Narração Diana
Tae é o nome dele.
Quando eu vi aquela beldade se mudar para o apartamento ao lado, não imaginei que teríamos tanto contato.
Ele era um gênio do basquete. Fez 8 cestas seguidas de 3 pontos na seletiva. Nem se esforçou. Ele fazia parecer que era fácil.
Eu só olhava e admirava. Suspirava.
Certas coisas nunca serão nossas.
Uns nasceram para brilhar, outros para as sombras. Tae nasceu para iluminar mais que o sol com seu sorriso. Ele fazia uma cesta e soltava uma risada tão linda e gostosa que todas as torcedoras morriam de amor. O treino começou a encher de mulheres inesperadamente. Cada cesta dele era uma euforia. Uma querendo gritar mais alto que a outra.
— Tae, quer ser o pai dos meus filhos?! — Uma louca gritou. O nome dele ficou conhecido depressa. Já tinham circulado o Instagram dele em vários grupos da faculdade.
Elas iam assustar o garoto e ele ia voltar para a Coreia do Sul, certeza. Aliás, investigaram a vida dele, parecia ser de uma família poderosa.
Eu assistia a seletiva da arquibancada, esperando o dia que faria parte daquele grupo. Fazia minhas anotações como se fosse realmente monitora do time de basquete. Pinheiros era o nome do time. Achei péssima a ideia, mas era o que alguém 80 anos atrás inventou quando criou o centro esportivo dessa universidade.
Assistir aos treinos do time em que meu irmão jogou tinha sido a maneira que eu tinha encontrado de me aproximar de Bernardo, e costumava ser um momento que eu dividia apenas com ele, não com essas loucas.
As líderes de torcida faziam seus números, mas volta e meia paravam tudo para gritar o nome do coreano marrento que fazia cestas.
Tae coçou a cabeça, encabulado. Ele não era do tipo envergonhadinho, mas aposto que as coreanas não eram tão eufóricas assim. A risadinha que ele soltou ao ouvir os elogios valeu a pena para todo mundo. E a cada cesta nova ele era idolatrado.
Em algum momento Tae foi derrubado no chão. Meu Deus, xingaram até a avó do cara que o derrubou: Everton. Coitado do Everton. Mandaram ele para tudo que era lugar. As mulheres queriam matá-lo, e o ameaçaram.
Depois do jogo, pelo menos doze garotas se ofereceram para secar o rosto de Tae com suas toalhas, pediram o telefone dele. Ouvi Tae falando que não tinha celular. Mentira, ele usava para escutar seus fones, eu mesma tinha visto. Ele tinha Instagram, então estava mentindo porque deve ser muito introspectivo.
O treinador não permitia treinos abertos, principalmente uma seletiva, os novatos poderiam ficar nervosos e não dar o melhor de si. Só que, como sempre ficava vazio, ele nunca se importou, mas agora estava uma festa da uva. O treinador Montanha logo esvaziou o ginásio, e fomos enxotados.
— Ei, esse menino é da sua sala, não é? — Perguntou-me uma das líderes de torcida ao sair. Amanda o nome dela. Loira, alta, peituda, linda. Sempre exibia suas pernas perfeitamente lisas. Ela não era magra sem graça como eu, era uma magra definida e elegante. Ela nunca falou comigo, apesar de sempre me ver ali, e ela me conhecia porque sua melhor amiga, Hannah, já foi muito próxima a mim.
— Sim. — Respondi. — Mas, de onde nos conhecemos?
— Bem, eu vi você saindo da sala dele. Mas, agora nos conhecemos. Amanda, prazer.
Ela me ofereceu a mão para apertar.
— Diana. — Falei, desconfiada, apertando a mão dela com certa incredulidade. Uma líder de torcida fazendo amizade com uma pessoa simples e normal da faculdade? Muito estranho.
Muito estranho tudo isso. Tae: um estudante intercambista, jogador de basquete, colírio para os olhos de todas as meninas (e dos meninos, também) já estava provocando milagres. Ele é tudo.
E eu sou só a estúpida que não consegue amigos porque não se destaca em nada. Que tem que limpar a sujeira dos amigos no apartamento porque não sabe se impor, que mora ao lado do garoto mais bonito que já viu na vida, mas que nunca disse bom dia a ele.
Suspirei.
Ouvi que Tae passaria 1 ano aqui no Brasil para conseguir duplo diploma. Seria o ano mais lindo da minha vida podendo vê-lo todo dia. Foi o que pensei.
O universo deve ter rido de mim quando escolheu colocá-lo na minha turma de engenharia de produção.
Devia ter umas 60 pessoas na sala, é claro que ele nunca sequer me olhou. Acho que ele não sabe nem quem são seus professores, está sempre dormindo. Mas por que tão lindo?
Aquele lindo cabelo liso.
Aquele queixo forte.
A voz...
Meu Deus, não deixa eu me apaixonar.
Tae nunca me notou. Isso, de certa forma, era bem cômodo para mim. Eu jamais conseguiria dizer "oi" a ele, observá-lo escondida nas trevas era muito mais confortável. Imagine só: ficar na mira daqueles lindos olhos castanhos e brilhantes. Eu ficava nervosa e sem ar só de imaginar.
Semanas se passaram.
Amanda me visitava quase todos os dias no começo, mas depois que viu que Tae dormia a aula toda, seu interesse na minha amizade foi se esgotando. Ainda bem, porque ela só conversava sobre Instagram e futilidades.
O resultado da incrível performance de Tae não podia ser outro: foi convidado a entrar na equipe de Pinheiros e surpreendeu zero pessoas.
Enquanto isso, a cada treino eu me apaixonava mais. Ele tinha uma magia ao redor. As carinhas que ele fazia. Seu sorriso. A forma que ele mordia os lábios. Cada vez que ele marcava pontos eu sentia mais vontade de beijá-lo.
Eu e a imensa torcida que ele criou. Antes era só eu na torcida, esperando o treinador Montanha falar comigo. Agora o ginásio estava ficando cheio, parecia final dos interescolares.
O treinador alterou o horário dos treinos para que a multidão não se acumulasse. E, bem, como eu assistia aula com Tae, quando ele tinha tempo para treinar eu também tinha.
Eu tirava fotos dele mesmo sabendo que ele tinha redes sociais, pois eu não tinha, e não bastava vê-lo durante a aula ou no basquete. Eu precisava ficar olhando as fotos dele antes de dormir. Isso me dava paz.
A última foto saiu desfocada e sem brilho, mas ele estava tão lindo.
Foi quando beijei aquela foto que percebi de novo o quanto eu estava apaixonada.
Minha admiração por ele todos os dias não foi nem mesmo notada por ele. Quer dizer, eu estava stalkeando ele mesmo, verdade seja dita.
Ele dormia durante todas as aulas, eu tinha diversas fotos cômicas desses momentos. Ria sozinha no apartamento enquanto Mari perguntava do que eu tanto ria.
Pela enésima vez fui assistir sua partida de basquete. Tae nunca olhava para a plateia e o treinador me permitia pelo menos assistir, já que nunca ia ser parte da equipe.
Peguei meu celular e tirei mais uma foto de Tae.
Fiquei passando o dedo pela foto. Tão lindo.
Espere.
Ele viu a foto. Ele olhou para a câmera.
Meu Deus. Estava com flash.
Saí correndo dali rapidamente.
Quando o jogo acabou, fui falar com o técnico. Eu estava há exatos 11 meses tentando ser assistente e nada.
— Você precisa melhorar suas notas. — Disse o treinador Montanha. — Não posso te dar uma tarefa extra se você tem dificuldade com as disciplinas regulares.
— É porque não sou gostosa como as líderes de torcida! — Falei, finalmente, o que estava engasgado em minha garganta. Nunca tive tanta coragem em toda a vida. O treinador deu de ombros. Eu estava certa, pois nenhuma das monitoras era conhecida por ser a melhor da turma.
Quando saí da sala do treinador, após desistir do meu sonho, quem eu encontro logo em seguida?
Kim Tae. Sim, eu sabia o sobrenome dele depois de espiar na lista de presença.
Não parecia estar nem um pouco feliz.
— A foto. — Ele disse, direto ao assunto. A voz dele me assustou, era muito cortante e gelada. Seu sotaque tinha sumido um pouco desde a última vez em que ouvi sua voz na aula.
— D... Do que... Do que está falando?
Ai, Deus. Aqueles olhos. Admirei-o mesmo quando ele queria me matar. Então ele colocou uma mão na cintura e a outra me estendeu esperando algo. Ele queria o celular.
Coloquei na mão dele sem pensar duas vezes. Eu sou muito burra.
Ele ficou ainda mais zangado.
— Desbloqueie.
Eu o fiz. Tão cadelinha! Ele vasculhou muito pouco da minha galeria e encontrou sua foto. Apagou-a imediatamente, e colocou o celular de volta em minha mão.
Ele devia estar bem acostumado com assédio e crimes virtuais com sua foto.
Eu me senti um lixo.
Mas, de toda forma, eu estava errada em fazer o que fiz.
Ele foi embora total e completamente arrogante, parecendo ter feito um favor à humanidade.
Suspirei de novo.
Todo dia uma derrota nova. Socorro.
Aquela situação me deixou completamente abalada. É a segunda vez que trocamos palavras e ele já quer me eliminar da face da Terra.
Sofri tanto, mas tanto! Eu era apaixonada platonicamente por ele e ele me trata assim? Eu precisava parar de stalkeá-lo e segui-lo.
Foi então que tomei uma decisão. Eu sempre imprimia todas as fotos dele e as apagava do celular para evitar que algum parente ou colega visse. Eu ia queimar todas essas fotos.
Enquanto corria pelo corredor dos armários, Hannah - a líder de torcida e ex-namorada do meu falecido irmão - me viu correndo. Ela me odiava. E provou isso quando estendeu o pé na minha frente.
Tropecei e caí.
Na queda, meu caderno escorregou da minha mão. Todas as fotos de Tae que eu guardava com todo o carinho voaram pelo ar. Os milhares de sorrisos dele que consegui captar com a câmera do meu celular se espalharam como confetes ao vento.
As fotos caíram pelo chão lentamente, enquanto todos olhavam aquele absurdo.
Silêncio total até a última foto dele serpentear no ar com um trajeto difuso e se depositar aleatoriamente no chão. Foi justamente a foto da comemoração da última cesta que ele fez na sexta-feira passada.
Tinha uma dúzia de estudantes que pararam suas rotinas para me ver estatelada, de barriga colada no chão.
O silêncio se quebrou com uma risada violenta de Hannah.
— Ela é apaixonada pelo Tae! — A risada dela iniciou um coral de gargalhadas escandalosas.
Hannah pegou uma das fotografias e começou a exibi-la a outras pessoas, me ridicularizando.
— Vejam isso! A pata choca é apaixonada pelo cara mais bonito da faculdade!
As pessoas começaram a rir e a apontar o dedo na minha direção.
— Ridícula! — Falavam de mim.
— Que sem noção! — Gritaram.
— Não é aquela idiota que tenta há dez anos entrar para a secretaria de basquete?
— Ela acha que é uma líder de torcida?
— Meu Deus, que garota tosca!
— Está achando que estamos no High School Musical?
— Nojenta.
Risadas.
Muitas risadas.
E quem chegava perguntava o que aconteceu e quando descobria, ria também.
Eu tentei pegar todas as fotos, mas as pessoas as afastaram de mim e as risadas se multiplicaram. Peguei todas as minhas coisas que consegui, e saí correndo, incapaz de ouvir meus próprios soluços no meio de tanta zombaria.
NarradorTae atendeu ao telefonema da mãe, Jieun, enquanto mastigava uma torrada que Shimin, seu irmão querido, preparou com todo o carinho.— Está tudo bem, Tae? — Ela perguntou, em coreano, e Tae respondeu no mesmo idioma:- Claro, mãe.- Seu irmão disse que está se destacando no basquete.- Meu irmão fala demais - Tae lan&c
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Narração DianaTae entregou o microfone a alguém, reposicionou o holofote ao seu local de origem e desceu do palco. É claro que ninguém desgrudou os olhos dele. Eu estava completamente em choque depois de sentir aquela luz e todas as atenções sobre mim. Não movi um dedo, nem conseguia respirar. Ele veio andando em minha direção, cada passo dele provocava mil palpitações em meu peito. Tae pegou educadamente a minha mão e a beijou.Não se ouvia uma cigarra naquele momento.Seus olhos reluziram um brilho inexpressivo por baixo daqueles cabelos pretos.Tae sorriu. Tinha algo em seu doce sorriso que me fez duvidar de sua inocência. Não sei exatamente o que era. Não, n
NarradorShimin acordou sentindo o cheiro de ovos. Ele jamais imaginou que seu irmão prepararia uma saborosa refeição assim tão cedo, Tae tomava café na cafeteria apenas. Porém, quando chegou à cozinha, viu que Tae lia o jornal pacificamente enquanto a luz dourada da manhã entrava pela janela. Uma xícara de café liberava uma fumaça quentinha da caneca de Tae.— Você contratou outra empregada, Tae? — Shimin perguntou, vendo alguém no fogão, e sua voz fez Diana olhar para trás. As olheiras intensas de Diana fizeram Shimin dar quatro passos para trás — V... Você? O que Diana está fazendo no nosso apartamento a essa hora?— De onde a conhece? — Indagou Tae, levantando uma sobr
Narração DianaVoltamos à sala.Quando fui sentar em minha cadeira, Tae apontou com o indicador o espaço ao seu lado.Não. Ele não ia me fazer arrastar cadeira no meio da aula.Fingi que não entendi e virei para o quadro. O professor explicava a matéria sem nenhuma vontade de viver, assim como eu.Recebi uma mensagem no WhatsApp e já sabia quem era.Deus, faz ele parar.“senta aqui” Tae disse.“depois dessa aula eu troco a cadeira de lugar, por favor”
Narração DianaAssim que chegamos ao estacionamento do prédio, toda vez que alguém passava perto da gente no percurso até o apartamento dele, Tae segurava minha mão. Mas, era só ficarmos sozinhos que ele se afastava de mim e andava à frente.Tentei dar uma de maluca e escapar para meu apartamento quando chegamos ao nosso andar, o sétimo, mas Tae me puxou para o seu pelo braço.Quando entrei lá, vi que o apartamento estava impecavelmente organizado e limpo. Ele aparentemente tinha chamado a empregada ultimamente. Então, o que ele queria comigo?— Tire meu casaco. — Ele falou, seco, assim que fechou a porta. Bem, se eu não reivindicasse muito, talvez ele parasse de ter ideias mir
Narração DianaSim, eu agora sou parte da equipe.Sou eu quem apita o início do treinamento e o fim. Claro que não é toda vez, e que trabalho com as assistentes mais velhas, de outros anos. Todas são de cursos diferentes, e são as maiores fãs da equipe. Dizem que as assistentes têm mais amor à camisa que os jogadores.Fiz amizade com Julieta, uma garota fofa, baixinha e simpática que me ensinou tudo, inclusive procedimentos básicos de massagem e todas passamos por um cursinho de primeiros-socorros. As listas de telefones estavam sempre disponíveis e fomos instruídas sobre como e quando ligar para a polícia, SAMU, dedetização e etc.O treinamento de combate a inc&
Shimin deu um pulo de dois metros depois de derramar o chá quente em sua próprioa perna, e eu peguei um pano para ajudá-lo a limpar e minimizar as dores.— Soobin está aqui? — Shimin murmurou, ignorando a dor da queimadura, enquanto eu pressionava o pano de prato insistentemente contra sua perna.— Sim. Eles discutiram no vestiário, eu soube. — Claro que eu não diria que ouvi tudo de fofoqueira que sou.— Sabe, ele é um primo de Tae. Eles eram muito próximos quando eram mais novos, mas... Por algum motivo se estranharam depois de adultos.Como assim por algum motivo? Esclareça melhor isso aí.— Sinto muito. — Falei,