Parei o carro em frente minha casa, e me certifiquei de que ela não esqueceria o caderno dessa vez. Peguei sua mão e a levei até seu portão, calmamente, tentando prolongar meu tempo ao seu lado. Mesmo que já fossem quase sete da noite, e eu estivesse com ela desde a uma da tarde.
— Depois de hoje passei a acreditar que nada é impossível para você — falei, acariciando sua bochecha quando paramos em frente sua casa.
— Depois de hoje? — ela riu, curiosa.
— Sim. Achei que fosse impossível você ficar mais linda do que você já é — ela olhou para o lado, escondendo um sorriso, enrubescida. — E hoje com esse vestido você me encheu os olhos.
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Seus olhos, de sólidos, entraram em uma fusão intensa e se desfizeram em líquido, drenando tudo o que havia de ruim dentro dela. Uma dravita, que derreteu e virou café. Uma xícara convidativa, aquecida e envolvente. Não aquela bebida escura, opaca. O castanho que você enxerga quase como se os grãos refletissem na luz. Quando ela me olhou daquela maneira, tive a impressão de que estava me convidando. 'Aceita essa xícara de café?'. Como recusar? Eu adorava café.— Eu nem sei o que seria de mim hoje se não fosse você... — ela sorriu, tristonha.— Lizza, você precisa me ligar quando coisas assim acontecem — acariciei sua bochecha por cima da mesa pequena.— Não queria incomodar &mdas
— Por que está dizendo isso? — ela piscou com pressa, mas não demonstrou nenhuma expressão perceptível ao olho humano.— Eu era como um refugiado que você resgatou. Você me mostrou tudo que eu precisava ver, Lizza. Sua doçura me envolveu, e me fez enxergar como amar. Você me ensinou a sentir; lecionou de um modo tão gentil que não quero que pare nunca. Me deixou ao seus pés, e eu faria tudo o que me pedisse sem pestanejar. Você me faz mudar de ideia em um estalar de dedos — ri pelo nariz, atordoado. — Lizza, eu não sei o que você tem, mas tem um poder sobre mim que nem mesmo eu entendo. Você tem um feitiço do qual não posso mais escapar. Sou todo seu, Lizza, de corpo, alma e coração.— É voc&ec
Então entendi por que Regina sempre me dizia que eu era a pessoa certa para sua filha. "Um dia eu vou ficar bem; alguém ainda vai me abraçar e me juntar de novo." Pude ouvir a voz de Lizza, cansada, recitando aquelas palavras. Era uma esperança perdida, podia-se ver pela forma como a grafia era mais renhida naquele trecho. Algo que ela desejava e acreditava ser inalcançável. A frase se repetiu em minha mente como um eco desproporcional; quanto mais se repetia, mais alto ele ficava.Minha primeira reação foi querer despedaçar aquele maldito papel. Desejei nunca ter lido nada daquilo; nunca ter tido conhecimento daqueles sentimentos, muito menos liga-los a Lizza de uma forma tão íntima. Soquei meu travesseiro com toda a raiva que eu queria descontar naquele cara que eu nem sabia quem era. Esmurrei a cabeceira da cama e desejei que a
O caminho foi calado. Lizza fitava a janela, estudando cada aspecto que encontrava do lado de fora. Parecia desconhecer o local para o qual eu a levava. Estava apreensiva; meditativa; nervosa. Tive medo que em algum momento ela escorregasse, e caísse mais uma vez naquele passado que tanto a feria. E me encolhi quando pensei que talvez eu não conseguisse resgatá-la de lá. — Uma cachoeira! — falou maravilhada, assim que parei o carro próximo à trilha que teríamos que fazer para encontrar a água jorrando. Lá de cima era possível avistar o azul espumoso da cascata que batia nas pedras acinzentadas rapidamente, em um espetáculo que deixou Lizza sem fôlego, como uma criança em um parque de diversões pela primeira vez. Uma cena doce que assisti pasmado. E coberto de amor. — Você gostou? — ri, leve. Ela me olhou sorrindo
— Eu sempre desconfiei disso — dei risada, deitando sobre a toalha quadriculada quando a puxei, e ela deitou-se em meu peito. Beijei o alto de sua cabeça muitas e muitas vezes, e ela fez círculos despreocupados em minha barriga, por cima da minha camiseta escura.Não me respondeu.O silêncio não era constrangedor. Era reconfortante. Eu sempre preferia estar ouvindo Lizza falar. Mas naquele momento, sua quietude se encaixou de modo pleno diante da cena.Depois de longos dez minutos apenas degustando a simplicidade de tudo aquilo, ela se pronunciou.— Você acha que duas pessoas podem ficar juntas pelo resto da vida? — pegou-me desguarnecido. Estava me deliciando do silêncio saboroso que se deitou e
Chegamos por volta das quatro. Parei o carro em frente sua casa, e me virei para Lizza.— Você está bem? — olhei-a profundamente, tentando me infiltrar de algum modo em seus olhos. — Não quero te deixar aqui e pensar que pode acontecer de novo o que aconteceu ontem. Quero ter certeza de que está bem.— Estou bem, Augusto. Obrigada. Não acontece diariamente, agora que você está aqui — ela desviou os olhos.— Por favor, me ligue ou me mande uma mensagem se precisar de alguma coisa, tudo bem?— Claro, eu ligo — sorriu de modo carinhoso. — E você, prometa que vai trabalhar certo durante essa semana, e virar o funcionário do mês. Sem mais faltas.
— Cada dia que passa, eu me sinto mais apaixonado por você — sussurrei, e ela ainda estava com os olhos colados em mim. — Eu nunca me senti assim antes. É surreal. Eu passo o dia todo pensando em coisas bonitas para te dizer. Penso em você o tempo todo. Meu coração esquenta e dispara, e eu sinto que eu preciso só de você. Nenhuma outra garota me atrai, só você. Fixação, quase isso. — Lizza sorriu. As nuvens se dissiparam, e a luz da lua refletiu em seus olhos.— Eu não duvido disso... — ela também sussurrava. — Dá para sentir isso de você, todas as vezes que fala comigo.O magnetismo que emanava de Lizza não me deixou desviar o olhar. Estávamos em combustão; havia faíscas saindo de todos os meu
— É melhor eu ir — Lizza apoiou o queixo em meu peito, ainda me segurando.— Sabia que você é linda?— Não sou não — ela fez uma careta, me provocando e dando as costas para mim, enquanto se afastava.— Tem razão. Você não é bonita mesmo — segui seus passos. — Você é um sonho de tão linda.Pude vê-la sorrindo, corando de leve. Parecia cada vez mais familiarizada com minha presença e com aquelas palavras.— A propósito, você já disse isso hoje, senhor Augusto.— Pois eu digo de novo: você é linda.<