Hoje médica

~~CAPÍTULO 2~~

CHLOE ROSS

Quando atravessei a entrada principal do hospital, eu percebi que hoje seria um dia daqueles, longo. Caminhei em direção elevador, a ala pediatra está no terceiro andar, nós ocupamos apenas dois andares, recepção, sala de espera, consultórios médicos, compartimentos de internação, UTI, farmácia e por fim, um pequeno jardim para as crianças brincar. Acima de nós funciona a maternidade, outros andares, alas cirúrgicas, UTI, salas de pesquisas, quartos luxuosos de internação compartimentos administrativos e direção, sala de reuniões e demais.

Entrei no meu consultório, quando o hospital entregou-me minha primeira sala, ele estava pintado de branco, uma sala sem expressão, fria, assustadora, como todos os hospitais públicos. Eu tive a ideia de montar papel de parede nas paredes em tom de vermelho e roxo, minhas cores favoritas. Passei a vida ganhando presentes e muitos presentes infantis, agora eu sou uma mulher e não preciso mais deles. Mamãe enviou-me quase todos os meus ursos, minhas bonecas de pano e livros infantis, mandei montar uma estante de vidro, onde eu organizei os ursos e bonecas de pano bem ao lado da minha mesa, o espaço que restou, montei carinhos e figurinhas de heróis da Marvel e Werner.

No centro, coloquei um tapete fofo, com alguns travesseiros, do meu lado esquerdo, coloquei 3 poltronas muito confortáveis, atrás da porta ao lado das poltronas coloquei uma cabeceira em cima 5 tabletes, enquanto meus pequenos pacientes esperam por resultados eles, assistem desenhos animados. A minha frente, no fundo da parede temos uma maca, a porta do meu lado direito, é o banheiro a porta do meu lado esquerdo é a copa.

Fui diretamente para o banheiro tirar o sapato alto e calçar sapatilhas, sempre tenho reservas de roupas no banheiro, estão bem limpas e muito bem conservadas, tenho uma copa, onde tem um micro-ondas, geleira, máquina de café, torradeira e lavatório. A maioria dos eletrodomésticos, eu comprei, eu preciso delas, eu comprei para suprir minhas necessidades, não ficarei culpando o hospital por isso e aquilo, eu sabia desde o início que nem todos os hospitais tem condições dignas para os médicos.

Eu escolhi trabalhar em um hospital público, onde as pessoas realmente precisam de ajuda, e há poucos médicos cuidando da demanda dos pacientes, onde você tem hora para entrar e não para sair.

— Bom dia doutora.

Eu ouvi minha companheira de trabalho dizer, ela é minha assistente, Leticia, auxilia-me no atendimento e agiliza os exames que peço, é bem produtiva e inteligente, somos jovens e isso facilita nossa comunicação sem criarmos um escândalo ou mal-entendidos. Sou a médica mais jovem deste departamento, o hospital chamou-me assim que submeti meus documentos, fui a melhor aluna da faculdade, mais de 4 hospitais entraram em contato comigo em Califórnia com diversas propostas de trabalhos. Entretanto, nada me prendia em Califórnia, eu sempre soube que meu destino estava condenado a viver longe de casa. Aqui estou. Numa cidade desconhecida, vivendo o que sempre sonhei.

— Bom dia, tomou café?

Eu questionei colocando meus óculos.

— Sim doutora, obrigada por perguntar, estas são as consultas de rotina de hoje, e há duas entradas, não especificaram o que os pacientes sentem.

Isso não é uma boa notícia.

— Vamos trabalhar com grau de emergência e não de chegada.

Ela assentiu, eu caminhei até a sala de espera e chamei todos aqueles que estavam à minha espera e os encaminhei para a sala de espera pediátrica. Não sou a única médica neste sector, mas o hospital faz questão de organizar a todos, seu paciente perto do seu consultório, nunca tivemos problemas com isso.

— Bom dia, primeiramente, fiquem sentados e não faça barulho.

Eu sorri olhando para os pequenos.

— Alguns pais conhecem o meu método de atendimento, primeiro eu atendo crianças em estado de emergência depois as consultas normais.

Afirmo.

— Por favor, mães com crianças em emergência.

Nenhum deles levantou a mão. Eu olhei para as crianças, algumas estavam brincando e outras no telefone. Mas, havia uma que chamou minha atenção, seus olhos estão profundos, muito brancos.

— Venha aqui baixinha.

Eu me ajoelhei para olhar porque os olhos da criança estão tão fundos.

— Minha língua arde, as vezes dói.

A menina disse lamentando-se.

— Aonde mais dói?

Eu arrastei os cabelos dela para verificar se estão saudáveis, eu sorri para pequena e levei ela para meu consultório.

— Nossa, quantos ursos.

Minha pequena paciente comentou, admirando a quantidade de ursos na minha estante.

— Você pode levar um depois.

Afirmei para ele usando luvas.

— Eu posso mesmo?

Ela questionou animada.

— Claro que sim.

Respondo, lentamente, eu tirei a camisa da menina, eu gosto de verificar os corpos dos meus pequenos pacientes, isso acontece depois que encontrei sinais de abuso sexual no corpo de uma criança, ela tinha apenas 3 anos, foi um choque total para mim. Nunca, nunca imaginei que um dia me depararia com essa situação. Encontro bolhas no corpo da criança e olhei para os pais estranhando que eles não tenham visto sua filha, muito menos mencionar na recepção o estado caótico dela.

— Seu corpo dói?

Eu questionei a pequena.

— Sim.

Abro a gaveta e tirei um kit de teste de sífilis, eu tirei um pouco de sangue dela, em seguida tirei toda a sua roupa para verificar se ela está sendo abusada sexualmente ou não. Seus órgãos estão intactos.

— Pronto, eu vou injetar vitaminas no seu organismo por alguns minutos.

Eu murmurei entregando o kit de sangue para minha assistente, em seguida, coloquei minha pequena paciente na poltrona enquanto preparava soro e vitaminas.

— Está com fome? Eu vou pedir sopa quentinha para você.

Eu questionei.

— Canja de galinha?

— Boa escolha.

Entreguei a ela um tablete para ver desejos animados enquanto reponho suas vitaminas perdidas. Saio com seus pais para o corredor, o primeiro exame deu positivo para sífilis.

— O que minha filha tem?

A mãe da minha paciente questiona.

— Sua filha tem sífilis.

Não há como transmitir essa informação de um jeito sutil, alguma coisa está acontecendo aqui, infelizmente minha paciente está pagando pelos males dos outros.

— O quê? Ela foi abusada?

— Não há índice de violência sexual, e essa não é a única forma de transmissão, por favor, eu vou pedir que façam exames, só por precaução.

— Não há nenhuma necessidade de fazermos exames, quem está doente é nossa filha.

O pai respondeu rapidamente. Não posso obrigá-los a fazer exames, ainda não. Mas, eu posso fazer algo pela menina.

— Ela será internada até que seu tratamento termina.

— O quê?

— Senhorita Leticia, inicie o protocolo de internação e instale ela no quarto.

— Agora mesmo doutora.

Entrei no meu consultório e chamei outra família para atender, não posso obrigar os pais a fazer tudo que digo, entretanto, eu tenho o poder sobre meus pacientes, enquanto não souber o que está acontecendo, ela não irá sair daqui até que o tratamento seja cumprido.

— Doutora Chloe.

Eu estava assinando o prontuário médico, quando Leticia entrou na sala, levantei os olhos para encarar ela.

— Sim.

Ela olhou-me sem saber o que dizer.

— Abra essa boca menina.

Falei impaciente, odeio dramas.

— A doutora Isa mandou-lhe uma adolescente.

Doutora Isa, ela nunca recebe adolescentes em seu consultório, o que está fazendo nos consultórios de pediatria geral? Muitos profissionais ficam anos a espera de uma vaga para subir de cargo, enquanto há gente que não sabe o fazer com o posto.

— Doutora Chloe Ross, boa tarde querida.

Eu encarei-a ignorando sua cara de pau.

— Se vai me mandar um paciente, faça isso na minha cara, avisando e pedindo.

Ela engoliu seco, em seguida abriu um sorriso em seus lábios.

— O que isso Chloe? Somos colegas de trabalho e mais, eu não sou muito boa com adolescente.

Papo furado, ela mal me cumprimenta quando nos cruzamos, fica de nariz empinado comigo e sei muito bem que ela fala de me pelas costas.

— Então, vá para pediatria comum e saia do geral, alguém com mais conhecimento está louco para ocupar esse lugar, querida.

Atiro.

— Não precisa ser grossa comigo.

— Deixa de ser sonsa, eu sei muito bem que manda-me paciente e você assina como se fosse você que os atendeu.

Ela olhou-me

— Acha mesmo que eu não olharia nos prontuários? Conheço todos os meus pacientes, não volte a mandar-me pacientes, ou submeto uma reclamação contra você.

Saio do seu consultório e vou ao meu, chamei adolescente para entrar.

— Boa tarde doutora.

A mãe da adolescente disse, elas se sentaram nas poltronas em minha frente.

— Boa tarde, O que você tem?

Questionei, ela olhou-me, depois olhou para seus pais.

— Por favor, quero falar com ela a sozinha.

— Ela é menor.

Ela é uma adolescente que precisa de privacidade.

— Conhecem a palavra privacidade e confidencialidade entre o médico e o paciente?

Eles encaram-me depois se retiraram. Ela foi sentar na maca para que eu possa examinar ela.

— Eu estou gravida.

Ela revelou, surpreendendo-me.

— Fiz teste de farmácia, estou tendo tonturas, comendo pouco.

Oh merda.

— Você quer esse bebê?

Essa é a pergunta primordial.

— Meu namorado quer, ele me ama, mas eu sou muito nova.

Eu me sentei ao lado dela, ela parece muito mais nova, uns 13 entre 14 anos. Ela não pode passar por isso sozinho, uma figura materna é muito essencial na sua vida e durante a sua possível gestação.

— Não existe nenhuma vergonha de carregar um bebê tão cedo, essa é uma decisão sua, porque o corpo é seu. Você passará noites em claro ouvindo choro de criança, terá que trabalhar duro para colocar comida na mesa, terá que estar disposta a renunciar tudo, porque nem sempre todos irão te apoiar. O homem que hoje lhe diz que te ama, vai perder o interesse, e você precisa estar forte para abraçar seu filho nos dias escuros.

— Você é muito direta doutora.

— Eu tenho que ser. Deixa-me examiná-la.

Ela tirou as roupas e fiz alguns exames internos nela, depois receitei vitaminas e anti enjoos até ela tomar uma decisão sobre seu bebê.

— Este é o meu cartão, quando tiver tomado uma decisão me ligue ou aparece aqui.

Entreguei-a.

— O hospital oferece aborto?

Ela mordeu o lábio, eu não imagino o quanto ela está assustada, espero que tome uma decisão com mais calma e não cometa nenhuma loucura.

— Sim, tudo em confidência.

Eu informei a ela. Ela não precisa passar pelos perigos das ruas tentando fazer isso sozinha.

— Eu vou pensar.

Os pais dela entram no meu consultório.

— Doutora o que ela tem?

— Ela está bem, só desnutrida, ela precisa de muita proteína, comer frutas e descansar.

— Muito obrigada doutora.

Eu assenti, me despedindo deles.

— Seu almoço doutora.

Eu sorri, estava morrendo de fome, quando segurei uma colher, eu ouvi meu nome sendo chamado para o banco de urgência. Rapidamente, eu saí correndo em direção ao banco de socorro da entrada principal do hospital.

— Doutora, uma criança entrou com queimadora de 2 grau, temos outra com ataque cardíaco e outra convulsão, precisamos de toda ajuda pediatra.

Usei luvas e caminhei até a criança com convulsão na sala de emergência, rapidamente coordenei com as enfermeiras para melhor dosagem das injeções, eu saí de uma sala para outra sem perder o ritmo.

Quando voltei para meu consultório, meu corpo parecia como se tivesse passado um camião nele.

— Doutora, quer que eu aqueça seu almoço?

Eu fiz um sinal que sim com a mão, enquanto procurava pelo meu telefone, um apito soou no tablete do trabalho, este é o número de casa. O que aconteceu para eles me ligarem pelo número do trabalho?

— Caramba filha, porque não está me atendendo?

Eu suspirei aliviada enquanto me sentava, aonde está meu telefone, tirei agenda e encontrei, abro o ecrã e vejo 5 ligações da mamãe.

— Eu disse para senhora me ligar de noite, de dia eu não tenho tempo.

Informei novamente. Eu me esqueci de ligar para ela ao acordar.

— Eu sinto muito filha, fiquei preocupada, você não me ligou pela manhã.

— Eu sinto muito, mãe.

— Doutora, a paciente do quarto 45 está tendo outro ataque cardíaco.

Uma enfermeira entrou gritando no meu consultório. Encerrei a chamada e segurei meu tablete com força, meu dia será muito, muito longo. Quando estabilizamos a paciente eu voltei para meu consultório, rapidamente, eu preparei chocolate quente e liguei para minha mãe.

— Oi mãe, desculpa, eu tive uma emergência.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo