Quinta-feira
Sara Jane se admirava diante do espelho do armário uma última vez, dando voltas e conferindo se não havia nada de errado com sua fantasia. Aquela devia ser a milésima vez que ela olhava o próprio reflexo curvilíneo dentro do traje de policial sexy, mas ainda não estava suficientemente convencida de que estava linda. Cássia, a amiga com a qual ela dividia o apartamento modesto num prédio de esquina da Cunha Gago, gritava da sala para que ela se apressasse. Olhou no relógio do celular, já eram quase 19:00 horas. Deu um último retoque na maquiagem que usava, ajeitou os cabelos negros, colocou o quepe e saiu do quarto. Tinha meia hora para chegar até a casa luxuosa do Jardim Paulistano, onde ela e Cássia encontrariam os colegas de faculdade para um baile no Dia das Bruxas.
O velho elevador do prédio rangeu, descendo os cinco andares que separavam Sara e Cássia da portaria. Enquanto as duas andavam charmosas pelo saguão em direção à rua, chamavam toda a atenção dos olhares masculinos mais atrevidos. Ignorando as piadinhas sobre algemas - um dos adornos de sua fantasia, além de um cassetete de plástico, o quepe, a blusa decotada com distintivo, o short curto, os coturnos e a meia arrastão – Sara caminhou ao lado da amiga, cujo tom de pele jambo combinou perfeitamente com sua fantasia de Jasmine. Ambas estavam se sentindo maravilhosas. Tinham a certeza absoluta de que iriam se destacar na festa e se divertir muito.
O Uber chegou em cinco minutos em frente ao prédio. Observando-as pelo retrovisor, o motorista as conduziu em silêncio até o endereço da Zona Oeste, tocando um sertanejo universitário em seu rádio. Aquele era um dia de descanso e de festa para as duas estudantes. Tagarelavam sobre as provas finais do bimestre e das perspectivas de estágio de seu curso de jornalismo, mas estavam mesmo ansiosas para curtir aquele início de fim de semana com feriado prolongado à vista. Solteiras, as garotas planejavam dançar muito naquela noite, além de aproveitar a companhia dos garotos do curso de Publicidade que também tinham sido convidados. Cássia ansiava reencontrar por Diego, um moreno alto que havia ficado com ela certa vez num barzinho em frente a faculdade, mas estaria tranquila também caso ele não aparecesse. Não costumava se prender a expectativas.
A entrada do condomínio Arco Verde estava agitada perto das 19:30. A movimentação de veículos era intensa devido a festa na mansão Telles de Mendonça e a dupla de amigas precisou de alguns minutos para se aproximar da entrada da residência da colega de sala, a bordo do Uber. Tão logo desembarcaram, encontraram alguns amigos amontoados diante de uma moça loira usando salto alto, saia e tailleur no portão de entrada. Ao lado de um assistente que segurava um tablet e se comunicava via rádio com o chefe de segurança da mansão, a hostess confirmava os nomes dos convidados em uma lista impressa. A cada confirmação, o rapaz magro de cabelos engraxados permitia a entrada pelo seu lado direito e assim, o jardim da casa começava a ficar cada vez mais ocupado.
- Chegamos bem na hora, miga! – Comentou Cássia, abrindo um sorriso largo no rosto bonito. Sara estava bem a seu lado, eufórica. Seus olhos observadores minudenciavam cada canto da impressionante estrutura da mansão e seus arredores, não perdendo um detalhe. Os 700 m² do lugar eram mais do que suficientes para garantir uma vida bem confortável a Regiane e sua família em São Paulo. Não era de se admirar que a filha de engenheiros viajasse para a Europa com a mesma frequência com que trocava de sapatos ao longo dos semestres. Dinheiro não lhes parecia um problema. Sara, Cássia e Regiane cursavam o 3º semestre de Jornalismo na mesma faculdade e já se conheciam há certo tempo. Se a garota não podia considerar a herdeira dos Telles de Mendonça uma grande amiga, pelo menos não era seu desafeto.
- É uma casa impressionante! – Exclamou Sara, tão logo recebeu uma pulseirinha amarela do assistente da hostess e pôs-se a caminhar por uma pequena via de paralelepípedos junto de Cássia, rumo a entrada do lugar.
Assim que Sara e Cássia se afastaram do portão da mansão, um burburinho se formou sobre alguns nomes que não estavam na lista de convidados, mas as duas logo esqueceram aquilo, se juntando à sua galera nas dependências da casa. Uma batida eletrônica comandada pela picape de um DJ já agitava um grupo grande de jovens que se sacudia no jardim da casa ao som da música. Dois garçons serviam aperitivos, canapés, taças e copos de variados drinks àqueles que preferiam aguardar o clima esquentar mais, acomodados às mesas dispostas nos cantos do jardim frondoso. A borda da piscina limpíssima estava toda rodeada de holofotes multicoloridos, cujos canhões desenhavam fachos de luz no céu sem muitas estrelas daquela noite. Ao fundo do esplendoroso quintal, a uns dez metros da piscina, um letreiro em neon anunciava o "open-bar". Por trás do balcão um casal de bartenders fazia malabarismos com coqueteleiras e garrafas, servindo os estudantes ávidos por álcool.
- Isso aqui está bonito demais! – Berrou Cássia, tendo a voz abafada pela pancada sonora que o DJ liberava do alto de sua picape. Ela já balançava os braços para o alto no ritmo da música. – Vamos cumprimentar a Regiane lá dentro e vamos retornar aqui para fora para dançar!
Sara concordou com a amiga e ambas adentraram a mansão pela porta da frente, aberta e convidativa. Enquanto entravam, as meninas acabaram esbarrando com o Peter Pan, a Tinker Bell e dois presidiários à caráter, saindo apressados. A anfitriã estava rodeada de amigos ao pé de uma escadaria que levava ao andar superior de sua mansão milionária. Sua fantasia de odalisca era quase carnavalesca. Tinha adornos muito dourados e muito brilhantes no busto, combinando com a maquiagem levemente amarelada acima dos olhos e nas maçãs do rosto. Um véu igualmente dourado estava sendo ajustado para cobrir sua boca e evidenciar o delineado negro de seus olhos verdes. Os cabelos castanhos estavam presos num rabo de cavalo impecavelmente preso no alto da cabeça com um enfeite verde-jade, assentando com os sete véus que rodeavam sua cintura. A pele de Regiane estava bronzeada artificialmente e coberta por um óleo que brilhava contra a luz. Estava impressionantemente linda.
- Vocês vieram, meninas! – Sua voz rouca sobressaiu ao som das batidas eletrônicas que ecoavam para dentro de casa através de um sistema de som embutido no teto de quase toda a residência. Sara e Cássia se aproximaram do grupinho a bajular a anfitriã e educadamente cumprimentaram todos os presentes. O Drácula fora gentil beijando as mãos das garotas, a Arlequina deu-lhes um forte abraço, mas foi do havaiano uma passada de mão mais marota abaixo do cóccix de Sara na hora do cumprimento. Ele era um dos rapazes do curso de Publicidade e tanto Sara quanto Cássia já o tinham visto de passagem pela faculdade. Tinha um olhar de malícia excessivo no rosto másculo e mal barbeado.
- Não poderíamos deixar de vir à sua festa, Rê. Com certeza esse vai ser o baile à fantasia mais comentado da cidade no ano! – Elogiou Sara, dando um beijinho no rosto da odalisca.
- E você está linda, Rê! Adorei a fantasia de mil e uma noites! Estamos até combinando! – Exultou Cássia, enaltecendo a própria fantasia temática, causando uma gargalhada na dona da festa.
- Estamos todas lindas. Muito obrigado pela presença, meninas. Me acompanham até lá fora para receber os demais convidados?
O convite era irrecusável.
A primeira hora foi de reconhecimento do terreno e não demorou para que as primeiras investidas dos garotos começassem tanto para cima de Sara quanto de Cássia. A pista de dança que se formou em meio ao jardim, em volta da piscina, tornou-se tão frenética quanto eclética. O DJ soube transitar entre os mais diversos estilos musicais, sem deixar que a empolgação dos estudantes diminuísse um minuto que fosse. O tumulto que se formou na portaria devido à falta de convite foi resolvido rapidamente por Regiane e seu chefe de segurança, que permitiu a entrada dos penetras a fim de abafar maiores problemas. Embora sua hostess desaconselhasse a entrada de pessoas que não tinham sido convidadas, a casa era bem espaçosa e comportou todo mundo com certa folga. Resolvido o entrave, os "amigos de amigos" acabaram se juntando aos demais presentes sem grande confusão e logo todos os olhares voltaram a admirar o belo sorriso no rosto da anfitriã da festa, minguado apenas brevemente enquanto ela resolvia aquele problema. Estava tudo bem.
Sara estava se entendendo com um charmoso vampiro de nome Charles em meio ao baile. O rapaz cursava o segundo ano de Publicidade e os dois já tinham se visto por alto nos corredores da faculdade. Ele estava ali a convite de um colega de sala da garota. O papo estava desenrolando bem, havia certo entrosamento entre os dois, foi quando o havaiano atrevido voltou a atacar.
- Ei! Olha onde põe essa mão! – Sara deu um passo para frente ao sentir duas mãos deslizarem pelas suas costas e apalparem a região abaixo de seu cóccix. Um volume grande de convidados se acotovelava ali ao som da música tocada alta e o cara tentou a sorte tocando a menina sem permissão.
- Qual é a sua, irmãozinho?! – Charles deu um passo à frente e ficou entre Sara e o havaiano ao notar o assédio. Algumas pessoas ao redor perceberam o clima fechar e começaram a abrir espaço.
- Foi mal, velho. Não tinha percebido que a garagem dela já estava ocupada!
O havaiano estava altamente alcoolizado e o tom exageradamente lascivo em seu comentário causou ira em Charles que avançou para cima dele. Os colegas ao redor não deixaram que ambos chegassem às vias de fato, segurando-os e uma garota surgiu em meio à multidão puxando o havaiano.
- Jonathan! O que você está fazendo? Você está bêbado!
A garota vestida de bombeira sexy, toda de vermelho, levou o cambaleante e ébrio havaiano dali, dando-lhe tapas nos ombros largos enquanto se afastava. Sara ficou sem entender nada, ultrajada. O clima com o vampiro tinha esfriado e ela se afastou, prometendo que voltaria logo. Precisava achar Cássia.
Cássia foi encontrada aos beijos com um Aquaman de cabelos desgrenhados nos fundos da casa. De onde estavam, o som da batida eletrônica parecia só um eco distante e era difícil saber onde acabava a Jasmine e onde começava o Aquaman tal a intensidade do amasso. Sara achou injusto importunar a amiga naquele momento e saiu dali direto para o bar. Pediu um drink especial ao barman musculoso de covinhas no rosto e ele lhe serviu uma bebida cor de rosa que a menina não fazia ideia do que era. O gosto era mais agradável que a cor e ela conseguiu relaxar um pouco depois do estresse com o havaiano assediador. De frente para o balcão, Sara tinha uma visão incrível da festa. Seu olhar apurado de jornalista começou a agir automaticamente, embora ela estivesse ali para desanuviar as ideias. De onde ela estava, a garota viu a herdeira dos Telles de Mendonça participando de uma animada roda de vira-vira com tequila no jardim. A seu redor estavam a Mulher-Gato, a Arlequina, a She-Ra, dois presidiários e o Capitão América, esse responsável por balançar a cabeça da moça após ingerir a bebida. A garota chegou a cambalear e a cair de quatro no jardim, zonza, mas os garotos foram rápidos em acudir. A atenção de Sara foi desviada quando ela viu a bombeira sexy de antes passar próximo do grupo de Regiane, parecendo contrariada. Não havia sinal do havaiano atrevido, mas o Zorro a acompanhou de perto e a seguiu até próximo do bar. Tentando disfarçar, Sara colocou no rosto o aviador espelhado que estava pendurado em seu decote e abaixou a cabeça quando a bombeira chegou batendo no balcão pedindo uma vodca. Enquanto ela discutia algo inaudível com o Zorro devido a batida da música, Sara viu bem quando o rapaz de preto ergueu o indicador da mão esquerda pedindo a mesma bebida pura para a bartender ruiva. O grande chapéu da fantasia fazia sombra sobre seu rosto mascarado, mas era evidente que o bigode falso estava descolando de seu rosto enquanto ele discutia algo com a bombeira. Sara estava intrigada com toda aquela movimentação e antes que ela pudesse entender, afinal, o que tanto os dois discutiam, sua atenção foi tirada novamente da cena quando o barman lhe ofereceu mais uma bebida.
- Vi que você gostou do meu Martini com morango. Quer mais um?
Ele não conseguiu ver, mas os olhos de Sara brilharam por trás dos óculos enquanto um sorriso radiante surgia em seu rosto. Ela estava atraída pelo rapaz atrás do balcão e agradecida, ela aceitou o drink. Aqueles segundos foram suficientes para que tanto a bombeira quanto o Zorro desaparecessem de sua vista e ela não voltou a vê-los.
Sara voltou a encontrar Cássia quando o DJ chamou todo mundo para o meio do jardim com uma seleção especial de músicas populares dos anos 90. Entre muito axé, funk e pagode, as duas amigas se acabaram de tanto dançar. A rotina de estudos dos últimos anos as tinha afastado de festas e badalações em geral. Para ambas era muito bom estar de novo entre amigos curtindo aquele momento.
Do alto da picape que estava instalada a uns quatro metros do gramado, o DJ muito simpático começou a tirar várias selfies com o pessoal agitando de fundo. Simultaneamente ele passou a compartilhar as imagens no grupo de W******p criado especialmente para a festa. Uma panorâmica mostrava cerca de 80 pessoas espalhadas pelo jardim naquele momento. Alguns mais exaltados já se jogavam na piscina com roupa e tudo no auge da efervescência das músicas, mas a grande maioria preferia continuar os passinhos dessincronizados no gramado, no ritmo marcado pelo DJ em seu microfone.
- Eu não lembro dessa coreografia! Socorro, Deus! – Divertia-se Sara desengonçada, enquanto a amiga arrasava nos passos bem sincronizados de um axé.
Num dado momento o vampiro Charles encontrou Sara na multidão e o rapaz tratou de se aproximar dela. Encorajado pelas boas doses de álcool que havia consumido, ele arriscou puxá-la para um beijo, algo que ela não infligiu resistência. O vampiro continuou a dançar desajeitado com a Jasmine e a policial pouco depois, ouvindo o DJ comandar os passos da dança lá de cima. Cássia tentava ensinar uma coreografia para o enferrujado vampiro enquanto Sara ria e foi por um segundo que os olhos da menina se desviaram da dupla e ela percebeu que havia algo de errado acontecendo. Sara parou de dançar no meio da multidão e apoiou sua mão no ombro de Charles, vendo a hostess loira e um garçom cochicharem algo para Regiane. O trio estava a uns seis metros da picape, era impossível ouvir o que eles diziam, mas de repente a odalisca estava transtornada.
- Tem algo de errado. – Balbuciou Sara para o vampiro, que mal pode ouvi-la. – Eu já volto. – Sara simplesmente largou do rapaz e da amiga, caminhando sozinha em direção ao interior da mansão, para onde tinha visto Regiane, a hostess e o garçom sumirem. No caminho, passou por vários estudantes contagiados pelo volume da música que tocava alto. O DJ continuava repetindo o refrão do axé no microfone, mas tudo estava ficando para trás. Mal colocou os pés dentro da mansão, Sara ouviu berros exaltados vindo lá de dentro. Seguiu as vozes passando pela sala ampla decorada em estilo contemporâneo. Chegou em um corredor bem iluminado que desembocava em uma cozinha de modelo industrial e ali dentro encontrou um pandemônio.
- Isso não pode ter acontecido! NÃO PODE! – Exclamava Regiane com os olhos a lacrimejarem e a bela maquiagem de odalisca arruinada.
- Alguém deve ter entrado na casa sem que o chefe de segurança visse. Só pode ser! – Racionalizava a hostess.
- Eu estava procurando os blocos de gelo para as bebidas quando o encontrei... Não sei o que pensar! – Desculpava-se o garçom.
Num canto, a Mulher-Gato e o Capitão América choravam inconsoláveis já sem os capuzes. Seus olhos estavam fixados em direção à porta da despensa, ao fundo da cozinha. Sara caminhou lentamente procurando entender o que estava acontecendo e ficou estarrecida com a cena dentro do cômodo. Ela parou estática à porta e levou as mãos a boca horrorizada. Ali no chão, com o plexo trespassado por uma lâmina prateada estava o havaiano e ele estava morto.
SábadoSara acordou em sua cama com a luz do sol incidindo através da janela em seu rosto, naquela manhã de feriado. Era Dia de Finados. Sua primeira lembrança foi do sonho macabro que tivera com aquele havaiano brutalmente assassinado na despensa da mansão Telles de Mendonça. Só de camiseta e calcinha, como dormira, foi até o banheiro do apartamento modesto, tentando afastar aquela imagem da cabeça jogando uma água no rosto. Encontrou Cássia sentada no sofá da sala com seunotebookno colo. Sua expressão não era das mais felizes olhando para a tela.— Já explodiu na imprensa. Só se fala do assassinato na festa à fantasia nas mídias sociais. – A moça deu uma
Sexta-FeiraO delegado Marcondes estava em sua sala na presença do investigador Noronha, do investigador Carvalho e do estagiário administrativo Felipe enquanto os vídeos da câmera de segurança da mansão Telles de Mendonça rodavam no computador em velocidade acelerada. Os arquivos tinham sido copiados para um pendrive e entregues para Noronha na madrugada após a festa à fantasia, mas a Polícia ainda não tinha tido a chance de olhar as imagens com calma. Os depoimentos daquele extenuante expediente tinham acabado. Marcondes tinha uma pilha de relatórios para assinar e ainda tinha que rever os depoimentos por escrito antes que o dia terminasse, mas fez uma pausa para analisar os vídeos com seus mais eficientes investigadores.— Já estamos há duas horas aqui e nada. Só um bando de adolescente tarado se pegando no sofá de couro dos grã-finos. &mdas
Sábado— “É um erro grave formular teorias antes de conhecer os fatos. Sem querer, começamos a mudar os fatos para que se adaptem às teorias, em vez de formular teorias que se ajustem aos fatos. ”— Quem disse isso? — indagou Sara, sentada no sofá da sala pronta a abocanhar mais uma fatia da pizza de atum que havia acabado de ser entregue.— Sherlock Holmes. — respondeu Cássia, mastigando um pedaço generoso da pizza ao mesmo tempo. — vou dar um jeito de acrescentar essa citação no nosso artigo sobre o crime da rapieira.— “Crime da rapieira”? É assim que quer chamar nossa matéria? Ninguém sabe o que é uma rapieira! Por que não chamamos de “Um crime quase perfeito”?
Sexta-FeiraDaiane Sobral entrou na sala do delegado acompanhada da mãe para o interrogatório. Ainda estava abalada pelo que tinha acontecido com Jonathan Braga durante a festa à fantasia na mansão Telles de Mendonça e seu rosto, sem qualquer resquício de maquiagem, denunciava que não tinha dormido bem aquela madrugada. Os cabelos desgrenhados, presos indisciplinadamente por um elástico, davam a ela um aspecto desleixado que poucas vezes se permitia exibir em público. Sentada a seu lado, a mãe, uma senhora razoavelmente jovem, procurava mantê-la firme ante as perguntas de Marcondes, não permitindo que ela desabasse a chorar.— Qual seu relacionamento com a vítima? — indagou o delegado com os dedos entrelaçados e os antebraços pousados sobre a mesa.— Éramos... éramos amigos.O barulho das teclas digitadas
DomingoSara chegou à porta da loja de fantasias as 08:30. Sabia que o horário de abertura era as 09:00, mas estava ansiosa demais para esperar em casa. Sua mente era incapaz de descansar um só minuto que fosse, povoada pelas lembranças de como aquele Dia das Bruxas tinha começado e principalmente de como ele havia terminado. Banhado em sangue.Procurando se distrair, ela ouvia música em seu celular. Oleddo fone de ouvidobluetoothpiscava incessante. Uma MPB tranquila tocava em seuSpotify, mas a moça estava longe de prestar a atenção em sua letra. Ela precisava desvendar urgentemente os mistérios que rondavam aquele crime na mansão Telles de Mendonça, descobrir as razões que levaram o assassino a cometê-lo e levá-lo à justiça. Ela não conseguiria descansar enquanto aquele pe
Cássia marcou o encontro com Daiane em uma praça pública a fim de que a garota ficasse mais à vontade num local aberto e arejado. Era 09:37 quando a garota desceu do carro do pai, um sedan preto importado e caminhou até o banco onde Cássia tinha indicado por mensagem. Vestida com um short jeans e uma blusa decotada, a garota se aproximou da morena jambo com passos curtos. As duas se cumprimentaram. Quando se sentou no banco, ela tinha expressão séria e olheiras profundas no rosto pálido. Os cabelos loiros estavam como na delegacia, presos desleixadamente com um elástico.- Obrigada por vir, Daiane. – Começou Cássia, com um meio-sorriso. – Sei que não tem sido fácil sair de casa depois do que aconteceu, mas eu precisava conversar com você.A praça estava bastante movimentada naquele começo de dia. Alguns casais passeavam com
Segunda-FeiraUm alvoroço tomava o 14º DP naquela manhã com o relato do delegado Marcondes sobre a tentativa de roubo na sala de arquivos. O sistema de câmeras do local havia sido desativado às 22:32 da sexta-feira pelo que foi chamado pelos técnicos de “pane no sistema de armazenamento de dados”. Nenhuma imagem do invasor havia sido capturada, o que aumentou o clima de desconfiança entre os colegas que trabalhavam na delegacia. Enquanto a Corregedoria era acionada para apurar o caso grave de tentativa de macular provas de crimes, todos andavam se perguntando o que estariam procurando na sala de evidências.A concentração de Marcondes e sua equipe, no entanto, estava em mandar a arma usada no homicídio na mansão Telles de Mendonça para a perícia. A análise de digitais e DNA na espada precisava ser feita o quanto antes. O tempo estav
Carvalho estava ao volante de um sedan preto, usado pela Polícia nas investigações, quando estacionou diante de um rico sobrado no bairro de Moema. A seu lado, Noronha fumava um cigarro, enquanto observava a vizinhança tranquila pela janela aberta do automóvel. - Tem que ter grana pra morar num bairro desses. – Comentou, defenestrando o cigarro para fora do veículo. Carvalho grunhiu algo como uma afirmação. Com o braço apoiado na porta ele observava o alto da janela do sobrado, absorto. - Acha que alguém de dentro tentou atrapalhar a investigação no DP? – A pergunta veio do nada, mas o experiente investigador viera ruminando o assunto em sua cabeça o caminho todo da delegacia até ali. - Não sei. – Noronha baforou nicotina. – Seja lá quem tenha tentado melar a investigação, não fez direito. A arma do crime está sendo analisada pela perícia nesse momento. Carvalho continuou pensativo, mas tratou de apanhar o mandado de condução no porta