DAVINAOutro quarto.Esse era outro quarto cheio de garotas, e eu era apenas mais uma.Colchões finos e cobertas surradas espalhavam-se pelo chão de concreto. Algumas meninas choravam baixinho, outras estavam sentadas, imóveis, com os olhos vazios.Eu engoli em seco. Um calafrio subiu pela minha espinha.Minhas mãos tremiam, mas não era só medo. Era raiva. Eu me lembrava do som do meu coração batendo contra o peito, do aperto sufocante em minha garganta antes de tudo escurecer. O ataque de pânico me deixou vulnerável, e foi naquele momento que me pegaram. Cerrei os punhos. Eu me odeio por isso.Olhando ao redor, reconheci algumas garotas do navio, elas soluçavam e se abraçavam, sussurrando que queriam ir para casa. Eu as entendi. Parte de mim queria chorar com elas, mas engoli o impulso.Eu precisava pensar.Foi quando o vi. Um dos capangas. Eu me lembrava dele do navio. O estômago revirou ao perceber que, se ele estava ali, então talvez…Aimee.Me levantei tão rápido que minha visão
MEIA-NOITE (HUXLEY)A chaleira chia baixo, o som irritante arranhando meus nervos. Eu me inclino para cima da bancada, observando a fumaça que sobe em espirais suaves, tentando convencer minha mente de que o chá vai me acalmar. O silêncio sempre me encontrou confortável. Não sou do tipo que precisa de conversas ou distrações. Sou alguém que sabe o que quer e age sem hesitar. Ou pelo menos, era assim até que ela apareceu. Eu coloco a fatia do bolo no prato. Mais uma tentativa de algo que não faz sentido. Eu nunca gostei de bolo.Açúcar demais.A primeira vez que ela me deu uma fatia, me deixou experimentar aquela mistura doce e fofa. Tão doce que fez meu estômago revirar, mas algo mais pesou na balança. Eu tenho certeza de que o problema estava com o bolo dela. Porque desde aquele momento, eu não consigo comer mais nenhum outro. Nada se compara. Este, da padaria, é insuportavelmente doce, a massa é pesada. Não é fofo. Não é dela. Eu me recuso a aceitar que estou reclamando de um mald
MEIA-NOITE (HUXLEY)Eu congelo, a mão ainda na maçaneta. Roubaram?— Quem? — pergunto, a raiva já fervendo dentro de mim.— Homens de KJ — Willow continua, com dificuldades para respirar. — Eles levaram todos os sacos da queen, a nova pílula de Gutemberg. Todos os lotes... sumiram.Viro para ele, sentindo a raiva se intensificar. A queen. A nova droga que Gutemberg inventou. O que deveria ser o nosso trunfo, a nossa vantagem, foi roubado bem debaixo do nosso nariz.— Como é que isso aconteceu? — pergunto, com os dentes cerrados.— Foi rápido. Eles invadiram o laboratório com muitas armas, tentamos reagir, mas éramos poucos e tinha
DAVINA—Você precisa aprender a se comportar.— Lucia disse com um sorriso doce, mas com um tom de desprezo disfarçado. Estávamos todas sentadas no canto do quarto, fazendo o que podíamos para aguentar o tédio e a angústia.—Você se acha melhor do que nós, não é?— respondi, sem conseguir segurar. —Porque eles te tratam como uma princesinha. Você realmente acha que está acima de tudo isso?Ela riu.— Eu com certeza sou melhor do que você.Bufei.Claro que ela acha isso.— Seu cérebro deve ser uma piscina vazia, não é? Da última vez que chequei, você é uma escrava como qualquer uma de nós. Então, não se iluda com o pão fresco, porque você ainda é o animal de estimação deles.Ela me olhou com uma mistura de raiva e desdém, mas não respondeu.Revirei os olhos e voltei a encarar a parede, repassando mentalmente todos os meus últimos momentos felizes com minha mãe.A porta se abriu com um estalo seco, e os guardas entraram, arrastando Ava pelo braço. Ela estava completamente desfigurada. Seus
DAVINAO espelho à minha frente estava embaçado, refletindo uma versão de mim mesma que eu mal reconhecia. O cabelo estava solto e molhado, o rosto pálido, os olhos ardendo de raiva, e o corpo... o corpo ainda não estava preparado para aquilo tudo. As roupas estavam lá, jogadas sobre a cama, roupas que me fizeram sentir como se estivesse me vestindo para um pesadelo, não para um "trabalho" que eu não tinha escolhido, que ninguém escolheria. Eu olhei o vestido na cama, o tecido preto como a escuridão que eu sentia por dentro, reluzindo sob a luz fraca da lâmpada. Um vestido feito para chamar atenção, como se fosse um prêmio que eles quisessem exibir. Me forcei a vestir o vestido, sentindo o tecido se ajustar sobre meu corpo. A parte superior era justa, com um decote ligeiramente profundo, mas o verdadeiro inferno estava nas laterais, onde o corte fazia uma linha quase até minha cintura, deixando parte da pele exposta. As linhas do tecido contornavam meu corpo de maneira vil, apertando
DAVINAVincent entrou sem pressa, mas sua presença preencheu cada canto da sala. O silêncio entre nós foi denso, como fumaça espessa. Meus olhos subiram por sua silhueta escura e bem definida, e então se fixaram no rosto. Ele estava impecavelmente vestido, como sempre, com um terno escuro e uma camisa branca perfeitamente ajustada. Seus cabelos, impecavelmente arrumados, e seus olhos penetrantes e frios me encaravam como se eu fosse um animal exótico.Meu estômago revirou. Eu o conhecia, mas não de verdade. Não éramos próximos. Mas nossas histórias se cruzaram suficiente para eu lembrar.Príncipe sombrio. Era assim que eu o chamava na minha mente. Porque Vincent Mancini tinha o porte de alguém que governava na escuridão. A elegância, o perigo e a frieza de alguém que não pertencia ao mundo c
DAVINAEsta é a quarta vez que estou indo à boate, mas não estou tão nervosa como da primeira vez. No começo, meu estômago revirava só de pensar que eu teria que tocar em um homem e fingir que gostava. Agora, não preciso me preocupar. Eu sei quem vai estar lá. Eu sei o que vai acontecer.Vincent.Eu não sei ao certo o que acontece entre a gente. Ele prometeu que me ajudaria, mas não fizemos muitos avanços nesse quesito e começamos a chamar atenção negativa.A primeira vez foi... surreal. A gente só dançou. A música lenta, os olhos dele me queimando enquanto ele me puxava para perto. Eu pensei que fosse derreter sob aquele olhar, e quando ele me tocou, de forma suave, mas possessi
DAVINAO som grave da música vibrava através das paredes, uma melodia ascendente, abafando minha própria respiração. A luz vermelha do ambiente pintava a pele de Vincent com um brilho febril, sombras recortando seus traços afiados. Ele estava ali, meu príncipe sombrio, a única coisa entre mim e minha ruína.Meus dedos tremiam quando ele segurou minha cintura, firme, como se me dissesse sem palavras que estava tudo bem. Mas não estava. Nunca esteve. Eu sentia os olhos famintos dos outros sobre nós, o vidro que nos separava do resto do clube era apenas um detalhe. Eles estavam ali para assistir.Eu me obriguei a erguer o olhar, encontrando o cinza tempestuoso dos olhos de Vincent. Ele não parecia diferente, não parecia tenso. Pelo contrário, me encarava com aquela intensidade calculada, aquele misto de fascínio e domínio que me fazia esquecer que aquilo era uma mentira.— Davina, confie em mim. — A voz dele soou baixa, rouca, só para mim.Engoli em seco e assenti. Confiar. OK.As mãos d