CristinaEra nove e meia quando cheguei em casa. Havia um bilhete da Anna na porta da geladeira. A sua vez de ir às compras. Dormirei na casa do Ed. Até segunda. 09:33 PM Anna Abri a geladeira e não havia muito ali além de leite, maças e um pedaço de queijo que eu duvidava muito que fosse queijo azul. — Está bem, Anna. Estou indo ao mercado — conversei comigo mesma. No quarto, troquei a roupa do dia por uma calça de ginástica e camiseta da NYU. Calcei tênis de corrida, prendi os cabelos com o elástico e vesti um moletom antes do casaco de inverno. Com a bolsa pendurada no ombro, segui para o mercado a meia hora de casa. Ao chegar, entrei empurrando um grande carrinho de compras. Anna tinha uma lista específica de coisas que ela sempre me pedia para comprar. Ela já ficava salva no bloco de notas do celular. O carrinho já estava bem cheio e eu me questionava se conseguiria levar tudo isso a pé para casa. Entrei na sessão alcoólica, pensando em comprar um vinho que não tive
CristinaNa manhã seguinte, segui sozinha para a faculdade. Cheguei às sete e meia e sentei-me na biblioteca. O senhor Roy começava a fazer falta. Ele sempre aparecia por aqui essas horas e ajudava-me um pouco mais com a tese. Espalhei sobre a mesa as notações, abri o laptop, alguns livros e comecei a estudar. Um bloco com algumas folhas foi jogado à minha frente, fazendo um barulho alto e assustando-me. Olhei para elas e depois para o corpo que se escorava à mesa, ao meu lado. — O que é isso? — perguntei para Cillian. — Li a última versão da sua tese enviada ao Roy e fiz algumas observações. Transtorno de estresse pós-traumático é um bom tema. Mas existe muito argumento pessoal sendo exposto de maneira muito hostil. É bem claro que esse tema mexe com as suas emoções. Talvez você devesse considerar mudar. Ainda dá tempo. — Mas eu não quero! — O meu tom saiu um tanto rude. Ele encarou-me em silêncio por alguns segundos, observando-me com olhos estreitos. — Okay. Leia as anotaçõ
CristinaEstava em frente ao espelho aplicando o batom, quando o interfone tocou. Olhei as horas no celular e eram exatamente nove e meia. — Pontual — disse para mim mesma. Eu havia saído do trabalho às oito e quinze e mandado a mensagem para Bea. Ela disse que às nove e meia chegaria para me buscar. Apertei o botão no interfone para destravar a porta lá embaixo e depois o outro que me permitia falar e ser ouvido por quem quer que estivesse na entrada. — Pode subir — disse e voltei em seguida para o banheiro, finalizando o batom. A campainha tocou e caminhei até a porta, ajeitando os cabelos soltos. Ao abri-la, outra surpresa naquele dia. Não era a Bea. — Cillian? Ele ergueu a cabeça e os lábios se abriram com espanto. Os ombros ficaram tensos e o peito se encheu de ar. Os seus olhos piscaram lentamente, ao mesmo tempo que engoliu em seco. Ele parecia estar sem palavras e quase sem fôlego. — Nossa… — Foi a única coisa que saiu da sua boca em um sussurro. — O que faz aqui?
CristinaAcordei com o barulho irritante da prensa do caminhão de lixo. Tentei me levantar, mas a minha cabeça latejou. Eu nem sequer sabia que horas eram quando chegamos em casa. A última coisa que me lembro, foi de tirar os sapatos e subir sobre uma mesa com uma mulher que conheci naquela noite, para cantar Dancing Queen. Vagarosamente, levantei-me da cama e saí do quarto, arrastando-me pelas paredes do corredor. Bea estava na sala, sentada no chão, em frente a janela, meditando sob a luz do sol. Não a atrapalhei, apenas segui caminho até a cozinha e peguei um remédio para a dor de cabeça e um copo d’agua. — Aproveitou bem a noite — disse ela, enquanto começava se alongar. — Eu não me lembro de muita coisa após cantar sobre a mesa. — Dancing Queen? Sério? — Ela riu. — É a minha música favorita. Não consigo resistir. Aspirina? — ofereci. — Eu já tomei. — Vou fazer ovos com bacon. Quer? — Eca! Eu não como carne. — Desde quando? — Desde Bali. — Entendi. Então farei ovos e t
CristinaDeixei a sala às pressas com o celular na mão. Eu havia me esquecido completamente do feriado. Os meus pais me matariam se eu não estivesse em casa. De certa forma, devia isso a eles. Nem sequer pude visitá-los durante todo o verão devido ao trabalho. Liguei para a rodoviária rezando para que ainda tivesse passagem. Faltava uma semana. — Interestadual. Como posso ajudar? — Preciso de uma passagem para Bridgeport. — Certo. O próximo ônibus disponível saí às quatro, no dia vinte e quatro de novembro. — O quê? Não. Isso é depois do feriado. Preciso de uma passagem para antes da Ação de Graças! — Fui um tanto impaciente. — Eu lamento, mas não há mais assentos disponíveis. Todos os ônibus estão lotados. — Senhorita Reis… — Cillian chamou por mim, mas eu não olhei para ele. Apenas ergui o dedo indicador para que me desse um minuto. — Querida, você não entendeu. É um caso de vida ou morte. Preciso estar em casa para o feriado! — Você e o resto da população americana. Tenha
Separei a roupa que usaria no dia seguinte e guardei todas as outras. Depois de um banho quente e do jantar, deitei-me para dormir, mas estava ansiosa demais para isso. Apanhei o celular e nele havia uma mensagem de texto da Marisol. Ansiosa por amanhã. Estou com saudade 10:02 p.m. Marisol Também estou. Logo mais estarei aí. Como está o humor do papai? 10:04 p.m. Cris Por quê? Vai trazer alguém? Um namoradinho? 10:06 p.m. Marisol Um amigo! 10:06 p.m. Cris Ele ainda tem a faca de caça. Mas relaxe. Ele será bem-vindo. 10:07 p.m. Marisol Ri alto. Nosso pai sempre amolava a faca de caça na mesa de centro da sala, quando levávamos algum amigo em casa, ainda que não fosse sequer uma paquera. Boa noite, Sol. 10:08 p.m. Cris ***Quando o despertador tocou, eu já estava de pé, vestida, conferindo a roupa em frente ao espelho na porta do guarda-roupa. O meu coração batia acelerado. Eu estava nervosa, sentindo borboletas no estômago. Não porque iria ver os meus pais
CristinaEnquanto caminhávamos pelo passeio que levava até a casa, olhei para janela e vi dois rostinhos ali, com sorrisos travessos. Quando me viram aproximar, desapareceram rapidamente. Subimos os degraus da varanda e quando chegamos na porta, segurei a maçaneta e parei por alguns segundos. — Por que paramos? — Estou dando tempo para as minhas irmãs se esconderem. Elas fazem isso toda vez que venho para casa. Gostam de me dar susto. Ele riu. Abri a porta e entramos. — Cheguei! — anunciei, retirando o sobretudo. Pendurei-o no cabideiro da entrada e em seguida fiz o mesmo com casaco do Cillian. — Hija! — disse a minha mãe, vindo de braços abertos até mim. — Finalmente estás en casa. Abracei-a apertado e beijei o seu rosto. — Te extrañé mucho mamá. — Soltei-a. — Mama… Esse é o Cillian. Um amigo da faculdade. — Seja bem-vindo! Sou Rosalia — disse ela, sorridente, estendendo-lhe a mão. — Gracias por recibirme en tu casa — respondeu ele. Olhei-o um pouco surpresa por vê-lo fa
CristinaCillian parecia estar se divertindo. Às vezes, ele ria. E sempre conversava em espanhol com a minha mãe, que parecia estar gostando muito dele. Mas ela não era a única, ele ganhou até mesmo desenhos das gêmeas. Aprovou o churrasco e disse que aquele era o melhor que já comeu. De repente, começou a falar de basquete com o meu pai e John, o vizinho. Eles se entrosaram em uma conversa um tanto animada. — Estou começando a gostar dele — disse o meu pai para mim, em um tom divertido. — Posso falar com você? — Marisol sussurrou no meu ouvido Assenti com a cabeça e nós nos levantamos indo para dentro de casa. As gêmeas vieram logo atrás. — Está tudo bem? — perguntei quando chegamos na sala. — Preciso de camisinha. — O quê? — Arregalei os olhos com espanto. — Você transou? — perguntei alto. — Shhh. A mamãe não pode escutar. E não. Eu não transei. Ainda. — Você não falou com a mamãe? — Não. Ela já fez o discurso de me guardar até o casamento. Teria um infarte se dissesse e