— Kau, o que está fazendo nesse quarto? Que barulhos são esses? O que você tá aprontando menina? — Gritou Maro, a governanta, esmurrando a porta do lado de fora do meu quarto.
Rapidamente guardei todas as minhas coisas, desliguei o notebook e troquei de roupa. Maro, não podia me ver assim, ninguém podia. Isso era um segredo só meu.
— KAU, TA QUASE NA HORA DO SEU CASAMENTO — Berrou brava.
— Já vou abrir, só um minuto — falei terminando de me vestir e fui abrir a porta logo em seguida.
Maro bufou, não sabia por que estava tão brava. Este casamento era contra a minha vontade e ela sabia muito bem disso.
— Menina, seu pai me mata se você atrasar. O que estava fazendo trancada neste quarto? — disse entrando rapidamente e colocou o vestido de noiva na cama.
— Estava assistindo um filme pelo notebook — respondi ignorando aquele vestido ridículo.
— Um filme a essa hora? está querendo provocar seu pai? Você já tomou banho? — Caminhou até o guarda roupa para pegar o véu e a caixa de sapatos.
— Tomei sim — me joguei sobre a cama.
— O que pensa estar fazendo? Levanta daí já e vem se trocar. O cabeleireiro e a maquiadora já estão chegando — disse, segurou em meu braço e puxou-me com força.
— Já falei que não quero nada disso, não vou deixar ninguém relar a mão em mim — gritei irritada. — Não sou obrigada a me casar, e mesmo sabendo que não tenho escolha, vou fazer isso nas minhas condições, como eu quiser. — Me soltei de seu agarre. — Eu faço o meu cabelo e a maquiagem — avisei.
— Olha, olha, o que vai fazer. Não vai me prejudicar — disse preocupada.
— Claro que não, Maro, te amo como uma mãe. Afinal, nem minha mãe aguentou meu pai, foi embora sem olhar para trás. Você é tudo o que eu tenho — falei abraçando-a, que retribuiu com muito carinho.
— Você tem razão, mas ninguém precisa saber disso. Vem que te ajudo a se vestir — afastou-se e foi pegar o vestido, enquanto eu me despia contrariada.
O vestido rastava pelo o chão e parecia um bolo fofo de tão armado que era. Modelo tomara que cai, escolhido pelo meu pai e que me incomodava de mais.
— Não vou me casar com esse vestido — avisei tentando tirar.
— Kau, para com isso. Não temos outro vestido, esse é o único — disse desesperada.
— Maro, pega a maleta de costura que era da minha mãe — pedi, sentindo seu olhar incrédulo sobre mim.
— O que vai fazer? — Perguntou preocupada.
— Confia em mim! Vou me casar do jeito que eu quero — falei ao colocar o vestido no chão.
Maro ainda estava contrariada quando abandonou o quarto e buscou pela maleta que eu havia pedido. Sentei-me no chão com ela me observando. Medi o comprimento da frente do vestido e o de trás. Peguei o lápis de costura e fiz uma marcação na frente e bem ali cortei o tule devagar para não rasgar e nem sair torto.
A parte de trás cortei bem menos, deixando comprido na altura da batata da minha perna e a frente na altura do joelho. Graças a Deus o corte ficou certinho, sempre fui muito boa com costura, às vezes criava minhas próprias roupas. Ainda faria faculdade de estilista.
Peguei o vestido do chão e pedi para que ela me ajudasse a vesti-lo. Quando terminou de fechar os botões nas costas, ficou me olhando sem dizer nada.
— O que foi?
— Ficou lindo e diferente, nem parece que foi você quem cortou. Parece até outro vestido — admirou-me.
Olhando-me no espelho, fiquei surpresa com o que vi. Era assim que eu me imaginava me casando, mas com quem eu realmente amasse. No entanto, o vestido estava como eu queria. Não ligava para o que meu pai pensaria quando me visse.
Entretanto, ainda me olhando percebi que faltava alguma coisa. Fui até minha gaveta e peguei minha meia preta de renda até o joelho e a coloquei, calcei meu All Star preto, tipo bota de salto alto, e me senti à vontade. Coloquei um cinto preto e largo de cetim na altura da cintura dando um laço atrás. Era assim que eu queria me casar um dia, caso eu mudasse de ideia.
— Kau, seu pai não vai gostar nada disso. É bem sua cara, mas não para se casar — olhou-me preocupada.
— Ele não quer que eu me case? Então, vai ser do meu jeito — falei sentando-me em frente a penteadeira.
Soltei meu cabelo negro que estava preso em um rabo frouxo, o ajeitei com a mão, deixando todo ondulado e deixei a franja longa de lado.
Estava perfeito, coloquei um brinco grande de pena branca de pavão. A maquiagem, delineei bem meus olhos e na boca passei um batom bem vermelho, com a pele branca como leite, ele se destacou como eu gostava. Agora sim estava como gostava. Só queria ver a cara do meu pai.
— Maro, pega minha luva preta de dedo. Por favor.
— Você não acha que já está bom? Para que a luva?
— Se é para casar, vai ser como eu quero.
Maro não disse mais nada, me entregou as luvas e juntas saímos a caminho da igreja.
Sinceramente não sei se vou conseguir encarar aquele mauricinho do Oscar, ele parece uma mosca morta e sou obrigada a casar-me com ele. Isso não é justo. Pensei enquanto o motorista estacionava o carro na frente da igreja.
Minutos depois estava subindo a escadaria com o coração disparado de raiva, ódio, todos os sentimentos ruins me consumiam naquele momento.
— Kau, esse não foi o vestido que escolhi. E cadê sua sandália? — Questionou meu pai, ao pegar no meu braço para entrarmos na igreja.
— A sandália está em casa, me sinto melhor assim — respondi levantando meu pé. — Quanto ao vestido, é o que escolheu, só fiz ele ficar do meu gosto, pelo menos isso eu posso fazer, ou quer comprar um outro para eu usar? Isso poderia atrasar seu lindo casamento, por que isso só interessa a você, não é mesmo? — Falei muito irritada.
— Não vou comprar outro, você vai entrar assim. Esse casamento é importante para os negócios e um dia vai me agradecer por isso — disse baixinho me guiando até o altar como a cerimonialista nos pediu.
Não respondi o que falou, apenas entrei em silêncio com uma vontade louca de morrer, ou sumir dali. Eu não podia deixar meu pai controlar minha vida, como fazia com minha mãe, ele não era meu dono. Tinha idade o suficiente para fazer minhas escolhas. Não ligava e nunca ligaria para os negócios da família, meu sonho sempre foi ser dançarina, escritora e estilista, mas nem isso pude fazer.
— Filha... Kau — chamou meu pai me cutucando, me tirando dos meus pensamentos.
Foi então que notei Oscar bem a minha frente.
Meu pai o cumprimentou e ele pegou em minha mão. Ignorei o beijo que meu pai iria me dar e subi dois degraus para chegar até o altar de braços dados com Oscar. Isso me causava náusea.
O Padre começou a cerimônia e eu não consegui prestar atenção em uma só palavra do que dizia. Só pensava em como sair dali, de fugir disso tudo. Tantas vezes tentei fugir do meu pai, mas sempre fui encontrada. Era quase impossível fugir dele.
— Você aceita?
— Kau... — chamou Oscar me cutucando.
— O que foi?
— Você aceita se casar por livre espontânea vontade? — Perguntou o padre, fazendo meu estômago doer na hora.
Eu não podia dizer sim. Não queria essa vida para mim, não era o meu sonho. Precisava fazer alguma coisa e tinha que ser rápido.
— Você aceita? — Perguntou o padre novamente.
Oscar não tirava os olhos de mim. Todos na igreja me olhavam apreensivos, aguardavam por minha resposta. Respirei fundo e resolvi responder.
— EU JÁ DISSE QUE NÃO VOU DIZER SIM — gritei para que todos me ouvissem e sem esperar qualquer reação ou resposta, sai correndo feito uma louca, jogando o buquê para o alto e rapidamente sai da igreja com meu pai gritando para seus capangas irem atrás de mim.
Quando notei um rapaz de moto estacionando, fui até ele desesperada e implorei que me levasse até a rodoviária. Vendo meu desespero apenas me entregou o capacete e pedindo que fosse mais rápido que pudesse, partimos dali. Com os capangas tentando sair do estacionamento, pois seus carros estavam cercados.
Parti levando apenas minha bolsinha de mão que estava com meus documentos, cartões de crédito e o meu celular. Não tinha planejado nada disso, mas não me casaria contra minha vontade.
O rapaz me deixou na rodoviária como pedi. Agradeci a ajuda e fui comprar minha passagem. Eu poderia ir para qualquer lugar. No entanto fazia uma semana que havia descoberto sobre minha mãe estar morando em Foz do Iguaçu.
Era uma viagem longa, pois morava em Pouso Alegre e acho que meu pai nunca iria me encontrar lá, pois ele não fazia ideia de onde ela morava. Eu só sabia que ela estava nessa cidade, mas não tinha o endereço nem nada a respeito. Seria como procurar uma agulha no palheiro, mas era melhor do que ficar com meu pai.
Minutos depois estava a caminho da cidade da minha mãe. Ela partiu quando eu tinha apenas seis anos, então as lembranças que tinha dela eram poucas. Era muito nova para entender o que estava acontecendo, só lembro que eles brigavam muito. Hoje, com vinte e dois anos, consigo entender que o maior culpado de ela ter nos deixado foi meu pai.Jonathas Almeida era uma pessoa extremamente difícil de conviver, era autoritário de mais, achava que poderia mandar em todos. Vivia mal-humorado, não sorria e só pensava nos negócios dele.Que mulher aguentaria um homem assim? Entendia que ela não possuía outra escolha, por esse motivo tinha muita vontade de encontrá-la.Passei a viagem toda imaginando em como seria nosso reencontro, se ela me reconheceria e se ainda sentia algum sentimento por sua filha. Suspirei, notando que vários olhares dentro do ônibus eram direcionados a mim.Ri fraco, acho que eu também ficaria horrorizada em ver uma noiva fugitiva.
Quando voltei para a realidade percebendo que estávamos sozinhos e que os guardas passaram sem me ver. O empurrei na hora.— O que pensa que está fazendo? Quem te deu permissão para me beijar — perguntei, meu coração batia descompassado e minhas pernas estavam trêmulas. Eu queria esganá-lo.— Tá reclamando do que? Você retribuiu sem hesitar — zombou.— Precisei retribuir, eu estava sendo perseguido pelos guardas, essa foi a única forma de me esconder — respondi sem graça, notando que meus pães e o pacote de biscoito estavam pisoteados no chão e minha barriga continuava roncando.— Então você é uma ladrazinha, mas porque está vestida de noiva? — Questionou me examinando.— Não sou ladra e é uma longa história. Contarei depois que me arrumar uma roupa e pagar algo para eu comer, estou morrendo de fome — pedi muito sem graça novamente.— Te pago um belo café da manhã e te compro roupas novas com uma condição.— Que condição?— Minha mãe é
— Ah, Julian, conta outra, é claro que você sabe o que tem nesse quarto.— Juro que eu não sei! Esse quarto está trancando já faz seis meses. Ouço muitos barulhos a noite, mas não faço ideia do que se trata — explicou muito sem graça e muito confuso.— Tudo bem, dou minha palavra que não entrarei nesse quarto. Agora preciso de um banho e dormir um pouco. Sou muito grata por me acolher na sua casa. Seria terrível passar mais uma noite na rua. Em troca desse favor, tentarei ser uma noiva bem convincente.— Obrigado pela ajuda, Kau. Tome seu banho que eu vou ver se dona Chica pode pegar algumas roupas da filha dela para te emprestar, Ana tem uns vinte anos, acredito que essa também seja a sua idade. Chica é mãe da nossa cozinheira. Assim que o almoço estiver pronto te chamo.— Na verdade, farei vinte e três em duas semanas. Agradeço por me arrumar algumas roupas. Vou lá então — subi as escadas e fui para o quarto de hóspedes que Julian me mostrou.En
— Mãe, quem tem um compromisso com a Bianca é você. Nunca aceitei essa ideia louca de ser noivo dela. Eu falei que tinha uma namorada e não acreditaram em mim. Pois é, ela está aqui e estamos juntos já faz um ano, prefiro me casar com ela que eu amo, do que com aquela garota esnobe e ridícula que escolheu para mim — explicou bastante irritado.— Filho, Bianca é uma atriz jovem e famosa, faz vários filmes nacionais e novelas, pode te ajudar a entrar nesse meio. É o seu sonho — argumentou decepcionada.Fiquei ali só observando a discussão deles. Eu sabia que esse noivado não era real, então essa briga boba não surgia efeito em mim. Esse casamento nunca iria acontecer mesmo.— Não, esse não é meu sonho, é o seu. Nunca quis ser ator de cinema — gritou muito nervoso.— Quando você era pequeno, dizia que queria ser como eu.— Quando eu era pequeno, disse tudo, eu cresci mãe e meu sonho é ser médico. Será que agora podemos almoçar? — Perguntou sentando-se do m
Julian respondeu ao beijo sem nenhuma hesitação e enquanto ele explorava minha boca com muita necessidade, tentei abrir os olhos algumas vezes para ver se os capangas do meu pai haviam ido embora. Para a minha sorte tinham acabado de partir. Fiquei aliviada e no mesmo instante me afastei do Julian.— Assim vamos ser bem convincente — sorriu safado.— Julian, preciso de um favor — o ignorei. — Preciso ir em um salão de cabelereiro, você conhece algum?— Sim, conheço o que minha mãe costuma ir, mas a essa hora deve estar lotado. Porque precisa ir? E por que parece preocupada?— Julian, te beijei para me esconder.— Se esconder... de quem? — Perguntou confuso.— Meu pai tem muitos amigos e alguns deles vieram atrás de mim, quando os vi te beijei — menti mais uma vez.Não contaria para ele que eram os capangas do meu pai, pensaria que estava mentindo a respeito de ser pobre e não queria isso. Só não conseguia entender como foram me procurar just
Nunca pensei que aquele imbecil do Oscar fosse atrás de mim e com a sorte que tenho esbarrei bem nele. Poxa! Como sou sortuda, dá até raiva.— Você me desculpa, não a vi — lamentou-se.Tentei evitar de olhá-lo, estava com medo de ser reconhecida. Julian percebendo meu desconforto e me puxou para mais perto de si.— Amor, você está bem? — deu um beijo em minha boca, me fazendo tremer na base.— Estou sim — respondi assim que ele se afastou dos meus lábios.— Que bom que está bem, vou tomar mais cuidado quando eu andar por aí — disse Oscar sem graça. — Hey, preciso de uma informação — chamou nossa atenção quando percebeu que iríamos entrar no carro.— Diga --- perguntou Julian, aproximando dele.— Vocês viram essa garota, ela é minha noiva e por causa de uma briga com seu pai, fugiu e descobri que veio para essa cidade — contava mostrando uma foto minha.— Não a vimos, mas como descobriu que veio para cá? — Questionou Julian.
— O que faz aqui a essa hora da noite? — Questionou Julian me olhando.— Credo, Julian, você quase me matou de susto — resmunguei baixinho.— Desculpa, não era minha intenção, mas porque está falando assim.— Dormi sem jantar, lembra?— Claro que lembro — disse no mesmo tom de voz que eu.— Acordei com fome e resolvi tomar um copo de leite, comer um lanche e quando cheguei aqui embaixo ouvi barulhos e fui ver o que era, e vinha daquele quarto. Você sabia que sua mãe sequestrou alguém e faz ela de refém? E pelo que entendi a vítima se recusa comer — contei quase sussurrando para que ninguém me ouvisse.— Você está ficando louca? Minha mãe jamais faria isso — disse assustado.— Elas estão lá agora, vai ouvir pela porta e tire suas próprias conclusões... — ele nem esperou eu terminar de falar e foi para lá, enquanto fiquei fazendo um lanche para mim, não demorou muito, ele voltou branco como um fantasma.— Você tem razão, parece
Voltamos para sua casa pensando no plano e como ele disse, Chica não estava em casa, nem sua mãe e nem mesmo a Ana. Havia chegado a hora de descobrir quem estava naquele quarto e o porquê.— Julian, a porta está trancada. Você sabe onde está a chave?— Minha mãe tem o costume de guardar tudo no seu quarto. Vamos logo procurar — disse me puxando pela mão.Entramos no quarto de Sacha que era enorme. Tinha um close com tantas gavetas que não fazia ideia por onde começar.— Olha na penteadeira que vou procurar no close e seja rápida — falou abrindo algumas gavetas e procurando, enquanto eu procurava na penteadeira.Foi então que algo me chamou a atenção, notei um pequeno baú de madeira bem pequeno escondido atrás de um vaso na penteadeira.— Olha o que achei — andei em sua direção com o baú na mão.— Abre, para ver o que tem dentro — olhou-me aflito.Sem pensar duas vezes eu abri e para minha surpresa tinha duas chav