— Não seja tão amável... — sussurrei como resposta. — Não sou essa pessoa boa que você acredita que sou.
— Eu não te entendo, Augusto — puxou a mão e ficou em pé com um salto, levando a louça suja para a cozinha. — Você faz de tudo para me conquistar e quando está quase lá, vira a lata de lixo do seu passado em meus pés.
— Não precisa agir desta maneira, Lizza — levantei-me, a seguindo.
— E de que maneira eu deveria agir? — virou-se para me olhar. — Eu tenho a impressão de que está na soleira da porta e que vai passar por ela a qualquer momento, sem me avisar.
— Você realmente acha isso
Estava com a cabeça quente. A discussão com Lizza me deixou à flor da pele; descamado. Minha mente entrou em ebulição; tantas coisas diferentes passeando pela minha memória que se tornava difícil organizar todas elas para enfim, começar a entende-las.O Augusto de Flávia não se importaria em tirar a roupa de Suzane ele mesmo. O de Daniela. O de Viviane. De quantas mais? Ela estava certa, claro que estava. Eu não conseguia sequer lembrar o nome de todas elas. Aquele Augusto não iria virar o rosto para não ver a mulher se despir, da forma que eu estava fazendo naquele momento. Aquele Augusto iria colocar um número a mais em sua lista.Mas não o Augusto de Lizza.Ali, enfrente àquela mulher que eu mal c
Lizza não apareceu durante a semana, plantada aos pés da árvore como uma flor murcha em plena primavera. As músicas não ressoaram no meu quintal imitando a última vez em que ela me evitou; a casa vizinha estava em completo silêncio, para meu desespero. Enquanto desejei que ela respondesse minha mensagem, sua casa gritou o vácuo para mim até eu ficar surdo.Sua ausência começava a machucar. Nunca imaginei amar alguém como eu a amava. Nunca entendi nada sobre meus sentimos, nem nunca soube manusea-los. E embora Lizza tenha me ensinado com uma maestria horrivelmente grande, eu me via com meu coração em minhas mãos, sem saber o que fazer. Para onde eu carregava aquilo? Como eu deveria agir?Um grande sufoco se instalou dentro de mim. Senti-me desolado; abruptament
Vermelho. Era a cor mais presente em minha casa, naquele momento. Dizem que é a cor do amor. Mas não era como um todo, uma cor alegre para mim.Luzes de velas, pétalas de rosas e um pouco do meu coração, formavam um caminho da porta de entrada até a cozinha, onde em uma mesa, uma caixa prateada recheada de doces a esperava, propriamente junto de uma bandeja de comida japonesa que ela adorava. E suco de laranja, claro.Na parede, letras repicadas com os dizeres 'Me Perdoa?', e na cadeira onde Lizza se sentaria, um pequeno buquê de margaridas. No papel vermelho com bolinhas brancas que abraçava as flores, espalhei bilhetes dizendo como ela era linda.Eu fora um aluno aplicado; tudo o que ela gostava, se encontrava em minha casa naquele instante. Estava paparicando
— Sabia que você é linda? — acariciei sua bochecha por cima da mesa. Tinha uma pressa absurda em ter sua pele em contato com a minha durante toda a noite.— Estava começando a sentir falta de ouvir isso — deu um gole no suco, sem deixar meus olhos penetrarem nos seus.Observei-a, em silêncio. Prestei atenção em cada único detalhe: a florzinha branca no canto da unha do anelar, combinando com o esmalte azul; a forma de sua garganta saltar como se coreografasse uma música todas as vezes que ela engolia; o mindinho embaixo do copo quando ela o pegava; os cílios compridos subindo e descendo conforme seus olhos piscavam. Tudo nela parecia estar em sintonia. Até mesmo o ar que entrava e saía de seus pulmões.Apesar de não conseguir decifrar Lizza, ela se tornava cada vez mais clara para mim. Eu sabia que teria uma explicação além do &oa
— Não vá — sussurrei, segurando seu rosto com uma das mãos. Desviei os olhos de seus lábios, para me afogar no café de sua íris. Talvez eu tenha me queimado por uma imersão precipitada, mas eu não me importei com a vermelhidão deixada em minha pele.— Está tarde, Augusto — Lizza vacilou, e em um descuido repentino como um lampejo, sorriu para mim.— Fique — pedi, acariciando sua bochecha com as costas da mão.— Tudo bem — olhou para baixo, ainda com o sorriso aposto. — Mas sem muita demora, tudo bem? — murmurou.— Tem uma coisa que você queria ver — dei um meio sorriso, envergonhado, pegando seus dedos e a conduzindo p
Acordei atordoado. Não abri os olhos de imediato, e pensei estar sonhando quando senti o perfume de Lizza ainda brincando com meu sistema respiratório. Tentei me virar, e parei quando senti um peso leve em meu corpo. Pisquei lentamente, a avistandoadormecida em mim. Abraçava-me e repousava a cabeça em meu peito. Uma de suas pequenas pernas estava jogada em cima de mim, enquanto a outra se emaranhava com meus pés. A iluminação era pouca, vindo ainda das velas que permaneciam queimando bravamente. A TV estava desligada. Que horas seriam?Agarrei meu celular em meu bolso e cocei os olhos enquanto ligava a tela. O relógio marcava exatos 3:24. Lizza dormia tranquila em meu peito, e não tive coragem de acorda-la para que fosse para casa. Não mesmo. Fiquei inseguro se talvez ela acharia que fora um
Sentei-me na cama, em sua frente, e a estudei com cautela. Vestia jeans escuro, e uma camiseta clara amarrotada pela noite. Em seus pés, um par de meias cor de rosa que me fez sorrir; não havia prestado atenção nisso durante a madrugada.Suas mãos pequeninas alcançaram as torradas, e quando agarrou uma delas, a geleia sujou seu polegar na beirada. Lizza colocou a torrada na boca e lambeu seu dedão.— É minha preferida — disse, sorrindo meiga enquanto mastigava; não perdeu a etiqueta enquanto o fez, por sinal.Estava adorável, assim, ao acordar. Sonolenta, e ao mesmo tempo, cheia de uma energia que vazava por seus olhos. Uma eletricidade singular, correndo em todos os fios de sua pele tênue. Querido Augusto,Que antiga romântica, eu, escrevendo uma carta para você. Mas sempre adorei e aderi à ideia de manuscritos. Gosto da forma como minha caligrafia me parece mais calorosa do que a tinta preta e opaca de uma impressora que não partilha dos meus sentimentos.Hoje é Quarta-feira, e depois de muito pensar e analisar, decidi escrever-lhe para esclarecer muito do que ainda possuía sombras. Desculpe pela carta gigantesca, não pude evitar. Havia muito o que você precisava saber. Não sei dizer ao certo quando irei te entregar esta carta, visto que pedi para você me tirar da sua vida e talvez você realmente o faça. Tenho medo disso, Augusto. Tenho medo de que você me obedeça. Sei que disse muitas coisas naquela tarde, e que te feri com uma facaEpílogo