Quando o sinal do intervalo ecoou pelos corredores, Luna se levantou junto aos outros alunos, ainda um pouco desconfortável. Seguiu o fluxo até o refeitório, um amplo salão iluminado por grandes janelas que deixavam a luz do dia entrar e refletir nas mesas de metal polido. O local era decorado com murais coloridos e placas com mensagens motivacionais. O aroma de comida fresca pairava no ar, mas havia algo tenso no ambiente que ela não conseguia ignorar: os olhares.
Ela pegou uma bandeja e seguiu pela fila, observando as opções disponíveis. Havia pratos simples, como sanduíches, saladas e sopas, mas também sobremesas que pareciam deliciosas. Escolheu uma salada e um suco de maçã, tentando não chamar atenção. Com a bandeja em mãos, começou a procurar um lugar para sentar. Olhou ao redor, mas percebeu que algumas pessoas cochichavam entre si, lançando olhares furtivos em sua direção. O calor subiu para seu rosto, e ela tentou ignorar. Finalmente, avistou uma mesa com quatro pessoas, aparentemente ocupada apenas de um lado. Respirou fundo e se aproximou. — Com licença, posso me sentar aqui? Uma das garotas, com cabelos loiros ondulados e um sorriso cruel, olhou Luna de cima a baixo. Sem dizer uma palavra, colocou os pés no banco vazio à sua frente, bloqueando o espaço. Luna hesitou, sentindo a hostilidade no gesto. Seus olhos buscaram outra alternativa, tentando esconder o embaraço. Avistou, então, Darius em uma mesa próxima, cercado por quatro pessoas que compartilhavam sua aura enigmática. Todos tinham algo em comum: a postura confiante, os olhares intensos e uma energia surreal. Decidida a tentar mais uma vez, ela caminhou até a mesa. — Vocês se importam se eu me sentar aqui? Darius levantou os olhos, mas não disse nada. Em vez disso, ele pegou sua mochila e a colocou no banco vazio ao seu lado, um gesto claro de recusa. Os outros na mesa trocaram olhares, como se compartilhassem um segredo, enquanto um leve sorriso se formava nos lábios de um dos amigos dele. Luna sentiu o peso do constrangimento apertar seu peito. — Tudo bem. — Ela murmurou mais para si mesma, tentando manter a compostura. Com os olhos cheios de determinação, seguiu para um canto mais afastado do refeitório, onde encontrou uma mesa vazia. Sentou-se ali, tentando ignorar o burburinho ao seu redor e a sensação de isolamento que parecia envolvê-la. Mais ao longe, em um canto menos movimentado do refeitório, Luna notou duas garotas conversando animadamente. Elas pareciam diferentes do restante dos alunos — mais acolhedoras, menos presas àquela atmosfera pesada. Quando uma delas levantou a mão e chamou por Luna, sua primeira reação foi de incredulidade. "Estão chamando outra pessoa, com certeza", pensou, olhando para os lados. Porém, a garota ruiva insistiu, gesticulando com um sorriso caloroso. — Sim, você! Vem cá! — ela exclamou. Luna apontou para si mesma, hesitante. — Eu? — perguntou, ainda incerta. As garotas assentiram ao mesmo tempo, confirmando. Luna olhou para sua bandeja e, após um instante de indecisão, levantou-se. Seu coração acelerou de leve; não sabia se deveria confiar, mas algo nos sorrisos delas parecia genuíno. Quando chegou à mesa, a ruiva apontou para o assento vazio entre elas. — Pode sentar aqui. Não mordemos, prometo! Luna sorriu timidamente e se acomodou. — Obrigada... — Eu sou Âmbar! — disse a ruiva, estendendo a mão. Seus cabelos eram encaracolados e de um tom naturalmente ruivo, quase flamejante, com olhos claros cor de âmbar que brilhavam sob a luz do refeitório. Suas sardas espalhavam-se pelo nariz e bochechas, complementando sua pele clara. Ela tinha um sorriso que parecia constante, irradiando simpatia. — E eu sou Genevieve. — acrescentou a outra garota, com um tom mais suave, mas igualmente acolhedor. Genevieve tinha a pele morena e cabelos lisos e negros, cortados com uma franja impecável que emoldurava seu rosto. Seus olhos, de um profundo tom de jabuticaba, pareciam observar Luna com uma curiosidade tranquila. Sua beleza tinha algo exótico, quase místico, que fazia Luna pensar em uma índia das histórias que sua mãe contava. — E você é...? — perguntou Âmbar, inclinando-se levemente para frente, como se estivesse ávida por saber mais. — Luna... Luna Bolivar. — respondeu, ainda desconfiada, mas já começando a relaxar com a energia amigável das duas. — Nome bonito! — comentou Genevieve, dando um sorriso sincero. — E é sua primeira vez por aqui, né? A gente percebeu que você estava meio perdida. — Sim, é meu primeiro dia... — Luna começou, mas hesitou em continuar, temendo falar demais sobre si mesma. — Relaxa, a gente sabe como é começar do zero. — disse Âmbar, com um tom compreensivo. — Qualquer coisa, você pode contar com a gente. Certo, Gen? Genevieve assentiu. — Claro. Aliás, o refeitório é sempre meio... intenso. Mas com o tempo, você vai se acostumar. Luna sentiu um calor estranho no peito, uma sensação de pertencimento que não esperava encontrar tão cedo naquele lugar. — Obrigada... de verdade. As três começaram a conversar, Âmbar sempre cheia de histórias engraçadas e Genevieve com comentários mais discretos, mas igualmente perspicazes. Pela primeira vez naquele dia, Luna se sentiu menos sozinha. Enquanto saboreavam o almoço, Âmbar inclinou a cabeça para o lado, observando Luna com curiosidade. — Então, de onde você veio? Não me diga que você é daqui, porque não parece... Luna engoliu seco, tentando decidir o quanto deveria compartilhar. Mas algo no olhar genuíno de Âmbar e Genevieve a fez relaxar um pouco. — Eu vim de Nova York. Genevieve arregalou os olhos, impressionada. — Nossa, Nova York? Deve ser incrível! Luna deu de ombros, um sorriso triste escapando. — Talvez fosse, se as circunstâncias fossem diferentes... — Ela fez uma pausa, tentando conter a dor que subia ao falar do passado. — Minha mãe... Ela morreu de forma trágica. As expressões das duas garotas mudaram imediatamente para uma mistura de tristeza e compaixão. — Meus pêsames, Luna. — disse Genevieve suavemente, enquanto Âmbar assentia em solidariedade. — Obrigada. — Luna respondeu, baixando os olhos para a bandeja. Após um momento de silêncio, continuou: — E foi por isso que vim morar aqui. Meu pai... ele me acolheu, mas é estranho, porque eu nunca o conheci antes. Âmbar e Genevieve trocaram olhares rápidos. Genevieve foi a primeira a quebrar o silêncio. — E qual é o nome do seu pai? Luna hesitou, mas decidiu não esconder. — Eliezer Bolívar. O silêncio que se seguiu foi quase ensurdecedor. As duas garotas ficaram estátuas, como se alguém tivesse congelado o tempo ao redor delas. Luna franziu a testa, confusa. — Por que vocês estão tão espantadas? Genevieve foi a primeira a se recompor, mas ainda parecia desconfortável. — É só que... o sobrenome Bolívar não é estranho. Minha avó sempre fala sobre essa família. — E não de um jeito comum. — completou Âmbar, agora olhando para Luna com um misto de curiosidade e cautela. — Sempre achamos o Sr. Bolívar muito misterioso. Genevieve assentiu. — Minha avó é meio supersticiosa, sabe? Ela sempre diz que há segredos sombrios na mansão Bolívar. Luna sentiu um arrepio subir pela espinha, mas tentou disfarçar. — Segredos sombrios? Como assim? Âmbar deu de ombros, mas havia algo em seu olhar que parecia cauteloso. — São só histórias, sabe? Boatos antigos. Mas, bem... agora que você está lá, talvez descubra algo. Genevieve deu uma cotovelada discreta em Âmbar, mas Luna percebeu. — Algo como o quê? — ela insistiu, sua curiosidade agora totalmente despertada. Genevieve sorriu de forma hesitante. — Quem sabe? Talvez sejam só as lendas que as pessoas inventam para tornar tudo mais interessante. Luna não ficou satisfeita com a resposta, mas decidiu deixar o assunto morrer por enquanto. Ainda assim, não podia negar que uma nova inquietação havia surgido dentro dela. O que aquelas histórias significavam? E por que sua presença na mansão parecia tão importante para elas?Enquanto Luna conhecia o cotidiano de sua nova escola, na diretoria, Eliezer Bolívar conversava com a Diretora Howthorne. Sentado em uma poltrona de couro escuro, ele mantinha a postura impecável e o semblante sério, algo típico de sua personalidade reservada.A diretora Howthorne, uma mulher de cabelos grisalhos e olhos penetrantes, o observava com atenção. Apesar de sua aparência humana, seus modos ainda carregavam traços da loba que fora no passado. Ela havia deixado a matilha há décadas, mas mantinha um vínculo velado com os Lunares, especialmente por ser uma figura de respeito em Lendcity.— Agradeço por me receber, diretora. — Eliezer começou, com sua voz grave e controlada. — Estou aqui para falar sobre minha outra filha, Taynara.Howthorne ergueu uma sobrancelha, interessada. Ela sabia da ligação de Eliezer com os Lunares, mas poucos compreendiam a extensão dos segredos que ele guardava.— Ah, sim, Taynara. — disse ela, entrelaçando as mãos sobre a mesa. — Tenho acompanhado se
Eliezer empurrou a porta pesada da mansão, entrando no vasto hall de entrada. O ambiente estava iluminado por um imenso lustre de cristal que pendia do teto alto, refletindo luzes suaves nas paredes decoradas com quadros antigos e cortinas aveludadas. O som de seus passos ecoava pela sala silenciosa, interrompido apenas por sua voz grave e firme.— Ravena! Quero você no meu escritório agora! — ele bradou, sua voz cortando o ar como uma lâmina.Ravena, que estava na cozinha terminando de secar os pratos do jantar, ergueu a cabeça de imediato. Ela parou por um momento, tentando compreender o tom urgente na voz de Eliezer. Ele raramente a chamava com tanta impaciência. Com um suspiro contido, ela enxugou as mãos em seu avental branco impecável e saiu rapidamente, atravessando os corredores da mansão.Ravena era uma jovem que carregava consigo uma beleza única e impressionante. Sua pele de ébano reluzia sob a luz suave dos lustres, e seus olhos expressivos eram de um castanho quente, semp
O Segredo Revelado por EsmêRavena, ainda sentindo o peso da conversa com Eliezer, dirigiu-se apressadamente até o altar que mantinha escondido em um dos recônditos mais discretos da mansão. O altar era simples, mas carregava uma energia ancestral poderosa. Velas acesas em círculos, ervas aromáticas espalhadas e um espelho antigo repousavam no centro, refletindo a chama trêmula.Ela se ajoelhou diante do altar, com as mãos unidas, e murmurou em voz baixa:- Vovó Esmê... Eu preciso de você. Apareça, por favor.Quase imediatamente, o ambiente ficou pesado, e o ar pareceu vibrar. Uma figura translúcida emergiu no espelho, com olhos sábios e um sorriso acolhedor. Esmê, a avó de Ravena, era uma presença poderosa, mesmo em espírito.- Eu já sei por que me chamou, minha pequena Ravena - disse Esmê, sua voz ecoando como um sussurro entre mundos.Ravena respirou fundo, hesitante, mas sua preocupação logo emergiu em palavras.- Eu temo pelo que Luna pode ser, vó. Temo por ela... e por seu futur
Bem vinda a Lendcity A estrada estava vazia, com árvores imponentes à margem e um céu cinza pesado acima. Luna olhava pela janela do carro, os olhos marejados, mas já sem lágrimas. A dor da perda da mãe ainda estava cravada em seu peito, mas já fazia parte de seu ser, como uma cicatriz que, por mais que doída, era impossível de ignorar. O luto a engolia, e cada quilômetro que a afastava de sua antiga vida em Nova York parecia mais um peso em seus ombros.Ela nunca havia conhecido seu pai, Eliezer Bolívar. Nunca teve motivo para isso, até agora. A carta, com palavras frias, mas que, de alguma forma, sentiu o peso de uma tentativa de conexão, foi o que a levou até aqui. Ele, um homem desconhecido, que sua mãe sempre evitou mencionar. Ela sequer sabia o que esperar de Lendcity, uma cidade que parecia mais uma lenda do que um lugar real. O que ela sabia era que ali, em algum lugar, estava o homem que deveria ser seu pai.O carro parou em frente a uma casa grande, mas antiquada, com o por
Luna acordou sobressaltada, seu coração batendo forte no peito. Levou alguns segundos para entender onde estava, até que o som de batidas firmes na porta a trouxe completamente de volta à realidade.— Entre! — disse com a voz rouca de sono, acreditando que era seu pai.A porta se abriu lentamente, mas ao invés de Eliezer, uma jovem mulher entrou no quarto. Ela tinha a pele morena que reluzia sob a luz suave do lustre, cabelos negros presos em um coque elegante e vestia um vestido longo, coberto por um avental impecavelmente branco. Sua beleza era esplêndida, e sua postura, graciosa, com um toque de autoridade que parecia natural.— Boa noite. — disse a jovem, sua voz aveludada e formal. — Meu nome é Ravena. Sou empregada da casa e também sua criada. Vim avisá-la que o jantar está pronto, e o senhor Eliezer a aguarda na sala de jantar.Luna piscou, tentando se acostumar à presença de Ravena. Antes que pudesse responder, a jovem olhou ao redor, notando as malas ainda intocadas no chão.
Segredos da floresta A madrugada estava silenciosa, exceto pelo leve farfalhar das árvores ao redor da mansão Bolívar. Luna virou-se na cama pela quarta vez, incapaz de pegar no sono. Algo dentro dela parecia inquieto, pulsando como se buscasse uma saída. Após alguns minutos de luta interna, ela cedeu. Levantou-se, foi até a janela e a abriu.O ar frio da noite tocou sua pele, e ela inspirou profundamente. O céu estava limpo, com uma lua cheia brilhante que parecia maior do que o normal, cercada por estrelas que cintilavam como pequenos cristais. O brilho prateado da lua iluminava o jardim da mansão, revelando o contorno das árvores e os caminhos de pedra.Luna sentiu um arrepio na espinha ao olhar para a lua. Algo sobre sua luz parecia... convidativo. Um calor inexplicável cresceu em seu peito, e ela não conseguiu desviar o olhar. Era como se a lua sussurrasse seu nome, atraindo-a para algo que ela não compreendia.Ela fechou os olhos, tentando entender aquela sensação. Em sua mente
Após a conversa no escritório, Luna desceu as escadas, ainda assimilando a ideia de voltar para a escola. Já havia algumas semanas desde o acidente de sua mãe, e ela não tinha certeza de como se sentiria rodeada por tantas pessoas desconhecidas.Eliezer estava esperando por ela no hall de entrada, segurando uma mochila preta simples e uma pilha de cadernos e livros encapados com cores sóbrias.— Aqui estão seus materiais. Achei que precisaria de algo básico para começar — disse ele, estendendo o conjunto.Luna aceitou os itens com um aceno de cabeça. A mochila parecia pesada, mas a preocupação maior não era o peso físico, e sim o que o dia traria.— Eu achei que talvez... não fosse voltar para a escola — confessou, hesitante.— Educação é essencial — respondeu Eliezer, categórico. — Além disso, será bom para você. Uma oportunidade de começar de novo, se adaptar.Luna não quis prolongar a conversa. Apesar de tudo, sabia que ele estava certo. Então subiu para o quarto, trocou de roupa e