No final, passamos muito mais tempo no escritório do que eu imaginava. Alexander, aparentemente inspirado por algum espírito discursivo, transformou nosso final de noite em uma maratona de decisões, planos e longas reflexões. Quando finalmente saímos, era uma da manhã. Enquanto ele discursava com entusiasmo, ignorando completamente as necessidades básicas de qualquer ser humano — comer, dormir, respirar —, eu não era a única vítima. Meus pensamentos se voltaram para os funcionários que, coitados, tiveram que acompanhá-lo nessa cruzada noturna. Mas ninguém sofreu mais do que o motorista, cuja única função parecia ser levar o carro do estacionamento à porta. Ele havia esperado desde as oito da manhã por um trabalho que duraria, no máximo, cinco minutos. E ainda tinha que, mais tarde, levar o carro até algum lugar seguro antes de trazê-lo de volta no dia seguinte.A diferença é que Alexander estava radiante, quase injustamente feliz, enquanto voltávamos para casa. Ele ligou o rádio casu
— Quando você vai começar a fazer as malas? — Alexander perguntou, quebrando o silêncio no carro. O rádio anunciava que era 1h30 da manhã, e eu me perguntava por que ele parecia tão casual ao jogar essa bomba. Entre as muitas decisões que ele tomou naquela noite (e que, claro, eu concordei sem muita escolha), estava a de voltarmos à mansão para uma espécie de “avaliação”. Como era conveniente para mim economizar com aluguel e outras despesas, não tive coragem de me opor, mas meu espírito gritava em protesto. Voltar a morar com os meus sogros? Eu preferia enfrentar uma horda de advogados corporativos.Olhei para as luzes da rua do lado de fora e respondi com a voz mais neutra que consegui: — Uns três ou quatro dias. Preciso encontrar um lugar para guardar os móveis. — Não precisa. Só arrume suas roupas e deixe o apartamento como está. O resto fica. A naturalidade na voz dele me irritou antes mesmo de eu processar o que ele estava dizendo. — Como assim, fica? — O apartamento
Quando acordei no dia seguinte, ainda era difícil acreditar em como as coisas tinham mudado. O sol já estava alto, e Alexander estava deitado ao meu lado, a expressão tranquila — algo que eu nunca tinha visto nele antes. Foi quando ele, ainda com os olhos semiabertos, lembrou-se de algo que pareceu mais importante do que o café da manhã que não tivemos: — Esquecemos de comer ontem. Vou pedir comida agora. Olhei para ele, à beira das lágrimas, de verdade. Como conseguimos esquecer de comer? Eu mencionei que estava faminta pelo menos umas dez vezes na noite anterior! Só de falar sobre minha fome, já estava me sentindo satisfeita. Mas, claro, alguém estava ocupado demais para me ouvir. E, honestamente, eu também estava. — Você não precisa ir trabalhar hoje. Vou pedir uma licença para você — ele disse com um tom alegre, enquanto me abraçava e plantava um beijo na minha bochecha. Havia algo tão desconcertante em sua disposição. Essa “vibe de lua de mel” que ele estava emitindo era e
Quando me virei para encarar Alexander, ainda encostada à porta, ele estava parado no meio do quarto, os braços cruzados e uma expressão indecifrável. Sua masculinidade acabara de ser questionada pela minha avó, e ele parecia perdido entre o constrangimento e a necessidade de dizer algo. Mas, como sempre, foi o silêncio que ele escolheu.— Charlotte? — ele finalmente chamou, a voz hesitante, quase como se estivesse com medo da resposta.— Hum? — murmurei, tentando evitar contato visual. Eu sabia onde isso ia parar. — Sobre a consulta ao médico… — Ele hesitou, limpando a garganta, mas antes que pudesse completar a frase, eu já estava com as mãos no rosto, interrompendo-o.— Pelo amor de Deus, Alexander, esqueça o que a vovó disse! — gritei, tirando as mãos do rosto para encará-lo. Ele piscou algumas vezes, surpreso, mas não disse nada. Apenas ficou lá, me encarando com aquele sorrisinho que fazia meu coração pular e meu cérebro implorar por paciência.— Charlotte?— O que é?! — minh
Eu ainda me perguntava como alguém como Alexander havia crescido naquela casa. Era difícil imaginá-lo com birras infantis ou crises de raiva. Talvez sua frase de rebeldia aos cinco anos tenha sido algo como: “A incompetência aqui é alarmante. Prefiro educar-me com livros.” Porque, sinceramente, essa é a única explicação lógica para ele ter se desviado tão completamente da lógica distorcida da família Speredo.Quando a discussão finalmente morreu — mais por exaustão coletiva do que por resolução —, Alexander apertou minha mão com firmeza e me conduziu pela sala, como se nada tivesse acontecido. Não deu um único olhar para trás, ignorando os rostos carrancudos que nos seguiam até a porta.No carro, ele permaneceu em silêncio enquanto ligava o motor, mas seus olhos, por um momento, buscaram os meus. Algo estava por vir. Eu sabia.— Eu deveria encontrar um novo lugar para enviá-los — ele disse, com a calma glacial que só Alexander Speredo conseguia ter ao planejar algo tão drástico. Eu
O elevador demorava uma eternidade, e meu cérebro, claro, aproveitou o momento para criar cenários dignos de um filme de suspense barato. Algo tão sério que Alexander não conseguiu me ligar diretamente? Por que usar a recepcionista para me chamar? A resposta óbvia? Encontraria um cadáver. Provavelmente o dele. E, claro, a polícia teria me convocado para identificá-lo, como nos dramas mais bizarros da minha imaginação. Eu sabia que era um pensamento absurdo, mas diga isso para meu coração, que já havia entrado em pânico total, e para minhas pernas, que pareciam prestes a desabar. Quando as portas do elevador se abriram, precisei de todo o meu autocontrole para não desmaiar dramaticamente. Alexander estava lá, vivo e mais irritantemente charmoso do que qualquer homem deveria ter permissão de ser. Respirando. Inteiro. Sem marcas de tiro ou qualquer sinal de envenenamento. Mas meu corpo não acompanhava a lógica tão rápido quanto meu cérebro. — Alexander — murmurei, apoiando-me contr
Parada no corredor, encostei na parede e deixei o celular pesar na minha mão. Tentei me convencer de que estava tudo sob controle, mas meu cérebro já estava a mil, desenhando cenários catastróficos envolvendo Mattia, Alexander e, claro, meu inegável talento para atrair problemas. Respirei fundo e disquei o número de Alexander, com os olhos fixos na porta do quarto de Lily, como se ela fosse me ouvir do outro lado e sair para espiar minha conversa. Alexander estava no país G, que, graças a Deus, tinha apenas duas horas de diferença no fuso horário. Eram 17h aqui, então provavelmente ele estava jantando ou, mais provável, fechando um contrato com algum magnata. O telefone chamou uma, duas, três vezes… e foi para a caixa postal. Meu coração acelerou, mas era um clássico. Não era a primeira vez que minhas ligações eram ignoradas, e provavelmente não seria a última. “Não seja neurótica, Charlotte.” Tentei me convencer, mas minha mente já deslizava para pensamentos pouco construtivos.
Eles estavam todos impecavelmente arrumados, como se uma equipe de produção tivesse invadido a casa com roupas de gala e uma tonelada de maquiagem. Minha sogra, em particular, parecia uma árvore de Natal fora de época, com cada centímetro do pescoço e dos pulsos cobertos de joias brilhantes. Quanto à Lily, ela optou por algo mais sutil — ou quase. O vestido branco com babados, a maquiagem carregada e a trança perfeitamente arrumada a deixavam deslumbrante, se você ignorasse as pulseiras douradas que pareciam pesar mais do que ela. Sentei-me ao lado da minha avó, que também parecia saída de uma vitrine de alta-costura. Não perdi tempo e sussurrei: — Por que você não me disse que Mattia vai se casar com a Lily? Minha avó, com a sutileza que lhe era peculiar, beliscou a parte de trás da minha mão com tanta força que quase gritei. — Sua pirralha! — ela sibilou, os dentes cerrados. — Só soube disso meia hora antes de você. Fui interrogada como se estivesse em um tribunal, até perde