DANIEL NAVARRO
Me lembro claramente do dia em que Caroline saiu da minha vida. Ela estava linda, como sempre, mas seu olhar estava mais frio do que eu jamais imaginei possível. Carol, como eu a chamava, domina qualquer ambiente. Sua presença me atrai como um ímã, e sou incapaz de recusar o que ela quer ou de me afastar dela. Nosso relacionamento foi intenso desde o início, e talvez por isso, quando ela decidiu terminar, senti como se levasse uma facada. Não há explicação suficiente para justificar o fim. Não para mim.
Mesmo após aquele término tenso e as palavras afiadas que trocamos, algo em mim permanece preso a ela. Talvez seja uma mistura de orgulho e desejo. Mesmo depois de tudo, a ideia de reconquistá-la não me parece absurda. Eu ainda a amo e faria o que fosse necessário para tê-la de volta. Por isso, quando soube que ela estaria no casamento do meu irmão Lucas, decido que essa é a ocasião perfeita para reverter nossa história.
Lucas e eu sempre fomos próximos, embora nossas personalidades sejam bem diferentes. Ele é o equilíbrio e a calma; eu sou intensidade e impulsividade. De algum modo, somos opostos complementares, e o casamento dele é não só um motivo de orgulho para mim, mas também uma oportunidade. Caroline estará lá, e essa é minha chance de mostrar que segui em frente, que talvez ela tenha cometido um erro ao terminar comigo.
Desde que Lucas me contou sobre o casamento, um plano começou a se formar na minha cabeça. Sou determinado e meticuloso, gosto de tudo sob controle, e se quero algo, vou até o fim para conseguir. Além disso, minha presença costuma se destacar nos ambientes, seja pelo meu jeito direto, pela postura ou pela intensidade que exalo. Meus amigos já comentaram sobre meu "olhar penetrante" e sobre a maneira como meu terno sempre parece feito sob medida. E sei que esse ar de autoconfiança é algo que Caroline sempre admirou — e odiou — em mim.
Decidi, então, que, se quero fazer Caroline repensar o que jogou fora, preciso dar a ela uma razão para isso. Pensei em levar uma acompanhante que se passasse por minha noiva, alguém ao meu lado que me desse a segurança de mostrar a Caroline uma versão mais sólida de mim, sem as fragilidades que ela conhecia tão bem.
Comecei a procurar a "noiva" perfeita. Precisava de alguém que pudesse cumprir esse papel em um ambiente cheio de olhares atentos, antigos conhecidos e familiares. Depois de várias buscas, liguei para uma amiga que trabalha em uma agência de acompanhantes independente. Pouco tempo depois, ela me enviou a foto de uma possível candidata: "Lana".
Na primeira olhada, soube que tinha encontrado a pessoa certa. Lana é atraente, mas de uma forma diferente, sem exageros. Tem um porte elegante, uma beleza natural que chama atenção sem esforço. Seus olhos têm um brilho curioso, como se sempre houvesse algo a mais escondido ali. Tem cabelos escuros cacheados que emolduram o rosto com suavidade e um sorriso discreto, quase enigmático. Ela exala uma confiança silenciosa, mas perceptível.
Ela parece perfeita para o que preciso — alguém que possa me ajudar a manter a postura e o controle ao longo do casamento e, ao mesmo tempo, ser convincente o bastante para que Caroline sinta o impacto de sua presença.
Enquanto explico o plano a Lucas, mostro a foto de Lana. Ele observa a imagem com um misto de descrença e diversão antes de cruzar os braços e soltar um meio sorriso.
— Então, deixa ver se entendi — Lucas começa, cruzando os braços e tentando conter o riso. — Você vai contratar uma mulher para fingir que é sua noiva, só para provocar a Caroline?
— É um pouco mais complexo do que isso, mano. Não se trata só de provocar — rebato, sentindo a necessidade de convencê-lo. — Caroline precisa ver que ela não tem o poder de decisão sobre o que faço ou deixo de fazer. Se vê-la me deixa confuso, ter Lana do meu lado me ajuda a manter a postura. É... estratégia.
Lucas levanta uma sobrancelha, incrédulo.
— E você acha mesmo que isso vai funcionar? Que Caroline vai simplesmente correr de volta para você ao ver essa mulher ao seu lado?
— Se não funcionar, pelo menos terei tirado qualquer esperança da minha cabeça — admito, tentando soar mais confiante do que realmente estou. — E quem sabe, talvez sirva para que Caroline me enxergue de outra forma.
Lucas suspira, mas seus olhos têm um brilho contido de preocupação e, talvez, até um pouco de compreensão.
— Só espero que você saiba onde está se metendo, Daniel. Porque, ao que parece, Lana sabe exatamente onde está pisando.
Lucas se vira e sai, deixando-me com um pensamento que ele plantou e que não quero encarar. Espero até que sua silhueta desapareça pelo corredor e, ao verificar meu relógio, percebo que ainda tenho algum tempo até o encontro com Lana no hotel.
Sento-me à mesa, puxo o dossiê de Lana, feito pelo meu advogado. Sei que não é a atitude mais ética, mas também é minha garantia de que ela é confiável para desempenhar esse papel. Começo a folhear as páginas, e o que encontro é uma mistura de desafios e força que me chama a atenção. Uma jovem mulher, de vida complicada, mas extremamente resiliente.
Estudando o dossiê, uma foto dela olhando para a câmera com um olhar quase enigmático me fisga. Os detalhes do documento revelam o lado pragmático de sua vida: responsabilidades enormes para alguém tão jovem, uma irmã sob sua tutela e o peso de sustentar uma família sozinha. É o tipo de informação que, no papel, parece simples, mas, quando penso no que realmente significa, sinto um respeito estranho por ela. Tento não me apegar a detalhes desnecessários, mas, por algum motivo, aquele olhar nas fotos mexe comigo de um jeito inesperado.
"Foco, Daniel," murmuro para mim mesmo, fechando o dossiê e guardando-o na minha pasta. No fundo, sei que devo manter as coisas claras entre nós, estritamente profissionais. Mas algo sobre ela, que não consigo identificar com precisão, parece me desafiar, trazendo à tona uma curiosidade que não estou acostumado a sentir.
Fecho o arquivo, puxo meu paletó do cabide e me preparo para encontrá-la. No caminho para o hotel, reflito sobre meu plano e seus riscos, mas a ideia de ter Caroline de volta faz qualquer esforço valer a pena. Chego ao saguão antes da hora marcada e me sento em um canto discreto, aguardando sua chegada.
Então, o som de saltos altos ecoa pelo mármore do saguão, atraindo automaticamente meu olhar para a entrada. Lá está ela: Lana, em um vestido vermelho justo que realça sua postura e emana uma mistura de força e sensualidade. A suavidade de seus passos contrasta com a intensidade de sua presença; cada movimento parece calculado, mas seu olhar permanece sereno e confiante. Fico de queixo caído, impressionado com o quanto sua beleza e presença vão além de qualquer descrição que eu tivesse lido sobre ela.
Ela caminha até mim, mantendo uma leveza quase despretensiosa, mas há algo forte na forma como mantém a cabeça erguida, como se já soubesse o que está por vir. Meu coração acelera, e eu forço um sorriso controlado.
Quando nossos olhares se cruzam, tento recuperar o foco e, com a voz baixa e firme, apenas falo:
— Lana Martins? — Ela ergue o olhar e me encara por alguns segundos que parecem uma eternidade.
LANA MARTINSMeu coração b**e acelerado enquanto atravesso o saguão luxuoso do hotel, um lugar que raramente frequento. As paredes de mármore, reluzentes sob a luz suave, os candelabros elegantes, e os arranjos de flores impecáveis me intimidam. A mensagem da minha colega ecoa na minha mente: "Um empresário influente precisa de uma acompanhante para um evento importante." O pagamento prometido é suficiente para cobrir as próximas mensalidades do internato de Ana. Mais do que isso, representa uma oportunidade de estabilidade que não posso ignorar.Ao avistar o homem em um canto, sinto uma onda de atração por sua presença marcante e imponente. Seus cabelos escuros estão penteados para trás, de maneira elegante e impecável. A barba bem definida contorna seu maxilar, dando um ar sério ao rosto. Ele veste um terno preto que exala sofisticação e profissionalismo, complementado por uma camisa e uma gravata também pretas, mantendo um estilo clássico e discreto. Seu olhar intenso se fixa em mim
LANA MARTINSEnquanto tento organizar meus pensamentos naquela manhã de sábado, o toque da campainha me faz saltar. Corro até a porta e, ao abri-la, meu coração dispara. Daniel está parado ali, impecável em um terno escuro, com aquele leve sorriso enigmático que ele usa tão bem. Quase tropeço nas palavras, pega completamente de surpresa pela presença imponente dele na entrada do meu pequeno apartamento.— Como você... me encontrou? — Gaguejo, puxando a porta um pouco mais, tentando disfarçar o nervosismo e o constrangimento por estar usando um cropped decotado e revelador, absolutamente inapropriado para a ocasião.Ele ergue uma sobrancelha, como se a pergunta fosse desnecessária.— Você sabe que tenho acesso a informações sobre você, Lana — diz ele, com uma naturalidade que torna tudo ainda mais desconcertante.Respiro fundo, lembrando do dossiê que ele mencionou no nosso encontro no hotel. Claro, ele conhece cada detalhe sobre mim; Daniel é meticuloso demais para deixar algo ao acas
LANA MARTINSAssim que a porta da suíte se fecha, percebo que estou mergulhando em um mundo distante da minha realidade. Meus olhos vasculham o ambiente sofisticado: uma cama king-size rodeada por móveis modernos e imponentes, decorados em tons de creme e dourado. As amplas janelas se abrem para uma vista espetacular do oceano, o que aumenta a sensação de surrealismo.Respiro fundo antes de abrir o guarda-roupa, sentindo a antecipação misturada com um toque de nervosismo. Ali dentro, tudo parece cuidadosamente pensado para uma vida de luxo: vestidos elegantes, conjuntos casuais e peças finas que parecem saídas de catálogos de alta moda. Observando mais de perto, noto que cada roupa reflete alguém que eu ainda não reconheço — alguém que pertence a um mundo que conheço apenas de longe. O desconforto dá lugar a uma curiosidade misturada à empolgação.Ao alcançar uma prateleira no canto, encontro um conjunto de lingeries rendadas, delicadas e reveladoras. O rubor sobe em meu rosto ao perc
DANIEL NAVARROÀ medida que o sol se põe e o céu ganha tons de laranja e roxo, levo Lana para se juntar à minha família em um ritual à beira-mar, realizado ao redor de uma grande fogueira. A cerimônia é simples e profundamente conectada à cultura local, simbolizando a união e o amor eterno. Ao meu lado, ela tenta parecer à vontade, mas seu olhar vigilante em Caroline a deixa inquieta.Minha família e os amigos estão relaxados, rindo e compartilhando histórias, mas percebo que Lana nota como Caroline sempre encontra uma maneira de se aproximar ou provocar de forma sutil, disparando comentários disfarçados que a fazem questionar cada uma de suas respostas.— Então, Lana... Como você e Daniel se conheceram? — Caroline pergunta, sorrindo como se fosse uma conversa casual.Lana é pega de surpresa e hesita por um segundo antes de responder:— Nos conhecemos em um evento, e desde então soubemos que algo forte nos conectaria.Caroline ergue uma sobrancelha, claramente não convencida. Sinto o
LANA MARTINSNo dia seguinte, o sol brilha alto e a brisa fresca do mar traz uma sensação renovadora. O ar parece limpo, fresco, mas, ao mesmo tempo, algo em mim está turvo. Caminho pela área da piscina, onde vejo Daniel conversando com Lucas e Caroline. Ela se aproxima com aquele sorriso fácil, colocando-se ao lado dele de forma casual, mas excessivamente próxima. Cada risada dela é acompanhada de um toque no braço de Daniel ou um sorriso provocador - gestos que deixam claro o que ela está tentando fazer.O que aconteceu na noite anterior ainda está martelando em minha cabeça. Só de pensar no toque de Daniel, uma onda de calor se espalha pelo meu corpo, seguida de vergonha. Tento ignorar a sensação estranha que cresce dentro de mim, mas a irritação começa a se intensificar. O que estou fazendo aqui? Não é para eu sentir nada, mas a maneira como Caroline monopoliza a atenção de Daniel me incomoda profundamente. Respiro fundo, tentando me lembrar do porquê de estar ali: é um trabalho,
LANA MARTINSEncaro o nascer do sol pela pequena janela da minha sala, o céu tingido de tons alaranjados e rosados. Cada amanhecer me traz um misto de esperança e inquietação, porque, a cada dia, meu caminho parece mais distante do que eu sempre sonhei. Esse pequeno apartamento, que um dia representou o começo da minha independência, agora é só uma lembrança amarga do que a vida poderia ter sido.A campainha toca de repente, e o som estridente ecoa pelo apartamento, me fazendo parar no meio da sala, com os olhos fixos na porta. Ainda é cedo, e eu não estou esperando visitas. Olho para Ana, que brinca no chão com uma boneca de cabelos encaracolados, tão absorta na brincadeira que mal nota o barulho. Respiro fundo e abro a porta.Do outro lado, está uma mulher baixa, de óculos retangulares e um olhar frio, segurando uma pasta de documentos firmemente contra o peito. O coque impecável e o terno cinza-escuro a tornam ainda mais severa. Ela me observa como se já soubesse exatamente o que va
LANA MARTINSEnquanto me maquio, minha imagem reflete no espelho da pequena penteadeira. Meus olhos, grandes e profundos, trazem uma expressão endurecida, como se tivessem aprendido a carregar muito mais do que alguém de vinte anos deveria. Meus cabelos encaracolados, agora presos em tranças apertadas, caem em torno do meu rosto, destacando as maçãs do rosto marcantes. Mas, por mais que tente me concentrar, as lembranças do acidente me perseguem sem piedade nesta noite silenciosa. Sentada aqui, ancorada na minha realidade, me perco no passado, revivendo o momento que mudou tudo.~ Flash On ~Naquela época, eu ainda trabalhava como garçonete e, apesar dos meus dezenove anos, todos me consideravam responsável e comprometida, mas, acima de tudo, ansiosa para melhorar de vida e ajudar minha família. Minha rotina era simples, quase previsível, entre a casa e o trabalho, e meu maior desejo era um futuro tranquilo ao lado dos meus pais e de Ana, minha irmãzinha.Ana, com apenas cinco anos, er
LANA MARTINSÉ uma manhã cinzenta e fria, e estou atrasada. Mais uma vez. Acelerar a respiração e os passos já se tornou um hábito nas manhãs em que consigo visitar Ana. Cada segundo no internato parece insuficiente; os minutos escapam antes que eu realmente possa aproveitar sua companhia. Ver Ana, mesmo por tão pouco tempo, é tudo para mim. Essa visita, por mais breve que seja, renova meu propósito.Ao entrar pelo portão do internato, avisto Ana brincando na quadra com uma bola de borracha. Assim que me vê, ela corre e pula no meu colo com um sorriso iluminando o rosto.— Lana! — Ela me abraça com força, os olhos brilhando de alegria.— Minha pequena! Como você está? — pergunto, sentindo um misto de felicidade e tristeza. Por mais que queira levar Ana de volta para casa, sei que essa é a única forma de garantir sua segurança.— Estou bem! A professora disse que sou a melhor em desenhos da turma. — Os olhos de Ana brilham de orgulho, e ela me puxa até a parede onde alguns desenhos estã