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Capítulo 2 — Sombras Abissais

A sombra penetrava fundo nela, rompendo a tanga de folhas, invadindo seus poros como ondas de éter, despertando sensações fluidas que se espalhavam sob a pele. Ao longe, tambores batucavam em compasso irregular, ecoando cada vez que aquilo — formas sem rosto, tentáculos de trevas — deslizavam pelas coxas da jovem. Toques simultaneamente suaves, gélidos e provocantes. Vinham agora pelos quadris de Yara, desafiando-a a distinguir prazer de ameaça no mesmo arrepio.


O vento sussurrava entre as árvores do refúgio de Ceiba, carregando consigo um lamento ancestral. As folhas tremulavam em uma melodia silenciosa, reverberando o peso de tempos imemoriais, conforme a presença da guardiã das árvores sagradas pairava sobre aquele santuário oculto.

Tupã estava deitado sobre um leito de musgo, o corpo envolto por curativos feitos de raízes trançadas e folhas embebidas em bálsamos curativos. A dor ainda pulsava sob sua pele, uma lembrança cruel do cerco que quase o levou à morte. Cada respiração era uma luta entre sua alma e o mundo físico, uma batalha interna que ele não sabia se venceria.

Ele fechou os olhos por um momento, tentando silenciar a tempestade dentro de si. Mas então, a lebre chegou.


A pequena criatura surgiu da penumbra da floresta, movendo-se em saltos graciosos até parar diante de Ceiba.

A guardiã inclinou-se levemente, seus longos cabelos trançados tocando o chão coberto de folhas. Seus olhos dourados — tão antigos quanto a própria terra — se fixaram na lebre, ouvindo o que só ela podia compreender.

Então, sua expressão mudou.

Uma sombra se espalhou sobre seu rosto, algo sombrio e grave, ao que ela virou-se para Tupã, seu olhar como raízes perfurando a terra.

— A escuridão tomou o que mais amas — disse Ceiba, sua voz ecoando como um trovão distante.

O coração de Tupã parou.

— O quê? — A palavra saiu rouca, carregada de uma incredulidade que se transformava em desespero.

Ceiba se aproximou, cada passo ecoando entre os troncos ancestrais.

Yara foi apanhada pela noite viva. Naaldlooyee a reivindicou para si. As sombras a devoraram e agora ela jaz em um abismo que nem mesmo a luz ousa tocar.

O mundo de Tupã se despedaçou.

Por um instante, tudo ao seu redor se tornou um borrão. O som das árvores, o farfalhar do vento, a pulsação da floresta — tudo pareceu distante, como se o tempo tivesse parado no momento exato em que aquelas palavras foram pronunciadas.

Ele tentou se erguer, mas um choque de dor rasgou seu peito. Sua respiração falhou, os músculos falharam, e ele caiu de volta ao leito, o suor frio cobrindo sua pele.

— Eu preciso ir até ela — murmurou, o desespero transbordando em sua voz.

Ceiba, no entanto, não se moveu.

E como pretendes fazer isso? — Sua voz era serena, mas havia algo feroz em seu olhar. — Teu corpo mal se sustenta. O caminho até o Senhor das Sombras não é uma trilha para um guerreiro quebrado. É uma jornada para um espírito disposto a perder tudo.

Perder tudo.

Tupã cerrou os punhos, sentindo as unhas cravarem em sua palma. Ele já havia perdido tanto. Seu povo, sua paz, sua liberdade. Mas Yara? Não. Isso ele não podia perder.

— Mostre-me o caminho — ele exigiu, sua voz como pedra rachando.

Ceiba inclinou a cabeça, estudando-o como se tentasse enxergar além da carne e dos ossos, até a essência de sua alma.

O caminho ao Lorde das Sombras Abissais não é trilhado com pés — disse ela, sua voz um sussurro entre as folhas. — É trilhado com escolhas.

Tupã respirou fundo, ignorando a dor. Ele já havia feito sua escolha.

Mas, então, algo dentro dele hesitou.

E se ele falhasse?

Seu corpo ainda estava frágil. Seu espírito, abalado. Ele não era mais o guerreiro imbatível que se movia como o vento e golpeava como o trovão. Ele era um homem ferido, quebrado.

E Yara estava além do véu do mundo, nas garras de um ser que moldava a própria escuridão.

Tu duvidas — Ceiba constatou, seus olhos penetrando sua alma.

Tupã fechou os olhos, os dedos crispando sobre o leito de musgo. Sim, ele duvidava. E odiava admitir isso.

Mas ele também sabia que não tinha outra escolha.

Mesmo que eu duvide, eu irei.

Um sorriso triste dançou nos lábios de Ceiba.

Então prepara-te, filho da tempestade. Pois as Sombras Abissais não perdoam aqueles que ousam desafiá-las.

E, naquele momento, Tupã intuiu que sua jornada não seria apenas para resgatar Yara.

Seria, talvez, para enfrentar algo que ele temia encarar desde o início: a verdade sobre si mesmo.

E se, no final, não houvesse mais um Tupã para retornar?

O vento uivou entre as árvores, conforme as sombras da floresta começavam a se agitar.

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