Abri meus olhos sentindo a claridade do quarto de hospital quase me cegar, mas foi só olhar para o lado que eu o vi. Fernando estava ao lado da cama, com uma mão segurando a minha e a outra segurando o celular, ele parecia tão concentrado que nem notou que eu o olhava até que abri a boca.— Como ele está? — seus olhos se viraram imediatamente para mim e o sorriso largo e doce se abriu.Foi a primeira coisa com que me preocupei, meu filho, eu tinha apagado depois que o levavam, estava cansada de mais para manter os olhos abertos enquanto aguardava os exames.— Ele está bem, já fizeram todos os exames e o colocaram no berçário, Pedro não saiu de lá nenhum segundo. Aparentemente Angel vai ter que usar óculos bem cedo, mas fora isso não tem nenhum problema. — e ali eu consegui respirar mais aliviada, meu medo sempre foi que ele nascesse com problemas cardiológicos ou até pior. Fernando se abaixou dando beijos em meu rosto. — Você tem que vê-lo, vou pedir para a enfermeira trazer.Não demo
— Você sabe que eu te amo, não sabe? — a voz de Fernando soava triste e pesarosa.Estávamos sentados no sofá em nossa sala, havia dias que não tínhamos uma conversa decente.— Claro que sei. E eu te amo do mesmo jeito. — aproveitei o momento de abertura daquela casca esquisita que se tinha criado entre nós nos últimos dias e o abracei, me aconchegando nele, sentindo a falta que fazia não ter o seu toque e calor sempre que eu quisesse.Desde que tínhamos assumido nosso relacionamento nunca ficamos sem nos falar desse jeito, nem mesmo deixamos qualquer que fosse o problema ficar entre nós. Sempre procurávamos conversar depois de uma briga e acertar tudo.Esse tinha sido o maior período desde que começamos a namorar que ficávamos sem nos falar e me doía ainda mais não saber o porque, o que tinha dado nele para se distanciar de mim daquela forma?— Então você vai me entender, vai compreender o meu pedido. — o peito dele se expandiu com a respiração profunda, seus olhos estavam sérios e pa
Sempre soube que na vida havia momentos únicos responsáveis por grandes mudanças no cenário geral, aquela virada de mesa, a girada do mundo e de repente tudo o que você planejou, toda sua vida que parecia perfeita desmorona bem diante de seus olhos e você não tem poder de fazer nada, tinha noção de que estava passando por um desses momentos nos últimos meses.Agora mesmo, por exemplo, pegar um ônibus sozinha para São Fernando, carregando uma mala na mão e meu bebê na barriga, não era o que eu esperava estar fazendo a essa altura da vida, mas era minha única opção no momento, na verdade não a única, mas a melhor.Eu sabia que precisava de apoio nesse momento, não aguentava mais ficar trancada dentro de casa, sufocando um pouco a cada dia com as palavras engasgadas dentro de mim. Por isso no momento em que Emily me ligou insistindo que eu fosse para São Fernando, "que eu fosse para casa", eu sabia que tinha que aceitar.Desde que Fernando tinha decidido me abandonar eu havia passado um
Eu sai cedo da casa do meu pai sabendo que hoje seria o dia que Helen ia chegar, não ia demorar para Emily acordar e ir encontrá-la na rodoviária e eu precisava manter distância dela.Esse tinha sido o motivo real de eu ter saído de São Paulo, peguei minhas férias atrasadas e decidi usar vindo para o mais longe dela, sabendo que se ficasse perto de Helen não responderia por mim, não ia suportar ficar tão perto dela e não a tocar, não querer cuidar dela e isso me faria ceder aos desejos dela como sempre fiz, então quando percebesse estaria apoiando a ideia de ter aquela criança.— O que está fazendo aqui tão cedo? — Vitor questionou ao me ver no bar da cidade pela manhã.— Você está de serviço? Porque não estou vendo nenhuma farda. — ele sorriu se jogando na banqueta ao meu lado. — Também não sabia que a polícia tinha virado fiscal de bar.— E não virei, só estou surpreso de vê-lo aqui advogado.Vitor era da idade da minha irmã, e como a maioria das pessoas em São Fernando ele não tinh
Segunda-feira, dia de loucura no trânsito, loucura no trabalho, na vida, o tempo louco de São Paulo não ajudava a melhorar meu humor de cão. A essa hora da manhã precisava estar chovendo? Ok, não estava caindo o mundo, mas a garoa fina irritante molhava o suficiente para o trânsito virar um caos.Tinha visto no jornal antes de sair de casa que em algum lugar da rodovia # dois carros haviam batido, o que deixava tudo mais e mais lento. Bati a cabeça no volante enquanto esperava que algum daqueles carros se mexessem mais do que um centímetro, respirei fundo tentando me acalmar, seria um longo dia no escritório.Sete horas, esse era meu horário normal, mas já era oito quando finalmente parei meu carro no estacionamento do prédio onde trabalho. A empresa era bem reconhecida e renomada, eu já trabalhava aqui há tantos anos que em dias como esse eu me perguntava por que eu não largava tudo e me mudava.O elevador estava cheio de pessoas se amassando, todos tão atrasados quanto eu e não que
Depois que toda a choradeira acabou passamos o resto da tarde conversando e compartilhando problemas e experiências. Fazia tanto tempo que eu não me sentava com amigas e simplesmente conversava como fizemos hoje, era libertador.O sol já tinha se posto quando deixamos a casa de Bete e o céu estava escuro, mas as luzes e estrelas iluminavam toda a extensão azul acima de nós, aqui em uma cidade sem prédios e arranha-céus era bem mais fácil de apreciar as estrelas em uma noite como aquela, parecia até uma daquelas imagens da NASA, onde o céu está perfeitamente limpo e iluminado, um cobertor azul escuro bordado com pontos de luz sobre nossas cabeças.Continuei com a cabeça para fora do carro aproveitando a brisa no rosto e a paisagem até que Emily estacionasse a caminhonete na entrada de casa. Tudo o que eu queria a essa altura era uma cama e colocar os pés para cima, por mais divertido que fosse passar o dia fora era cansativo somado a viagem e gravidez.Assim que abri a porta meus pensa
Assim que me virei lá estava ele, na penumbra da cozinha, vestido apenas com uma calça de moletom, com a luz parcial do quintal iluminando sua pele nua. O peito subindo e descendo com antecipação, os olhos ávidos na espera por alguma reação minha, e eu tinha certeza de que se pressionasse minhas mãos em seu peito seu coração estaria batendo tão rápido quanto o meu.Não tinha dúvidas porque era assim desde que o conheci.Fernando não disse nada, apenas ficou ali do outro lado do balcão me encarando. Eu fui a primeira a desviar o olhar me concentrando no micro-ondas como a covarde que era, torcia para que ele fizesse logo o que foi fazer ali e fosse embora.Mas o infeliz sabia bem como mexer comigo, não demorou para que eu sentisse o calor do seu corpo perto do meu. Seus braços me envolveram em um casulo quando ele agarrou o balcão a minha frente me deixando presa entre o granito frio e seu peito quente. Senti quando ele esfregou o nariz em meus cabelos, descendo até estar contra minha
Eu estava me sentindo o pior filho da puta, não queria deixar Helen, não queria abandonar ela de novo daquele jeito. Mas eu precisava, era o único jeito de fazê-la entender que eu só queria o bem dela.Nada estava acontecendo como eu queria, como tinha planejado, deveríamos estar juntos em São Paulo preparando tudo para a chegada do nosso filho, eu tinha que estar ao lado dela cuidando, mimando, garantindo que ela tivesse tudo o que queria e precisava, mas ao invés disso eu estava dentro do meu carro dirigindo fugindo da minha mulher pois sabia que se continuasse perto dela ia acabar começando a acreditar no que ela dizia.Mas eu sabia que não podia fazer isso, não podia ser fraco assim quando tinha noção de que nenhum de nós dois estava preparado para a chegada de uma criança com tantas limitações e problemas, seria como trazer um problema para as nossas vidas já sabendo que é um problema e isso seria burrice.Ao menos agora eu estava mais tranquilo, Helen estava com a minha família