Capítulo 2

PV Marylin Darlinghton

Os dois homens me olhavam curiosos, pensei que talvez eles me expulsariam do barco, mas não foi o que aconteceu, eles me deram roupas que ficaram extremamente grandes, mas que eram confortáveis, eles não pediram explicações. Apenas me olhavam e esperavam por algo que eu dissesse além de obrigada.

 — As roupas ficaram grandes, mas eram as únicas que tínhamos aqui que caberia em você, era da minha filha antes dela decidir se casar – disse o senhor mais velho, observando como a roupa estava sobrando em meu corpo de modelo. — Ela era um pouco mais robusta que você — comentou sorrindo, ele mostrava um olhar de saudade no rosto.

 — Ela está muito longe? — Sem dúvida meu pai sentiria o mesmo que ele, e isso me entristecia, se ao menos o tivesse escutado, agido diferente, eu estaria com ele, sem precisar ter medo da minha sombra.

 — Ela acabou de se casar, está morando em Atenas, pelo menos por enquanto – disse com pesar. — Eu não queria que ela se casasse sabe, ela é tão nova, tem tanto para viver, e agora tudo que a espera são filhos e uma casa para cuidar. — Ele me olhou e parecia vê-la. — Eu queria que ela ganhasse o mundo como eu não pude, que ela lutasse por algo a mais. Não consegui ajudá-la, mas talvez consiga ajudar você — disse estendendo a mão. — Meu nome é Ulisses e o homem que você conheceu é meu filho Aquiles. — Peguei na mão dele uma segunda vez naquele dia, agora com a certeza de que ele era um bom homem e que talvez eu pudesse, pelo menos, por um curto período, ficar em paz, sentindo a brisa do mar sem ter medo do que vinha atrás de mim nem do que me esperava no futuro.

 — Sou Mary.

Ao me apresentar, foi como se liberasse um mundo de expectativas. Daqui para frente, ali naquele barco, rodeada por aquelas duas pessoas, eu tinha a chance de seguir, de ser quem eu era, sem ter medo de errar, de me arrepender, eu estava sozinha, sem dinheiro, sem saber para onde ir, a não ser por aquele barco que viajava à mar aberto em direção ao horizonte para longe da França, longe de William, para longe de tudo que um dia ele me causou, da dor, do ressentimento e daquela dor. A dor do amor era um tema que sempre odiei ler, sempre evitei romances porque era como entrar em uma prisão sem fim, mesmo que não fosse sua história, você acabava sendo influenciada, como muitas meninas da minha idade eram, agora aqui andando entre a cozinha e o único quarto do barco me perguntava se talvez eu tivesse pegado uma história qualquer, de um romance qualquer, eu não tivesse sido preparada para William, talvez os livros de romances podiam ter me salvado do meu trágico fim, e do meu longo futuro obscuro mais à frente.

Eu tinha chegado ali com garra e coragem, depois de tudo que eu passei, estar ali rodeada por boas pessoa talvez fosse uma recompensa do destino, por ter me entregado a um homem que não me amava, um monstro, era isso que ele era e sempre seria, eu jamais o perdoaria, jamais conseguiria esquecer as noites em tormenta que passei, toda a dor física que ele tinha me feito passar, a dor emocional que eu ainda sentia, porque no fundo saber que meu coração batia forte por ele, mesmo depois de tudo, era como se fosse um segundo castigo pelas minhas escolhas erradas, pelo fato de eu o escolher, em vez da minha liberdade, algo pela qual sempre lutei, eu sempre fui diferente e ao conhecer William eu queria me tornar normal, simples, humana. Esqueci o que sempre me fez viver e lutar, esqueci daquilo pelo qual eu fiz meu pai me apoiar a cada ano da minha vida, aquilo que fazia com que qualquer medo fosse embora, aquilo que fazia com que eu subisse em árvores e aos cincos anos montasse em meu primeiro cavalo sem ter medo do quão alto eu estaria montada nele, e no fato de que podia cair a qualquer momento. Liberdade, a minha liberdade, sempre me levou a locais e problemas pelos quais só me fizeram crescer e não me arrepender de nada do que já fizera em minha vida, até o exato momento em que um homem fez com que ela perdesse lugar.           

Não sabia para onde esse barco iria me levar, mas sabia que iria sobreviver. Nada mais nessa vida podia me atingir, eu ia viver como vivia antes de William, mas agora pela primeira vez eu estaria sozinha, sem nada além do meu reflexo no espelho e o meu vestido de noiva que ao colocá-lo numa sacola era como se estivesse abrindo outra porta para achar o que seria do meu presente, não sabia o que faria com ele, mas desejava jogá-lo no fundo do mar como meu passado de poucas horas atrás.

 — Não o jogue. — Olhei para trás vendo Ulisses me observando. — Ele deve ter custado caro, você pode vendê-lo, e assim conseguir algum dinheiro —  falou, apontando-me um dos beliches.  — Pegue e coloque o vestido debaixo da cama, deixe o lá e quando fizermos a última parada em Atenas irei te levar a uma costureira, tenho certeza de que ela pagará bem pelo vestido, o suficiente para você sobreviver – disse, aproximando-se e pegando em meu ombro antes de levantar a mão, secando uma lágrima que nem eu mesma sabia que tinha derramado. — Reze para os deuses, eles sempre têm uma solução para tudo — disse antes de sair, deixando-me sozinha, joguei-me na cama empurrando o vestido para o chão e para debaixo dela. Aquele seria meu destino então. Atenas, Grécia.

Tinha um destino, só faltava resolver o que fazer com ele.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo