Ao chegar ao hotel, um prédio imponente de vidro e mármore, foi direto ao setor de Recursos Humanos.
O corredor tinha um cheiro forte de produtos de limpeza e café requentado. Porém, quando foi falar com o encarregado do RH, um sujeito de rosto severo e terno engomado, nem esperou que ela explicasse. — Impossível trabalhar aqui com uma criança. No colo! O coração de Malú afundou. Mas apesar de ter ficado inicialmente triste, ela não desistiria, falaria diretamente com o dono. E se o rapaz do RH não escutaria talvez o dono a escutasse, assim como a senhora Moreira falou. Iria explicar-lhe que daria um jeito e que não levaria a pequena com ela, enquanto estivesse trabalhando. Pois, o rapaz do RH não lhe deu nem oportunidade de lhe explicar direito, já foi logo dispensado-a. Ela soube então que o dono estaria lá à noite. Resolveu que insistiria. Por isso, quando deu nove horas, Malú voltou novamente ao hotel, dessa vez pela entrada principal. O saguão era luxuoso, com lustres brilhantes refletindo na superfície polida do chão. O perfume floral e amadeirado do ambiente misturava-se ao som de conversas abafadas e passos elegantes sobre o tapete. Ela esperaria o dono no saguão do hotel. Porém, assim que entrou, observou dois homens pedindo informações para a recepcionista em um português totalmente arrastado. Os homens estavam de costas, por isso não a viram então, um arrepio subiu por sua espinha ao ouvir um sotaque familiar. Malú congelou “Russos!”. Seus olhos se arregalaram ao vê-los mostrando sua foto para a recepcionista, ela sentiu o seu coração disparar. “Viktor a encontrou….” Pensou ela Ela então aproveitou e, com a menina no colo, escondeu-se atrás de uma parede, enquanto via os homens mostrarem a sua foto para a moça, que disse: — Sinto muito, mas não posso dar informações dos hóspedes do hotel! — Essa moça não é uma hóspede — dizia um dos homens. — Acreditamos que veio procurar emprego aqui. — Sendo assim, quem poderá dar-lhes tal informação é somente Rony, o rapaz do RH! — disse um dos funcionários. Porém, enquanto olhava para frente, a moça avistou Malú, então apontou para ela e falou: — Vejam, não é a moça que procuram! Ao perceber aquilo, Malú ficou desesperada e pensou em correr para a porta da frente, porém, sabia que se saísse por lá, provavelmente havia outros lá fora à sua espera. Por isso, segurou a pequena May com força em seu colo, e correu na direção da área de serviço do hotel, com os homens em seu encalço. Ela não sabia para onde estava indo, mas continuou. Passou pela cozinha, onde o cheiro de carne grelhada e temperos pesados encheu seu nariz, e depois pela lavanderia, onde nuvens de vapor subiam das máquinas barulhentas. Os homens seguiam em seu encalço. Eles não corriam, pois não desejavam chamar atenção demais para si. Ela, porém, corria sem medo, mesmo com a pequena no colo. Por sorte, ela percebeu quando eles se atrapalharam com dois homens que entravam na lavanderia com três enormes carrinhos de lençóis sujos. Ela aproveitou e escondeu-se no almoxarifado, visto que naquele momento era a sua única opção. Ao entrar sentiu o cheiro de papelão úmido e produtos de limpeza encheu suas narinas, quando ela se escondeu entre as prateleiras. Com o coração com a cabeça martelando, pensou o que faria a partir dali. Agradecia ao perceber que a garota estava calma, porém, sabia que a pequena sentiria fome e teria que sair o mais rápido possível daquele hotel. Mas infelizmente não poderia voltar para o seu apartamento, pois tinha certeza de que eles já sabiam onde ela se escondia. Ela ouviu os passos firmes dos russos se aproximando, suas vozes falando em tons baixos e ameaçadores ao telefone, porém percebeu que eles haviam passado do almoxarifado, e suspirou aliviada, agora tinha que pensar como fugir dos outros que estavam na frente do hotel. Então, enquanto pensava nisso, alguém entrou no almoxarifado, era um dos funcionário do hotel, que quando a viu lá, falou aborrecido e alto o suficiente para alertar os russos que a procuravam: — Ei, moça! Não pode ficar aqui, é proibido a entrada de pessoas que não sejam os funcionários! Ela soube que precisava se mover, então olhando para fora saiu dali. Desesperada sentiu os passos dos russos atrás dela, por isso correu novamente o máximo que podia, deixando o almoxarifado para trás e saindo no estacionamento. O ar frio da noite bateu em seu rosto, mas ela não parou. A menina já estava bastante sonolenta, o que era incrível visto que ela corria com ela no seu colo. Porém, totalmente alheia a tudo, a garotinha já fechava os pequenos olhinhos. Ela se abaixou, escondendo-se por trás daqueles carros, ao ouvir passos no estacionamento. Então, os avistou novamente ao longe. Em desespero, ela sentou-se no chão, atrás de um carro que parecia bem grande. Sentindo o cheiro forte de graxa e gasolina. Os russos estavam próximos. O som das solas dos sapatos ecoava no concreto. Nesse momento, já totalmente desesperada, ela já não sabia mais o que fazer. Então quando ela viu a marca do carro, seu sorriso se iluminou, tirou algo da mochila, com as mãos ágeis e com uma facilidade incrível, conseguiu abrir o porta-malas do carro sem acionar o alarme. O clique da trava em seus ouvidos pareceu como o retumbar de um trovão, mas na verdade foi quase imperceptível. Malú se enfiou dentro, apertando May contra si, que pela graça de Deus, dormia naquele momento. Ela ainda ouviu os homens falarem em russo e provavelmente era no celular. Eles explicavam que a perderam de vista. Não sabia o que Viktor falou-lhes, mas sabia que ele não era nem um pouco gentil com eles. A voz deles era baixa e ameaçadora, enquanto o som do celular ecoava no estacionamento. Então, de repente o carro ligou. O som do motor roncando foi como um soco no estômago. O chão parecia estar se movendo sob seus pés, enquanto o carro começava a se afastar do estacionamento. Malú sentiu seu coração bater forte, enquanto tentava manter a calma. O veículo começou a se mover lentamente, ela prendeu a respiração. Por um instante, seu coração parou. Então, começou a bater tão forte que ela temeu que o som ecoasse dentro do porta-malas apertado. O couro do banco traseiro roçava em sua pele suada, enquanto o ar ali dentro parecia rarefeito, pesado com o cheiro forte de graxa e combustível. Ela prendeu a respiração quando sentiu o veículo dar um solavanco e começar a se mover. O chão estava desaparecendo sob seus pés. Cada metro que o carro avançava a fazia se sentir mais perdida, mais vulnerável. Aonde estava indo? Quem estava dirigindo? E se parassem o carro e descobrissem ela e May ali dentro? Um nó apertou seu estômago. Sua mente rodava, cheia de perguntas sem resposta. Cada pequeno solavanco da estrada fazia sua ansiedade crescer. O espaço escuro e apertado ao seu redor parecia se fechar mais e mais, como se estivesse sendo engolida. Ela precisava manter a calma. Precisava pensar. O calor do corpo adormecido de May contra seu peito era sua única âncora. O peito da menina subia e descia devagar, seu rostinho relaxado, alheio ao perigo. Malú fechou os olhos por um momento, tentando conter o pânico. Ela precisava de um plano. E rápido.Malú sentiu o coração disparar ao perceber que o carro estava em movimento, e provavelmente já havia saído do estacionamento. Afinal, ela podia ouvir o barulho de outros carros à sua volta, o suave balanço da estrada, o som abafado de motores roncando ao redor e as buzinas esporádicas confirmavam que não estavam mais no estacionamento. A angústia apertava seu peito como um laço se fechando. Seu primeiro impulso foi gritar, pedir para parar, mas rapidamente descartou a ideia. Se o motorista fosse o dono do carro, poderia pensar que ela era uma ladra tentando se esconder. E, pior ainda, os homens de Viktor podiam estar nas proximidades. Seu desaparecimento não passaria despercebido por muito tempo, e se a encontrassem... não queria nem imaginar. Sentindo o suor frio escorrer por sua testa, fechou os olhos, então começou a orar pela ajuda de Deus. "Deus, por favor! Nos ajude!", sussurrou baixinho: — Deus, por favor! Nos ajude! No escuro do porta-malas, Malú tentou acalmar a r
Enquanto dirigia suavemente lembrou que quando chegou à festa, Alexandre perguntou se ele havia realmente comprado o carro que tanto desejava, pois sabia do alto valor do tal carro. Mas já sabia a resposta, afinal conhecia a paixão de Ravi por carros modernos e caros. Ao olhar para o painel do carro e todo o seu interior, Ravi levantou a sobrancelha e sorriu, ao lembrar o que conversou algumas horas atrás com Alexandre: — Sim, e ainda está com cheirinho de carro novo! — Se continuar assim, não sei onde irá conseguir estacionamento para tantos carros? — Também não é assim, amigo — respondeu Ravi. — Comprei esse por algo em especial que os outros não têm. — E o que seria? — Perguntou curioso o seu amigo. — Espaço... e conforto — murmurou, lembrando-se do motivo pelo qual havia escolhido aquele modelo específico. — Sou uma pessoa bastante espaçosa e preciso disso para me sentir realmente confortável. Além disso, o vendedor me mostrou o quanto ele era moderno, de toque automático e
Porém, naquele momento pensando rápido, Malú apertou os lábios e, com um leve tremor na voz, respondeu em russo: — Извините, господин, я не понимаю, что вы говорите. (Desculpe, senhor, não compreendo o que diz.) Ravi piscou, de queixo caído, pensou: " Russo?! A garota está falando em russo? É isso mesmo, ou estou ficando louco?" Ele se inclinou ligeiramente para frente, os olhos fixos nela. A mulher, por sua vez, deu um passo para trás instintivamente, apertando ainda mais o bebê contra o peito, e olhando em todas as direções, parecia estar procurando uma possível rota de fuga. Mas Ravi sabia que era impossível ela sair de lá, visto que o portão já estava fechado, e na frente havia três seguranças. No entanto, ela também tentava proteger o bebê do vento e da garoa que havia ficado depois da chuva, enquanto balançava o bebê que gradativamente calou-se. Por isso, Ravi falou novamente: — Perguntei quem é você e ainda não ouvi sua resposta! E novamente ela falou em russo, di
Um arrepio percorreu sua pele quando percebeu que estranho também estava acordando. Ele abriu os olhos devagar, piscando algumas vezes antes de focar nela. Um sorriso suave curvou seus lábios, e, ao contrário do que esperava, sua expressão não demonstrava ameaça, apenas um misto de curiosidade e gentileza. — Bom dia, senhorita! Por favor, não precisa ter medo. Está segura aqui. Está se sentindo melhor? — perguntou Ravi, a sua voz estava ainda rouca pelo sono, mas ainda assim firme e acolhedora. Malú engoliu em seco, porém a sua garganta seca dificultava a sua fala naquele momento. O medo ainda pulsava em suas veias, principalmente ao lembrar-se da ameaça anterior dele de chamar a polícia, ela inicialmente ficou sem saber o que responder. Não entendia por que ele estava sendo tão gentil agora. Mas a preocupação com May era maior, por isso respondeu: — Bom dia si... sim estou! — murmurou ela hesitante. Seus olhos não desgrudavam da pequena que estava nos braços dele, seu instin
Naquele momento, ao sentir o olhar afiado de Ravi a tensão de Malú era visível, ela engoliu em seco ao ouvir as palavras dele, sentindo seu coração acelerar. O olhar firme dele a atravessava como se pudesse ver além das suas palavras hesitantes, Ravi a encarou e respondeu com franqueza: — É visível que está fugindo de alguém, porém, tenho toda a certeza de que não é da polícia. Malú sentiu um frio na espinha. Apertou instintivamente os dedos contra a barra do lençol que ainda a cobria. — Por que diz isso? — Sua voz soou mais fraca do que ela gostaria. Ravi inclinou-se levemente para frente, apoiando os cotovelos sobre os joelhos, sem desviar o olhar. — Porque esse alguém a machucou. Muito. E, pelo jeito, ainda quer machucá-la. Ela arregalou os olhos e, sem perceber, segurou a respiração. A mente dela disparava, tentando encontrar uma resposta convincente. — Não, senhor Castellani, acredite está enganado, não é bem assim eu... eu estava fugindo sim, mas não… — começou a dizer M
Malú corou e murmurou um "obrigada", ainda sentindo-se deslocada. Porém, gostou muito de Gabriela e percebeu que May olhava a todos com os olhinhos curiosos, como se já os conhecesse também. Então, baixando a cabeça, falou envergonhada: — Podem me chamar somente de Malú! — Agora que estamos todos apresentados, posso te chamar só de Malú também? — perguntou Ravi. Ela hesitou, então baixou a cabeça e falou num fio de voz: — Sim, Pode sem problemas… — Ótimo! Prefiro assim, Malú. Também pode me chamar somente de Ravi — falou ele, sorrindo. Camila então falou: — Quanto a mim, prefiro Cami. Mas diga-me, Malú, está melhor? — Sim, senhora estou e... aham... poderia ajudar-me a fazer algo para a minha bebê comer? Ela está com fome e... — Claro, Gabriela pode ajudá-la?! — disse Camila. — Sim, claro! Venha, vamos ver o que temos na geladeira de bem nutritivo para essa garotinha ficar ainda mais forte! — falou Gabriela, olhando para a bebê que já estava novamente no colo de
Ravi notou o silêncio dela por alguns instantes, como se estivesse lutando contra seus próprios pensamentos. Com delicadeza, ela pegou a garotinha dos braços dele, beijando-lhe a cabecinha adormecida. Sentiu a leveza do corpinho infantil se aconchegando e, então, tentou lhe dar uma justificativa aceitável: — Por causa de May. Acredito que o interior seja um lugar melhor para criá-la.Mas Lara Ravi aquelas palavras soaram falsas. Percebeu no mesmo instante que era uma mentira. Não uma mentira qualquer, mas uma que parecia gritar por socorro. Era como se conseguisse enxergar através dela, como se a conhecesse há anos e cada uma de suas mentiras estivesse escrita em sua expressão. Ravi se inclinou ligeiramente para frente, fitando-a com intensidade. — E sobre seu patrão abusivo? Não pretende procurar seus direitos? Posso te ajudar com isso, conheço bons advogados trabalhistas… Malú balançou a cabeça apressadamente, quase como um reflexo automático. — Não! Não é necessário. Já decid
Enquanto isso, longe dali... — Maldição, maldição! Como assim não a encontraram? Como podem ser tão burros! A ponto de ser enganados por aquela criança?! — disse Viktor, jogando o seu copo contra a parede enquanto vociferava para os seus homens que estavam de cabeça baixa para eles. Então, um deles se atreveu a falar: — Senhor, a ga… garota fugiu de nós do hotel, porém não voltou para o apartamento que estava, para buscar as suas coisas. Então, não fazemos ideia de on.. onde esteja, porém, sabemos que agora ela está realmente sem nada. Tudo que tinha deixou para trás! — E julgam que ela seria tão burra a ponto de voltar por meros trapos velhos? A minha menina é muito esperta e não idiota como vocês. É tão esperta que já enganou vocês várias vezes, seus imbecis! Droga! E agora, por suas incompetências, terei que refazer as investigações para saber para onde ela foi! — falou Viktor, aborrecido, segurando o homem pelo colarinho. Então o jogou no chão e com a faca que havia em sua mã