CAPÍTULO 5

Paris

Seis da manhã, acordei e me tranquei no banheiro para um banho antes da minha entrevista. Ainda não sabia como seria a questão da aposta.

Talvez as duas loucas me deixem trabalhar normalmente. Apesar de que não ligo. Vai ser divertido de qualquer forma. Eles podem descobrir a verdade, mas se preciso digo que uma fase ruim me deixou seja lá como eu deva ficar.

Com esses pensamentos, sai do banheiro e encontrei as duas me esperando sentadas em suas camas com caixas e um sorrisinhos.

— Achei que poderia escapar — brinquei, enxugando o rosto enquanto usava uma toalha cobrindo meu corpo.

— Sem chance. — Barbara declarou.

— Me desculpe, amiga, mas parece muito divertido para não fazer. — Inalda declarou abrindo uma das caixas.

— Então vamos nos divertir. — Sentei na cadeira da única penteadeira em nosso quarto e elas vieram. Barbara indicava o que Inalda precisava fazer porque ela era estudante de direito, não entendia nada de maquiagem, assim como eu.

Todas nós tínhamos planos para quando sairmos da faculdade, no fim desse ano, por isso dividíamos o quarto que nossas bolsas incluíam. O dinheiro que ganhávamos era reservado para nossos sonhos. O meu é comprar um apartamento e abrir meu consultório particular. Ainda não tenho o bastante para fazer tudo à vista, mas estou trabalhando para começar com o mínimo de dívidas e o máximo de empolgação. E sem precisar pedir ajuda aos meus pais, que já trabalharam demais em suas vidas para me levar até onde estou.

— Não. — Segurei a mão de Inalda quando entendi que ela pretendia esconder a minha cicatriz com maquiagem.

— Desculpe. — Ela fez aquela expressão que sempre fazia quando o assunto era minha cicatriz.

Odeio ver pena no olhar das pessoas. Às vezes me arrependo de ter contado a ela como consegui essa marca.

— Relaxa. Mas deixa ela ai. No fim, vai acabar ajudando na caracterização. — Forcei um sorriso.

Ela demorou um pouco, mas aceitou e mudou de assunto; falando sobre como seria os dias da aposta.

Eu tinha essa cicatriz desde o meu aniversário de quinze anos. Era uma lembrança de que existe mais pessoas cruéis que boas nesse mundo. Colegas de escola armaram para mim. Enquanto eu me arrumava toda feliz por ter permissão para comemorar meu aniversário com eles longe dos nossos pais, eles preparavam a armadilha.

Era para ser um estupro coletivo. E as meninas filmariam para me ameaçar caso eu tentasse contar para alguém, mas eles não esperavam minha reação. Ataquei tudo e todos. Eles tentavam me segurar e eu atacava mais ainda, como um animal acuado. Só que cai exatamente com o ombro — bem perto do pescoço — em uma garrafa quebrada no chão. Não morri por milagre. Ouvi isso de várias pessoas, inclusive dos médicos que me salvaram. Era realmente um milagre porque o dono da casa chegou no momento exato, e ele era médico. Time perfeito para eu não sangrar até a morte, porque meus colegas me deixariam morrer, eles fugiram logo que me viram sangrando. Eu denunciei todos eles. Só foram condenados a serviço comunitário, por serem menores de idade e eu ter sobrevivido. Mas pelo menos eles sabem que não tenho medo. Depois desse dia os pais deles foram obrigados pela pressão dos outros pais a mudá-los de escola e nunca mais os vi.

Desde esse dia eu faço todos os cursos de defesa pessoal, ando com spray de pimenta, além de ter porte e posse de arma. Não passarei por isso novamente. Também criei certa resistência a confiar. Principalmente em homens.

Enquanto eu lembrava desse terrível episódio, Barbara terminava sua mágica.

— O que acha?

— Nossa! Você tem o dom. Me deixou horrível. Adorei. — Rimos. — Agora me deixe ir porque posso chegar feia, não atrasada.

Depois de algumas fotos do novo estilo, me apressei e cheguei na empresa no horário. No local, assim como pelo caminho, as pessoas me olhavam como se eu tivesse uma doença contagiosa. A sensação não é muito diferente de quando ando pela rua com uma roupa mais elegante e os homens me encaram como a um pedaço de carne e as mulheres como se quisessem me matar.

A roupa feita para deixar gorda incomodava um pouco, me deixava atrapalhada. Por isso nem vi quando ele entrou na sala. Estava pegando a caneta que derrubei ao tentar corrigir minha postura na cadeira.

Quando me levantei e o vi, quase que cai junto com a caneta que soltei.

Não poderia existir homem assim. É covardia do universo. Não que fosse um modelo de beleza padrão. Longe disso. Era másculo, alto, com um rosto marcado por duas cicatrizes finas. Ele emana algo que me deixa de pernas bambas. E pelo que percebi ao meu redor, eu não era a única afetada.

Foi tudo muito rápido. Ele ordenou que contratassem a de cinza e saiu. Demorou para eu entender que a de cinza era eu.

Quando caiu a ficha, todas me olhavam com raiva.

E eu? Estava só a felicidade por ter conseguido o emprego e por saber que teria a visão desse deus todos os dias.

Se não fosse casado...

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