• Manuela •
Seis Anos Depois... O dia amanhece com a doçura que só minha pequena Luna sabe trazer. Ela pula em cima de mim, espalhando beijos pelo meu rosto, enquanto sua risada infantil preenche o quarto. — Acorda, mamãe! — ela diz animada, segurando sua boneca de pano com firmeza. Abro os olhos lentamente, sorrindo ao ver aquele rostinho iluminado pelo entusiasmo. — Mamãe já acordou, meu amor. — Retribuo os beijos e a puxo para um abraço apertado. — Está animada para o primeiro dia na escolinha nova? — Sim, mamãe, muito animada! — ela responde, balançando a cabeça com entusiasmo. Enquanto me espreguiço, noto que Luna já está banhada e vestida com seu uniforme azul. Sorrio, admirada. — E quem foi que deu banho nessa princesa sem me chamar? — pergunto, fingindo indignação. — Foi a vovó! — responde Luna, com um sorriso travesso, enquanto abraça sua inseparável boneca, um presente de Pedro, seu padrinho e meu melhor amigo. Agradeço mentalmente à minha mãe, dona Natasha, que sempre me ajuda com Luna e a mima sem limites. Pego minha filha no colo e beijo seus cabelos loiros, que têm o mesmo tom do pai. — Hoje você vai passar a tarde na casa da vovó Pérola, e a tia Bianca vai te buscar na escolinha, está bem? — Tá bom, mamãe! — Luna diz enquanto corre pela porta do quarto. — Vou descer! — Cuidado com a escada! — grito, rindo da energia dela. Fico observando-a desaparecer no corredor, sentindo uma mistura de orgulho e nostalgia. Luna herdou o sorriso e o brilho nos olhos do Leonardo. Mesmo depois de tantos anos, o amor que senti por ele ainda me acompanha como uma sombra. A saudade dói, mas a memória de tudo o que vivemos é ainda mais dolorosa. Recém-formada em Administração, estou prestes a assumir o lugar do meu pai na empresa, permitindo que ele finalmente tenha a aposentadoria que tanto deseja. Foram anos difíceis, equilibrando os estudos com a maternidade, mas, com o apoio dos meus pais e dos meus padrinhos, consegui me formar, mesmo tendo que trancar um ano. Após um banho rápido, me arrumo para o trabalho e desço para tomar café da manhã. Encontro Luna já sentada, devorando uma torrada com geleia. — Bom dia, mamãe! — ela exclama com a boca cheia. — Cadê o vovô? — Bom dia, meu amor. — Sorrio enquanto me sirvo de café. — O vovô foi à empresa pegar algumas coisas e organizar a reunião para anunciar a aposentadoria dele. Minha mãe, sempre atenta, me olha com um sorriso acolhedor. — Hoje é o primeiro dia da sua nova rotina, hein? Já está preparada? — Preparada como posso, mãe. Vou precisar passar na casa dos meus padrinhos antes, para deixar a Bianca na faculdade. Ela tem aula só de manhã e pediu uma carona. Minha mãe brinca com Luna, chamando-a de "traidora" por ir para a casa da outra avó. Rimos juntas, e, após o café, subo para ajudar Luna a escovar os dentes e pegar nossas coisas. Logo estamos no carro, a caminho da casa dos meus padrinhos. — Bom dia, Manu! Bom dia, bebê da titia! — Bianca, irmã mais nova de Leonardo, entra no carro animada. — Bom dia, titia! — responde Luna, radiante. — Bom dia, Bia. Ansiosa para o primeiro dia de aula? — pergunto, enquanto dirijo. — Sim, mas tenho outra coisa para contar que, pelo visto, você ainda não sabe. — Bianca sorri de lado, misteriosa. — O quê? — pergunto, curiosa e um pouco apreensiva. — Meu irmão está voltando para o Brasil neste fim de semana. Ele vem para o aniversário da mamãe e também para assumir um caso da empresa onde trabalha, em Cambridge. Meu coração dispara. Seguro o volante com força, tentando não demonstrar minha inquietação. — Nunca imaginei que ele voltaria um dia... — murmuro, mais para mim mesma. — Ele não veio para ficar — Bianca esclarece. — Mas talvez o caso dure algum tempo. E, Manu, acho que está na hora de contar a ele sobre Luna. — Não sei se estou preparada para isso. Tenho medo de como ele vai reagir — confesso, minha voz embargada. Bianca toca meu ombro com carinho. — Sei que é difícil, mas ele tem o direito de saber. E você conhece meu irmão. No fundo, ele não é uma pessoa ruim. Pode ser que isso o ajude a mudar. Respiro fundo, tentando conter as lágrimas. O retorno de Leonardo era algo que eu sempre soube que poderia acontecer, mas nunca imaginei que o medo tomaria conta de mim dessa forma. Após deixar Bianca na faculdade e Luna na escola, sigo para a empresa. Durante a reunião com os funcionários, meu pai oficializa sua aposentadoria e anuncia que estou assumindo sua posição. Apesar de ser um marco importante na minha vida, não consigo afastar Leonardo dos meus pensamentos. — Tá pensando demais. Dá pra sentir o cheiro dos seus neurônios queimando daqui. — Pedro, meu melhor amigo, entra na sala sorrindo. — Leonardo estará de volta ao Brasil nesse fim de semana — confesso rapidamente. Pedro para, surpreso. — O que ele vem fazer aqui? — Um trabalho e o aniversário da madrinha dele. — Suspiro, nervosa. — Tenho medo, Pedro. Medo de ele querer tirar Luna de mim. Pedro se aproxima, me abraçando pelos ombros. — Ei, calma. Ele pode ser o que for, mas nunca te tiraria Luna. E você sabe que todos estamos do seu lado. — Mas e se ele quiser? E se ele for capaz disso? — questiono, a voz tremendo. — Nós não deixaríamos. Agora, respira e foca no trabalho. Temos muitos contratos para revisar antes do lançamento da nova coleção. Concordo, mas, no fundo, sei que será impossível desviar meus pensamentos. Leonardo está de volta, e o peso do que escondi por seis anos finalmente cairá sobre mim. À noite, em casa, depois de buscar Luna na casa dos meus padrinhos e dar um banho nela, deito ao seu lado, observando-a assistir a um desenho no tablet. Sua vozinha doce me tira dos pensamentos. — Mamãe, eu não tenho um papai? — pergunta, me pegando de surpresa. Sinto meu coração afundar, mas tento manter a calma. — Tem sim, meu amor. Ele mora longe, como já expliquei — respondo, acariciando seus cabelos loiros. — Ele é irmão da titia Bianca, né? — pergunta, com inocência. — Sim, é sim. — Ele nunca vem me ver? — continua, sua voz carregada de curiosidade. Engulo seco, tentando segurar as lágrimas. — Um dia ele vem, pequena. E eu tenho certeza de que ele vai te amar muito. — Será que ele vai gostar de mim? — ela pergunta, insegura. Seguro seu rostinho com carinho, tentando esconder a dor em meu coração. — Claro que vai, meu amor. Você é maravilhosa, e ele vai ter muito orgulho de você. — Amo você, mamãe. — Também te amo, princesa. Você é tudo para mim. Enquanto a abraço naquela noite, choro em silêncio, sentindo o medo apertar meu peito. Leonardo está voltando, e, pela primeira vez em anos, meu segredo está prestes a ser revelado. Não sei como será nosso reencontro, nem como ele reagirá ao saber da existência de Luna. Mas, acima de tudo, não sei se estou preparada para enfrentar esse momento. ainda estava em turbilhão. O trabalho na empresa me ocupava, mas o peso da chegada de Leonardo pairava sobre mim como uma nuvem carregada. A cada momento de silêncio, imaginava nosso encontro. Como ele reagiria ao saber da existência de Luna? Ele ficaria feliz? Com raiva? Ou, pior ainda, indiferente? Na noite de sexta-feira, véspera do aniversário da minha madrinha, Pedro apareceu em casa. Ele trazia pizza e vinho, como sempre fazia nas noites em que percebia que eu estava à beira de um colapso. — Trouxe seu calmante favorito — brincou ele, colocando a pizza sobre a mesa e me entregando uma taça. — Obrigada, Pedro. Você sabe que é o melhor amigo do mundo, né? — Sei. Modéstia à parte, você tem sorte de me ter — respondeu com aquele sorriso maroto que sempre me fazia rir. Enquanto Luna brincava na sala com seus bonecos, sentei-me com Pedro na cozinha. Ele me olhou com seriedade pela primeira vez naquela noite. — Manu, você já decidiu como vai contar para o Leonardo sobre a Luna? Suspirei, girando a taça nas mãos. — Não sei, Pedro. Ainda não sei nem como vou encará-lo. Tenho tanto medo… Ele não é o mesmo Leon de antes, sabe? O que ele vai pensar de mim? Será que vai achar que escondi Luna por egoísmo? Pedro pegou minha mão e apertou de leve. — Você não escondeu por egoísmo, Manu. Você estava protegendo sua filha e tentando se proteger também. E, honestamente, o Leon de antes te amava. Acho que, lá no fundo, ele ainda te ama. Minhas lágrimas ameaçaram cair novamente, mas Pedro sabia como me distrair. Ele começou a falar de Bianca, que continuava insistindo na ideia de conquistá-lo. Ri ao imaginar a cena, mas sabia que a distração seria breve.• Leonardo •Sábado...O salão está cheio de luzes e risadas, mas tudo ao meu redor desaparece no momento em que a vejo entrar pela porta. Manuela.Meu coração acelera como se o tempo tivesse voltado para os nossos dias juntos. Ela está ainda mais linda, sua beleza madura agora combinando com aquele sorriso de menina que nunca saiu da minha memória. Mas o sorriso dela, tão vibrante ao entrar, se desfaz quando nossos olhares se encontram. É como se o tempo congelasse por um instante, trazendo uma onda de emoções confusas — nostalgia, saudade, arrependimento.Desvio o olhar, tentando me recompor, mas logo noto algo que faz meu peito apertar ainda mais. Um homem se aproxima dela, a abraçando pela cintura com intimidade. Minha mandíbula trava enquanto observo ele segurar a mão de uma menininha loira, incrivelmente parecida com Manuela. Meu estômago revira. A garota deve ser filha deles. E ele? Talvez namorado. Ou marido. Esse pensamento me enche de ciúme, embora eu não tenha o direito de
• Manuela • Manhã de DomingoA noite foi difícil. As palavras de Leonardo ecoaram em minha mente como um martelo, impedindo qualquer descanso. Luna, minha pequena, parece ter sentido minha tensão, já que quase não dormiu também. Agora, as duas estamos na cozinha cedo, tentando começar o dia com nosso café da manhã.— Bom dia, princesinha do dindo! — a voz alegre de Pedro ecoa enquanto ele entra sem cerimônia, como sempre faz.— Bom dia, Pepe! Veio tomar café, né? — digo com um sorriso, abraçando meu amigo, cuja presença é sempre um alívio.— Bom dia, dindo! — Luna responde distraída, concentrada no cereal à sua frente.Pedro senta-se à mesa e me olha preocupado.— Vim tomar café, mas também ver como você está — diz, aceitando a panqueca que coloco em seu prato. — Cadê seus pais?— Estou bem, amigo. Obrigada por perguntar. — Tento sorrir, embora saiba que ele não se engana facilmente. — Meus pais viajaram cedo. Meu pai disse que quer aproveitar minha mãe. — Faço uma careta, arrancando
ManuelaO número de telefone que Bianca me passou pisca na tela do celular. Respiro fundo, reunindo coragem para ligar para Leonardo. Meu coração bate rápido, e uma sensação de apreensão toma conta de mim. Finalmente, pressiono o botão para iniciar a chamada.Início da Chamada— Alô? — a voz de Leonardo soa firme, mas carregada de tensão.— Leonardo, sou eu, Manuela. — Minha voz sai mais suave do que imaginei. — Só liguei para dizer que, se quiser, pode buscar Luna amanhã na escola para passar a tarde com ela.Há um momento de silêncio, seguido de um suspiro.— Certo. Me manda o horário que ela sai e o endereço da escola por mensagem.— Só queria te pedir para passar o tempo com ela na casa dos seus pais. Isso me deixa mais tranquila — acrescento, hesitante.Leon ri pelo nariz, um som meio debochado.— Você não confia em mim, não é?— Não é isso. — Tento me justificar. — Você nunca cuidou de uma criança. Na casa dos seus pais, eles podem te ajudar com o que precisar.Ele traga a paciê
LeonardoConfesso que a presença de Manuela comigo e Luna não me deixou à vontade. Minha mãe tinha me explicado que Luna poderia estranhar passar o dia comigo sozinha, já que somos praticamente desconhecidos. Ainda assim, a sensação de desconforto era inevitável.Enquanto esperávamos nossos pedidos no restaurante, tento criar um momento mais descontraído.— O que vai querer comer, loirinha? — pergunto, tentando soar animado.— Uma esfirra de carne, outra de frango, e suquinho de laranja. — Ela sorri, e não consigo evitar um sorriso de volta. Esses sabores e o suco de laranja também são os meus favoritos.— Vou querer o mesmo: esfirras de carne e frango e suco de laranja — digo ao garçom antes de olhar para Manuela. — E você?— Quero aquele combo de sanduíche de frango, batatas fritas e suco de laranja — ela responde, e um pensamento rápido me invade: sempre comilona.A conversa inicial é dominada por Manuela, o que me alivia, pois ainda estou tentando me acostumar com a situação.— Co
Leonardo Confesso que é estranho estar aqui, depois de anos, sentado à mesa de jantar com meus pais. Desde que voltei, tenho evitado situações como essa, mas hoje não houve como escapar. Minha mãe insistiu demais, e cedi.Ela olha para mim com aquele olhar que só mães têm, misto de curiosidade e preocupação.— Sobre o que é o caso que você está cuidando aqui na cidade, filho? — pergunta, tentando quebrar o silêncio.— Estou defendendo um homem acusado de assassinato. Ele alega ser inocente e, até agora, os fatos apontam que ele realmente pode ser. — Respondo, tentando parecer neutro, mas sei que meu tom carrega o cansaço de dias complicados.— Esses casos são complicados, mas desafiadores. Bons para testar suas habilidades. — Meu pai comenta, com um tom firme, mas sem grande entusiasmo.Mudando o foco, minha mãe olha para minha irmã:— E você, filha, como estão as aulas na faculdade?Minha irmã sorri, os olhos brilhando de empolgação:— Estão incríveis, mãe! Eu amo o curso, é tudo o
Leonardo Passei a semana inteira perdido em pensamentos. A conversa que tive com meu pai me atingiu como um soco, e as palavras dele não paravam de ecoar na minha mente. Preciso ser melhor. Hoje é domingo, e decidi aproveitar o dia para ver a Luna. Quero levar minha filha à praia, talvez criar uma memória boa entre nós.Chego na casa da Manuela e bato na porta. Ela atende com uma expressão surpresa, vestida em um vestido simples, mas bonito, que combina perfeitamente com o modelo infantil que a Luna também usa. É quase impossível não reparar como ela se esforça para fazer a filha feliz, mesmo que isso a deixe de lado.— Bom dia, Leonardo. — Ela diz, um pouco hesitante, mas cordial.— Bom dia. Eu ia perguntar se podia levar a loirinha na praia, mas parece que vocês já têm planos. — Respondo, percebendo a cesta de piquenique em suas mãos.— Aos domingos, sempre fazemos piquenique. — Ela explica, com um leve sorriso, mas há algo contido no olhar dela, talvez mágoa.Antes que eu pudesse
ManuelaA manhã começou cedo. Depois de arrumar minha menina e eu mesma, tomamos um café rápido antes de sair. Coloquei Luna na cadeirinha, ajustando o cinto com cuidado, e entrei no carro.— Mamãe, o Léo não vai com a gente? — ela pergunta com os olhos brilhando de expectativa.— Vai sim, filha. Estamos indo buscá-lo agora. — respondo, tentando sorrir para acalmar a animação dela.— Achei que ele tinha esquecido nosso combinado! — diz, cheia de entusiasmo.Chegamos à casa dos padrinhos, e lá estava Leonardo, já arrumado, esperando do lado de fora. Ele parecia quase ansioso.— Bom dia, loirinha. Bom dia, Manuela. — cumprimenta, entrando no carro.— Bom dia, Léo! — Luna responde sorridente, a alegria transbordando.No caminho, ela começa a falar sobre como iria “esfregar na cara” da coleguinha que o pai dela estava presente. Leonardo e eu rimos da inocência dela, mas um aperto no peito me lembrou que essa felicidade dela era algo recente.Ao chegarmos à escola, descemos juntos para lev
ManuelaUma Noite no ParqueEra sexta-feira, e tudo o que eu queria era passar o fim do dia deitada na cama com a Luna, comendo porcarias e vendo desenhos. Mas a campainha insistente me obrigou a levantar.Abri a porta e dei de cara com Leonardo. Ele estava bem vestido e parecia animado.— Leonardo, o que você está fazendo aqui? — perguntei, surpresa.— Tem um parque de diversões na cidade. Achei que seria divertido irmos lá. — Ele fez uma pausa, talvez percebendo minha expressão confusa. — Quero levar a Luna.— Ah, claro. Você espera a gente se arrumar? — perguntei, ainda tentando processar o convite. Ele assentiu com um sorriso.— Leeeeeo! — Luna gritou, aparecendo atrás de mim e pulando nos braços dele.— Que tal eu, você e sua mãe irmos ao parque hoje? — perguntou para ela, que respondeu com um grito animado de "Vamos!"Subi para ajudar Luna a se arrumar, e aproveitei para trocar de roupa também. Não pude evitar a surpresa pelo convite. Achei que ele quisesse ir apenas com ela, ma