Capítulo 5
Helena estava ajoelhada no chão da cabana, segurando uma tigela de água morna e um pano limpo. A luz da lua entrava pela janela, iluminando a silhueta de Erik, que estava sentado em uma cadeira com a camisa rasgada, expondo os cortes e hematomas da batalha contra os caçadores. — Você precisa ficar quieto, ou isso vai piorar. — Ela disse, molhando o pano e começando a limpar um dos cortes em seu ombro. Erik soltou um grunhido, mas não se moveu. — Não estou reclamando, estou? Helena revirou os olhos, mas continuou o trabalho. Os cortes não eram tão profundos, mas os hematomas ao redor mostravam que os golpes tinham sido brutais. — Sabe, eu ainda não entendo por que eles ajudaram você naquela hora, mas depois foram embora. Não parecia que gostavam de você, mas também não pareciam dispostos a te abandonar. — A voz dela carregava curiosidade, mas também uma pitada de cautela. Erik ficou em silêncio por alguns segundos, observando-a trabalhar. — Eles não estavam lá por mim. — A voz dele era baixa, quase um murmúrio. Helena parou por um instante, olhando para ele. — Então por que vieram? Ele inclinou a cabeça, os olhos amarelos se fixando nos dela. — Vieram por você. Helena sentiu o coração disparar diante a confissão dele, mas tentou não demonstrar a inquietação que sentia. — Por mim? Por que eles se importariam comigo? Erik suspirou, desviando o olhar para a janela. — Você ainda não entende o que significa estar marcada, não é? Ela estreitou os olhos. — Não. Então seria ótimo se me explicasse. Ele a encarou novamente, a intensidade no olhar dele a fazendo sentir como se ele estivesse vendo sua alma. — Minha marca te liga a mim. Isso significa que você não é apenas uma humana qualquer vagando por Eryndor. Você é minha. — A palavra saiu com um peso que fez Helena prender a respiração. — Para os outros lobos, isso significa que você é protegida por mim. Mas também significa que você é… Valiosa. Helena engoliu em seco, a mente girando com a informação. — Então eles só vieram porque… Queriam me observar? — E me observar. — Erik soltou uma risada sem humor. Ela franziu o cenho. — Por que fariam isso? Ele hesitou por um momento, como se considerasse não responder. Mas então soltou um suspiro pesado. — Porque estão esperando que eu cometa um erro. Helena inclinou a cabeça, confusa. — Um erro? O que você quer dizer? Erik segurou o braço dela, parando-a de limpar o próximo corte. Sua mão era quente e firme, mas o toque não foi agressivo. — Porque, para eles, eu sou um traidor. Helena piscou, surpresa. — Um traidor? O que você fez? Ele soltou a mão dela, recostando-se na cadeira, como se aquelas palavras carregassem um peso enorme. — Fui acusado de entregar informações da minha matilha para um grupo rival. Informações que levaram à morte de vários dos meus irmãos. Helena arregalou os olhos, recuando levemente. — Você fez isso? — Não. — A resposta foi firme, direta. — Mas isso não importa. Ela continuou olhando para ele, esperando que ele explicasse. — Alguém precisava pagar pelo que aconteceu, e eu era o alvo mais conveniente. Desde então, fui banido da matilha. Vivo aqui, longe deles, mas sob constante vigilância. Helena olhou para ele com uma mistura de surpresa e empatia. — Então esses lobos… Eles estavam te vigiando? — Sim. — Erik inclinou a cabeça para o lado, os olhos brilhando com algo que ela não conseguia decifrar. — Querem garantir que eu não faça nada que possa comprometer ainda mais a matilha. Helena ficou em silêncio por um momento, absorvendo o que ele havia dito. — Isso é… Horrível. Você foi condenado sem provas. Erik deu de ombros, o sorriso de lado retornando ao rosto. — Este é o mundo dos amaldiçoados, Helena. Justiça não é algo que vemos com frequência por aqui. Ela balançou a cabeça, incrédula. — E você aceita isso? Simplesmente vive com isso? — Não é uma questão de aceitar ou não. — Ele a encarou, os olhos brilhando com uma intensidade que a fez estremecer. — É uma questão de sobreviver. Helena mordeu o lábio, pensando no peso que ele carregava. — Isso explica por que você vive sozinho… Erik inclinou a cabeça levemente. — É mais seguro assim. Para todos. Ela voltou a cuidar dos cortes dele, mas sua mente ainda estava presa nas revelações. Enquanto passava o pano em outro ferimento, sentiu Erik se mexer levemente. — Você está usando isso errado. — Ele apontou para o pano na mão dela, os lábios curvando-se em um leve sorriso zombeteiro. — Estou tentando ajudar, tá bom? Não sou exatamente uma especialista em primeiros socorros. Ele estendeu a mão, pegando a tigela com ervas que estava ao lado dela. — Essas aqui. São as que você deveria usar. Mas é claro que você não saberia disso. Helena estreitou os olhos para ele. — Bem, talvez se alguém me dissesse o que fazer em vez de só ficar sentado aí me criticando, eu faria melhor. Erik riu, um som baixo e provocativo, mas genuíno. Ele pegou uma das ervas e começou a esmagá-la com os dedos. — Esta é boa para limpar os cortes. Tem propriedades que impedem infecções. — Ele entregou a folha a ela, e Helena pegou, franzindo o nariz ao sentir o cheiro forte. — Cheira a… Mofo. — E funciona como um encanto. Agora, esfregue isso aqui. — Ele apontou para um dos cortes no braço. Helena fez o que ele disse, ainda tentando ignorar o olhar dele que parecia analisar cada movimento dela. — Melhor assim? — Ela perguntou, tentando esconder o leve sarcasmo. Erik deu de ombros. — Melhor do que antes. Ela balançou a cabeça, mas não conseguiu evitar um pequeno sorriso. Apesar da situação, algo naquele homem, ou lobo, ela ainda não sabia como defini-lo, fazia com que ela não conseguisse ficar verdadeiramente irritada. — Então agora sou parte de você, é isso? — Ela perguntou, enquanto terminava de cuidar do ferimento. Ele ergueu os olhos para ela, o sorriso de lado reaparecendo. — Exatamente isso. Para o bem ou para o mal. Helena não respondeu, mas sentiu que, em Eryndor, nada seria tão simples quanto ele fazia parecer.Capítulo 6O silêncio da cabana era preenchido apenas pelo estalar ocasional do fogo na lareira. Erik estava sentado na mesma cadeira de madeira, o torso exposto e os braços apoiados nos joelhos. Observava Helena enquanto ela separava as ervas que ele havia indicado. Ela parecia concentrada, as sobrancelhas franzidas levemente, os lábios pressionados enquanto mastigava uma dúvida interna.Ele tentou ignorar o modo como o cheiro dela preenchia o espaço, mas era inútil. Aquele aroma era doce e inebriante, misturando algo familiar e antigo, como se evocasse memórias de uma vida que ele nunca teve. O lobo dentro dele rosnava de forma incessante, quase delirante."Toque-a de volta.""Ela nos pertence.""Por que está tão longe? O cheiro dela é nosso."Erik apertou os punhos, respirando fundo.— Você está quieto demais. — Helena comentou, a voz cortando o ar. Ela ergueu os olhos para ele, segurando uma tigela com as ervas que havia esmagado. — Está com dor?Ele inclinou a cabeça, tentando pa
Capítulo 7 A noite envolvia a cabana como um manto silencioso. O vento passava pelas árvores ao redor, sussurrando segredos esquecidos de um mundo condenado. No interior, a luz fraca do fogo lançava sombras oscilantes nas paredes de madeira rústica. Helena estava deitada sobre a cama improvisada de peles, sentindo o calor da fogueira acariciar sua pele. Ainda estava acordada, os pensamentos girando sem descanso. Ao seu lado, Erik repousava, ou pelo menos fingia. Seu corpo era uma presença sólida e quente, um lembrete constante de tudo o que havia mudado desde que ela chegara a Eryndor. O silêncio entre eles não era incômodo, mas carregado de perguntas não feitas. Finalmente, Helena rompeu a barreira do silêncio. — Você sabia, não sabia? — Sua voz soou baixa, hesitante. Erik abriu os olhos dourados, virando levemente a cabeça para encará-la. — Sobre o quê? — Ele perguntou, embora soubesse exatamente do que ela falava. Ela se virou para o lado, ficando de frente para ele.
Capítulo 8O amanhecer trouxe consigo uma névoa fina que se erguia dos campos ao redor da cabana. O ar estava fresco, carregado com o cheiro úmido das folhas e da terra. Helena puxou a manta ao redor do corpo, sentindo um arrepio que não vinha apenas do frio.Erik já estava de pé. Observava a clareira diante deles, os braços cruzados sobre o peito forte. Seus olhos dourados captavam cada movimento ao redor, como se estivessem sempre em alerta. Quando percebeu que Helena se aproximava, virou-se para ela com um meio sorriso.— Está pronta? — Ele perguntou, a voz rouca pelo frio da manhã.Helena hesitou por um momento, mas assentiu. Se quisesse sobreviver em Eryndor, precisava aprender.Erik levou-a até um espaço aberto entre as árvores, onde a grama era baixa e o solo firme. Ele girou uma pequena adaga entre os dedos e a entregou a ela.— Primeira lição: nunca confie apenas na magia. O corpo também precisa saber lutar.Helena segurou a lâmina, sentindo o peso frio em sua mão. Parecia pe
Capítulo 9A noite já havia se instalado sobre Eryndor, e a única luz que iluminava a clareira era a fogueira crepitante diante de Helena e Erik. O calor da chama pintava sombras no rosto dele, acentuando os contornos fortes de sua mandíbula e a intensidade dourada de seus olhos.Helena ainda sentia o peso do treinamento do dia em seus músculos, mas sua mente estava inquieta. Havia algo que não saía de sua cabeça desde aquele momento mais cedo, quando a pele de Erik roçou contra a sua e seus dedos deslizaram instintivamente até a marca no pescoço dele.Ela nunca havia reparado de verdade naquilo antes. Sim, já tinha visto a marca algumas vezes, mas nunca prestara atenção. Agora, porém, sentia que algo estava diferente… Ou talvez fosse apenas a forma como Erik reagira ao seu toque.Ela observou Erik pelo canto do olho. Ele parecia concentrado no fogo, mas algo em sua postura indicava que ele também estava imerso em pensamentos.Helena mordeu o lábio, reunindo coragem antes de perguntar
Capítulo 10A tensão entre eles ainda pairava no ar quando Erik virou bruscamente a cabeça, seu corpo inteiro se enrijecendo. Helena seguiu seu olhar para a escuridão da floresta, mas tudo o que viu foi a silhueta retorcida das árvores.— Erik? — Sua voz saiu baixa, mas cheia de alerta.Ele ergueu a mão, pedindo silêncio. Seus olhos dourados estavam fixos em um ponto além da névoa rasteira. Então, ele sussurrou:— Eles estão aqui.O sangue de Helena gelou.— Os caçadores?Erik assentiu lentamente, sua expressão sombria.— São pelo menos cinco. Eles estão nos cercando.O coração de Helena martelava. Ela se levantou de um salto, sentindo o corpo ainda dolorido do treinamento.— E agora? Fugimos?— Se ficarmos, teremos que lutar. Mas se corrermos… — Ele inspirou fundo, analisando a situação. — Podemos ter uma chance de despistá-los antes que nos alcancem.Helena não hesitou.— Então corremos.Sem mais uma palavra, Erik segurou sua mão e puxou-a consigo para dentro da floresta. O mundo ao
Capítulo 1Helena corria desesperada pela floresta, tropeçando nas folhagens e nos galhos escondidos entre elas. Suas mãos e joelhos estavam esfolados e doloridos, pois os usava para se apoiar cada vez que caia. Apavorada, levantou apressada na expectativa de não ser alcançada. Ela podia escutar nitidamente as vozes masculinas que se aproximavam dela.— Você não pode fugir para sempre, garota! — Um deles gritou, a voz rouca com crueldade transparecendo em seu tom de voz.Helena não olhou para trás. Ela sabia que, se parasse, seria o fim. O medo a corroía por dentro, e o terreno traiçoeiro da floresta começava a cobrar seu preço. Seus pés descalços estavam feridos, os galhos rasgavam sua pele, mas ela não desistiria. Continuaria correndo.— Apenas parem! Por que estão fazendo isso comigo? — Ela gritou, mais para o vazio do que para os homens que a perseguiam.Nenhuma resposta veio além de risadas sinistras.Mais uma vez, Helena tropeçou em uma raiz exposta, caindo de joelhos. Suas mãos
Capítulo 2Helena ficou ali, ajoelhada na terra úmida, tentando compreender o que acabara de acontecer. Sua respiração vinha em arfadas curtas, o coração martelando contra o peito como se quisesse escapar. A marca em seu pescoço ainda ardia, irradiando uma sensação estranha que ia além da dor. Era como se algo nela tivesse mudado, algo profundo e irreversível.Ela olhou ao redor, tentando se orientar na floresta que agora parecia mais viva e ao mesmo tempo ameaçadora.O lobo negro, ou seja lá o que Erik fosse, havia desaparecido, deixando-a sozinha. Mas mesmo na ausência dele, Helena sentia sua presença, como se uma parte dele estivesse grudada nela. Era perturbador e, ao mesmo tempo, inexplicavelmente reconfortante.“Eu não pertenço a ninguém”, pensou, tentando reunir forças. Mas as palavras dele ainda ecoavam em sua mente. “Agora você é minha.”Helena balançou a cabeça, determinada a não deixar o medo dominá-la. Ela se ergueu, apoiando-se em uma árvore próxima. Não sabia para onde i
Capítulo 3Helena despertou com o som de algo sendo mexido na cabana. Sua mente ainda estava enevoada pela exaustão da noite anterior. Os últimos acontecimentos passavam em sua mente como flashes: a fuga desesperada, a queda no abismo, o encontro com Erik… e, claro, aquela mordida que ainda ardia em seu pescoço.Ela abriu os olhos lentamente, encontrando a luz suave da manhã que entrava pelas frestas das janelas. O som era rítmico, como alguém cortando ou esmagando algo. Ao erguer-se da cama improvisada de peles, viu Erik próximo à lareira, mexendo em um pote sobre as chamas.Ele estava sem camisa, as costas largas e musculosas iluminadas pela luz da manhã. Seus movimentos eram metódicos enquanto ele triturava algo em uma tigela.— Está me observando? — A voz rouca de Erik cortou o silêncio, surpreendendo-a.Helena corou, desviando o olhar rapidamente.— Você estava fazendo barulho. Foi o que me acordou.— Bom. Precisamos conversar, de qualquer forma. — Ele não olhou para ela, continu