MEIA-NOITE (HUXLEY)
Eu congelo, a mão ainda na maçaneta. Roubaram?
— Quem? — pergunto, a raiva já fervendo dentro de mim.
— Homens de KJ — Willow continua, com dificuldades para respirar. — Eles levaram todos os sacos da queen, a nova pílula de Gutemberg. Todos os lotes... sumiram.
Viro para ele, sentindo a raiva se intensificar. A queen. A nova droga que Gutemberg inventou. O que deveria ser o nosso trunfo, a nossa vantagem, foi roubado bem debaixo do nosso nariz.
— Como é que isso aconteceu? — pergunto, com os dentes cerrados.
— Foi rápido. Eles invadiram o laboratório com muitas armas, tentamos reagir, mas éramos poucos e tinha
DAVINA—Você precisa aprender a se comportar.— Lucia disse com um sorriso doce, mas com um tom de desprezo disfarçado. Estávamos todas sentadas no canto do quarto, fazendo o que podíamos para aguentar o tédio e a angústia.—Você se acha melhor do que nós, não é?— respondi, sem conseguir segurar. —Porque eles te tratam como uma princesinha. Você realmente acha que está acima de tudo isso?Ela riu.— Eu com certeza sou melhor do que você.Bufei.Claro que ela acha isso.— Seu cérebro deve ser uma piscina vazia, não é? Da última vez que chequei, você é uma escrava como qualquer uma de nós. Então, não se iluda com o pão fresco, porque você ainda é o animal de estimação deles.Ela me olhou com uma mistura de raiva e desdém, mas não respondeu.Revirei os olhos e voltei a encarar a parede, repassando mentalmente todos os meus últimos momentos felizes com minha mãe.A porta se abriu com um estalo seco, e os guardas entraram, arrastando Ava pelo braço. Ela estava completamente desfigurada. Seus
DAVINAO espelho à minha frente estava embaçado, refletindo uma versão de mim mesma que eu mal reconhecia. O cabelo estava solto e molhado, o rosto pálido, os olhos ardendo de raiva, e o corpo... o corpo ainda não estava preparado para aquilo tudo. As roupas estavam lá, jogadas sobre a cama, roupas que me fizeram sentir como se estivesse me vestindo para um pesadelo, não para um "trabalho" que eu não tinha escolhido, que ninguém escolheria. Eu olhei o vestido na cama, o tecido preto como a escuridão que eu sentia por dentro, reluzindo sob a luz fraca da lâmpada. Um vestido feito para chamar atenção, como se fosse um prêmio que eles quisessem exibir. Me forcei a vestir o vestido, sentindo o tecido se ajustar sobre meu corpo. A parte superior era justa, com um decote ligeiramente profundo, mas o verdadeiro inferno estava nas laterais, onde o corte fazia uma linha quase até minha cintura, deixando parte da pele exposta. As linhas do tecido contornavam meu corpo de maneira vil, apertando
DAVINAVincent entrou sem pressa, mas sua presença preencheu cada canto da sala. O silêncio entre nós foi denso, como fumaça espessa. Meus olhos subiram por sua silhueta escura e bem definida, e então se fixaram no rosto. Ele estava impecavelmente vestido, como sempre, com um terno escuro e uma camisa branca perfeitamente ajustada. Seus cabelos, impecavelmente arrumados, e seus olhos penetrantes e frios me encaravam como se eu fosse um animal exótico.Meu estômago revirou. Eu o conhecia, mas não de verdade. Não éramos próximos. Mas nossas histórias se cruzaram suficiente para eu lembrar.Príncipe sombrio. Era assim que eu o chamava na minha mente. Porque Vincent Mancini tinha o porte de alguém que governava na escuridão. A elegância, o perigo e a frieza de alguém que não pertencia ao mundo c
DAVINAEsta é a quarta vez que estou indo à boate, mas não estou tão nervosa como da primeira vez. No começo, meu estômago revirava só de pensar que eu teria que tocar em um homem e fingir que gostava. Agora, não preciso me preocupar. Eu sei quem vai estar lá. Eu sei o que vai acontecer.Vincent.Eu não sei ao certo o que acontece entre a gente. Ele prometeu que me ajudaria, mas não fizemos muitos avanços nesse quesito e começamos a chamar atenção negativa.A primeira vez foi... surreal. A gente só dançou. A música lenta, os olhos dele me queimando enquanto ele me puxava para perto. Eu pensei que fosse derreter sob aquele olhar, e quando ele me tocou, de forma suave, mas possessi
DAVINAO som grave da música vibrava através das paredes, uma melodia ascendente, abafando minha própria respiração. A luz vermelha do ambiente pintava a pele de Vincent com um brilho febril, sombras recortando seus traços afiados. Ele estava ali, meu príncipe sombrio, a única coisa entre mim e minha ruína.Meus dedos tremiam quando ele segurou minha cintura, firme, como se me dissesse sem palavras que estava tudo bem. Mas não estava. Nunca esteve. Eu sentia os olhos famintos dos outros sobre nós, o vidro que nos separava do resto do clube era apenas um detalhe. Eles estavam ali para assistir.Eu me obriguei a erguer o olhar, encontrando o cinza tempestuoso dos olhos de Vincent. Ele não parecia diferente, não parecia tenso. Pelo contrário, me encarava com aquela intensidade calculada, aquele misto de fascínio e domínio que me fazia esquecer que aquilo era uma mentira.— Davina, confie em mim. — A voz dele soou baixa, rouca, só para mim.Engoli em seco e assenti. Confiar. OK.As mãos d
DAVINADe volta ao alojamento, o cheiro de cigarro e perfume barato impregnava o ar. Meus músculos ainda estavam tensos, e meu coração batia em um ritmo irregular. Eu não conseguia tirar a sensação dos lábios de Vincent dos meus, nem apagar a imagem de seus olhos escurecendo no momento em que nos afastamos.Então, a voz cortante de Lucia me trouxe de volta à realidade.— Você se divertiu, boneca? — Ela perguntou, encostada no batente da porta, os braços cruzados, o sorriso venenoso brincando em seus lábios pintados de vermelho.Seus cabelos ruivos brilhavam sob a luz fraca do corredor, uma moldura perfeita para seu rosto de fada, contrastando com o olhar cruel.Eu parei no meio do quarto, sentindo o peso de seu olhar deslizando sobre mim. Havia algo diferente nela. Um ressentimento, um aviso silencioso. Eu soube antes mesmo que ela falasse.— Eu estava lá, sabia? — Ela continuou, seu tom casual demais para ser sincero. — Vi tudo. Quer dizer, vi até seu cliente vip apagar as luzes. Voc
VINCENTEu estava sentado no carro, o único som era o eco da música distante que chegava pela janela entreaberta. A morte de meu pai, o capo, mal havia sido digerida, mas as consequências eram implacáveis. A traição do seu próprio irmão, que preparou a armadilha, ainda estava fresca. Eu tinha a raiva, a dor, e a vingança a cada passo que eu dava, mas não podia deixar isso me cegar.O problema é que a Itália não era mais uma opção.A minha cabeça tinha preço. Muitos queriam me ver morto por poder, dinheiro ou vingança. Principalmente, meu tio. A única coisa que maldito filho da puta deseja mais do que minha morte é o posto de capo que me pertence. Ele pensava que, agora que meu pai estava fora do jogo, eu voltaria para lá, como a tradição manda. Mas ele estava enganado. Não podia retornar à Itália agora que eu era um alvo fácil.O som da porta se abriu, interrompendo meus pensamentos. Não precisei levantar os olhos para saber quem era.— Você está bem com toda essa história do seu pai
DAVINAO vapor quente ainda pairava no banheiro quando saí, esfregando a toalha nos cabelos úmidos. A água quente tinha ajudado a dissolver a camada de hidratante e spray bronzeador, o cheiro repugnante e nocivo daquele lugar, mas não levava embora a tensão dentro do meu peito. Ainda não.A camiseta larga e o short que eu vestia pertenciam a Gutemberg. O tecido macio e gasto contra minha pele parecia mais seguro do que qualquer coisa que eu havia usado nos últimos dias. Eu respirei fundo antes de dar um passo para fora do corredor estreito do apartamento de Vincent.O ambiente estava silencioso, exceto pelo ruído abafado da cidade lá fora. A luz fraca da luminária sobre a mesa de centro criava sombras compridas nas paredes. Meus olhos se voltaram automaticamente para a pequena varanda e lá estava ele, o cara que vinha ganhando espaço no meu coração e mente, minha maça proibida, Gutemberg estava sentado no chão, com os cotovelos apoiados nos joelhos, o olhar fixo no céu.Hesitei antes