Eu sai cedo da casa do meu pai sabendo que hoje seria o dia que Helen ia chegar, não ia demorar para Emily acordar e ir encontrá-la na rodoviária e eu precisava manter distância dela.
Esse tinha sido o motivo real de eu ter saído de São Paulo, peguei minhas férias atrasadas e decidi usar vindo para o mais longe dela, sabendo que se ficasse perto de Helen não responderia por mim, não ia suportar ficar tão perto dela e não a tocar, não querer cuidar dela e isso me faria ceder aos desejos dela como sempre fiz, então quando percebesse estaria apoiando a ideia de ter aquela criança.
— O que está fazendo aqui tão cedo? — Vitor questionou ao me ver no bar da cidade pela manhã.
— Você está de serviço? Porque não estou vendo nenhuma farda. — ele sorriu se jogando na banqueta ao meu lado. — Também não sabia que a polícia tinha virado fiscal de bar.
— E não virei, só estou surpreso de vê-lo aqui advogado.
Vitor era da idade da minha irmã, e como a maioria das pessoas em São Fernando ele não tinha saído da cidade depois do ensino médio, só preferiu seguir a carreira do pai na policia local.
— Eu também não estou aqui a trabalho, então cale a boca e beba comigo. — falei batendo no balcão e pedindo mais uma cerveja.
Não tinha ido até ali com a intenção de beber, mas agora que tinha alguém do meu lado eu ia fazer apenas para manter as aparências, porque a última coisa que precisava era que descobrissem que eu estava fugindo da minha mulher.
Mas eu havia me esquecido de como as pessoas daquela cidade eram falantes e intrometidas, ninguém ali sabia cuidar da própria vida, então eu fiquei surpreso quando a primeira coisa que ele perguntou foi sobre Helen.
— E então onde está sua bela mulher? Seu pai me disse que estão esperando o primeiro filho. — Vitor tagarelou depois de um gole de cerveja.
— Ela está chegando. — murmurei ignorando a parte daquela conversa que eu queria evitar. — Hoje ela chega na cidade.
— Ai que ótimo, podemos sair todos juntos. — falou entusiasmado, mas não, não podíamos mesmo. — Cara eu nem consigo imaginar como deve ser bom a sensação de ser pai.
De repente eu estava arrependido de ter aberto a boca e dito qualquer coisa, talvez tivesse sido melhor se eu ficasse trancado dentro do carro, provavelmente era a única forma de garantir que eu estaria sozinho.
— Vai deixar a cerveja esfriar se ficar falando tanto. — resmunguei torcendo para que ele parasse por ali, mas já sabendo que seria impossível.
— Não me importo com isso, faz tempo que não te vejo e é bom colocar o papo em dia. Me conta ai como andam as coisas lá em São Paulo?
— Uma loucura como sempre, muito diferente disso aqui que parece ter parado no tempo. — fui rápido em responder dessa vez antes que voltasse aos assuntos sobre Helen e o bebê. — Mas isso é bom, toda essa quietude e tranquilidade é uma coisa boa.
— É sim, mas não se engane, São Fernando tem suas agitações, a última foi David finalmente sendo acusado pela mulher. — ele contou como se fosse a notícia do século, mas levou só um segundo para se lembrar de um detalhe importante. — E que você já deve saber já que é o advogado dela.
— Sim, já estou sabendo disso. E do clube, da Bete grávida do Carlos, do meu pai arrumando confusão enquanto estava bêbado. Sei de tudo o que acontece aqui, as fofocas correm rápido.
— Então já sabe que Emily se mudou pra cá e que ela e Marcos estão juntos de novo. — trinquei meus dentes ouvindo aquilo. — Cara, é muito bom ver eles juntos de novo, já que mesmo com todos esses anos longe eles continuavam se amando.
Eu não só sabia como tinha dado um jeito de fazer os dois caírem na real, depois de Emily ter perdido o bebê vindo atrás dele nesse fim de mundo eu achei que ela tinha aprendido uma lição e que ficaria longe do bastardo que a abandonou.
Mas não demorou muitos dias aqui para que os dois tivessem feito as pazes e embarcado em um novo romance. Só que foi fácil trazer minha irmã de volta a realidade, já que ela tinha escondido de Marcos o que aconteceu anos atrás, foi só contar ao bastardo para ele sair correndo a deixando para trás.
Marcos achou que seria fácil me julgar por não querer esse filho, me dizendo como um homem de verdade deveria agir, quando ele tinha sido o babaca que fez minha irmã sofrer por anos, quando foram as atitudes infantis dele que a fizeram perder o filho perfeito deles.
— Sim, já sei de tudo. Vai ser difícil me surpreender.
Meu celular tocou com uma mensagem do meu pai avisando que Helen tinha chegado, não consegui evitar que meu coração disparasse no peito, com a agitação só em pensar em ficar cara a cara com ela.
Fazia duas semanas que eu não a via, duas semanas desde a nossa briga e que me levou a sair de casa. Eu nunca tinha ficado tanto tempo assim sem vê-la desde que nos casamos, na verdade desde o começo do nosso namoro.
Mas bastava pensar que ela estaria com uma barriga maior, carregando aquela criança, para que eu me lembrasse o motivo de eu estar aqui e sem ela. Helen queria o divórcio, tinha decidido ficar com nosso filho, eu perdi essa batalha contra ela pois ela jamais desistiria do bebê.
— Ei, porque não foi buscar sua mulher na rodoviária? Ela está grávida Fernando e você aqui bebendo no bar? — a voz de Vitor e todo o julgamento em sua voz fizeram meu sangue ferver.
Tudo o que eu tinha escutado desde que expressei minha decisão foram criticas e mais criticas, todo mundo parecia ter uma opinião sobre como eu deveria agir, mas nenhum deles estava no meu maldito lugar.
— Porque não cuida da sua vida porra? — me levantei gritando e já saindo de lá, ou não responderia por mim e acabaria socando a cara do policial.
Entrei no carro e fiquei lá, não sei ao certo quanto tempo fiquei trancado pensando e repensando sobre nós dois. Helen tinha mexido comigo desde o primeiro dia que nos vimos, aquele jeito durão dela só a deixavam mais sexy e eu não quis saber de mais nada que não fosse estar aos pés dela.
Liguei o carro decidido a vê-la, não conseguia ficar longe dela sabendo que estavamos tão perto, eu precisava colocar meus olhos sobre ela mais uma vez.
Nunca pensei que estaríamos naquela situação agora, eu a venerava e só queria o melhor pra ela, como ela não conseguia ver isso?
— Onde ela está? — cheguei em casa desesperado já questionando minha irmã.
Emily me olhou com aquele olhar de reprovação, quase como se eu tivesse cometido o pior dos crimes, mas eu só era culpado de amar de mais a minha esposa.
— No meu quarto, mas ela está dormindo. — não me importei com mais nada, corri para o andar de cima indo direto para o quarto de Emily. — Não vá incomodá-la! — ela gritou quando eu já tinha alcançado o segundo andar.
Abri a porta devagar não querendo acordá-la e paralisei ao vê-la dormindo profundamente, Helen parecia mais magra do que a duas semanas e isso partia meu coração, saber que ela não estava comendo direito e que não tinha ninguém para cuidar dela acabava comigo. Não era pra ser assim, não foi como planejamos aquela gravidez.
Estava fazendo um calor terrível na cidade e eu me lembrei de como ela estava calorenta desde o começo da gravidez, então decidi abrir as janelas e deixar um pouco de ar fresco entrar, mas mantive as cortinas fechadas não querendo acordá-la.
Me virei para minha linda mulher e me ajoelhei ao lado da cama, sem conseguir me conter minha mão voou até seu rosto, acariciando a pele macia, antes de afastar os fios de cabelo que caiam.
Como eu queria que ela me entendesse, que visse as coisas pelo meu ponto de vista, não estaríamos os dois sofrendo com a separação agora. Mas eu precisava ser forte, não podia ceder e ver Helen se arrastar pra uma vida cheia de cuidados e tristezas, já tinha sido o bastante ver meu pai se sacrificar para cuidar da minha mãe doente, por isso eu não podia deixar que ela trouxesse uma vida ao mundo para ter que viver nesse inferno!
Segunda-feira, dia de loucura no trânsito, loucura no trabalho, na vida, o tempo louco de São Paulo não ajudava a melhorar meu humor de cão. A essa hora da manhã precisava estar chovendo? Ok, não estava caindo o mundo, mas a garoa fina irritante molhava o suficiente para o trânsito virar um caos.Tinha visto no jornal antes de sair de casa que em algum lugar da rodovia # dois carros haviam batido, o que deixava tudo mais e mais lento. Bati a cabeça no volante enquanto esperava que algum daqueles carros se mexessem mais do que um centímetro, respirei fundo tentando me acalmar, seria um longo dia no escritório.Sete horas, esse era meu horário normal, mas já era oito quando finalmente parei meu carro no estacionamento do prédio onde trabalho. A empresa era bem reconhecida e renomada, eu já trabalhava aqui há tantos anos que em dias como esse eu me perguntava por que eu não largava tudo e me mudava.O elevador estava cheio de pessoas se amassando, todos tão atrasados quanto eu e não que
Depois que toda a choradeira acabou passamos o resto da tarde conversando e compartilhando problemas e experiências. Fazia tanto tempo que eu não me sentava com amigas e simplesmente conversava como fizemos hoje, era libertador.O sol já tinha se posto quando deixamos a casa de Bete e o céu estava escuro, mas as luzes e estrelas iluminavam toda a extensão azul acima de nós, aqui em uma cidade sem prédios e arranha-céus era bem mais fácil de apreciar as estrelas em uma noite como aquela, parecia até uma daquelas imagens da NASA, onde o céu está perfeitamente limpo e iluminado, um cobertor azul escuro bordado com pontos de luz sobre nossas cabeças.Continuei com a cabeça para fora do carro aproveitando a brisa no rosto e a paisagem até que Emily estacionasse a caminhonete na entrada de casa. Tudo o que eu queria a essa altura era uma cama e colocar os pés para cima, por mais divertido que fosse passar o dia fora era cansativo somado a viagem e gravidez.Assim que abri a porta meus pensa
Assim que me virei lá estava ele, na penumbra da cozinha, vestido apenas com uma calça de moletom, com a luz parcial do quintal iluminando sua pele nua. O peito subindo e descendo com antecipação, os olhos ávidos na espera por alguma reação minha, e eu tinha certeza de que se pressionasse minhas mãos em seu peito seu coração estaria batendo tão rápido quanto o meu.Não tinha dúvidas porque era assim desde que o conheci.Fernando não disse nada, apenas ficou ali do outro lado do balcão me encarando. Eu fui a primeira a desviar o olhar me concentrando no micro-ondas como a covarde que era, torcia para que ele fizesse logo o que foi fazer ali e fosse embora.Mas o infeliz sabia bem como mexer comigo, não demorou para que eu sentisse o calor do seu corpo perto do meu. Seus braços me envolveram em um casulo quando ele agarrou o balcão a minha frente me deixando presa entre o granito frio e seu peito quente. Senti quando ele esfregou o nariz em meus cabelos, descendo até estar contra minha
Eu estava me sentindo o pior filho da puta, não queria deixar Helen, não queria abandonar ela de novo daquele jeito. Mas eu precisava, era o único jeito de fazê-la entender que eu só queria o bem dela.Nada estava acontecendo como eu queria, como tinha planejado, deveríamos estar juntos em São Paulo preparando tudo para a chegada do nosso filho, eu tinha que estar ao lado dela cuidando, mimando, garantindo que ela tivesse tudo o que queria e precisava, mas ao invés disso eu estava dentro do meu carro dirigindo fugindo da minha mulher pois sabia que se continuasse perto dela ia acabar começando a acreditar no que ela dizia.Mas eu sabia que não podia fazer isso, não podia ser fraco assim quando tinha noção de que nenhum de nós dois estava preparado para a chegada de uma criança com tantas limitações e problemas, seria como trazer um problema para as nossas vidas já sabendo que é um problema e isso seria burrice.Ao menos agora eu estava mais tranquilo, Helen estava com a minha família
Os dias estavam passando rápido de mais, Fernando não tinha aparecido como prometido, havia enviado apenas uma mensagem dizendo o quanto estava corrido e assim que conseguisse viria. Eu conhecia melhor do que ninguém aquele escritório e sabia que sua decisão de ficar lá tinha a ver com nossa situação, ele com certeza preferia adiar nossa conversa sabendo que seria algo definitivo.Mas eu estava ocupando minha cabeça com outras coisas, tinha marcado uma consulta com a obstetra da cidade, passava boa parte do tempo lendo mais sobre bebês com síndrome de Down e me informando em todas as dificuldades que seriam comuns de aparecer, eu queria estar pronta para dar tudo o que eu filho fosse precisar, mesmo que isso não incluísse um pai.E havia Fábio, que também era uma ótima distração, quando ele não estava na escola passava horas me fazendo companhia, cuidávamos do jardim juntos, víamos algum filme ou eu o assistia jogar bola.Nesses dias que se passaram eu finalmente tinha conhecido o fam
Lembrança:Helen parecia não acreditar no que estava vendo diante dos meus olhos. Eu estava parado na porta dela às oito da manhã de um domingo, depois de passar a noite toda planejando o que eu faria com a advoga que vinha mexendo com a minha cabeça, eu precisava dar um jeito de fazer ela se render ao meu charme ia usar toda a minha animação e energia para fazer derrubar as barreiras dela e conquistá-la.Encarei o corpo dela de cima a baixo, ela estava usado uma calça legging e uma regata folgada, tão diferente das roupas sociais que usava no escritório, mas a expressão de advogada durona continuava a mesma.— O que está fazendo aqui? — ela questionou incrédula, como se achasse que eu não iria levar a sério a conversa das amigas dela, eu teria aproveitado qualquer oportunidade de ficar sozinho com ela. — Como sabe onde eu moro?— Perguntas, perguntas. Tsc tsc, o povo de São Paulo não sabe mesmo como ser educado, não é doutora?! — falei e sacudiu a cabeça a chamando de doutora só porq
Encarei as chaves penduradas na parede como se elas fossem me dar alguma resposta.Era dia da minha consulta e eu tinha adiado contar para qualquer um em casa, parte de mim insistia em acreditar que Fernando apareceria no último minuto e me faria companhia, mas estava óbvio que não ia acontecer.Miguel tinha ido à cidade vizinha com alguns amigos e por isso havia deixado a velha picape ali, Emy e Sara estavam trabalhando então éramos só eu e Fábio. O menino havia tido uma súbita dor de barriga antes de sair para escola, dor essa que havia passado miraculosamente assim que a mãe saiu o deixando comigo.Tinha suspeitas sobre o que poderia tê-lo feito mentir para mãe, especialmente para não ir à escola já que ele adora passar o dia lá, rodeado de amigos, mas não o questionei, sabia que ele contaria assim que quisesse, assim como ele fez quando me contou sobre as brigas que havia presenciado com os pais.O garoto era tão inteligente e sensível, até se sentiu mal por contar pra mim o que t
— Calma, calma. — o homem murmurou rápido quando viu que tinha apertado todos os botões errados. — A gente começou com o pé esquerdo. — ele puxou uma cadeira a estendendo em minha direção. — Senta um pouco e toma uma água, já trago pra você. Não saía daí!Tentei manter em mente que ele tinha um humor de comediante, mesmo que eu não estivesse nenhum pouco no clima para dar risadas.Respirei fundo e encarei o relógio na parede, eu já estava atrasada dez minutos para a consulta. Perfeito!Fábio surgiu logo em seguida com um pedaço de bolo em um pratinho e a boca toda suja de chocolate. Ele me sorriu da forma mais inocente e eu não consegui segurar a retribuição apesar de toda a irritação que sentia passear por meu corpo.Parecia que hoje era o dia de: não saia de casa Helen! Me perder, o carro quebrar e ter que lidar com gene arrogante e que julgam meu casamento sem nem ao menos me conhecer, com toda certeza não estava nos meus planos quando me levantei da cama hoje.— Obrigada Fábio. —