"O destino une e separa as pessoas, mas nenhuma força é grande o suficiente para nos fazer esquecer o que sentimos por elas."
Sara Aster.
Após cansar de olhar pra janela do carro, inclinei o banco e liguei meu ipod. Somente minhas músicas poderiam me confortar naquela monotonia. Sabia que tinha que ligarpra Ana, havia prometido, mas não queria falar com ela tendo minha mãe por perto. Poderia dizer algo comprometedor.Fechei os olhos e me concentrei no som que saía dos fones, mas era impossível relaxar e pensar em nada. Não sei porquê, mas algo estava me deixando ansiosa. O que poderia ter naquele lugar de tão interessante? Provavelmente nada. Fora que precisava me recordar de cinco em cinco minutos do porquê estava fazendo tudo aquilo. Meus devaneios estavam me deixando sonolenta, e eu teria adormecido se não fosse pelos cutucões da minha mãe em meu braço.
– Oi. O que foi? – disse sem abrir os olhos e com uma voz mal humorada.
– Esqueci de te dizer. Logo logo você terá alguém pra te fazer companhia. – falou, não se importando com minha irritação.
– Como assim? Ai, meu Deus! Mãe, você tá grávida? – falei desesperada ao me tocar no que ela acabara de dizer.
– Mas é claro que não, Elisa! Estou tentando te dizer que o Daniel irá morar conosco. Lembra dele pelo menos? Meu filho, seu irmão mais velho... Ele irá fazer faculdade de medicina e a casa do Tom é a mais viável pra a universidade em que ele pretende se formar. Então combinamos de que Dan moraria conosco. Não quero que meu filho continue cuidando daquele homem. Porque mais parece que quem é o pai ali é o Daniel.
Minha mãe nunca falava o nome do pai do meu irmão. Ela tinha tanta raiva dele que só o chamava de “aquele homem”. Também, depois de ter traído ela com a primeira que passou na rua, não me admira que ela o odiasse.
– Eu deveria me lembrar dele, não deveria? Depois de tanto tempo...
Eu tinha um irmão. Um irmão que eu só conhecia por fotos. Um irmão que morava com o pai desde quando eu ainda usava fraldas. Mas eu deveria me lembrar dele, deveria sentir que minha família eram três e não duas pessoas. Contudo, ele não significava nada para mim.
- Já faz um tempo, eu sei. Mas não se preocupe, tenho certeza de que se darão bem!
- Você poderia ter dito antes.
– Eu sei, Elisa, mas eu já disse, eu esqueci. Você sabe melhor do que ninguém que eu estava cheia de coisa pra fazer com os preparativos do casamento.
Por que ela tinha que ser assim? Por que ela não podia ser o tipo de mãe que põe os filhos em primeiro lugar? Por que Helen não podia ser simplesmente uma mãe normal? Até quando eu teria que suportar aquilo?
Eu precisava conversar com alguém antes de pirar dentro daquele carro. Liguei para Ana.
– Alô, amiga?
– Elisa? Ah, amiga, já to morrendo de saudade! - dizia ela com sua voz de criança - Como estão as coisas aí?
– Dentro do carro? Ótimas, já tenho até novidades. Acabei de saber que logo terei alguém pra me fazer companhia. – provoquei. Eu sabia que Helen estaria bem atenta à conversa.
– Ai, meu Deus! Elisa, a tia Helen tá grávida?
– Não, não. - esbocei um leve sorriso no rosto. Era incrível como podíamos pensar as mesmas coisas. - Lembra do Daniel, meu irmão por parte de mãe?
– Aquele que você não vê há... há quanto tempo mesmo?
- O suficiente pra esquecer que eu tinha um irmão. – fez-se um breve silêncio. -Então, ele vai morar junto com a gente. Fica mais viável pra cursar a faculdade de medicina que ele quer fazer.
- Ele não morava com o pai rico?
– Aquele homem só é rico por causa da herança que o pai deixou. E com certeza uma herança muito, mais muito alta, porque do jeito que aquele cara esbanja a grana, os juros da conta no banco devem ser alto.
– Mas amiga, por que tanto ódio do pai do seu irmão? Ele te fez alguma coisa? - dizia Ana.
Ele te fez alguma coisa?
Aquela pergunta ecoou. Um eco profundo e longo, que trouxe momentaneamente um peso de volta à memória.
– Não. Ele não fez nada. Não fez nada. Nada.
- Tem certeza? Não é o que parece.
- É por causa dele que o Daniel não mora conosco. Aquele cara não faz nada na vida. É um verdadeiro libertino. Ele já deu em cima da minha avó, acredita?
– Oh, Deus! Das mulheres eu entendo, mas da sua avó? Ele deve gostar de mulheres maduras.
– rimos.– Prefiro não comentar.
Passamos uns trinta minutos no telefone. Minha mãe já estava querendo arrancar meu pescoço. Eu estava interrompendo seu silêncio. Estava ignorando-a. E ela odiava não ter o foco para si.
– Elisa, posso falar com a Ana? - minha mãe pediu tão educadamente que me assustei. Mas sabia que tinha algo errado. Quando ela me chama pelo nome é porque está com raiva. Quando está feliz, me chama de amore.
– Tudo bem. Ana, minha mãe quer falar com você.
– O que ela quer? - perguntou.
– Não sei. - passei meu celular pra ela, com relutância.
– Olá, Ana! Como vai? Espero que tenham colocado a vida de vocês em dia. Elisa ficará um tempinho sem te ligar, OK? Beijos, querida, mande um beijo pra seus pais. – Instantes depois só vi meu celular voar janela à fora.
– Por que fez isso? Ficou maluca? Você jogou meu celular pela janela!
– Não se preocupe. Compramos outro depois. Mas tenha certeza de que vai demorar um pouco.
- Qual é o seu problema, hein? Será que precisa de toda atenção para si?
- Elisa, espero que não tenha esquecido com quem está falando. Não sou Ana, e não tenho problemas com suas crises de identidade.
- Disso eu tenho certeza.– me joguei no banco e voltei a ouvir minha música . – Posso usar o ipod ou você vai jogá-lo pela janela também?
– O ipod pode usar. Ele te acalma. Parece até que você morre. A paz reina. E no momento eu preciso de paz.
Dormi o resto do caminho. Gosto de dormir quando estou preocupada ou nervosa. Todos os meus problemas somem. Acordei com a porta do motorista batendo e minha mãe saindo do carro.
Estávamos em frente a uma casa enorme. Parecia um mini castelo. Havia uma fonte em frente a casa e flores ao redor. A casa era azul claro, da mesma cor que a minha blusa. As janelas eram enormes e os quartos tinham meio que uma varandinha, como a dos castelos antigos. A decoração era divina. Pelo pouco que pude ver do lado de fora, deduzi que pelo menos não iria morrer completamente de tédio naquela lugar, era perfeito pra mim. Era perfeito para ficar longe de tudo e de todos.
Bom, pelo menos já sabia que não teria problemas pra conseguir outro celular. Saí do carro e minha mãe já estava se agarrando com seu novo marido, enquanto os homens da mudança tiravam nossas coisas do caminhão.
– Boa noite, Elisa. - disse Tom.
– Oi. - Não estava a fim de falar, apesar de ter me encantado com a casa.
A porta da entrada estava aberta, ao passar por ela o fio do fone saiu dos meus ouvidos e começou a enrolar em minhas pernas. Tentei soltar, mas assim que puxei o fio, comecei a cair em câmera lenta. Antes que pudesse chegar ao chão senti alguém me envolvendo pela cintura e impedindo minha queda. Olhava fixamente para o chão em estado de choque. Meu salvador estava ao meu lado ainda me segurando.
– Precisa tomar mais cuidado, Elisa. - uma voz sedutora falou, fazendo com que eu me desmanchasse em seus braços.
Ele me colocou de pé e pude ver seu rosto. Ele era tão... lindo. Tão encantador. Pensei que tivesse batido com a cabeça forte demais e tinha ido parar no paraíso. Parecia um anjo. Seus olhos penetrantes me olhavam de cima a baixo analisando cada parte do meu corpo, certificando-se de que eu estava bem. Não tinha reação, não conseguia parar de olhar e não conseguia pensar que parecia uma doente mental daquela forma, olhando diretamente pra ele. Ao concluir que eu estava bem, ele deu um sorriso de leve, mostrando alívio por não ter acontecido nada.
– Elisa, você está bem? – Tom perguntou preocupado, despertando-me do meu transe.
– Sim, estou. Acho que isso foi um castigo pelo meu mau comportamento. – brinquei, ainda olhando para aquele cara incrível a minha frente.
– Não se preocupe com isso. A viajem deve ter sido estressante.
– Você nem imagina o quanto. - disse me lembrando do meu celular.
– É isso que dá. Não fala com as pessoas aí acaba sendo castigada. Devia ter caído. - minha mãe falava.
– Obrigada pela preocupação. Eu sei que você se importa com o meu bem estar como a mãe amorosa e responsável que você é. - sarcasticamente falando é claro. Olhava diretamente em seus olhos ao dizer.
Podia falar sobre Daniel tomar conta do pai, mas a mesma coisa acontecia comigo e com minha mãe. Eu era a velha chata e ela a adolescente que queria curtir a vida e ser feliz.
– Disponha, querida. – ela era ridícula às vezes. Chegava a me irritar. O que reforçava a minha tese de papéis trocados.
Senti alguém chegando perto de mim por trás e segurando minha mão.
– Ignore-a. Isso deve ser crise de meia idade. - quase tive um troço no meio do salão de recepção. Aquele anjo falava ao pé do meu ouvido. Mas afinal, quem era ele pra falar que minha mãe estava tendo uma crise de meia idade, ou que eu deveria ignorá-la?
– Ignorá-la? Faço isso todos os dias. Sem que ela perceba, claro. – sussurrei. Por que eu disse aquilo? Eu nunca tentava ser agradável com as pessoas. - Só uma pergunta. Quem é você?
– Ah, me perdoe, Daniel. Esqueci de apresentá-los. Elisa, esse é o seu irmão, Daniel. – minha mãe disse.
Esse anjo era o meu irmão? A coisa mais bela da face da Terra era meu irmão? Não podia ser. Não conseguia acreditar. Fui tomada por uma tristeza e aflição tão grande que a melhor coisa que podia acontecer naquele momento era cair morta naquele lugar. E isso só me fez voltar ao estado deprimente de antes. Ou melhor, ficar pior do que antes.
"Quando somos amados, não duvidamos de nada. Quando amamos, duvidamos de tudo." Sidonie Colette. -Bom meninos, agora precisamos ir. Nosso avião sai daqui a duas horas. Até chegarmos ao aeroporto e passarmos por todas aquelas revisões, nosso voo já estará pronto pra sair. - dizia Tom. Quando meu estresse não me impedia de ver as coisas como elas eram, Tom era um fofo, educado, elegante e bonito. Acho que poderia confiar minha mãe a ele. Isso é claro, se ela não tivesse uma crise de meia idade na viagem. – Tudo bem, então. Só uma pergunta: onde fica meu quarto? – Ah, sim. Desculpe por ter esquecido de falar. Seu quarto é no segundo andar, última porta, do lado esquerdo. Qualquer dúvida pergunte ao Daniel. Ele te ajudará no que precisar. – Obrigada. Vou ajeitar minhas coisas. Boa viajem. Cuide bem da minha mãe, Tom. – Fique tranquila. Não deixarei que ela faça nenhuma besteira. Voltaremos e
"Por mais simples que sejam os momentos eles se tornam únicos e inesquecíveis se compartilhados com aqueles que amamos." Sara Aster. Naquela noite eu não dormi. Eu me sentia parte do Cirque du Soleil de tanto me contorcer na cama. Sempre que eu fechava os olhos a imagem de Daniel sorrindovinha a minha mente e meu coração disparava, sentia um frio na barriga e um aperto no peito. Minha querida Elisa. Aquela frase ficava ecoando na minha mente. Ninguém nunca havia me dado um beijo de boa noite ou me tratado com tanto carinho. Ele era diferente e me fazia sentir diferente perto dele. Mas eu não deveria me sentir assim, deveria? Afinal, Daniel era meu irmão, um irmão que mais parecia um primo distante, mas que mesmo assim tinha o mesmo sangue que o meu correndo em suas veias. Levantei antes do Sol. Tomei um banho bem demorado esperando que assim o tempo pudesse passar. Vesti uma calça jeans já que o tem
“Aproveite cada dia como se fosse o último, valorize cada momento. Afinal, nunca se sabe quando sua hora vai chegar.” Sara Aster. Não tive sonhos. Muito menos uma noite tranquila. Desde que eu havia chegado àquela casa, nenhuma noite havia sido tranquila. Minha mãe talvez chegasse no dia seguinte de noite. Imaginava como seriam as coisas após sua volta. Fiquei uns trintaminutos pensando nos últimos dias e em como seriam os próximos. Pensando em Daniel. Será que aquilo tudo era alguma brincadeira de mau gosto? Será que ele tinha percebido o escândalo que meu coração fazia perto dele? Tantas coisas, tão pouco tempo. ”Todas as dificuldades vem acompanhadas de meios para solucioná-la, Elisa ”, Ana disse uma vez, e desde então essa frase já tinha me consolado inúmeras vezes em menos de uma hora. Não podia me render à vontade de me flagelar pensando em como era errado sentir aquelas coisas estranhas quando estav
“A única coisa certa do planejamento é que as coisas nunca ocorrem como foram planejadas.” Lucio Costa. Flash back on Elisa, vá brincar na piscina com suas amiguinhas. – a professora de educação física disse. - Elas não são minhas amigas. – sussurrei. - Você precisa entrar. Como poderei avaliá-la se você não fizer o que eu digo? - Não me avalie. – disse enquanto olhava fixamente para um ponto qualquer. Meus olhos nunca encontravam os daquela mulher. Na verdade, meus olhos não encontravam os de ninguém. - Elisa, agora estou falando sério. Ou você entra ou eu pessoalmente irei jogá-la na piscina! – as crianças já começavam a me encarar. Seus olhos pareciam queimar minha pele. Eu só queria sair daquele lugar. – Elisa, estou falando com você! – Ela precisava parar de falar, a voz dela parecia explodir minha cabeça! Tapei os ouvido
"O amor muitas vezes nos confunde, muitas vezes nos ilude. Mas sabemos quando o sentimento é verdadeiro e não pode ser destruído tão facilmente." Sara Aster. Acordei suada e ofegante. O Sol ainda demoraria a nascer e eu sabia que o sono não voltaria. Foi difícil dormir depois de um dia tão agitado. Cada vez que eu fechava os olhos tudo o que vinha à mente era o sorriso de Daniel, assim como na noite passada.Mas o que veio depois eu realmente não esperava. Eu havia sonhado com ele. E nesse sonho nós fazíamos o que não podíamos fazer: nos beijávamos. Nas minhas reflexões de madrugada, eu já havia me questionado o suficiente sobre o porquê de ter esperado um beijo em algum momento daquela brincadeira boba. Não era certo. Nunca seria. Então por que meu coração insistia em bater mais forte toda vez que eu lembrava da distância entre nós e do beijo na testa? Droga, era só um beijo na testa! Por mais que eu estive
“Valorize os momentos com as pessoas que se ama. Eles nunca voltam e são únicos. Sendo bons ou ruins nos trazem experiências maravilhosas.” Sara Aster. Alguns dias depois... Apesar de ter que lutar contra os pensamentos e as coisas que sentia por Daniel, tudo estava indo bem. Já tinha me acostumado com minha nova casa e meu celular novo fazia com que as coisas ficassem mais fáceis de se superar. Meu contato com Anahavia diminuído, toda vez que conversávamos ela perguntava sobre Daniel de um jeito mais interessado que o normal. Aquilo me fazia queimar de ciúmes por dentro, o que me deixava com uma sensação de culpa maior que qualquer coisa, principalmente porque Ana não sabia de nada. Marisa era a mais nova agregada da casa e, por incrível que pareça, conforme fui conseguindo abaixar as barreiras, ela foi se tornando mais próxima, mais... amiga. Ela era incrível! Conseguia me animar nos meu
“Algumas coisas são verdadeiras. Acreditando nelas ou não.” Cidade dos Anjos. Tiffany me acordou antes mesmo do Sol aparecer. Estava morrendo de sono, e ela não parava de latir e andar por minha barriga. Tirei-a de cima de mim e coloquei-a ao meu lado. Olhei o visor do celular pra saber que horas eu havia sido despertada do meu sono sagrado. – Seis da manhã? Não podia ser, sei lá... umas sete ou oito horas? Vou te colocar pra dormir com Daniel. – falei para Tiffany e ela simplesmente latiu. Sabia que não conseguiria voltar a dormir, então decidi levantar e tomar um banho. Não estava afim de ficar me martirizando hoje. Passei uns trinta minutos debaixo do chuveiro. Cantei várias músicas enquanto me ensaboava, fiz vários penteados com o cabelo cheio de xampu, dancei no meio do Box, enfim, voltei a ser criança. Após terminar o banho, coloquei uma calça jeans pra ficar à vontade já que o tempo estava
“Cada dia é algo único. Procure vivê-lo intensamente!” Sara Aster. O dia passou rápido. Arrumei minhas coisas para a manhã que seria meu primeiro dia de aula. Daniel e eu passamos a tarde juntos assistindo filmes e debatendo sobre a personalidade de cada personagem. Mas a noite passada não saía da minha cabeça. O que eu tinha na cabeça pra ter agido daquela forma? Pior, o que tinha dado em mim pra eu ter falado aquilo? Tiffany passou o dia junto conosco. Fiquei surpresa por não ter tido trabalho com ela. Percebi que o que Daniel falou sobre malteses serem medrosos e gostarem de passar a maior parte do tempo no colo de seus donos era verdade. Vimos vários filmes enquanto ela dormia sobre a minha barriga. E então segunda-feira chegou. Não dormi direito, isso é óbvio. Acordei um pouco mais cedo do que Daniel disse que eu precisaria. Queria me arrumar com calma e ainda tinha que pensar em como falar para Marisa o m