Se eu economizasse, conseguirei me estabilizar em alguns meses. Pensava ela.Com a decisão fo
Naquela sexta-feira, Clark saiu do escritório com o semblante carregado, seus pensamentos fervendo após mais uma discussão amarga com seu pai. Dominic Johnson tinha o talento único de provocar nele um misto de raiva e frustração que parecia incontrolável. Era como se cada palavra entre eles fosse um duelo velado de egos, ressentimentos e expectativas não atendidas. Enquanto ajustava a gravata ao sair pela porta principal da empresa, ele resmungou para si: — Essa empresa não vai me engolir. Clark sabia que precisava de um escape, um lugar onde pudesse acalmar os ânimos antes que sua raiva transbordasse. Não queria ir a nenhum dos bares sofisticados que frequentava com seus colegas de trabalho ou clientes. Escolheu, ao invés disso, um bar discreto na cidade, um lugar onde poderia ser apenas mais um homem com um copo de uísque nas mãos, sem as pressões de ser Clark Johnson, o herdeiro de um império empresarial. O bar era acolhedor, iluminado de forma sutil e com uma música suave que
Assim que Clark entrou na sala de reuniões, o ambiente estava carregado de tensão. Dominic Johnson, seu pai, o encarava com uma expressão séria, como se estivesse esperando um movimento errático. Clark, no entanto, decidiu tomar as rédeas da situação antes que qualquer conflito ressurgisse. — Vamos esquecer a nossa conversa de ontem e focar no que realmente importa. — Clark disse com firmeza, aproximando-se da mesa de reuniões. — Estou disposto a ir para o Japão, se esse é o seu desejo. Dominic manteve o olhar fixo no filho, os olhos estreitados, avaliando cada palavra. Ele apoiou as mãos na mesa com calma, mas seu tom era carregado de autoridade quando respondeu: — Sobre a nossa conversa de ontem, confesso que não será esquecida. Mas falaremos sobre isso em outro momento. Dominic se acomodou na cadeira com a elegância de quem sabia que estava no controle da situação. Sem rodeios, ele continuou: — Partirá amanhã cedo para o Japão. E levará a Janine com você. Clark arqueou as sob
Quando Clark entrou no hotel, o ambiente elegante parecia contrastar com a inquietação que o dominava. O concierge, sempre atento, o cumprimentou com um sorriso caloroso. — Boa tarde, senhor Johnson! Como foi sua manhã? Clark, sem perder tempo, ignorou a cordialidade habitual e perguntou diretamente: — Fez o que pedi? O concierge, um homem de meia-idade com uma postura impecável, assentiu com um sorriso que parecia misturar profissionalismo e um toque de curiosidade. Aproximando-se discretamente, ele respondeu quase em um cochicho: — Sim, senhor. O café foi enviado como solicitado, mas... ela não tocou em nada. Clark franziu a testa, claramente frustrado. Antes que pudesse dizer algo, o concierge continuou: — Ah, e encontrei isso no chão do quarto. Com um movimento preciso, o homem retirou um pedaço de papel dobrado de seu bolso e o entregou a Clark. O bilhete parecia levemente amassado, como se tivesse sido descartado sem importância. Clark o pegou com certa hesitação e, ao
Estava anoitecendo quando o táxi parou diante da casa onde Aline havia passado uma infância repleta de alegria e momentos inesquecíveis ao lado de seus pais. O motorista olhou pelo retrovisor, curioso com o olhar distante da passageira. Aline pagou a corrida, agradeceu baixinho e saiu do carro, puxando a mala de rodinhas. Ela parou na calçada, encarando a fachada da casa. A pintura desbotada denunciava o tempo que havia passado desde a última vez que alguém cuidara do lugar. As janelas estavam fechadas, mesmo assim parecia que cada canto daquele lar ainda guardava os ecos de risadas e conversas. A rua, antes vibrante e cheia de vozes infantis, agora estava mergulhada em silêncio, com apenas o som distante de um cachorro latindo e as folhas balançando ao vento. Ela se lembrou de como costumava correr por ali com Carla, Beatriz e Jéssica, suas melhores amigas da infância. Lembranças de brincadeiras, risadas e aventuras preenchiam sua mente, e um sorriso involuntário surgiu em seus láb
Quando Aline abriu a porta, seu coração deu um salto ao ver Jéssica parada ali, com a mesma expressão calorosa e acolhedora de sempre. Era como se o tempo tivesse recuado, apagando os anos de distância e trazendo de volta uma parte de sua infância. — Jéssica... é você mesmo? — A voz de Aline tremeu de incredulidade e emoção. Antes que Jéssica pudesse responder, Aline a puxou para um abraço apertado. As duas começaram a rir, dando pulinhos de alegria, como se fossem novamente as meninas despreocupadas que costumavam ser. — Não acredito que você está aqui! — Aline disse, finalmente se afastando o suficiente para encarar o rosto da amiga. — Eu estava passando e vi uma luz acesa. Não podia acreditar que era você! — respondeu Jéssica, sua voz transbordando entusiasmo. — Você voltou! Aline olhou ao redor, seus olhos repousando brevemente na casa que guardava tantas memórias. Um sorriso suave apareceu em seu rosto, misturado com uma ponta de melancolia. — Voltei... — ela murmurou
Na manhã seguinte, o sol dourado já atravessava as cortinas quando Aline despertou. O aroma inconfundível de café fresco misturado ao perfume suave e aconchegante de biscoitos de canela invadiu o quarto, trazendo-lhe um calor familiar que parecia envolvê-la em um abraço do passado. Ela espreguiçou-se lentamente, sentindo o conforto de estar novamente em um lugar tão carregado de memórias. Aceitar o convite de Jéssica para dormir em sua casa fora uma decisão acertada. Contudo, a tranquilidade daquela manhã não apagava a razão de sua visita àquela cidade. A missão que a trouxera ali estava mais clara do que nunca, e ela sabia que era hora de enfrentá-la. Descendo para o café da manhã, Aline foi recebida por Jéssica e sua mãe com um sorriso caloroso. A mesa estava posta com xícaras fumegantes de café, um prato cheio de biscoitos dourados e uma cesta de pães fresquinhos. — Dormiu bem? — perguntou Jéssica, enquanto passava manteiga em uma fatia de pão. — Sim, como uma pedra — respondeu