Helena ficou ali, ajoelhada na terra úmida, tentando compreender o que acabara de acontecer. Sua respiração vinha em arfadas curtas, o coração martelando contra o peito como se quisesse escapar. A marca em seu pescoço ainda ardia, irradiando uma sensação estranha que ia além da dor. Era como se algo nela tivesse mudado, algo profundo e irreversível.
Ela olhou ao redor, tentando se orientar na floresta que agora parecia mais viva e ao mesmo tempo ameaçadora.
O lobo negro, ou seja lá o que Erik fosse, havia desaparecido, deixando-a sozinha. Mas mesmo na ausência dele, Helena sentia sua presença, como se uma parte dele estivesse grudada nela. Era perturbador e, ao mesmo tempo, inexplicavelmente reconfortante.
“Eu não pertenço a ninguém”, pensou, tentando reunir forças. Mas as palavras dele ainda ecoavam em sua mente. “Agora você é minha.”
Helena balançou a cabeça, determinada a não deixar o medo dominá-la. Ela se ergueu, apoiando-se em uma árvore próxima. Não sabia para onde ir, mas sabia que ficar ali não era uma opção.
***
Helena não sabia quanto tempo passou caminhando. A floresta parecia infinita, com árvores antigas e raízes que pareciam querer agarrá-la. A luz do sol, se é que ainda era dia, quase não penetrava ali.
Enquanto caminhava, sentiu um formigamento na nuca. Era como se alguém a observasse. Ela parou de repente, olhando ao redor, mas não viu nada além de árvores e sombras. Mesmo assim, o formigamento não desapareceu.
— Eu sei que está aí! — Gritou, sua voz tremendo mais do que gostaria.
O silêncio foi a única resposta, mas ela sabia que não estava sozinha. Então, do nada, Erik emergiu das sombras, seus olhos dourados brilhando como tochas na penumbra. Ele estava de volta à forma humana, mas ainda exalava aquela aura predatória.
— Você é péssima em fugir. — Disse ele, com um sorriso divertido.
Helena deu um passo para trás, mas manteve o queixo erguido. — Por que está me seguindo?
— Porque você não sobreviverá sozinha. Este mundo não é para os fracos.
— Eu não sou fraca. — ela retrucou, tentando ignorar o fato de que estava com medo. — Não preciso de você.
Erik deu uma risada baixa, quase como um rosnado. — Você pode dizer isso quantas vezes quiser, mas a Marca prova o contrário.
— O que é essa marca? — Helena explodiu, apontando para o pescoço. — O que você fez comigo?
Ele cruzou os braços, inclinando a cabeça como se considerasse a melhor forma de responder.
— A Marca é um vínculo. Um pacto. Você agora está ligada a mim, e eu a você.
— Um pacto? Eu não concordei com nada disso!
— Não é algo que você possa escolher, mikró. — Ele usou o mesmo apelido que havia usado antes, o que só a irritou mais.
— E o que isso significa? Que eu sou sua prisioneira?
— Não. — Respondeu ele, com uma calma que a irritava. — Significa que você está sob minha proteção. Que ninguém neste mundo ousará tocá-la sem enfrentar as consequências.
Helena estreitou os olhos.
— E se eu não quiser sua proteção?
Erik deu um passo à frente, e a intensidade em seus olhos fez seu estômago revirar.
— Então você morrerá.
As palavras dele foram como um golpe. Ela queria gritar, argumentar, mas sabia que ele estava falando a verdade. Ela não tinha ideia de onde estava, e tudo ao redor parecia perigoso.
Ainda assim, algo dentro dela se recusava a aceitar.
— Deve haver um jeito de quebrar essa... coisa.
Erik riu novamente, mas dessa vez havia algo de sombrio no som.
— Você realmente não entende, não é? Este mundo tem regras. E a Marca é uma das mais antigas. Não pode ser desfeita.
Helena sentiu a raiva crescendo em seu peito, misturada com o desespero.
— Isso é loucura.
— Talvez. Mas é a realidade agora.
Ele virou-se de repente, gesticulando para que ela o seguisse.
— Vamos. Não temos tempo a perder.
— Para onde você está me levando?
— Para um lugar seguro.
Helena hesitou. Seguir aquele homem, ou o que quer que ele fosse, parecia ser uma péssima ideia. Mas qual era a alternativa? Ficar ali, sozinha, à mercê de um mundo que ela não entendia?
Ela acabou seguindo, mantendo uma distância segura.
***
A cabana apareceu diante dela como uma visão improvável. Era pequena e rústica, escondida no meio da floresta. A fumaça que saía da chaminé indicava que estava habitada, embora tudo ao redor parecesse abandonado.
— É aqui que você mora? — perguntou, franzindo o cenho.
Erik abriu a porta sem responder, entrando e gesticulando para que ela fizesse o mesmo.
Por dentro, a cabana era tão simples quanto por fora. Havia uma lareira acesa, uma mesa de madeira com duas cadeiras e uma cama encostada na parede. Tudo era funcional, sem nenhum toque de luxo ou conforto.
— Não é muito — disse ele, como se lesse seus pensamentos. — Mas é o suficiente.
Helena ficou parada na porta, sem saber se confiava nele o suficiente para entrar.
— Você tem escolha — disse ele, olhando por cima do ombro. — Pode ficar aí fora e enfrentar o que está lá, ou entrar e tentar entender o que está acontecendo.
A ameaça implícita em suas palavras a fez entrar, mesmo que com relutância.
Erik puxou uma cadeira para si, observando-a com atenção. — Agora que estamos aqui, você tem perguntas.
— Tenho mais perguntas do que respostas — respondeu Helena, cruzando os braços. — Comece explicando por que você me marcou.
— Porque você caiu no meu território. E porque você não é uma humana comum.
Ela franziu o cenho. — Do que você está falando?
Ele se inclinou para a frente, os olhos brilhando com intensidade. — Algo em você chamou minha atenção no momento em que chegou aqui. Há algo dentro de você, algo adormecido.
— Isso não faz sentido!
— Não agora, talvez. Mas fará.
Helena sentiu a frustração crescer. — Eryndor, a Marca, você... Nada disso faz sentido!
— Bem-vinda ao meu mundo, mikró. Aqui, nada é como deveria ser.
Helena balançou a cabeça, sentindo o peso da exaustão. Ela precisava de respostas, mas, mais do que isso, precisava descansar.
Erik pareceu perceber isso. Ele se levantou, caminhando até a porta. — Descanse. Amanhã, falaremos mais.
— E você?
— Ficarei de guarda.
Helena o observou sair, o som de seus passos desaparecendo na escuridão. Finalmente sozinha, ela sentou-se na cama, o corpo pesado de cansaço.
Mas antes que o sono a alcançasse, uma sensação estranha a invadiu. A Marca em seu pescoço pulsava levemente, como se respondesse à presença de Erik lá fora.
E pela primeira vez, ela se perguntou se aquela ligação podia ser mais perigosa, ou mais poderosa, do que imaginava.
Capítulo 3Helena despertou com o som de algo sendo mexido na cabana. Sua mente ainda estava enevoada pela exaustão da noite anterior. Os últimos acontecimentos passavam em sua mente como flashes: a fuga desesperada, a queda no abismo, o encontro com Erik… e, claro, aquela mordida que ainda ardia em seu pescoço.Ela abriu os olhos lentamente, encontrando a luz suave da manhã que entrava pelas frestas das janelas. O som era rítmico, como alguém cortando ou esmagando algo. Ao erguer-se da cama improvisada de peles, viu Erik próximo à lareira, mexendo em um pote sobre as chamas.Ele estava sem camisa, as costas largas e musculosas iluminadas pela luz da manhã. Seus movimentos eram metódicos enquanto ele triturava algo em uma tigela.— Está me observando? — A voz rouca de Erik cortou o silêncio, surpreendendo-a.Helena corou, desviando o olhar rapidamente.— Você estava fazendo barulho. Foi o que me acordou.— Bom. Precisamos conversar, de qualquer forma. — Ele não olhou para ela, continu
Capítulo 4O calor da lareira dançava nas paredes da cabana enquanto Helena tentava processar tudo que Erik havia lhe contado. Mas antes que pudesse organizar seus pensamentos, o som distante de algo rompendo a calma do bosque chegou até seus ouvidos. Erik, no entanto, congelou imediatamente. Sua postura relaxada desapareceu, e seus olhos dourados brilharam com uma intensidade feroz.— O que foi isso? — Helena perguntou, sentindo um calafrio percorrer sua espinha.Erik ergueu uma mão, pedindo silêncio, e inclinou a cabeça ligeiramente para o lado, como se estivesse escutando algo que ela não conseguia ouvir. Ele se moveu com a precisão de um predador, atravessando a sala até uma janela pequena e entreaberta. Do lado de fora, a floresta parecia inerte, mas o brilho nos olhos dele indicava que algo estava errado.— Fique aqui. — Ele murmurou, sem sequer olhar para ela.— O quê? Não! O que está acontecendo? — Helena protestou, mas ele já estava pegando uma espada curta que estava apoiada
Capítulo 5 Helena estava ajoelhada no chão da cabana, segurando uma tigela de água morna e um pano limpo. A luz da lua entrava pela janela, iluminando a silhueta de Erik, que estava sentado em uma cadeira com a camisa rasgada, expondo os cortes e hematomas da batalha contra os caçadores. — Você precisa ficar quieto, ou isso vai piorar. — Ela disse, molhando o pano e começando a limpar um dos cortes em seu ombro. Erik soltou um grunhido, mas não se moveu. — Não estou reclamando, estou? Helena revirou os olhos, mas continuou o trabalho. Os cortes não eram tão profundos, mas os hematomas ao redor mostravam que os golpes tinham sido brutais. — Sabe, eu ainda não entendo por que eles ajudaram você naquela hora, mas depois foram embora. Não parecia que gostavam de você, mas também não pareciam dispostos a te abandonar. — A voz dela carregava curiosidade, mas também uma pitada de cautela. Erik ficou em silêncio por alguns segundos, observando-a trabalhar. — Eles não estavam lá por mi
Capítulo 6O silêncio da cabana era preenchido apenas pelo estalar ocasional do fogo na lareira. Erik estava sentado na mesma cadeira de madeira, o torso exposto e os braços apoiados nos joelhos. Observava Helena enquanto ela separava as ervas que ele havia indicado. Ela parecia concentrada, as sobrancelhas franzidas levemente, os lábios pressionados enquanto mastigava uma dúvida interna.Ele tentou ignorar o modo como o cheiro dela preenchia o espaço, mas era inútil. Aquele aroma era doce e inebriante, misturando algo familiar e antigo, como se evocasse memórias de uma vida que ele nunca teve. O lobo dentro dele rosnava de forma incessante, quase delirante."Toque-a de volta.""Ela nos pertence.""Por que está tão longe? O cheiro dela é nosso."Erik apertou os punhos, respirando fundo.— Você está quieto demais. — Helena comentou, a voz cortando o ar. Ela ergueu os olhos para ele, segurando uma tigela com as ervas que havia esmagado. — Está com dor?Ele inclinou a cabeça, tentando pa
Capítulo 7 A noite envolvia a cabana como um manto silencioso. O vento passava pelas árvores ao redor, sussurrando segredos esquecidos de um mundo condenado. No interior, a luz fraca do fogo lançava sombras oscilantes nas paredes de madeira rústica. Helena estava deitada sobre a cama improvisada de peles, sentindo o calor da fogueira acariciar sua pele. Ainda estava acordada, os pensamentos girando sem descanso. Ao seu lado, Erik repousava, ou pelo menos fingia. Seu corpo era uma presença sólida e quente, um lembrete constante de tudo o que havia mudado desde que ela chegara a Eryndor. O silêncio entre eles não era incômodo, mas carregado de perguntas não feitas. Finalmente, Helena rompeu a barreira do silêncio. — Você sabia, não sabia? — Sua voz soou baixa, hesitante. Erik abriu os olhos dourados, virando levemente a cabeça para encará-la. — Sobre o quê? — Ele perguntou, embora soubesse exatamente do que ela falava. Ela se virou para o lado, ficando de frente para ele.
Capítulo 8O amanhecer trouxe consigo uma névoa fina que se erguia dos campos ao redor da cabana. O ar estava fresco, carregado com o cheiro úmido das folhas e da terra. Helena puxou a manta ao redor do corpo, sentindo um arrepio que não vinha apenas do frio.Erik já estava de pé. Observava a clareira diante deles, os braços cruzados sobre o peito forte. Seus olhos dourados captavam cada movimento ao redor, como se estivessem sempre em alerta. Quando percebeu que Helena se aproximava, virou-se para ela com um meio sorriso.— Está pronta? — Ele perguntou, a voz rouca pelo frio da manhã.Helena hesitou por um momento, mas assentiu. Se quisesse sobreviver em Eryndor, precisava aprender.Erik levou-a até um espaço aberto entre as árvores, onde a grama era baixa e o solo firme. Ele girou uma pequena adaga entre os dedos e a entregou a ela.— Primeira lição: nunca confie apenas na magia. O corpo também precisa saber lutar.Helena segurou a lâmina, sentindo o peso frio em sua mão. Parecia pe
Capítulo 9A noite já havia se instalado sobre Eryndor, e a única luz que iluminava a clareira era a fogueira crepitante diante de Helena e Erik. O calor da chama pintava sombras no rosto dele, acentuando os contornos fortes de sua mandíbula e a intensidade dourada de seus olhos.Helena ainda sentia o peso do treinamento do dia em seus músculos, mas sua mente estava inquieta. Havia algo que não saía de sua cabeça desde aquele momento mais cedo, quando a pele de Erik roçou contra a sua e seus dedos deslizaram instintivamente até a marca no pescoço dele.Ela nunca havia reparado de verdade naquilo antes. Sim, já tinha visto a marca algumas vezes, mas nunca prestara atenção. Agora, porém, sentia que algo estava diferente… Ou talvez fosse apenas a forma como Erik reagira ao seu toque.Ela observou Erik pelo canto do olho. Ele parecia concentrado no fogo, mas algo em sua postura indicava que ele também estava imerso em pensamentos.Helena mordeu o lábio, reunindo coragem antes de perguntar
Capítulo 10A tensão entre eles ainda pairava no ar quando Erik virou bruscamente a cabeça, seu corpo inteiro se enrijecendo. Helena seguiu seu olhar para a escuridão da floresta, mas tudo o que viu foi a silhueta retorcida das árvores.— Erik? — Sua voz saiu baixa, mas cheia de alerta.Ele ergueu a mão, pedindo silêncio. Seus olhos dourados estavam fixos em um ponto além da névoa rasteira. Então, ele sussurrou:— Eles estão aqui.O sangue de Helena gelou.— Os caçadores?Erik assentiu lentamente, sua expressão sombria.— São pelo menos cinco. Eles estão nos cercando.O coração de Helena martelava. Ela se levantou de um salto, sentindo o corpo ainda dolorido do treinamento.— E agora? Fugimos?— Se ficarmos, teremos que lutar. Mas se corrermos… — Ele inspirou fundo, analisando a situação. — Podemos ter uma chance de despistá-los antes que nos alcancem.Helena não hesitou.— Então corremos.Sem mais uma palavra, Erik segurou sua mão e puxou-a consigo para dentro da floresta. O mundo ao