CristinaNo dia vinte e cinco, acordamos e a cidade lá fora estava coberta por neve. Logo depois do café da manhã eu e as meninas saímos para brincar naquilo que parecia magico para as pequenas. Construímos um grande boneco de neve com nariz de cenoura, uma cartola de mágico na cabeça e braços de gravetos secos. Tiramos algumas fotos e logo uma bola de neve voou diretamente até mim, enchendo o meu cabelo de gelo. Olhei para o lado e lá estava Marisol, escondendo-se atrás da oliveira. Uma pequena e divertida guerra de neve começou. Cillian estava na varanda, de pé, nos assistindo enquanto ria de tudo aquilo. Bela pegou uma bola de neve e arremessou nele, o convidando para aquela maluquice que possivelmente nos daria um resfriado. Cillian aceitou o convite. Ele desceu e se juntou a nós. Um movimento na calçada, chamou a minha atenção. Por ela, vinha um rapaz com roupa camuflada, carregando uma enorme mochila nos ombros, usando um casaco de neve e boné. Ele caminhava devagar e de cab
CristinaSentada na biblioteca, eu encarava a imagem na tela do celular sobre a mesa. Era uma foto minha com o Cillian e o boneco de neve. — Está tudo bem? — perguntou Anna, sentada à minha frente. — Uhum. — Parece triste. — Sei lá… eu só acordei com um sentimento ruim. — Tipo o quê? — Como se uma nuvem negra estivesse prestes a chegar. — Às vezes, a mente tende a fazer isso quando você está muito feliz. Se você é uma pessoa com tendência de autossabotagem, é claro. Está querendo se autossabotar, Cristina? — Encarou-me com olhos estreitos. — Não, que eu esteja percebendo. Talvez seja só intuição. — Talvez. — Vou devolver esses livros. Levantei-me, seguindo para a ala de psicologia ao fundo da grande biblioteca. Guardava o primeiro livro quando mãos na minha cintura me assustaram. — Sou eu — Cillian sussurrou no meu ouvido. Virei-me para ele e sorri. — A gente não devia estar fazendo isso aqui. — Eu me certifiquei de que não tem ninguém por perto. — Aproximou-se mais,
CristinaNo dia seguinte, cheguei ao trabalho, às onze. Miller estava na sua sala, muito irritado com o processo que não se encaminhava muito bem. Passar o dia perto dele foi bem difícil. Ainda eram sete e meia da noite e já não aguentava mais tanto chilique e ameaças de demissão. — Parece que a esposa apresentou provas junto a denúncia que fez contra ele — sussurrou Beth. — Questão de tempo para isso estar na mídia. A porta da sala dele foi aberta e a sua figura brotou a nossa frente. — Vocês duas! Não pago para ficarem de fofoquinha. Venham até aqui. — Entrou novamente na sua sala. Eu me levantei e juntas, fomos até lá. — Você! — Apontou para Beth. — Limpe o chão. — Sim, senhor. Ele apertou um botão no seu ramal sobre a mesa e mandou que o pessoal do marketing fosse até a sua sala. Logo cinco pessoas apareceram ali. — A vadia da minha ex-esposa está forjando provas contra mim para levar ao tribunal. Ela já apresentou isso na polícia, então amanhã de manhã estarei em tod
Cristina— Ou! Olá — disse uma mulher sorridente, parada perto da entrada. Eu a reconheci imediatamente. Era a mãe dele. Por que ele mentiu para esconder a mãe? — Você deve ser a Cristina. Eu ouvi falar muito de você. — Ela surpreendeu-me com um abraço rápido. — Sou a Sheryl, mãe do Cillian. Muito prazer. — O prazer é meu. Ainda me sentia confusa com tudo aquilo, também um pouco envergonhada. Cillian entrou e fechou a porta. — Venha. — Puxou-me pela mão. — Vou colocar mais um prato à mesa. Pedimos comida mexicana. Eu adoro! — falou com empolgação. Olhei para ele, que estava de pé ao nosso lado. Cillian olhava para a mãe, muito nervoso, nem sequer piscava. Senti que eu não era bem-vinda ali naquele momento. — Acho melhor não. Tenho que ir para casa. — Ah, é uma pena. Eu queria poder conhecer melhor você. — Talvez outro dia. — Forcei um sorriso. — Por que não no fim de semana? — Mãe! — Cillian tentou chamar a sua atenção. — Fim de semana? — Você poderia vir com a gente. —
Parte DoisUma Verdade Difícil Cillian“Eu te amo” Essas palavras não paravam de ecoar na minha mente. Foi a primeira vez que um interesse amoroso as dissera para mim. Eu também a amava, mas tinha medo de dizer. Aliás, medo é algo que sinto desde aquela noite no bar, onde beijei Cristina pela primeira vez. A todo instante, mesmo nos momentos mais felizes, eu tinha a sensação de que tudo entre nós não era tão real ou sólido quanto parecia ser. Eu sabia que assim que contasse a ela, Cristina iria embora. Todas iam. A volta para casa demorou mais do que outro dia qualquer. O trânsito infernal de Nova Iorque foi o que me fez reconsiderar inúmeras vezes a minha vinda para cá. Eu estava em Londres há tanto tempo e acostumado aquele lugar, que, às vezes, tudo aqui é estressante demais para mim. Entrei na garagem subterrânea e estacionei o carro. Ao desligar o motor, relaxei o corpo no banco e respirei fundo, sentindo a minha cabeça doer de maneira quase insuportável. — Ela me ama — suss
CillianColoquei a taça sobre a mesa de centro e caminhei até a porta. Mas ao abri-la, não estava preparado que quem eu veria. Cristina olhou para mim com olhos brilhantes e sorriso vibrante. — Eu pedi demissão! — disse ela com imensa empolgação. O meu corpo inteiro tensionou. Eu não estava preparado para ela naquela hora. Não estava pronto para apresentá-la a minha mãe. Uma porção de desespero preencheu-me subitamente, enrijecendo o meu corpo. — Isso… Isso é ótimo. — Tentei sorrir para disfarçar o meu nervosismo, mesmo sabendo que ela ainda notaria. O sorriso no seu rosto e a felicidade estampada no olhar se foram de repente, e eu me senti péssimo, culpado. — Está tudo bem? — perguntou em um tom baixo. — Só não é uma boa hora. — Ah! Okay. — Seu cenho franziu com um pouco de constrangimento. Esse apartamento estava se tornando mais dela do que o meu nos últimos dias. Era péssimo não poder deixá-la entrar. — Desculpe vir sem avisar. — Eu te ligo mais tarde. — Engoli em seco, pe
CillianQuando o sol iluminou o quarto, eu saí da cama. Não havia dormido e não conseguiria. Estava sentido uma enorme pressão dentro de mim. Parecia que eu explodiria a qualquer instante. Precisava sair. Caminhei para o closet e, ao entrar, logo vi ao canto algumas roupas dela, dobradas na prateleira. Tentei ignorar a dor que isso me causou e vesti-me apressadamente. Desci pelo elevador social direto para a recepção. Na calçada, marquei o tempo no relógio do punho, coloquei os fones de ouvido e atravessei a rua para o Central Park. Alonguei-me rapidamente e então comecei a correr. Correria até a exaustão se isso fosse tirar essa pressão de dentro do meu peito. Foram quarenta e três minutos de corrida sem interrupções. Em casa, ao entrar, a minha mãe preparava o café da manhã. — Fiz panquecas! — cantarolou. — Sem fome! — Foi tudo o que disse indo para o quarto. Entrei no banheiro e tranquei a porta. Tirei os tênis, o relógio, os fones e comecei a me despir. Observei as tatuagens
CillianO fim de semana em Pasadena estava sendo mais longo do que eu conseguia suportar. A casa estava cheia de pessoas com olhares críticos, fofoquinhas ao pé do ouvido e sorrisos forçados para mim. Entornei em um só gole uma dose de uísque e entrei na casa, escondendo-me no corredor que levava para o escritório. Caroline apareceu e escorou-se no outro lado do corredor, diante de mim. Ela sorriu e chutou a ponta do meu sapato com o bico do seu. — Como me achou aqui? — perguntei. — Me lembro da gente se esconder aqui quando os nossos pais brigavam. Não tem briga agora. Por que está se escondendo? — Essa gente toda é irritante. — Você parece triste. — É porque estou. — O que aconteceu? — Levei um pé na bunda. — Ah, droga! Outra vez por aquele mesmo motivo? — Não. Dessa vez, porque fui um babaca. — O que você fez? — Menti dizendo estar indo a um congresso, quando, na verdade, estaria bem aqui. — Nossa! — Ela riu. — Você foi mesmo um babaca. — É. E não quero falar disso.