A claridade atravessava as janelas, filtrando a luz do amanhecer e iluminando suavemente o ambiente luxuoso da suíte. O céu de São Paulo exibia tons alaranjados misturados ao azul suave do início da manhã, e a cidade começava a despertar abaixo dela.
Celina despertou devagar sentindo-se desorientada, seu corpo afundando na cama macia, o lençol de algodão egípcio cobrindo sua pele desnuda. Piscou algumas vezes, tentando se situar. O teto alto, os móveis sofisticados, o cheiro amadeirado no ar… nada daquilo lhe era familiar, nada era seu Virou o rosto para o lado e sentiu o coração falhar uma batida. Ali, ao seu lado, o homem do bar ainda dormia profundamente. O peito largo subia e descia em uma respiração lenta e tranquila. Os lençóis cobriam a parte inferior de seu corpo, mas deixavam à mostra a pele quente e tatuada de seu braço, repousado sob a cabeça em um gesto despreocupado, como se nada no mundo pudesse perturbá-lo. Celina engoliu em seco, sentindo um turbilhão de emoções de uma só vez. Ela se sentou na cama rapidamente, segurando o lençol contra o corpo, como se precisasse desesperadamente de uma barreira entre ela e a noite anterior. — O que eu fiz? — sussurrou bem baixinho Seu coração batia forte. Ela tentou lembrar de cada detalhe, forçando a mente a resgatar os fragmentos da noite anterior, mas tudo parecia envolto em um nevoeiro confuso. Lembrava-se do bar, da tensão entre os dois, das palavras sedutoras daquele homem, do desejo crescente, dos drinks e das mãos firmes conduzindo-a até o elevador. Lábios quentes explorando seu corpo. Respirações pesadas misturadas à penumbra. O toque firme de mãos hábeis percorrendo sua pele. Depois disso… flashes desconexos, tudo era um emaranhado de fragmentos confusos. O peito de Celina subiu e desceu com força. Ela nunca havia feito algo assim antes. Nunca. Ela passou a mão no rosto, sentindo a pele quente. — Meu Deus... que loucura foi essa? O sussurro escapou de seus lábios, carregado de culpa e desespero. Aquela não era ela. Ou talvez fosse. Talvez fosse a mulher que estava adormecida dentro dela, sufocada por anos de um casamento monótono e pela traição brutal que sofrera. Mas nada daquilo justificava o vazio que sentia agora. Ela olhou para ele novamente. O desconhecido com quem passara a noite, parecia absolutamente tranquilo, enquanto ela sentia o peso do mundo em seus ombros. Celina sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Ela mordeu o lábio, tentando conter a onda de emoções. Com cuidado, deslizou o lençol ao redor do corpo e se sentou à beira da cama. Seus pés tocaram o chão frio, despertando-a ainda mais para a realidade. Sentia a cabeça levemente pesada, não pela bebida em si, mas pelo impacto de tudo o que acontecera. Ela precisava sair dali. Precisava respirar. Levantou-se devagar, caminhando pelo carpete macio em direção às roupas espalhadas pelo chão. O vestido de seda que usara na noite anterior estava jogado próximo à poltrona. Sua lingerie, em algum ponto entre a cama e o caminho para o banheiro, os sapatos nem sinal. Sentindo o rosto arder, pegou tudo rapidamente e entrou no banheiro, trancando-se ali dentro. Apoiou as mãos na pia e ergueu o olhar para o espelho. O reflexo a encarou como um lembrete cruel da noite anterior. Os olhos castanhos estavam marcados pelo cansaço, o batom vermelho desbotado nos lábios, os cabelos levemente desarrumados. — Olha pra você, Celina — sussurrou para si mesma, sua voz trêmula. — O que você fez com a sua vida? Celina sentiu um nó na garganta. O silêncio do banheiro ecoou sua pergunta sem resposta. Inspirou fundo e fechou os olhos por um instante, tentando afastar o peso esmagador da culpa. Ela não havia feito nada de errado. Estava solteira agora. Não devia mais nada a ninguém. Mas, então, por que se sentia tão… perdida? Em menos de 24 horas, viu seu casamento desmoronar e, sem nem pensar, se jogou nos braços de um desconhecido. Isso não era ela. Isso não fazia sentido. Ou fazia? Talvez estivesse tentando preencher o vazio. Talvez quisesse esquecer. Mas nada daquilo ajudava. Ela respirou fundo, tentando conter as lágrimas. Não choraria ali. Não agora. Vestiu-se rapidamente, evitando se olhar muito no espelho, ignorando o aperto no peito. Não queria encarar aquele homem mais uma vez. Não queria conversar, não queria prolongar aquela manhã constrangedora. Só queria ir embora. Abriu a porta do banheiro devagar, espiando para ver se ele ainda dormia. Sim, ainda estava deitado dormindo. Celina hesitou. O lençol cobria suas partes íntimas, mas ele estava de bruços, um dos braços dobrado sob a cabeça, exibindo a musculatura definida e as tatuagens que percorriam seu ombro e braço. Ela não havia reparado nelas na noite anterior. Agora, à luz do dia, conseguiu ver os traços marcantes das tatuagens em sua pele. Símbolos enigmáticos, frases em um idioma que ela não reconhecia, formas geométricas conectadas de maneira precisa. Seu olhar subiu até o rosto dele. Mesmo dormindo, havia algo nele que exalava perigo. Um mistério que ela nunca iria desvendar. E talvez fosse melhor assim. Celina segurou a bolsa com força e caminhou em direção à porta, os pés descalços deslizando pelo chão sem fazer barulho. Cada passo parecia um passo para longe do caos, da dor, da noite que agora queria esquecer. Por um segundo, hesitou, deveria ao menos deixar um bilhete? Agradecer pela noite? Sentiu um impulso inexplicável de acordá-lo, de perguntar quem ele era, de entender por que estava ali. Mas não podia. Por mais cruel que fosse, a realidade estava esperando por ela do lado de fora. Com passos silenciosos, caminhou até a porta do quarto. Segurou a maçaneta e fechou os olhos. — Me perdoa, Deus... — murmurou, antes de sair. Abrindo a porta devagar, saiu silenciosamente da suíte presidencial, sentindo-se ao mesmo tempo aliviada por fugir daquela realidade e culpada pelo que acabara de fazer. Atravessou o corredor do hotel sem olhar para trás. Era hora de encarar sua própria vida novamente. Sozinha.Celina estacionou o carro na garagem da mansão e ficou ali por alguns instantes, respirando fundo. As mãos ainda tremiam no volante, e sua mente estava um turbilhão. A noite anterior parecia um borrão, um sonho — ou talvez um pesadelo. Desceu do carro com passos incertos e entrou na casa em silêncio. A mansão estava mergulhada na escuridão, apenas algumas luzes de presença iluminavam discretamente o caminho até o quarto. Subiu as escadas devagar, o coração acelerado. A cabeça martelava, reflexo da bebida e da falta de sono. Quando empurrou a porta do quarto e entrou, encontrou tudo escuro. Suspirou aliviada, pensando que poderia deitar e tentar esquecer tudo. Mas então, um clique suave ecoou no ambiente. A luz do abajur ao lado da poltrona foi acesa, e Celina conteve um grito ao ver a silhueta de César sentado ali, à sua espera. Os olhos dele estavam sombrios, o rosto rígido, uma expressão de puro ódio. — Onde você passou a noite? — a voz dele cortou o silêncio como uma l
Celina ainda sentia o impacto da surpresa enquanto se sentava na cadeira de couro à frente da enorme mesa de mogno. O choque de o encontrar naquele escritório luxuoso, o homem misterioso da noite no hotel a deixou sem palavras por alguns instantes. Ele estava ali, à sua frente, como seu possível chefe. Thor Miller a olhava fixamente, os olhos intensos examinando cada detalhe de sua expressão. Como se estivesse se divertindo com a situação. Ele não parecia surpreso em vê-la, e isso só a deixava ainda mais nervosa. — Senhorita Bernardes — ele começou, a voz grave e carregada de uma calma irritante. — Por favor, fique à vontade. Celina engoliu em seco e tentou recuperar o controle de si mesma. Endireitou a postura e tentou parecer profissional. — Obrigada — sua voz saiu quase um sussurro Thor se recostou na cadeira, sem desviar o olhar. — Antes de começarmos, vou me apresentar. Sou Thor Miller, CEO da Miller Holdings. Meu avô, Thor Miller, e meu pai, Roberto Miller, construíra
Celina se virou e viu uma mulher lindíssima entrar sem hesitação. Sentiu o estômago despencar. A mulher foi diretamente até Thor e, por trás da cadeira, passou os braços ao redor do pescoço dele. — Que saudade, amor — disse ela, inclinando-se para um selinho rápido. Celina ficou paralisada. Seus olhos instintivamente desceram para as mãos de ambos. Ali estavam. As alianças douradas. Thor limpou a garganta e, com visível irritação, afastou a mulher com delicadeza. — Isabela — disse ele, em tom de advertência. — Já te falei que não aceito interrupções quando estou em uma reunião de trabalho. Isabela revirou os olhos e sorriu de lado. — Deixa de ser chato, amor. Ela olhou rapidamente para Celina, seu olhar carregado de desprezo. Celina sentiu como se tivesse levado outro tapa no rosto. Como ela pôde ser tão idiota? Isabela, aparentemente satisfeita, deslizou os dedos pelo ombro de Thor e saiu da sala. Thor ajeitou o paletó e voltou sua atenção para Celina, co
Celina encarava o teste de gravidez sobre a pia do banheiro da empresa, incapaz de desviar o olhar daquelas duas linhas cor-de-rosa. Positivo. Seu coração batia descompassado, e sua mente estava um caos. — O que eu vou fazer agora? — murmurou, passando as mãos trêmulas pelos cabelos. Ela começou a andar de um lado para o outro, sentindo o desespero crescer em seu peito. — Eu posso ser demitida… Não sei nem quem é o pai… Sua respiração estava acelerada. Sua cabeça girava. Não fazia ideia de quantas semanas estava, e essa incerteza a aterrorizava. Se fosse de César, seria um golpe do destino. Um último laço que a ligaria para sempre a ele, quando tudo o que queria era esquecê-lo. Se fosse de Thor… Celina apertou os olhos, recusando-se a terminar o pensamento. As lágrimas escorreram pelo seu rosto. Ela não estava pronta para aquilo. O som do telefone tocando na sala ao lado a fez prender a respiração. Ela ignorou, incapaz de se mover. O telefone tocou novamente. E nova
Celina saiu do consultório médico com as pernas trêmulas, sentindo o coração martelar contra o peito. Cada palavra da ginecologista ecoava em sua mente como um martelo em vidro frágil: "Um mês e três dias." "Precisamos marcar seu pré-natal." Ela entrou no carro quase no automático e fechou a porta com força. Suas mãos tremiam tanto que teve que segurar o volante por um instante antes de ligá-lo. Mas, ao invés de dar a partida, abaixou a cabeça e apoiou a testa no couro frio do volante. — Não… isso não pode estar acontecendo… — sussurrou, sua voz quebrada pelo choque. Fechou os olhos, tentando encontrar uma falha, uma possibilidade de erro. Mas os cálculos eram claros. O pai do seu filho só podia ser uma pessoa. Thor Miller. Seu chefe. O homem que ela odiava com cada fibra do seu ser. O homem arrogante, prepotente, frio e insensível. O homem que a tratava como se fosse descartável, como se sua existência se resumisse ao trabalho que fazia para ele. E agora… Celina
Celina estava sentada no chão frio, do lado de fora da casa que um dia foi sua. Seu corpo estava ali, mas sua alma parecia ter sido arrancada. As lágrimas escorriam em silêncio, molhando sua pele pálida. Seus pertences estavam espalhados pela calçada como se fossem lixo, roupas misturadas com documentos, sapatos. O vento da noite passava por ela, mas Celina não sentia frio. Não sentia nada além do vazio dentro de si. "Não sou nada. Não tenho ninguém." As palavras de César ecoavam em sua mente, cortando como lâminas afiadas. "Você era um nada quando se casou comigo. E vai continuar sendo." Seus dedos tremiam ao apertar a barra da própria blusa. O que vou fazer? Pra onde vou? Ela não tinha família para acolhê-la. Nenhum porto seguro. Seu mundo, que já estava desmoronando, agora havia ruído por completo. O barulho de um carro se aproximando tirou-a , por um breve momento, do estado de choque. Os faróis iluminaram sua figura encolhida no chão, e Celina ouviu o motor desligand
Ao ouvir toda aquela conversa, Celina tapou a boca para conter o soluço que ameaçava escapar. Ela sentiu a alma se despedaçar. A tontura veio forte, e ela precisou segurar-se na parede. Se Thor descobrisse sobre o bebê… Ele a obrigaria a abortar também. Celina sentiu o pânico tomar conta de seu corpo. Ela não podia contar. Não podia deixar que ele soubesse. Seus olhos arderam, e as lágrimas voltaram a cair. Virou-se e saiu correndo pelo corredor, sentindo o coração esmigalhado dentro do peito. Seu filho nunca poderia saber quem era o pai. E, assim, a decisão foi tomada. Ela protegeria seu bebê. Mesmo que isso significasse carregar esse segredo pelo resto da vida. Ao entrar em sua sala apressada, fechou a porta atrás de si, encostando-se nela como se precisasse de apoio para não desmoronar. Seu corpo tremia. O peito subia e descia de forma descompassada. Então, como se uma represa tivesse rompido, as lágrimas vieram. Ela deslizou até o chão, cobrindo
Celina chegou à casa de Tatiana ainda abalada com tudo o que tinha acontecido naquele dia, sentindo o peso do mundo sobre os ombros. Assim que entrou, desabou no sofá da sala de estar, exausta emocionalmente. Tatiana percebeu o semblante abatido da amiga e se sentou ao lado dela, segurando suas mãos com carinho. — Amiga, me conta tudo. Como foi a conversa com Thor? — Tatiana perguntou, com preocupação. Celina respirou fundo, antes de começar a falar, tentando manter a compostura, mas era impossível. Seus olhos marejaram e sua voz saiu embargada. — Eu ouvi Thor e Isabela conversando hoje... — Ela fez uma pausa, sentindo um nó na garganta antes de continuar. — Ela disse que pode estar grávida. E sabe o que ele respondeu? Que se isso for verdade, ela deve abortar. Ele não quer esse filho, Tatiana. Ele disse isso com uma frieza, uma crueldade... como se estivesse descartando uma vida como se fosse lixo. Tatiana arregalou os olhos, chocada com o que ouvia. — Meu Deus, Celina... —