Algumas horas antes...
A cobertura do luxuoso hotel Duna, em Goiás, pulsava com música eletrônica. Os graves intensos faziam o chão vibrar, como se acompanhassem as batidas aceleradas dos corações ali presentes. A festa de Alexandre ainda estava muito animada, e apesar de ainda ser cedo e com certeza passaria da meia-noite, pois ao que tudo indicava não tinha hora para acabar. Ravi estava encostado em um dos sofás de couro branco, cercado por duas figuras bem conhecidas: Lívia e Ruana. Uma loira de cabelos longos e brilhantes, um vestido justo realçando suas curvas. A outra, ruiva de olhos esverdeados. Ambas tinham sorrisos provocantes e estavam sempre juntas – inseparáveis, diziam as más línguas que elas, muitas vezes, adoravam dividir o mesmo homem ao mesmo, bem fosse ou não verdade, Ravi não poderia dizer, porém, já havia saído com ambas alternadamente e se quisessem também sairia com as duas na mesma noite. "E por que não? Já havia feito aquilo antes com outras mulheres, porque não com as suas queridas amigas?" pensou Ravi, enquanto olhava para as duas mulheres. Normalmente, Ravi gostava desse jogo de olhares e insinuações, mas naquela noite, algo parecia diferente. Na verdade, ele estava até mesmo bastante entediado. O perfume adocicado de Lívia misturava-se ao cheiro de álcool, não o prendia mais. As conversas eram previsíveis, recheadas de duplos sentidos que, em outra ocasião, o teriam entretido. Visto que com frequência, tais conversas o excitava, mas naquele momento, pareciam apenas um ruído a mais em meio à música ensurdecedora e o estavam aborrecendo. Tanto que resolveu voltar para a sua mansão, queria dormir e descansar, afinal, amanhã teria um longo dia de trabalho. Suspirou e tomou um gole de sua bebida, sentindo o líquido queimar levemente na garganta. — Ravi? — Ruana sussurrou perto de seu ouvido, a voz macia e sedutora. Ele desviou o olhar da pista de dança e a encarou, sem muito interesse. — Acho que vou nessa — disse, deixando o copo sobre a mesa. As duas mulheres se entreolharam, surpresas. — O quê? — Lívia franziu a testa. — Mas ainda é cedo! — Amanhã tenho um dia cheio — respondeu com um meio sorriso. Afastando-se delas conseguiu se livrar das suas intenções, então procurou seu amigo Alexandre, o dono da festa. Encontrou-o perto do bar, rindo com alguns conhecidos. Chamou-o à parte e agradeceu pelo convite, disse que já estava indo. Seu amigo olhou na direção das duas amigas de Ravi e ambas pareciam aborrecidas, no entanto, já conhecia o seu amigo e sabia que quando ele decidia algo, ninguém o fazia mudar de opinião. — Mas já, tão cedo amigo? perguntou Alexandre arqueando a sobrancelha. — Sim, tenho minhas responsabilidades amigo — respondeu ele. Porém, antes de se sair, Ravi o convidou para uma pequena social à beira da piscina que realizaria no final de semana na sua mansão. Afinal, depois de um bom tempo, Ravi decidiu vender o seu apartamento e morar na mansão que Eduardo seu pai deu para ele. Não somente ele, convidou alguns outros amigo também . — Mas no fim de semana, vou fazer uma social na minha nova casa. Você vem, certo? O rosto de Alexandre se iluminou, então comentou: — Até que enfim! Você percebeu que tem que se divertir um pouco, afinal nem tudo na vida se resume a trabalho, você precisa se divertir mais, cara! — É o que pretendo. — Ravi sorriu. — Aproveitar melhor a vida, principalmente com os meus amigos, é por isso que estou te convidando e peço que não falte em? — Pode deixar, não faltarei por nada, ainda mais sabendo o quanto de gatas você convidou para esta social à beira da piscina! — Falou piscando Alexandre para ele. Ravi sacudiu a cabeça e também sorriu, pensando que Alexandre não tinha jeito mesmo, era muito pegador e irresponsável. Após as despedidas, deixou para trás a agitação da festa e desceu até o estacionamento. O silêncio do local era um alívio bem-vindo depois da barulheira da cobertura. Caminhou até seu carro, um modelo luxuoso que ainda exalava aquele inconfundível cheiro de novo. As luzes do teto refletiam na lataria impecável, destacando o design arrojado e moderno. Ao entrar e ligar o motor, sentiu a potência suave da máquina vibrar sob suas mãos. "Que maravilha", pensou, manobrando para sair. Enquanto dirigia suavemente lembrou que quando chegou à festa, Alexandre perguntou se ele havia realmente comprado o carro que tanto desejava, pois sabia do alto valor do tal carro. Mas já sabia a resposta, afinal conhecia a paixão de Ravi por carros modernos e caros. Ao olhar para o painel do carro e todo o seu interior, Ravi levantou a sobrancelha e sorriu, ao lembrar o que conversou algumas horas atrás com Alexandre: — Sim, e ainda está com cheirinho de carro novo! Comprei esse por algo em especial que os outros não têm. — E o que seria? — Perguntou curioso o seu amigo. — Espaço... e conforto — murmurou, lembrando-se do motivo pelo qual havia escolhido aquele modelo específico. — Sou uma pessoa bastante espaçosa e preciso disso para me sentir realmente confortável. Além disso, o vendedor me mostrou o quanto ele era moderno, de toque automático e veloz. E com todo aquele espaço, ele se torna excelente para passear com uma gata, ou quem sabe duas! Afinal, o papai aqui tem o coração tão espaçoso quanto o seu próprio carro! Alexandre deu uma enorme gargalhada. E Ravi ria ao lembrar as gargalhadas do seu amigo, mas realmente nunca escondeu de ninguém quais eram as suas duas maiores paixões: "Carro e mulher!" Pensou ele. Aliás o que se tornava uma constante preocupação de Diana sua mãe, afinal ela sempre desejou que Ravi e encontrasse alguém por quem ele se apaixonasse, mas era quase impossível, pois como o Ravi falou para Alexandre seu coração era grande demais para uma só garota. E enquanto pensava em tudo aquilo, manobrava suavemente o carro para fora do estacionamento. Estava ansioso para chegar em casa e relaxar. Porém, enquanto seguia por uma via um pouco movimentada, foi que ele percebeu algo que o fez franzir a testa. Um cheiro adocicado e inesperado se espalhou pelo carro. Ravi respirou fundo, tentando identificar o aroma. Não era couro, nem o cheiro característico do motor. Era algo mais sutil, envolvente... — Perfume de morango? — sussurrou ele. Virou a cabeça levemente, tentando localizar a origem do cheiro. Ravi franziu a testa, tentando lembrar se havia pedido para o seu motorista comprar algum perfume novo para o carro. Mas não se lembrava de nada. Então, de onde vinha aquele perfume? O sinal vermelho fez Ravi reduzir a velocidade. Por reflexo, olhou pelo retrovisor, franzindo o cenho ao perceber que o perfume doce ainda impregnava o ar dentro do carro. Não era um aroma qualquer—era feminino, envolvente, como morangos frescos misturados com um toque suave de baunilha. Ele inspirou novamente, ao sentir a fragrância se intensificar. "Será que algum ladrão, ou melhor, ladra entrou no meu carro?", pensou enquanto olhava em todas direção do interior do carro pra ver se não havia nenhum frasco de perfume lá. Mas descartou a ideia imediatamente. O sistema de segurança não havia acusado nenhuma invasão, e o estacionamento do prédio possuía câmeras. Se algo suspeito tivesse acontecido, ele já teria sido avisado. Além disso, não havia qualquer sinal de arrombamento. O sinal abriu, e ele seguiu adiante, mas o incômodo permaneceu. Havia algo errado. Cerca de uma hora depois, ao entrar na propriedade de sua mansão, ele ainda não conseguia se livrar da estranha sensação. O longo caminho até a entrada principal estava escuro, iluminado apenas pelas discretas luzes do jardim, e a garoa fina que sobrara da tempestade anterior ainda umedecia a estrada de pedras. Foi quando um som inesperado cortou o silêncio. O corpo de Ravi tencionou. Ele pisou no freio de uma vez, o carro deslizou alguns centímetros antes de parar completamente.Ravi franziu o cenho totalmente incrédulo. "Ouvi certo?" Se perguntou ele com um olhar tenso e fixo no espelho retrovisor. Então o som veio de novo, um choro abafado e trêmulo. Dessa vez, o som estava um pouco mais claro. — É um... choro de bebê realmente! — Confirmou ele aborrecido e incrédulo, enquanto sentia o seu coração acelerar, e uma corrente de adrenalina disparar por suas veias, misturando raiva e indignação. Ainda parado dentro do carro pensou: "Seria realmente possível alguém ter colocado um bebê dentro do meu porta-malas?” Porém o choro que veio, baixo inicialmente, em questão de segundos, se tornou um grito claro e desesperado. — O que diabos estava acontecendo? — sussurrou ele. Sem perder tempo, saiu do carro e caminhou até a traseira, cada passo dele que ecoava no silêncio da noite misturado a umidade do ar tornava a atmosfera pesada, bem como tudo muito inusitado. Porém ao ouvir o choro infantil com ainda mais nitidez, Ravi sentiu o seu coração bater acelerado
Naquela noite em seu aniversário de 15 anos. A festa luxuosa ocorria na mansão Petrova, uma construção imponente de arquitetura neoclássica, cercada por um vasto jardim. Foi ali, sobre a sombra das árvores frondosas do jardim, que Viktor se aproximou pela primeira vez. Malú sentiu o cheiro amadeirado de seu perfume que se misturava ao aroma floral ao redor, e tal cheiro associado ao medo que sentiu dele, lhe causou náuseas. Ele tomou sua mão com firmeza e a puxou para mais perto. — Você é minha Malú — sussurrou ele, seus lábios quase roçando seu ouvido. — E não importa onde vá, jamais fugirá de mim. Ela sentiu um calafrio na espinha e tentou se afastar, mas ele apertou a sua cintura com força, imobilizando-a contra o seu corpo. Nesse momento os olhos dele de um azul profundo e gélido brilhavam como uma ameaça silenciosa. — Já te deixo de sobreaviso Malú. — continuou ele, baixando a voz. — se deixar que algum idiota te toque, acabarei com ele, e o matarem lentamente. E você assistir
Malú tinha medo de estranhos, principalmente se fossem homens, e não costumava confiar neles. Por isso, levantou-se e foi até ele, pedindo a garota: — Por favor, me devolva a minha May. Posso cuidar dela. Ravi arqueou a sobrancelha, observando-a com atenção, seu olhar afiado captou a tensão em sua postura, e o forte sotaque russo em sua voz o intrigou. —Tem certeza que consegue cuidar dela? — perguntou ele, percebendo o tremor sutil em seus dedos. — Sim! — respondeu ela rapidamente Foi nesse momento que Malú notou que o que estava vestindo. Seu rosto empalideceu ao perceber a camisola leve e absurdamente transparente que cobria seu corpo. O tecido fino revelava muito mais do que deveria, deixando-a exposta de um jeito que a fez sentir-se vulnerável e envergonhada. Seu coração disparou ainda mais forte ao ver o olhar surpreso de Ravi. Ele não disfarçou o impacto de sua visão. Os olhos dele percorreram sua silhueta de forma involuntária, e por um segundo, ele pareceu estupefato.
Lembranças de Camila… Camila lembrava-se, vívidamente, da noite anterior. Quando Ravi chegou com Malú desacordada nos braços, seus olhos estavam carregados de preocupação. Ele a deitou com delicadeza no sofá e, sem perder tempo, pediu que ela ligasse para o doutor Fonseca.Também ficou preocupado com a sua filha, que não parava de chorar, pedindo o colo da mãe. May chorava sem parar, ficando com seu rostinho manchado de lágrimas, chamando pela mãe. — Shhh, pequena… já vai passar… — murmurou Camila, embalando-a nos braços. Ela preparou uma mamadeira, na esperança de acalmá-la, e por alguns instantes conseguiu. Mas logo May começou a se remexer, inquieta, buscando o calor materno. Foi então que Ravi pegou a garotinha nos braços. Para surpresa de todos, o choro cessou imediatamente. Não só isso, mas um sorriso tímido iluminou o rostinho da pequena, como se, de alguma forma, ela já confiasse nele. — Que coisa incrível! Parece que a garota adorou o patrãozinho! — comentou Camila pa
Na cozinha... Ao descer, ele levou-as para a cozinha, onde apresentou Camila a Malú: — Bem, senhorita Martinez, essa é a dona Camila, para os mais íntimos, apenas Cami! — falou ele sorrindo. O cheiro de café fresco e pão recém-assado misturava-se ao aroma amanteigado dos bolos e à doçura do leite quente. O ambiente era aconchegante, com móveis modernos e uma mesa posta com elegância. Camila sempre agradecia a forma como toda a família Sampaio a tratava, como se fosse membro da família. Ela era, uma mulher de meia-idade de cabelos grisalhos presos em um coque simples, lançou um olhar afetuoso para Ravi e cruzou os braços e falou brincando: — O patrãozinho continua o mesmo. Aposto que esqueceu de convidá-las para o café e agora está tentando se redimir com um charme barato. Ravi riu e beijou o topo da cabeça da governanta. — Sempre tão perspicaz, Cami! Camila virou-se para Malú e sorriu. — Seja bem-vinda, minha querida. Como se chama? — Malú… Malú Martinez — falou ela
Ravi notou o silêncio dela por alguns instantes, como se estivesse lutando contra seus próprios pensamentos. Com delicadeza, ela pegou a garotinha dos braços dele, beijando-lhe a cabecinha adormecida. Sentiu a leveza do corpinho infantil se aconchegando e, então, ouviu a justificativa dela: — Por causa de May. Acredito que o interior seja um lugar melhor para criá-la. Aquelas palavras soaram falsas. Ele percebeu no mesmo instante que era uma mentira. Não uma mentira qualquer, mas uma que parecia gritar por socorro. Era como se conseguisse enxergar através dela, como se a conhecesse há anos e cada uma de suas mentiras estivesse escrita em sua expressão. Ravi se inclinou ligeiramente para frente, fitando-a com intensidade. — E sobre seu patrão abusivo? Não pretende procurar seus direitos? Posso te ajudar com isso, conheço bons advogados trabalhistas… Malú balançou a cabeça apressadamente, quase como um reflexo automático. — Não! Não é necessário. Já decidi. Vou embora. Afinal, tenh
Enquanto isso, longe dali... — Maldição, maldição! Como assim não a encontraram? Como podem ser tão burros! A ponto de ser enganados por aquela criança?! — disse Viktor, jogando o seu copo contra a parede enquanto vociferava para os seus homens que estavam de cabeça baixa para eles. Então, um deles se atreveu a falar: — Senhor, a ga… garota fugiu de nós do hotel, porém não voltou para o apartamento que estava, para buscar as suas coisas. Então, não fazemos ideia de on.. onde esteja, porém, sabemos que agora ela está realmente sem nada. Tudo que tinha deixou para trás! — E julgam que ela seria tão burra a ponto de voltar por meros trapos velhos? A minha menina é muito esperta e não idiota como vocês. É tão esperta que já enganou vocês várias vezes, seus imbecis! Droga! E agora, por suas incompetências, terei que refazer as investigações para saber para onde ela foi! — falou Viktor, aborrecido, segurando o homem pelo colarinho. Então o jogou no chão e com a faca que havia em sua mão
Ravi estava em seu escritório, imerso no trabalho. A manhã havia sido exaustiva, mas ele não reclamava. Afinal, desde a fusão das duas empresas Baby Bliss e Green Valley, há dois anos, sua carga de trabalho triplicou. Ele sorriu ao se lembrar da vídeo chamada que tivera minutos antes com Eduardo, seu pai, e Natália, sua cunhada. — Ué, filho, por que reclamar? — disse Eduardo, com um sorriso maroto. — Não é você mesmo quem sempre diz: “O trabalho dignifica o homem”... Pois então, aproveite e seja o homem mais digno do mundo! — Ele riu, piscando para Natália, que logo acrescentou: — É, cunhado, ninguém disse que seria fácil! — falou ela, com um tom desafiador, mas carinhoso. Ravi sorriu, sentindo-se aquecido pela leveza daquela conversa. — Me sinto o Hércules ultimamente — respondeu, brincando. — Agora, me digam: como faço para descasar você e o Heitor, hein? Era uma piada recorrente entre eles. Ravi sempre dizia que fora graças ao casamento de Natália e Heitor que as duas empresas