Celina olhou para o teto por alguns segundos antes de responder. Parecia querer guardar cada pedacinho daquela noite antes de dividir com o mundo — ou, no caso, com Tatiana.— Ele me ouviu. E mais do que isso... ele me viu.— Como assim? — Tatiana perguntou, agora mais curiosa do que antes.— Ele não perguntou sobre o César, sobre o que me fez triste ou de onde vinha a dor nos meus olhos. Ele apenas... esteve ali. Me fazendo esquecer. Me fazendo rir. Me fazendo sentir... — ela hesitou, como se a palavra estivesse tímida dentro da garganta — leve.Tatiana sorriu, mas se manteve em silêncio, permitindo que Celina continuasse.— Foi como respirar depois de muito tempo sufocada. Como se o ar voltasse a entrar nos pulmões e eu lembrasse do que era estar viva. — Ela riu, meio sem graça. — E olha que nem foi nada demais... só uma conversa, umas músicas, um brinde e um beijo na bochecha.— Às vezes é isso que mais toca — Tatiana disse, suave. — A leveza. A ausência de esforço. O oposto do que
O despertador tocou suavemente, mas Celina já estava acordada. Pela primeira vez em semanas, havia dormido bem, sem sonhos turbulentos ou enjoos intensos. Sentia-se mais leve, como se a noite anterior tivesse aliviado parte do peso que carregava nos ombros.Se espreguiçou, pegou o celular e viu uma nova mensagem de Gabriel na tela."Bom dia, linda. Que sua viagem seja incrível. E que você volte logo pra eu poder te ver de novo."Celina sorriu sozinha, sentindo um calor gostoso no peito. Respondeu um simples “Obrigada, Gabriel! Nos falamos depois”, e seguiu para o banho.Depois de se arrumar, tomou um remédio para enjoo – precaução essencial para a longa viagem até Dubai. Desceu as escadas e encontrou Tatiana na cozinha tomando suco.— Dormiu bem? — a amiga perguntou, entregando-lhe um copo de suco de pêssego.— Pela primeira vez em muito tempo — Celina respondeu, sentando-se à mesa.— Deve ter sido influência do cantor bonitão — Tatiana brincou, piscando para ela.Celina riu e negou c
O perfume de Thor naquela manhã — forte, amadeirado, intenso como ele — começou a embrulhar seu estômago. A náusea subia pela garganta e se misturava ao nervosismo de estar ao lado dele, à lembrança do olhar fulminante que ele lançara a Roberto e à pressão que ela mesma colocava sobre si por parecer estar no lugar errado, na hora errada, com a pessoa errada.Tentou respirar fundo. Uma, duas vezes. Em vão.A tensão no carro era quase palpável. E Thor, alheio — ou fingindo estar —, mantinha o olhar fixo na estrada, os punhos apertados no volante, a mandíbula travada. O silêncio era uma tortura. Um campo minado de palavras não ditas e sentimentos reprimidos.Celina fechou os olhos por um instante e levou a mão ao abdômen. O enjoo ganhou força.— Thor... — ela murmurou, com a voz fraca.Ele não respondeu.— Thor, para o carro... por favor... agora.Ele olhou rapidamente para ela pelo retrovisor interno e viu seu rosto pálido, suando frio. Sem pensar duas vezes, puxou o carro para o acosta
Celina pegou os talheres com mais força do que deveria. Começou a comer, mas mal conseguia engolir a comida. O cheiro do molho parecia enjoativo, o gosto nem se destacava. Thor, por outro lado, comia tranquilamente, distraído com algum documentário passando na tela à sua frente.Celina respirou fundo. Será que estou exagerando? — pensou. Ou será que ele está mesmo fingindo que não percebeu?Tentou forçar a barra e comer mais um pouco. Cada garfada parecia pesar uma tonelada. Definitivamente tudo estava sem gosto. A presença incômoda da aeromoça e a maneira como ela flertava descaradamente com Thor, tirou completamente sua concentração, perdendo seu apetite. A dúvida que tinha sobre a postura dele mediante aquela constrangedora cena, a corroía por dentro. Com o seu suposto "incômodo", não estava conseguindo discernir se ele realmente estava alheio ou fingindo não notar. Parecia tranquilo, entretido com um documentário qualquer.Exausta, Celina pegou a taça e bebeu um pouco de água. Em
O silêncio da manhã foi a primeira coisa que atingiu Celina ao despertar. O lençol de cetim frio sob sua pele revelava que César não estava ali. Ela abriu os olhos lentamente, piscando contra a claridade difusa que entrava pelas cortinas entreabertas. Virou-se para o lado, confirmando o que já sabia: a cama ao seu lado estava intacta, como se ele sequer tivesse deitado ali naquela noite. Nos últimos meses, isso havia se tornado rotina: ele saía cedo e voltava tarde da noite, sempre alegando estar sobrecarregado no trabalho. Um suspiro escapou de seus lábios. Levantou-se devagar, os pés descalços encontrando o carpete macio enquanto caminhava até as grandes janelas do quarto. Puxou as cortinas, revelando a paisagem cinzenta lá fora. O céu carregado de nuvens, cinzento, trazia uma sensação estranha, uma melancolia que parecia invadir seu peito. Aquele céu refletia exatamente como ela se sentia por dentro. Suspirou fundo e murmurou para si mesma, quase sem perceber: — Agora ele
Celina abriu a porta do escritório, e seu mundo desmoronou. O ar sumiu dos seus pulmões. Seu coração deu um salto doloroso dentro do peito antes de despencar em um abismo de desespero. Ali, diante de seus olhos, estava César, seu marido, o homem que prometeu amá-la e respeitá-la, entrelaçado no corpo de outra mulher. Nicole estava jogada sobre a mesa, os cabelos loiros desarrumados, os lábios entreabertos em puro prazer. As pernas estavam enroscadas na cintura de César, as mãos cravadas em suas costas. A cena era crua, explícita, e Celina sentiu náuseas instantaneamente. Seu corpo congelou. O sangue gelou em suas veias. Ela queria gritar, mas a voz morreu em sua garganta. Queria correr dali, mas suas pernas não obedeciam. Nicole foi a primeira a notar sua presença. Em vez de pânico ou constrangimento, um sorriso surgiu em seu rosto. Um sorriso de satisfação. De triunfo. Celina sentiu o chão ceder sob seus pés. Os olhos de Nicole brilhavam com malícia, como se já esperas
Celina arqueou uma sobrancelha, avaliando-o por um instante. Ele não era como os homens que geralmente tentavam abordá-la. Não parecia apressado. Não usava uma cantada barata. Apenas oferecia algo simples, com uma confiança desconcertante. E, talvez pelo álcool, ou talvez porque precisava desesperadamente se sentir desejada depois de ser descartada como lixo, ela sorriu de canto. — Aceito. O homem inclinou levemente a cabeça, o sorriso de canto quase desafiador. — Você não parece do tipo que aceita bebidas de estranhos. Celina soltou um riso baixo, sem humor. — Talvez hoje eu seja. Ele a observou atentamente, os olhos escuros estudando cada detalhe de seu rosto. — Então hoje é um dia atípico. — Pode apostar que sim. O homem ergueu uma mão, chamando o garçom, e sem nem precisar olhar o cardápio, pediu: — O melhor drink do bar para esta senhorita. Celina observou enquanto o garçom assentia e se afastava. O homem então puxou um banco e se sentou ao lado dela, casua
A claridade atravessava as janelas, filtrando a luz do amanhecer e iluminando suavemente o ambiente luxuoso da suíte. O céu de São Paulo exibia tons alaranjados misturados ao azul suave do início da manhã, e a cidade começava a despertar abaixo dela. Celina despertou devagar sentindo-se desorientada, seu corpo afundando na cama macia, o lençol de algodão egípcio cobrindo sua pele desnuda. Piscou algumas vezes, tentando se situar. O teto alto, os móveis sofisticados, o cheiro amadeirado no ar… nada daquilo lhe era familiar, nada era seu Virou o rosto para o lado e sentiu o coração falhar uma batida. Ali, ao seu lado, o homem do bar ainda dormia profundamente. O peito largo subia e descia em uma respiração lenta e tranquila. Os lençóis cobriam a parte inferior de seu corpo, mas deixavam à mostra a pele quente e tatuada de seu braço, repousado sob a cabeça em um gesto despreocupado, como se nada no mundo pudesse perturbá-lo. Celina engoliu em seco, sentindo um turbilhão de e