DAVINAEu fiquei de pé, os olhos fixos em Timmy, Aaron e Meia-noite, sem deixar escapar um movimento sequer. Cada um deles parecia tentar evitar o meu olhar, mas eu podia sentir a tensão crescente no ar. Eles me trouxeram de volta ali, como se estivessem me jogando de volta numa prisão da qual eu tentava escapar. Não conseguia engolir a história que eles estavam tentando me vender. Algo estava errado, e eu não descansaria até entender o quê.— Quem eram aqueles homens? — perguntei, minha voz mais fria que a própria noite ao redor de nós.Timmy evitou me olhar, franzindo a testa, uma mistura de desconforto e culpa estampada no rosto. Aaron, por sua vez, trocou um olhar rápido com Meia-noite, ambos parecendo ainda mais inquietos. O silêncio que se seguiu foi pesado demais, como se estivessem escondendo algo.Meia-noite foi o primeiro a falar, mas suas palavras foram vazias, evasivas, como se ele estivesse tentando ganhar tempo.— Não sabemos quem eram. — Ele disse, a voz carregada de u
DAVINAO motor do carro de Aaron roncava baixinho na escuridão da rua deserta. A luz fraca do poste piscava, projetando sombras irregulares no asfalto. Daí de dentro, podíamos ver a casa da minha mãe, suas janelas fechadas e a silhueta de uma cortina se movendo levemente com o vento.Eu estava no colo de Timmy, sentindo o calor do seu corpo contra o meu. Ele tamborilava os dedos na minha coxa, inquieto, enquanto olhava pela janela. Gutemberg estava no banco ao meu lado, calado como sempre, mas com o maxilar travado. Aaron e Meia-noite dividiam o banco da frente, conversando em sussurros sobre alguma coisa que eu não fazia questão de ouvir. Meia-noite acendeu um cigarro, e o cheiro amargo de nicotina preencheu o carro.— Então, você está dizendo que Pryia sabia mais do que contou? — Aaron finalmente quebrou o silêncio, se virando levemente para me encarar.— Eu não acho. Eu tenho certeza. — Minha voz saiu firme, mas meu estômago se contorcia com as lembranças. — Lucia não gostava de mi
DAVINA— Quanto tempo mais vamos ficar esperando a Pryia sair de casa? — Aaron perguntou, olhando para a casa da minha mãe. — Estou morrendo de fome.Meia-noite bufou com impaciência e virou a cabeça para Aaron, seu olhar carregado de sarcasmo.— Se você quiser ir vigiar os ceifadores junto com Mart e Silver, pode ir. — A voz dele foi carregada de comando, mas, em algum lugar ali, havia também um toque de brincadeira.Aaron riu, sem perder a compostura, e puxou uma barra de cereal de sua jaqueta jeans, exibindo-a como uma conquista. Ele olhou para Meia-noite com um sorriso de canto, claramente desinteressado na oferta.— Prefiro ficar aqui no carro com a nossa garota. — disse Aaron, e, então, se virou para mim, com um sorriso ainda mais largo. — Quer um pedaço da minha barra? É de morango com chocolate.Ele segurou a barra de cereal entre os dedos, estendendo-a em minha direção, mas antes que eu pudesse responder, percebi que meu rosto estava quente, queimando de vergonha. Eu podia sen
DAVINAO caminho de volta da casa de Pryia foi feito em silêncio, apenas o ronco baixo do motor e o som distante da cidade preenchendo o vazio dentro do carro. Eu estava no banco da frente, ao lado de Meia-noite, enquanto Aaron, Timmy e Gutemberg dividiam o banco de trás.Quando paramos na lanchonete para pegar algo rápido, todos compraram seus lanches e voltaram para o carro. O cheiro de batatas fritas e hambúrgueres tomou conta do ambiente enquanto cada um se ocupava com sua comida. O rádio tocava uma música qualquer, abafada pelos mastigares e pelo silêncio carregado de tensão.Foi então que Gutemberg limpou a boca com o dorso da mão, largou o sanduíche no colo e limpou a garganta.— Parece que Aaron e Timmy estavam certos. Sua irmã ainda sente algo por mim.O barulho de papel amassado parou. Meus dedos apertaram o copo de refrigerante. Ninguém disse nada.— Ela tentou me beijar.— ele explicou.— Eu sabia! — Aaron gritou, alheio a minha expressão.Timmy fez um som de desgosto.Meia
DAVINAO quarto era silencioso, exceto pelo som suave da chuva lá fora. Meia-noite tinha me conduzido até lá, e agora estávamos apenas nós dois, a tensão pairando no ar como algo quase palpável. Eu estava parada, perto da cama, hesitando. O cheiro familiar dele ainda estava no ar, mas não era o suficiente para me fazer esquecer a insegurança que me tomava.Essa era a segunda vez que eu ia dormir com Meia-noite, e a sensação era estranhamente diferente. Não pela proximidade, porque, na verdade, estávamos mais próximos do que nunca. Mas porque, dessa vez, havia algo mais profundo em jogo que parecia pairar entre nós.— Você não precisa de nada, né? — Meia-noite perguntou, a voz suave, mas com aquela firmeza típica. Eu olhei para ele, e pela primeira vez naquela noite, vi uma rachadura na máscara dele. Talvez ele não soubesse, mas seus olhos estavam diferentes, mais suaves, como se estivessem buscando algo em mim.Eu balancei a cabeça, sem saber o que responder. A verdade é que eu não tin
DAVINAEu nem tive tempo de pensar. Meia-noite me puxou para trás de seu corpo. Eu nem vi quando ele sacou a pistola, mas lá estava ela, fria e mortal em sua mão, apontada para o vazio.— Não se mexa — ele ordenou, a voz baixa, mas carregada de comando.Por reflexo, prendi a respiração. Ele era puro controle e precisão, os ombros largos e tensos, pronto para disparar a qualquer momento. O olhar dele varreu o ambiente e, em seguida, focou nos outros dois que surgiram da escuridão.Timmy e Aaron.Ambos armados.Os dois vestiam apenas calças de moletom, descalços, e ainda assim pareciam perigosos demais para serem apenas garotos acordando no meio da noite. Timmy tinha o cenho franzido, o cabelo bagunçado e a pistola firme na mão. Aaron, ao lado dele, exibia um brilho alerta nos olhos, como se a adrenalina tivesse varrido qualquer resquício de sono. E então, no topo da escada, apareceu Fantasma.Diferente dos outros, ele usava uma camisa preta que parecia ter sido feita sob medida para a
DAVINAO silêncio dentro da casa era quase ensurdecedor. Era raro ter um momento só para mim ultimamente, mas eu sabia que não deveria reclamar. Todos os caras estavam na rua resolvendo mais um dos inúmeros problemas que surgiram desde que decidimos enfrentar aquela gangue maldita. Eu queria estar lá, queria lutar ao lado deles, mas sabia que minha presença era um risco. Pelo menos, era o que todos insistiam em dizer.Suspirei, apoiando os cotovelos na bancada da cozinha, tentando ignorar o incômodo no peito. A verdade era que, apesar de tudo, eu me sentia inútil. Estava segura, mas não fazia nada além de esperar. E esperar nunca foi o meu forte.O som de batidas na porta me tirou dos pensamentos. Meu corpo se moveu automaticamente. Talvez fosse um dos caras que esqueceu algo ou quisesse checar como eu estava. Sem hesitar, girei a maçaneta e abri a porta.O ar pareceu sair dos meus pulmões quando vi quem estava ali.Pryia.O olhar da minha irmã era uma mistura de choque e alívio, como
DAVINADAVINAMinha cabeça latejava. O mundo ao meu redor girava quando abri os olhos, piscando repetidamente para tentar focar minha visão.Tudo branco. Paredes, móveis, teto.Tentei me mexer e percebi que algo prendia meus tornozelos. Não o suficiente para me manter no chão, mas as correntes limitavam meus movimentos. Podia andar, mas apenas passos curtos. Correr estava fora de questão.Meu coração disparou.Onde diabos eu estava!?Meu corpo doía. Cada músculo e cada fibra. Meus olhos estavam pesados, a visão embaçada, e tudo girava. Tentei me levantar, mas meu equilíbrio falhou, e caí de volta na cama, meu corpo fraco demais para me sustentar.Respirei fundo, tentando me concentrar. Quando finalmente consegui ficar de pé, cambaleando, dei um passo incerto até a porta. Minhas mãos trêmulas alcançaram a maçaneta e eu tentei abrir, mas não havia jeito. A porta não cedeu.Foi quando os flashes começaram.Pryia. A imagem dela me encarando com olhos vazios. A última coisa que eu me lembra