Eu já sabia que ia acabar com ele. Já tinha decidido isso, mesmo que a convicção me escapasse sempre que Alexander surgia com aquele ar distante e inatingível. No fundo, eu já me considerava sozinha há muito tempo, um adorno dispensável na vida dele, e me repetia que estava pronta para seguir em frente.Mas ainda doía. Ele mentiu. Ele tinha outra. E depois de admitir isso com um desdém quase casual, ele olhou para o relógio — aquele maldito relógio de pulso caríssimo — e se virou para sair. Me deixou ali, aos prantos, como se fosse nada.Orgulho sempre foi meu sobrenome. Jamais me deixaria rebaixar… até aquele instante. Porque naquele dia, por algum motivo que nem sei dizer, meu orgulho cedeu.Eu o vi pegando a bolsa e indo embora, e, sem pensar, corri para segurá-la com as duas mãos. Minha voz saiu tão baixa que quase achei que ele nem ouviria.— Se você sair agora, não vai me encontrar quando voltar.E ele ouviu. Mas sua resposta foi arrancar a bolsa das minhas mãos com tanta força
Assim que ouvi as palavras dele, qualquer resquício do joguinho de olhares morreu ali. Minha vontade de continuar olhando nos olhos dele foi substituída por uma sensação de puro desprezo, e eu deixei escapar uma risada amarga.— Você… você tem a audácia de pedir perdão?Ele ficou em silêncio, talvez sem saber o que dizer — ou, quem sabe, sabendo que nada do que dissesse mudaria alguma coisa. Isso não me impediu de ir até o fim, é claro.— A resposta é não, Alexander. Eu jamais vou te perdoar. E se o universo for justo, você vai pagar por tudo.Soltar aquilo não me trouxe alívio. As palavras saíram vazias, como uma moeda lançada em um poço que nunca devolve nada. Mas para ele, pareceu o bastante. A expressão dele congelou, tão distante quanto sempre.— Estou indo embora — disse ele, seco, antes de se virar, pegar o casaco e sair, deixando a porta bater. Por um instante, fiquei olhando para a porta fechada, com o coração inquieto, pulsando naquela mistura exasperante de ódio e… pena? E
Continuei encarando Alexander enquanto os médicos saíam da sala, e as lágrimas começaram a se acumular nos meus olhos. Teimosamente, enxuguei cada uma antes que pudessem cair — mais por orgulho do que por qualquer outra coisa. Ele não merecia ver nem uma fração da minha dor.— Vovó, poderia nos dar um momento a sós? — Alexander pediu com aquela calma inabalável que parecia tão ensaiada. Minha avó assentiu e saiu, lançando-me um último olhar triste.Quando ele se aproximou da cama, senti meu corpo inteiro se retrair. Ele achava que qualquer coisa que dissesse agora faria diferença? Nem esperei que ele começasse.— Me deixa em paz, Alexander. Não quero ver seu rosto nunca mais. — As palavras saíram afiadas, e pela primeira vez, o vi hesitar. Seus olhos se encheram de uma decepção que quase me pegou desprevenida, como se ele realmente não entendesse o motivo da minha mágoa.Virei-me para o lado oposto, ignorando sua presença. O silêncio era quase ensurdecedor, mas ele não fez nada para p
Minha mãe me encarou com um olhar calculista, como se estivesse considerando onde eu cabia (ou melhor, onde eu não cabia) no seu grande plano. Então, disparou, sem hesitar:— Vou começar minha vida com ele. Já perdi tempo demais nesta cidade e com essa… família. Quero ser feliz, Charlotte. Dá pra fazer isso por mim? E, por favor, não conte a ninguém. Saio daqui a dois dias. Quando estiver estabelecida, te mando dinheiro, e quem sabe até te trago comigo, quando tudo estiver resolvido.Eu sabia que era mentira. Uma desculpa mal disfarçada para me manter calada. Ela nunca teve intenção de me levar. Naquele momento, aos quatorze anos, era óbvio que eu estava sendo oficialmente removida do seu mapa. Afinal, o que uma garota daquela idade entende sobre egoísmo? Naquela época, o ato mais egoísta que eu cometia era roubar o melhor pedaço de bolo. Mas naquele dia, aprendi o que significava o egoísmo de verdade. Era um troféu de uma mãe que escolhia seguir seu próprio caminho — sem mim.Respire
Normalmente, quando alguém da família Speredo está em apuros — o tipo de problema que só os ricos conhecem —, esses guardas entram em modo “alerta vermelho”, prontos para salvar até o último botão de grife. Foi quando a ficha caiu: e se algo aconteceu com Alexander… por minha causa? Senti o coração pular no peito, e o pouco ar que me restava sumir. Olhei para o chefe de segurança com olhos arregalados, e minha voz saiu fraca: — Não tem nenhuma ameaça. O que houve? Alexander… ele está bem? — Perguntei, tentando ignorar a batida descompassada no peito. — Está tudo sob controle, senhora. Apenas recebemos um alerta para escoltá-la em segurança até o escritório — respondeu ele, sério demais. — Então… não houve um ataque? Ninguém foi sequestrado? — Mal consegui acreditar. — Não, senhora. O jovem mestre só achou que a senhora… bem, precisaria de reforço — ele disse, e juraria que, debaixo daquele semblante estoico, havia um quê de diversão.Respirei aliviada, mas não pude evitar um toqu
— Por que eu brincaria com algo assim? — retruquei, sem conter o sarcasmo.Alexander não respondeu de imediato. Em vez disso, contornou minha figura, caminhando até a porta. Por um segundo, pensei que ele fosse sair — afinal, discussões entre nós sempre terminam assim, com ele encerrando a conversa e ponto final. Mas, para minha surpresa, ele apenas acendeu as luzes, fazendo o escritório brilhar a um ponto quase incômodo. Ele voltou, e a intensidade no olhar era tão forte que por um momento eu senti um calafrio.— Charlotte… você realmente nunca considerou — sua voz era um misto de irritação e cansaço — que eu precisaria saber o que realmente aconteceu com sua mãe? Que não é algo que você tem o direito de esconder?Pisquei, meio surpresa com a fúria dele. Alexander, respirando fundo, ainda lutava para não elevar a voz mais do que já fizera. E eu? Senti-me exposta, como se, finalmente, tivesse sido pega em um erro de proporções épicas.— Eu… — as palavras me faltaram. Respirei fundo,
Eu sei que o lobby da empresa não era o lugar ideal para discussões sérias ou para Alexander segurar minhas mãos daquela forma. Mas, quem eu estava enganando? A pergunta me escapou antes que eu conseguisse segurá-la.— Vamos pegar o carro — disse ele, sem sequer responder à minha pergunta. Claro. Ele apenas ignorou.Alexander soltou minhas mãos e começou a andar na minha frente, seu passo seguro, como se nunca tivesse sido interrompido por algo tão irrelevante quanto o meu questionamento. Suspirei e o segui. Se ele não ia dar bola, eu também não ia me importar… ou pelo menos eu tentava convencer a mim mesma disso.Assim que saímos da empresa, um dos seguranças entregou as chaves do carro a Alexander, que acenou para eu entrar. Ele dirigiu até meu prédio, o que já era inusitado. Normalmente, um “boa noite” seco encerraria nossa interação. Mas o que realmente me pegou de surpresa foi quando ele saiu do carro e abriu o porta-malas. Então, como se aquilo fosse a coisa mais lógica do mundo
Foi naquele dia, sob o pretexto de uma consulta médica, que resolvi fugir. Era a chance perfeita. Os guardas não tinham ideia dos procedimentos, e Alexander, é claro, estava ocupado demais para acompanhar “sua esposa” em qualquer consulta. Então, lá estava eu, uma Charlotte diferente refletida no espelho do banheiro feminino do hospital. Vestindo salto alto e um lenço cobrindo metade do rosto, nem eu mesma me reconhecia.Passei pelos seguranças como um vento discreto, atravessando a saída sem que nenhum deles levantasse a sobrancelha. Uma mulher qualquer. Ou talvez, invisível. Em poucos minutos, estava em um táxi, trocando para outro logo em seguida, deixando pistas confusas, um rastro impossível de rastrear. Ou assim achei.Finalmente, cheguei ao meu novo refúgio, um pequeno apartamento longe daquelas paredes geladas. Longe de Alexander. E pela primeira vez em tanto tempo, senti o gosto da liberdade. Eu havia planejado cada detalhe: na manhã seguinte, ele receberia os papéis do divór