Despertei com a porta do quarto abrindo, arrastando no chão desnivelado, fazendo um som infernal. Abri os olhos com dificuldade, ainda sonolenta. Sentei rapidamente ao ver o rosto de Daltro.Ele pôs o bebê sobre a minha cama e disse, com a voz aterrorizante e que me amedrontava sempre:- Cuide do bebê. Preciso trabalhar.- Que horas você volta?- Tem compromisso? – perguntou ironicamente – Voltar para seu castelo encantado com um carro cor de rosa na garagem?- Aqui é o meu castelo. – Debochei.- O que quer, afinal?- Quero saber o que foi feito do dinheiro que lhes dei.- Não é problema seu.- Quero saber onde está o seu irmão caçula, filho de Breno.- Não lhe diz respeito.- Quero saber quem é a família do bebê.- Ouvi dizer que ele tem o mesmo sangue que você. E que corre o risco de ser sua única herança Hernandez depois da morte da “vovó Anya”. – Debochou.- Me diga a verdade.- Você daria uma boa detetive. Pena que é idiota... E mulher.- Não sua concepção machista, mulheres não
- Bebê? – Gritei, em pânico, mas ele não dava nenhum sinal.O coraçãozinho batia acelerado. A respiração começava a ficar ainda mais ofegante. E as pálpebras se fecharam por completo.Saí correndo pelo corredor estreito, passando pela sala, abrindo a porta, sem tempo sequer de fechá-la. Corri pela rua e olhei a casa de Daltro ao final da rua. Já havia anoitecido. Certamente ele já tinha voltado da Delegacia.Segui com a criança nua nos braços, não conseguindo conter o choro, até chegar na residência. Abri o portão pequeno, que rangeu e adentrei na pequena varanda, com o chão de madeira grossa, nobre, brilhante de cera vermelha, talvez passada há pouco tempo, pois ainda tinha cheiro. O teto era muito alto, certamente o pé direito na parte de dentro da casa era duplo, devido ao telhado em formato triangular, com telhas individuais, escuras, de bom gosto, não destoando com a estética da casa.As paredes eram em madeira firme e lisa e estavam pregadas na horizontal. Embora a pintura não e
- Sinceramente, esperava que você fosse um pouco mais fácil.- De ser enrolada?- De se entregar a mim... De corpo... E alma. – Riu debochadamente.Engoli em seco e sentei-me no sofá branco claríssimo, sem nenhuma mancha ou vestígio de sujeira.- O que houve com Zeus? – Maíra retornou, vindo do andar de baixo, que ficava oculto para quem via a casa de fora. Trazia no colo a criança.- Zeus? – Olhei-a, confusa.- Meu filho.- Zeus? Ele é só uma criança! Como fizeram isso com ele? – Perguntei, incrédula.Quem tinha coragem de botar o nome de um recém-nascido de Zeus? Era preferível que tivessem o chamado simplesmente “Bebê” pela vida inteira.- O que houve com meu filho? O que você fez com ele?- O que “eu” fiz com ele? Você... Deixou seu filho naquela casa horrível, aos cuidados de qualquer pessoa... – Observei a criança no colo dela, parecendo melhor – Eu nunca cuidei de um bebê na vida. Como pôde fazer isso com seu próprio filho, um bebê?Ela tocou a testa da criança, que ainda se re
- Expliquei que ela me mantinha prisioneira. Havia me dado um tiro no pé e cegado meu olho com um pedrada. Mostrei o que fez com meus cabelos... E expus a forma como me tratava, enchendo-me de remédios e bebidas para amenizar a dor... Como pôde, filha de Salma? Minha neta, sangue do meu sangue... – ela começou a chorar – Tratar sua própria avó, idosa, deste jeito!- Você... É louca... Doente. – Não me contive.Ela riu:- Acreditaram em mim. Não sou convincente? – Olhou para Daltro.- Quem são vocês? – Perguntei, sentando-me no sofá, deixando meu corpo praticamente cair, incapaz de dar um passo sequer, de tanto que minhas pernas tremiam.- Foi Theo quem denunciou. – Hades afirmou – Ele deve saber tudo que acontece com a irmã amante aqui neste lugar. – Me olhou, querendo uma resposta.- E não foi no meu distrito. Fez a denúncia em outro.- Assim como fizeram a denúncia de maus-tratos contra as pestinhas. – Anya me olhou, tentando chegar na sala, a bengala deslizando no chão, fazendo um
Demorei a sair, encurtando os passos, esperando ouvir a resposta que ela daria.- Foda-se! Vocês são um bando de filhos da puta! – Foi o que ela disse.Era suficiente para mim. Ficar mais um minuto sequer dentro daquela casa me deixaria doente. Bati a porta e me fui pela estrada, em direção à “casa monstro”, incerta sobre o que fazer primeiro.Senti as lágrimas escorrendo pelo meu rosto e não sabia se era por tristeza de tudo que Anya foi capaz de fazer com a própria família ou felicidade por aquilo estar encerrado e eu poder finalmente voltar para casa e ver meus pais.Não importava quanto tempo eu passasse ali. Eu não era uma Hernandez. E jamais seria.Assim que me aproximei da casa, avistei o Tesla de Theo estacionado em frente. Comecei a correr, entrando no quintal sem me preocupar com o matagal que machucava minhas pernas.Lá estava ele, parado na varanda, em frente à porta. Assim que me avistou, correu na minha direção, o nosso encontro ocorrendo no meio do caminho.O abracei co
- Está nos sequestrando? – Perguntei, aturdida.- Por que não? – Riu, com escárnio.- Hades, você não faria isso. – Theo arriscou.Hades retirou uma arma detrás da cintura e olhou-a, despreocupadamente:- Sabia que Maria Lua me beijou?Theo me encarou, tentando falar de forma tranquila:- Se foi naquela vez... Ela me contou.- Eu poderia ter dormido com ela, como qualquer outro.- Mas não dormiu. – Theo afirmou.- Sempre foi uma vagabunda, como a mãe. – Hades me olhou.- Salma tentou ajudá-los... Da forma como pôde. Anya não deixou o dinheiro chegar a todos. Mas você foi um privilegiado, pelo que percebi. E tudo por conta da sua irmã.- Isso é loucura! – Theo pôs as mãos na cabeça – Precisamos encerrar isto de uma vez por todas, por favor. Eu sei que... Vocês não pensam em atirar em nenhum de nós, não é mesmo? – Puxou-me em sua direção, pondo-me para trás, tentando me proteger com o próprio corpo.Talvez eu devesse ter medo de Hades e Daltro. Mas eu não tinha. Não que duvidasse do que
- Não... Não posso! Meu pai não sabe nada sobre isto. Ele está doente... Por favor. – Implorei.- Maria, eu não estou brincando. – Afirmou, apertando ainda mais a arma contra minha cabeça.Incerta sobre a forma como agir, encontrei o contato de meu pai no celular de Theo e liguei.- Theo? Como ela está?- Pai? - Maria Lua? – a voz dele demonstrava preocupação.- Ponha no viva voz. – Daltro ordenou.- Estou pondo no viva voz, pai. – Avisei, antes que ele pudesse ser enganado.Hades apertou com tanta força o revólver contra minha cabeça que me desequilibrei. Pegou-me com violência pelo braço e me levou até a parede, próxima da janela, onde me recostou, com a testa escorada no tijolo gelado.- Acha que é esperta, sua vagabunda? – Sussurrou no meu ouvido.Gemi, amedrontada, com dor, incerta se sentia meus membros inferiores e superiores.- Maria Lua, acalme-se! – Pediu meu pai.Hades foi falando no meu ouvido, a fim de que eu fosse repassando para meu pai o que ele quisesse, tão baixo qu
- Ele está falando com... Não... Não seria a Maíra que eu conheço! – Balançou a cabeça.- Sim, é ela mesma, Theo. Maíra entrou na Simplicity para vigiá-lo e sabe tudo sobre nós.- Mas desde quando eles planejam esta porra?- Desde sempre, seu idiota! – Daltro foi quem respondeu.- Fiquem à vontade, crianças! – Daltro disse, sentando-se no sofá, tranquilamente.Fui em direção a Theo e o abracei. Queria conversar com ele sobre o fato de nosso pai saber tudo que estava acontecendo... Se não tudo, grande parte pelo menos. Mas não tinha como falarmos qualquer coisa sem que eles escutassem.- Hades, você tem noção de que está nos sequestrando? – Falei, soltando Theo e indo em direção a ele.- Isto não é um sequestro.- Se não nos deixa ir embora e pede dinheiro em troca de nossa liberdade, isso é um sequestro. – Theo respondeu.- Seu plano foi idiota, leviano e burro. – Daltro me encarou.- Que plano? Abrir mão da minha herança e vir morar com vocês, já que Anya alegava que o que queria era