Laços de Fuga e Amor
Laços de Fuga e Amor
Por: Vickyara
prólogo

Cintia Sharapova

Chovia torrencialmente, as gotas grossas e implacáveis batiam no meu rosto, obscurecendo a minha visão. O caminho à frente era um borrão de escuridão e lama.

A minha perna latejava, o machucado inflamado dificultando cada passo. Não havia alternativa senão continuar a correr, a determinação me impulsionando adiante.

As luzes distantes da taberna eram minha única esperança; precisava ser forte para alcançá-las. Olhei para trás, mas não consegui mais avistar os meus perseguidores. Segui as luzes que candeiavam a estrada asfaltada, como faróis de salvação em meio à tempestade.

A taberna se aproximava, um refúgio em meio ao caos. Ao entrar, fui recebida por uma agitação abafada de pessoas. O som das vozes e risadas se misturava com o tamborilar da chuva no telhado de zinco. Luzes dançantes projetavam sombras nas paredes de madeira, fazendo-me estremecer. A atmosfera era densa, carregada de segredos e histórias não contadas.

Aproximei-me do balcão, as minhas roupas encharcadas gotejando no chão de tábuas. O bartender, um homem robusto com olhos cansados, não demorou a atender o meu pedido.

“Uma garrafa de Tequila,” murmurei, a minha voz quase perdida na cacofonia do lugar. Ele serviu a bebida com eficiência, e eu segurei-a com firmeza, como se fosse um amuleto de coragem.

Caminhei em direção ao balneário, seguindo as indicações que vi logo ao entrar. O corredor estava repleto de pessoas: marinheiros com olhos de ressaca, mulheres misteriosas envoltas em xales, e um grupo de bêbados ruidosos que quase me derrubou. O cheiro de tabaco e suor impregnava o ar, mas, surpreendentemente, o ambiente estava limpo, como se a própria taberna zelasse por sua reputação. Despejei a tequila ardente no meu joelho ferido, sentindo o líquido queimar como brasas. Resmunguei de dor, mas não podia parar.

Foi então que ouvi o barulho estranho: uma mistura de gritos abafados e objetos sendo arrastados. O que estaria a acontecer nos recônditos daquela taberna? O meu coração acelerou, e eu soube que, mesmo ali, sob a chuva e os olhares curiosos, estava prestes, eram eles, meus perseguidores, tão próximos e ameaçadores quanto a tempestade lá fora.

O que me aguardava nos recônditos daquela taberna?

A dor latejava na minha perna, mas não havia tempo para fraqueza. Tapei a ferida com um trapo sujo e decidi sair do balneário.

O ambiente mudara drasticamente. A taberna, antes abafada e enevoada, agora fervilhava de confusão. Eram eles, os homens que me perseguiam. Precisava escapar dessa armadilha.

Um dos homens me notou. Os seus olhos, frios como aço, miraram-me. Ele estava pronto para disparar. Subitamente, alguém puxou-me, e caí no chão, protegida pelo balcão do bar. Olhei para meu benfeitor. Os seus olhos azuis cintilavam, e a sua expressão era uma mistura de determinação e surpresa. “Precisamos sair daqui,” disse ele, como se eu fosse uma criança em perigo. Ele não sabia nada sobre mim, presumindo que o seu ato heroico resgatava uma princesa em apuros.

Sem esperar por sua atenção, atirei uma bola de fumo, obscurecendo a nossa posição. Virei-me para ele, puxando o seu braço. “Vamos,” sussurrei.

Saímos correndo, sem rumo, pelo corredor. O instinto guiou-me até uma porta de emergência, e descemos as escadas, emergindo do outro lado da rua deserta. A minha ferida latejava, e ele notou. “Você está machucada, precisa ir a um hospital,” declarou, preocupação evidente nos seus olhos azuis. “Eu dou conta,” respondi, firme.

“É aqui que nos separamos, príncipe.” Ele sorriu torto, um riso de escárnio. “Príncipe eu?” indagou, rindo. Os seus olhos ainda me intrigavam.

“Adeus,” murmurei, dando-lhe as costas.

Manquei com o objetivo de chegar a uma pensão qualquer. Mas algo estranho ecoava no ar. O meu instinto insistia para continuar, mas, O ruído que se desenvolvia lá atrás me fez recuar. Retrocedo, tudo graças a esse coração.

Não foi por acaso que me meti nessa confusão toda. Lá está ele, ameaçado por dois homens. Eles devem ter visto que ele estava comigo.

Enquanto estou escondida, tiro uma faca do meu bolso, e atiro em direção a um deles, e ele fica distraído em querer ver o machucado, e querer ver que direção veio o ataque. O outro homem parece confuso, tentando entender o que está acontecendo. É aí que saio do esconderijo e ataco: dou-lhe um pontapé no estômago. O príncipe, por sua vez, enfrenta o outro homem que já estava aleijado. Juntos, imobilizamos ambos. "Vamos antes que venham mais", digo, e ele segue-me. "É espantoso o que fez. Estou em dívida com você", diz ele. Ignoro-o

completamente.

"Aonde vamos? Tenho um quarto de hotel", acrescenta. "Vá para lá, então", respondo, mancando.

"Não posso deixar-te sozinha nesse estado, após você ter salvo a minha vida", insiste ele, com sinceridade na voz.

"Então siga-me sem comentar nada", ordeno, e ele obedece.

Entramos numa pensão. O bom das pensões é que ninguém se mete na sua vida. Pouco se importam se você está aleijado ou não, ou como obteve o machucado. No hotel, seria diferente; eles nos descobririam. A pensão, com a sua atmosfera desgastada e paredes finas como papel, parecia um refúgio improvável para o príncipe Charme e eu.

A atendente, com um sorriso cansado, nos informou: "Só temos um quarto disponível." Olhei para o príncipe e, com um tom de sinceridade, disse: "Esse lugar não tem nada a ver contigo." Queria que ele abandonasse a sua fachada heroica e buscasse o conforto que merecia. Mas ele não hesitou. Olhou diretamente para a atendente e declarou: "Então queremos esse quarto."

Subimos as escadas íngremes, que pareciam se estender até o infinito, e entramos no quarto. Era típico de uma pensão: móveis desgastados, cortinas desbotadas e um cheiro de história impregnado nas paredes. Vi a expressão de desconforto no rosto do príncipe charme.

Enquanto ele se acomodava, eu fui direto à casa de banho para cuidar da minha ferida. Liguei o meu celular e deparei-me com a última mensagem de Kovalenco: "Não sairá viva dessa cidade. Entrega-te, Cintia. Colocamos a sua cabeça a prémio." Terminei de ler e joguei o cartão na pia.

Fechei a ferida e, ao sair, encontrei o príncipe sentado em uma das camas, como se me esperasse. "Ainda acordado?" perguntei. Ele sorriu. "Queria ter certeza de que está tudo bem. Afinal, você é minha salvadora, e devo-lhe por isso."

Brinquei: "Até mesmo me arranjar uma maneira de sair desta cidade?" Os seus olhos não desviaram dos meus.

"Tenho um jato. Posso levar-te para onde quiser."

"É mesmo? Então preciso sair amanhã cedo." A minha mente estava alerta, e a dor na perna deixava-me trémula. Ele concordou: "Perfeito. Farei algumas chamadas pela manhã assim que encontrar meu celular."

"Fechado", respondi, deitando-me na cama ao lado. Tentei fechar os olhos, mas a ideia de homens me procurando-me mantinha acordada. Olhei para o príncipe, que também estava desperto, e decidi tentar dormir novamente, ignorando a tensão no ar.

[...]

O sol incide diretamente na minha fronte, e ao abrir os olhos com cautela, percebo com maior nitidez que este quarto não é tão asqueroso como parecia ontem. Talvez eu já esteja acostumada.

O ambiente está envolto em silêncio, e a pergunta surge: onde estará o príncipe charme? No criado-mudo, encontro um bilhete com uma caligrafia elegante, prometendo que ele voltaria e saiu em busca de um celular.

Decido lavar-me e cuidar da minha ferida enquanto espero por ele. Para minha surpresa, ele retorna mais rápido do que imaginei. A porta se abre, e, inicialmente, penso que poderiam ser meus perseguidores, mas logo lembro dele. Ele está bem vestido, carregando sacolas.

É um homem alto, com cabelos loiros lisos e olhos da cor dos céus. A sua presença é cativante, e me pergunto se será o efeito da ferida.

"Eu trouxe café, medicamentos para aliviar a dor e roupas. Temos pouco tempo; o meu carro e o jato estão à espera", diz ele, olhando para o relógio.

"Muito obrigada", sussurro sem jeito. Ele é, de fato, meu príncipe charme, mesmo que não tenha chegado montado num cavalo branco.

Visto as roupas que ele trouxe: uma camisa de linho e uma calças jeans da marca Mamacita. Surpreendentemente, o tamanho é perfeito, algo raro para minhas curvas. Olho-me no espelho, o meu rosto negro oval sem maquiagem.

Sinto-me horrível, mas tento arrumar os meus cabelos cacheados e volumosos. Saí da casa de banho e encontrei-o dando voltas pelo quarto, falando ao celular.

Ele fez um gesto com a mão, indicando a saída. O céu estava nublado, e o vento soprava forte. À nossa frente, um Mercedes preto estava estacionado, e dele saiu um homem de terno para abrir a porta. Ainda no celular, ele parecia entediado e preocupado com algo. Finalmente, chegamos ao heliporto, e ele desligou o celular. Entramos no jato, e percebi que ele estava desconfortável. Tentei quebrar o gelo: "Aliás, qual é o seu nome?", perguntei, buscando mudar o clima.

"Eu confesso que gostei do apelido 'príncipe'", disse ele, finalmente sorrindo. Os seus dentes eram perfeitos, como se tivessem sido esculpidos pelos deuses.

"Príncipe, o meu é Cintia", respondi, estendendo a minha mão. "Harris. Foi um prazer", disse ele, apertando a minha mão com firmeza.

"Para onde você quer ir?", perguntou.

"Bongavielle", afirmei. Escolhi essa cidade calma, onde muitos emigrantes conseguem se destacar. Assim que estiver estável, planeio ir para um lugar bem distante.

"Certo, estamos próximos", disse ele. Novamente, voltou ao seu computador portátil. Esse homem parecia triste. Acabei adormecendo, exausta pela noite difícil que havia mudado a minha vida para sempre. Acordei com alguém me agitando. Abri os olhos e deparei-me com o rosto angelical do príncipe Charme.

"Chegamos a Bongavielle", anunciou. O meu coração apertou, como se eu não quisesse ir embora, mas sim ficar com ele.

"Certo", respondi, levantando-me. Ele fez o mesmo. Fui surpreendida com um abraço. "Até a próxima, minha salvadora", sussurrou.

"Até um dia, príncipe Charme", disse, enquanto ele sorria e observava-me partir…

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