Narrador
Shimin acordou sentindo o cheiro de ovos. Ele jamais imaginou que seu irmão prepararia uma saborosa refeição assim tão cedo, Tae tomava café na cafeteria apenas. Porém, quando chegou à cozinha, viu que Tae lia o jornal pacificamente enquanto a luz dourada da manhã entrava pela janela. Uma xícara de café liberava uma fumaça quentinha da caneca de Tae.
— Você contratou outra empregada, Tae? — Shimin perguntou, vendo alguém no fogão, e sua voz fez Diana olhar para trás. As olheiras intensas de Diana fizeram Shimin dar quatro passos para trás — V... Você? O que Diana está fazendo no nosso apartamento a essa hora?
— De onde a conhece? — Indagou Tae, levantando uma sobrancelha, indignado.
— Ela é nossa vizinha. — Shimin apontou para o apartamento ao lado.
— Eu sei disso, mas como você sabe disso? — Tae não gostou.
— Como eu não saberia? — Shimin achou melhor se sentar e tomar um gole de café enquanto lhe explicavam a atual conjuntura. — Foi muita bondade sua fazer nosso café da manhã, Di...
— Sem conversinhas. — Disse Tae, sem desgrudar os olhos do jornal. Todo dia aprendia palavras novas por meio das notícias. — Diana agora é minha namorada e somente eu posso falar com ela.
— Isso é ridículo. — Shimin quase deu dois mortais para trás. — Só porque ela é sua namorada ninguém pode falar com ela?
— É. — Tae falou como se fosse a coisa mais normal do mundo.
— Diana, você concorda com isso? — Shimin perguntou, metendo o dedo indicador na mesa.
— Sim. — Diana se virou, respondeu mecanicamente e finalmente colocou os pratos na mesa. Ovos com gema mole. Tae abriu um lindo sorriso, da mais pura alegria, enquanto Shimin parecia estar vendo uma fratura exposta.
— Isso é inconcebível! — disse Shimin, em coreano. — Sua mãe vai saber disso!
— Não se meta. — Tae respondeu em coreano, levantou-se da cadeira e colocou seus jornais sobre a mesa, mostrando que a discussão chegou a um novo nível.
— Essa situação já passou dos limites, Kim Tae! Você está doente e precisa se tratar.
— Está com inveja de mim porque eu tenho uma namorada.
Shimin colou o rosto ao de Tae, que permanecia impassível e arrogante, erguendo uma sobrancelha.
— Vai se foder! — Shimin virou as costas e foi embora. Apesar de muito amoroso e atencioso, o mais velho tinha muito firme sua noção de certo e errado e lutava pelas suas certezas até o fim. Ele era incorruptível.
— O que discutiram? — Perguntou Diana, tirando o avental.
— Besteiras. — Tae murmurou e sentou-se à mesa novamente. — Sente-se e coma comigo.
Diana assentiu. Estava seguindo a cartilha corretamente porque queria ver como seria o dia seguinte. Só de pensar em parar com o bullying já lhe dava alegria de viver.
Narração Diana
Eu me sentei à mesa.
Até agora foi simples: lavar a louça e fazer ovos fritos e café. Se fosse sempre assim eu estava no lucro, dependendo da performance dele. Eu estava cumprindo minha parte e esperava que Tae fizesse a dele.
Porém, infelizmente eu vou passar o dia todo com ele na faculdade, o que vai permitir que ele me faça um zilhão de pedidos toda vez que ficarmos a sós.
Ignorei completamente a discussão dele com Shimin, porque não entendi nada. Tae pegou seu jornal e voltou a lê-lo, desprezando o surto do irmão, também.
Eu bugava algumas vezes, tentando entender o esquema de Tae. Peguei o garfo e olhei para ele, esperando sua aprovação. Ele assentiu e eu comi os ovos. Coloquei a mão na xícara de café e ele assentiu novamente. Daí eu bebi.
— Isso é muito chato. — Falei. — Não é possível que eu tenha que pedir permissão para tudo.
— Tem razão. — Ele murmurou, colocando o jornal ao lado — Se continuar assim, vou me apaixonar por você rápido demais.
Eu me engasguei com o café naquele momento. Então era isso? Ele queria ser idolatrado, mesmo?
— Eu já fiz três coisas por você. — Falei ao me restabelecer do engasgamento, enquanto Tae nem tirou o rosto da xícara me ouvindo morrer ali. — E você só fez uma por mim.
— Que três coisas você fez? — Ele perguntou, indignado.
— Beijei sua mão... Fui dormir na hora que você mandou... E vim fazer seus ovos.
— Foi dormir na hora que eu mandei? — Tae riu, sarcasticamente. — Você foi dormir 1:06 da manhã de acordo com sua última visualização no WhatsApp. Eu te mandei dormir meia noite e dez. Você não me obedeceu. — Ele estava irritado.
— Então são duas coisas. E você só fez uma por mim.
— Que valem por 10. Tive que falar que você é minha namorada na frente da faculdade inteira. Você me deve o ano inteiro de cafés da manhã.
— Sou assim tão feia e desengonçada a ponto de isso ser um sacrifício para você?
Ele voltou a ler o jornal, ignorando minha reivindicação.
— Já chega. — Eu me levantei da cadeira e joguei o guardanapo na mesa. — Esqueça o acordo.
Peguei minha mochila e abri a porta do apartamento dele. Não ligo para mais nada.
— Diana, volte aqui imediatamente! Eu não permito que você saia! — Tae apontava para o chão, como um dono quando ordena ao cachorro que fique junto. — Todos vão saber a verdade!
— Assim você me poupa o trabalho. — Falei enquanto fechava a porta.
Por que eu passei o caminho todo me sentindo a errada da história toda? Eu queria tanto me amar mais. Fui de ônibus para a faculdade. Claro que quando eu cheguei lá, Tae já havia chegado, afinal ele tinha um Fiat Toro. Mas, ele dormia no fundo da sala, para variar. Ignorante.
Nosso trato estava acabado e, para mim, podia cair um raio na cabeça coreana dele.
Fiquei o dia inteiro focada nos estudos. Na hora do almoço, as líderes de torcida me chamaram para comer, o que era estranho. Ninguém me chamava para comer.
Amanda, Hannah, e outras loiras que pareciam as paquitas tinham muita vontade de comer comigo e me perguntar tudo sobre Tae. No começo, foram bem simpáticas.
— Achei linda a declaração dele. — Disse Mel, referindo-se ao dia em que Tae falou do nosso namoro no meio da festa.
— Eu também. Acho que estaria morrendo de amores até agora. — Disse Luana.
— Desculpe ter parado de ir te ver na sua sala. — Disse Amanda, sorrindo amigavelmente. — Irei lá mais vezes.
— Estou tão feliz que vocês estão namorando, vocês combinam tanto! — Disse Hannah. — Desculpe ter te tratado mal todo esse tempo. Você nunca me fez nada, eu que fui rancorosa.
A igreja aplaude de pé. Um milagre aconteceu e Deus tocou no coração de Hannah. Vou até jogar na Mega Sena, pois estou com sorte hoje.
— Tudo bem. — Falei. Não, não estava nada bem, mas eu que não ia bancar a rancorosa. Almoçamos na cantina. As meninas comiam somente alface, e eu, tonta, para bancar a fina, comi só alface também.
Não deu dez minutos depois disso e eu já estava matando cachorro a gritos de tanta fome. Voltei para a minha sala. Aula de Álgebra Linear. Tae estava na porta da classe, como um vigia, com cara de poucos amigos, como sempre. Passei direto.
— Não ouse. — Ele falou, segurando a minha mão.
Olhei para ele como se fosse uma sujeira em meu sapato.
— Pensei que ia falar a verdade para todo mundo. Por que não o fez? — Perguntei, já com as ferraduras alinhadas.
— Eu perdoo sua rebeldia.— Ele disse. — Mas, você vai lavar minhas roupas com Vanish Crystal White.
— Eu já falei que não! — Minha voz saiu um pouco mais alta e Tae ficou inconformado com minha rebeldia.
— Então é assim? Você me usa dessa forma e agora quer cair fora? — Tae murmurou baixo e ameaçadoramente.
— Eu te usei? — Coloquei as mãos nas cadeiras. — Já chega, isso vai acabar. Escutem, todos! — Comecei a chamar a atenção de qualquer alma viva que passasse pelo corredor. — Vocês precisam saber! Tae e eu, na verdade....
Tae ficou sem reação. No impulso, para me calar, segurou meu rosto e selou meus lábios com um beijo de final de filme. Tenho certeza que as folhas das árvores rodopiaram ao nosso redor nesse momento e que tudo passava acelerado enquanto nós estávamos em câmera lenta. As pessoas ficaram olhando, extasiadas.
Até que o professor passou e viu a cena.
— Vocês vão ganhar falta. — Murmurou ele e entrou na sala, sendo seguido pelos alunos. Mas, o burburinho não acabou.
Nossos lábios se separaram, e foi doloroso para mim. Os lábios dele eram tão doces e macios, tão lisos que eu continuei com os meus entreabertos depois que nos afastamos. Fiquei muda, inconsolável.
Só se falava do beijo, e isso me despertou do transe.
— Você viu? Tae está completamente apaixonado pela Diana. — As pessoas comentavam.
— É verdade que eles vão se casar?
— Ela está grávida?
Tae não estava nem um pouco orgulhoso da atitude que tomou. Eu fiquei sem fôlego. Não foi meu primeiro beijo, mas com certeza foi o melhor de todos. Sim, já fui iludida no passado outras vezes, mas agora eu estava completamente prostrada por aquela pessoa.
Meu coração ficou quente e gelado ao mesmo tempo. As mãos dele seguraram meus ombros.
— Vai continuar tentando nos sabotar? — Ele perguntou. Eu estava sem reação, sem argumentos. — Não quer mais meus beijos? Nunca mais?
Eu precisava urgentemente organizar as minhas ideias. O beijo dele foi tão bom e me deixou tão extasiada e enlouquecida de amor que eu esqueci o motivo pelo qual desisti do plano.
— Que casal lindo. — Disseram. Quem via pensava mesmo que estávamos trocando carinhos.
— Ai, como eu queria ser amada assim! — Disseram. Diziam muitas coisas.
E eu estava adorando ser considerada a namorada dele. Eu não queria perder isso.
Eu aceito.
Aceito as migalhas.
Aceito ser a cachorrinha dele. Por quanto eu puder beijá-lo... e ficar perto dele...
Naquele momento estava decidido que eu faria qualquer coisa por aqueles lábios, até abrir mão do meu amor próprio e das minhas vontades.
Ainda que ele não sinta nem uma gota de sentimento por mim.
Ainda que ele me beije e não sinta nada.
Ainda que eu seja só um capricho.
Eu preciso de você, Tae.
Narração DianaVoltamos à sala.Quando fui sentar em minha cadeira, Tae apontou com o indicador o espaço ao seu lado.Não. Ele não ia me fazer arrastar cadeira no meio da aula.Fingi que não entendi e virei para o quadro. O professor explicava a matéria sem nenhuma vontade de viver, assim como eu.Recebi uma mensagem no WhatsApp e já sabia quem era.Deus, faz ele parar.“senta aqui” Tae disse.“depois dessa aula eu troco a cadeira de lugar, por favor”
Narração DianaAssim que chegamos ao estacionamento do prédio, toda vez que alguém passava perto da gente no percurso até o apartamento dele, Tae segurava minha mão. Mas, era só ficarmos sozinhos que ele se afastava de mim e andava à frente.Tentei dar uma de maluca e escapar para meu apartamento quando chegamos ao nosso andar, o sétimo, mas Tae me puxou para o seu pelo braço.Quando entrei lá, vi que o apartamento estava impecavelmente organizado e limpo. Ele aparentemente tinha chamado a empregada ultimamente. Então, o que ele queria comigo?— Tire meu casaco. — Ele falou, seco, assim que fechou a porta. Bem, se eu não reivindicasse muito, talvez ele parasse de ter ideias mir
Narração DianaSim, eu agora sou parte da equipe.Sou eu quem apita o início do treinamento e o fim. Claro que não é toda vez, e que trabalho com as assistentes mais velhas, de outros anos. Todas são de cursos diferentes, e são as maiores fãs da equipe. Dizem que as assistentes têm mais amor à camisa que os jogadores.Fiz amizade com Julieta, uma garota fofa, baixinha e simpática que me ensinou tudo, inclusive procedimentos básicos de massagem e todas passamos por um cursinho de primeiros-socorros. As listas de telefones estavam sempre disponíveis e fomos instruídas sobre como e quando ligar para a polícia, SAMU, dedetização e etc.O treinamento de combate a inc&
Shimin deu um pulo de dois metros depois de derramar o chá quente em sua próprioa perna, e eu peguei um pano para ajudá-lo a limpar e minimizar as dores.— Soobin está aqui? — Shimin murmurou, ignorando a dor da queimadura, enquanto eu pressionava o pano de prato insistentemente contra sua perna.— Sim. Eles discutiram no vestiário, eu soube. — Claro que eu não diria que ouvi tudo de fofoqueira que sou.— Sabe, ele é um primo de Tae. Eles eram muito próximos quando eram mais novos, mas... Por algum motivo se estranharam depois de adultos.Como assim por algum motivo? Esclareça melhor isso aí.— Sinto muito. — Falei,
NarradorTae ficou no corredor por um bom tempo, pensando. Diana estava muito esguia, provavelmente ficou bem magoada com ele.Todas as vezes em que ele fazia algo que a magoava, sentia-se momentaneamente saciado, e péssimo no segundo seguinte.E não mudava de atitude.O celular dele apitou. Mensagem de um número desconhecido em coreano: só podia ser Soobin.Certeza."Que saudades, primo. Estou grato à minha tia por me dar seu número. Vamos combinar de sair. Mande um abraço para Shimin."Tae entrou em seu apartamento e fechou a porta com tanta força que a janela tremeu. Bufava.
Narração DianaSoobin não me respondia desde o fora federal que dei nele ontem. Ficou dois dias sem aparecer no treino e eu fiquei preocupada com isso.Peso na consciência.Eu não podia dissolver a equipe assim. Meu trabalho era fortalecer os laços deles e contribuir para que a equipe ficasse mais unida.Sou uma péssima assistente.Mais uma vez olhei a nossa conversa e fiquei péssima. Talvez eu devesse ter abordado a situação de outra forma. Quer dizer, o que ele estava fazendo era errado. Mas, talvez, eu devesse neutralizá-lo em vez de agredi-lo com palavras, não sei.Estávamos na aula de desenho ge
Narração DianaEu estava toda contente com meu celular novo, muitas funcionalidades, câmera perfeita. Tae sorria ao me ver feliz.— Obrigada. Eu nem sei se deveria aceitar, é muito caro.— Eu quebrei o seu. — Ele disse, ansioso para me ver mexendo no brinquedo novo.— Era só consertar a tela.— Não gosto de dar presentes pela metade. — Ele disse.— Tudo bem. — falei, super feliz de verdade. Nem estava acreditando no presente que ganhei. Aquele celular valia muito mais que qualquer serviço que eu tenha feito a ele. Como funcionária de Tae, me senti recompensada pelo serviço abusivo
Narração Diana— O quê?! — Fiquei sem voz depois do grito que dei.— É isso aí. Tae é tão possessivo, calculista e ciumento que fez a primeira namorada ele se matar. — Soobin revelou.Aquilo era muito sério.Muito, muito sério.Soobin não poupou agressividade em suas palavras, e como consequência disso, minha voz sumiu. Não consegui falar nada, e eu esperava muito que não fosse uma mentira de Soobin. Na verdade, eu queria muito que fosse mentira.Confesso que foi forte demais para mim, eu precisava muito ir embora. Eu prec