LANA MARTINS
É uma manhã cinzenta e fria, e estou atrasada. Mais uma vez. Acelerar a respiração e os passos já se tornou um hábito nas manhãs em que consigo visitar Ana. Cada segundo no internato parece insuficiente; os minutos escapam antes que eu realmente possa aproveitar sua companhia. Ver Ana, mesmo por tão pouco tempo, é tudo para mim. Essa visita, por mais breve que seja, renova meu propósito.
Ao entrar pelo portão do internato, avisto Ana brincando na quadra com uma bola de borracha. Assim que me vê, ela corre e pula no meu colo com um sorriso iluminando o rosto.
— Lana! — Ela me abraça com força, os olhos brilhando de alegria.
— Minha pequena! Como você está? — pergunto, sentindo um misto de felicidade e tristeza. Por mais que queira levar Ana de volta para casa, sei que essa é a única forma de garantir sua segurança.
— Estou bem! A professora disse que sou a melhor em desenhos da turma. — Os olhos de Ana brilham de orgulho, e ela me puxa até a parede onde alguns desenhos estão pendurados. Observo as figuras coloridas e caóticas, cada uma contando uma pequena história da sua imaginação.
— São lindos, Ana — respondo, com os olhos marejando de orgulho e saudade. — Eu sabia que você era talentosa!
Por mais que eu tente sorrir, não consigo esquecer que o tempo é curto. A sensação de estar dividida entre as responsabilidades e o desejo de cuidar de Ana aperta cada vez mais. Quando o sinal da escola soa, indicando o fim da visita, Ana me olha com os olhos tristes e a voz fraca.
— Você vai voltar logo, né?
— Vou sim, prometo. Eu sempre volto, meu amor. — Abraço-a mais uma vez, como se pudesse transmitir todo o amor e segurança que não posso dar diariamente.
De volta ao mundo exterior, olho o relógio e percebo que já estou atrasada para o trabalho na VIPSecret. Pela quinta vez naquele mês. — Ah, droga! — murmuro, enquanto o nervosismo aumenta e corro para pegar o ônibus, torcendo para que Sarah, a dona, não me veja entrando. É mais um dia comum no clube de acompanhantes, mas sei que meu atraso, cada vez mais frequente, já é motivo de irritação para ela.
Assim que chego, ofegante e ainda ajustando o casaco, tento cruzar discretamente o corredor até o vestiário. Mas não tenho sorte. Sarah está parada na entrada, braços cruzados e o olhar severo fixo em mim.
— Está achando que é um favor vir trabalhar aqui, Lana? — diz, com a voz fria e cortante. — Já é a quinta vez que chega atrasada este mês. Acha que isso é alguma casa de caridade?
Respiro fundo, tentando acalmar o coração acelerado.
— Sarah, eu... eu precisei ver minha irmã. Ela está em um internato e só posso visitá-la em horários limitados.
— Isso não é problema meu! — Sarah interrompe, impaciente. — Aqui não é lugar para quem não leva o trabalho a sério. Você não é a única garota que precisa de dinheiro. Se não pode cumprir as regras, então está fora.
Tento argumentar, mas a decisão de Sarah está clara. A cada palavra dela, sinto o chão sumir mais e mais sob meus pés, pois sei que sem aquele trabalho não terei como pagar o internato de Ana.
— Não, por favor... Eu preciso desse emprego. É a única maneira de ajudar minha irmã — imploro, a voz falhando.
— Sem desculpas. Isso aqui é um negócio, e eu preciso de gente comprometida. A partir de hoje, está suspensa, Lana. Se quiser voltar, terá que me provar que está pronta para cumprir as regras. — Ela vira as costas, deixando-me sozinha no corredor, sentindo o peso da situação afundar ainda mais sobre meus ombros.
Desesperada, deixo a agência sem saber o que fazer. Sem o trabalho ali, não tenho outra fonte de renda imediata, e o próximo pagamento do internato está se aproximando. As ruas à minha frente se tornam borrões enquanto lágrimas quentes rolam pelo meu rosto, e a sensação de desamparo me invade completamente. Por mais que tente manter o controle e a esperança, parece que o mundo está desabando ao meu redor.
Enquanto caminho lentamente para casa, imersa em pensamentos, sinto o celular vibrar no bolso. É uma mensagem de uma colega que trabalha em uma agência de acompanhantes independente: "Lana, soube de um cliente precisando de uma acompanhante para um evento importante. O pagamento é alto, e ele quer alguém confiável. Talvez essa seja sua chance."
Paro por um momento, olho para o céu e murmuro, quase em prece: "Vocês estão cuidando de mim aí de cima." Respiro fundo, absorvendo a ideia. Talvez isso seja o sinal que eu tanto esperava. Faria qualquer coisa para garantir o futuro de Ana, mesmo que isso significasse aceitar contratos e condições incomuns. E, se o cliente realmente está disposto a pagar bem, talvez finalmente tenha uma saída para meus problemas financeiros.
A noite parece fria e silenciosa, mas, dentro de mim, uma determinação cresce. Essa é minha última chance. O caminho não será fácil, mas, para garantir o futuro de Ana, estou disposta a aceitar.
DANIEL NAVARROMe lembro claramente do dia em que Caroline saiu da minha vida. Ela estava linda, como sempre, mas seu olhar estava mais frio do que eu jamais imaginei possível. Carol, como eu a chamava, domina qualquer ambiente. Sua presença me atrai como um ímã, e sou incapaz de recusar o que ela quer ou de me afastar dela. Nosso relacionamento foi intenso desde o início, e talvez por isso, quando ela decidiu terminar, senti como se levasse uma facada. Não há explicação suficiente para justificar o fim. Não para mim.Mesmo após aquele término tenso e as palavras afiadas que trocamos, algo em mim permanece preso a ela. Talvez seja uma mistura de orgulho e desejo. Mesmo depois de tudo, a ideia de reconquistá-la não me parece absurda. Eu ainda a amo e faria o que fosse necessário para tê-la de volta. Por isso, quando soube que ela estaria no casamento do meu irmão Lucas, decido que essa é a ocasião perfeita para reverter nossa história.Lucas e eu sempre fomos próximos, embora nossas per
LANA MARTINSMeu coração b**e acelerado enquanto atravesso o saguão luxuoso do hotel, um lugar que raramente frequento. As paredes de mármore, reluzentes sob a luz suave, os candelabros elegantes, e os arranjos de flores impecáveis me intimidam. A mensagem da minha colega ecoa na minha mente: "Um empresário influente precisa de uma acompanhante para um evento importante." O pagamento prometido é suficiente para cobrir as próximas mensalidades do internato de Ana. Mais do que isso, representa uma oportunidade de estabilidade que não posso ignorar.Ao avistar o homem em um canto, sinto uma onda de atração por sua presença marcante e imponente. Seus cabelos escuros estão penteados para trás, de maneira elegante e impecável. A barba bem definida contorna seu maxilar, dando um ar sério ao rosto. Ele veste um terno preto que exala sofisticação e profissionalismo, complementado por uma camisa e uma gravata também pretas, mantendo um estilo clássico e discreto. Seu olhar intenso se fixa em mim
LANA MARTINSEnquanto tento organizar meus pensamentos naquela manhã de sábado, o toque da campainha me faz saltar. Corro até a porta e, ao abri-la, meu coração dispara. Daniel está parado ali, impecável em um terno escuro, com aquele leve sorriso enigmático que ele usa tão bem. Quase tropeço nas palavras, pega completamente de surpresa pela presença imponente dele na entrada do meu pequeno apartamento.— Como você... me encontrou? — Gaguejo, puxando a porta um pouco mais, tentando disfarçar o nervosismo e o constrangimento por estar usando um cropped decotado e revelador, absolutamente inapropriado para a ocasião.Ele ergue uma sobrancelha, como se a pergunta fosse desnecessária.— Você sabe que tenho acesso a informações sobre você, Lana — diz ele, com uma naturalidade que torna tudo ainda mais desconcertante.Respiro fundo, lembrando do dossiê que ele mencionou no nosso encontro no hotel. Claro, ele conhece cada detalhe sobre mim; Daniel é meticuloso demais para deixar algo ao acas
LANA MARTINSAssim que a porta da suíte se fecha, percebo que estou mergulhando em um mundo distante da minha realidade. Meus olhos vasculham o ambiente sofisticado: uma cama king-size rodeada por móveis modernos e imponentes, decorados em tons de creme e dourado. As amplas janelas se abrem para uma vista espetacular do oceano, o que aumenta a sensação de surrealismo.Respiro fundo antes de abrir o guarda-roupa, sentindo a antecipação misturada com um toque de nervosismo. Ali dentro, tudo parece cuidadosamente pensado para uma vida de luxo: vestidos elegantes, conjuntos casuais e peças finas que parecem saídas de catálogos de alta moda. Observando mais de perto, noto que cada roupa reflete alguém que eu ainda não reconheço — alguém que pertence a um mundo que conheço apenas de longe. O desconforto dá lugar a uma curiosidade misturada à empolgação.Ao alcançar uma prateleira no canto, encontro um conjunto de lingeries rendadas, delicadas e reveladoras. O rubor sobe em meu rosto ao perc
DANIEL NAVARROÀ medida que o sol se põe e o céu ganha tons de laranja e roxo, levo Lana para se juntar à minha família em um ritual à beira-mar, realizado ao redor de uma grande fogueira. A cerimônia é simples e profundamente conectada à cultura local, simbolizando a união e o amor eterno. Ao meu lado, ela tenta parecer à vontade, mas seu olhar vigilante em Caroline a deixa inquieta.Minha família e os amigos estão relaxados, rindo e compartilhando histórias, mas percebo que Lana nota como Caroline sempre encontra uma maneira de se aproximar ou provocar de forma sutil, disparando comentários disfarçados que a fazem questionar cada uma de suas respostas.— Então, Lana... Como você e Daniel se conheceram? — Caroline pergunta, sorrindo como se fosse uma conversa casual.Lana é pega de surpresa e hesita por um segundo antes de responder:— Nos conhecemos em um evento, e desde então soubemos que algo forte nos conectaria.Caroline ergue uma sobrancelha, claramente não convencida. Sinto o
LANA MARTINSNo dia seguinte, o sol brilha alto e a brisa fresca do mar traz uma sensação renovadora. O ar parece limpo, fresco, mas, ao mesmo tempo, algo em mim está turvo. Caminho pela área da piscina, onde vejo Daniel conversando com Lucas e Caroline. Ela se aproxima com aquele sorriso fácil, colocando-se ao lado dele de forma casual, mas excessivamente próxima. Cada risada dela é acompanhada de um toque no braço de Daniel ou um sorriso provocador - gestos que deixam claro o que ela está tentando fazer.O que aconteceu na noite anterior ainda está martelando em minha cabeça. Só de pensar no toque de Daniel, uma onda de calor se espalha pelo meu corpo, seguida de vergonha. Tento ignorar a sensação estranha que cresce dentro de mim, mas a irritação começa a se intensificar. O que estou fazendo aqui? Não é para eu sentir nada, mas a maneira como Caroline monopoliza a atenção de Daniel me incomoda profundamente. Respiro fundo, tentando me lembrar do porquê de estar ali: é um trabalho,
LANA MARTINSEncaro o nascer do sol pela pequena janela da minha sala, o céu tingido de tons alaranjados e rosados. Cada amanhecer me traz um misto de esperança e inquietação, porque, a cada dia, meu caminho parece mais distante do que eu sempre sonhei. Esse pequeno apartamento, que um dia representou o começo da minha independência, agora é só uma lembrança amarga do que a vida poderia ter sido.A campainha toca de repente, e o som estridente ecoa pelo apartamento, me fazendo parar no meio da sala, com os olhos fixos na porta. Ainda é cedo, e eu não estou esperando visitas. Olho para Ana, que brinca no chão com uma boneca de cabelos encaracolados, tão absorta na brincadeira que mal nota o barulho. Respiro fundo e abro a porta.Do outro lado, está uma mulher baixa, de óculos retangulares e um olhar frio, segurando uma pasta de documentos firmemente contra o peito. O coque impecável e o terno cinza-escuro a tornam ainda mais severa. Ela me observa como se já soubesse exatamente o que va
LANA MARTINSEnquanto me maquio, minha imagem reflete no espelho da pequena penteadeira. Meus olhos, grandes e profundos, trazem uma expressão endurecida, como se tivessem aprendido a carregar muito mais do que alguém de vinte anos deveria. Meus cabelos encaracolados, agora presos em tranças apertadas, caem em torno do meu rosto, destacando as maçãs do rosto marcantes. Mas, por mais que tente me concentrar, as lembranças do acidente me perseguem sem piedade nesta noite silenciosa. Sentada aqui, ancorada na minha realidade, me perco no passado, revivendo o momento que mudou tudo.~ Flash On ~Naquela época, eu ainda trabalhava como garçonete e, apesar dos meus dezenove anos, todos me consideravam responsável e comprometida, mas, acima de tudo, ansiosa para melhorar de vida e ajudar minha família. Minha rotina era simples, quase previsível, entre a casa e o trabalho, e meu maior desejo era um futuro tranquilo ao lado dos meus pais e de Ana, minha irmãzinha.Ana, com apenas cinco anos, er