Ponto de Partida

Os dias que se seguiram foram exatamente iguais, o recente casal nem sequer conseguia disfarçar o quanto estavam envolvidos, embora o beijo fosse cada vez mais ardente, os carinhos mais ousados, eles continuavam prudentes. Amanda desejava, claro que o queria, no entanto, estava sendo racional, nem sempre o desejo da carne deveria vir em primeiro lugar.

Ela estava feliz, muito mais do que gostaria e isso também era um problema, e o mesmo acontecia com Raul. O homem foi pego de jeito, estava louco por ela. A cada encontro a conhecia melhor e sua fascinação aumentava à medida que Amanda se revelava.

O cientista político só não estava totalmente ciente do rompimento dela, isso a médica ocultava, e ele não era curioso ao extremo para questioná-la e ela não se sentia segura para colocá-lo a par de toda a situação.

Deixaram esses pormenores de lado e seguiram aproveitando cada segundo que a vida lhes proporcionava.

— Meus amigos chegam amanhã — Raul comentou enquanto caminhavam no calçadão aproveitando a noite insuportavelmente quente e abafada.

— Pela manhã?

— Acredito que sim, não me disseram ao certo. Sei que perguntei mais de uma vez, entretanto não custa tentar. — Ele levou a mão dela próximo aos lábios e depositou um beijo. — Temos tempo de comprar um vestido e você me acompanhar no casamento.

— Eu sei, só não me sentiria bem, confortável. Mas prometo ajudá-lo a trocar o Chico e ficar acordada para dar aos dois um beijo de boa noite, ou quem sabe de bom dia. — Ela sorriu e se aconchegou nos braços dele que a envolveram.

— E isso não para por aqui.

— Ah não, Raul, aonde vamos então? — Amanda brincou sabendo exatamente o que o peso daquelas palavras queria dizer, significavam muito para duas pessoas que haviam acabado de se conhecer.

— Voltando para São Paulo, vou fazer um convite oficial e te levar para sair. Não pense que ficarei fora do seu alcance.

— Bobo. — Ela o empurrou com o quadril. — E não faço questão alguma que fique. Não era para as coisas acontecerem assim, mas já que evoluíram entre nós, aceito sair com você e ver no que vai dar.

— Isso é ótimo. — Raul ficou de frente para ela, vidrado em seus olhos caramelados, que com o brilho da lua pareciam mais claros, encaixou uma das mãos em meio aos seus cabelos e tomou seus lábios, chupando sua língua, provocando-a, em um beijo molhado e intenso, enquanto com a outra mão acariciava as suas costas.

Tudo estava indo rápido demais, porém, era inevitável lutar contra, aconteceu, tinha que acontecer. Qual era a probabilidade de se encontrarem na capital? Talvez nenhuma, no entanto, se encontraram  no litoral norte de São Paulo e estavam gostando e muito da companhia um do outro.

Fizeram o caminho inverso, assistiram a um filme que passava num canal da TV a cabo, deitados e abraçados na cama dele. E, apesar do contato físico e da troca de carinho, não fizeram amor. Era bem tarde quando Amanda voltou para o quarto dela, sorrindo como uma boba e deixando ele na mesma posição.

***

Antes das oito, Raul bateu na porta dela e foi tomado por um desejo indomável, assim que ela abriu de cabelos molhados caídos pelos ombros e enrolada em uma toalha.

— Você não facilita nem um pouco as coisas. — Ele a devorou com os olhos e a beijou com vontade.

— Não foi proposital. — Sorriu, travessa.

— Nunca desejei tanto que uma toalha caísse no chão. — Raul passeou com os olhos inflamados por todo seu corpo. — Bom, vou te esperar lá embaixo para tomarmos o café da manhã, ou não conseguirei conter meus ânimos, que nesse instante estão exaltados por um belíssimo motivo. — Ele voltou a beijá-la com ímpeto.

— Eu já desço. — Amanda retribuiu o beijo e sorriu quando ele se virou disfarçando a excitação que havia ficado evidente em sua bermuda.

A médica não demorou e logo se juntava a ele, tomaram o café, buscaram o Chico no quarto e foram fazer um passeio pela praia.

Assim que retornaram, Raul encontrou com os amigos, eles tentaram avisá-lo, no entanto, o moreno deixou o celular no quarto e totalmente descarregado.

— Cara, achamos que tivesse sido engolido por uma Baleia Jubarte. — Sanches sorriu e mirou nas mãos de Amanda e Raul entrelaçadas.

— Deixa de ser indiscreto — comentou uma moça de olhos verdes e bem-humorada . — Oi, me chamo Magda, não ligue. Esses homens são extremamente sem graça. — Elas se cumprimentaram com um beijo no rosto.

— Prazer, sou Amanda. — A médica pareceu à vontade diante dos amigos de Raul.

— Por isso ele nos ignorou durante todo esse tempo, mas concordo por um bom motivo. — Marcelo sorriu, se apresentou a ela e a beijou no rosto.

— Amanda, esses são os amigos dos quais te falei durante todos esses dias. Agora sabe o motivo — Raul farfalhou e todos riram.

A ortopedista cumprimentou a todos. Apresentações feitas, bagagens em seus respectivos aposentos, saíram para almoçar no centro de Ubatuba numa cantina deliciosa que Raul e Amanda haviam gostado e que recebiam os pets sem nenhum problema.

Não demoraram a voltar, a cerimônia estava marcada para as 19 horas e precisavam se arrumar.

— Amanda, vem conosco, vai. Agora conhece mais pessoas — insistiu Magda e Raul aprovou a persuasão da amiga.

— Agradeço, mas vou recusar. Gostei muito de vocês, me deixaram super à vontade, mesmo assim ficaria desconcertada.

— Não fique, depois de algumas horas ninguém saberá quem é quem. O povo vai beber tanto que mal se lembrarão dos próprios nomes — comentou Marcelo.

— Viu, você não deveria recusar. — Raul a abraçou pela cintura e ela sorriu.

— Obrigada, muito mesmo. Mas vou ficar. — Trocaram um selinho, seguiram para os seus quartos e Amanda entrou no seu.

Como prometido ela o ajudou com o Chico, depois o auxiliou com a gravata-borboleta, fizeram algumas selfies juntos, e se despediram assim que deu o horário.

— Não vem mesmo? Esse vestido que você está usando é simplesmente perfeito. Você está linda.

— Você é um fofo. — Ela o beijou e ajeitou novamente a sua gravata. — Boa festa. Ah, para você também, Chico, nada de beber e ficar por aí caindo pelos cantos, hein. — O pug pulou nela em busca de um carinho.

— Nos vemos mais tarde. — Raul a beijou novamente e ela acenou.

Amanda pediu um hambúrguer e o saboreou com um suco de uva gelado, tranquila assistiu a um filme de ação, leu alguns capítulos de seu livro e, cansada, acabou pegando no sono com o livro sobre o peito.

Acordou com um falatório nos corredores e, sonolenta, foi em direção a porta quando reconheceu as vozes que vinham do lado de fora. Discretamente, abriu uma pequena fresta e ficou pasma quando notou Raul abraçado a uma mulher que usava um microvestido, não era um simples abraço de amigos, mesmo porque essa moça não estava hospedada ali, era alguém que ela não havia conhecido, mas que, pelo jeito, Raul conhecia bem e intimamente.

A médica fechou a porta com cautela e sentou-se na cama, pensando que talvez fosse um engano. Porém, a confirmação de que não se tratava de um equívoco veio no instante em que ela começou a escutar risadas e comentários de conteúdo sexual dito pelos dois.

Completamente irritada, aproximou-se da sacada, a porta balcão de ambos os quartos estavam abertas, então, consequentemente tudo era audível, e o que começou a ouvir foi a pior coisa que poderia ter escutado. Raul e a mulher começaram a transar como animais no cio, a mulher grunhia e ele dizia o quanto ela era gostosa.

Pasma, não conseguiu dar um passo, continuou ouvindo gemidos, palavras eróticas e a cama sacolejando a ponto de quebrar os pés.

“Eu não acredito nisso”, pensou e voltou para dentro, já tinha ouvido o bastante. Amanda olhou as horas no smartphone, eram quase cinco da manhã. Furiosa, começou a juntar suas coisas, estava decidida, iria embora, nunca mais queria ver a cara do Raul.

Esperou que o dia clareasse, enquanto ainda ouvia a orgia no quarto ao lado, aquilo soou como um chute na boca de seu estômago e, quando a trepação cessou e o sol apareceu, já era hora de correr dali.

Apressada fez o checkout.

— A senhorita vai embora mais cedo? — inquiriu a recepcionista ao constatar que a reserva só se encerrava na manhã seguinte.

— Sim. Um imprevisto no trabalho. — Rapidamente fez o pagamento e, com a ajuda da moça, colocou as bagagens no carro e ligou o motor.

Partiu se sentindo usada, uma idiota feita de otária por um homem que possuía uma lábia irresistível. Só não se sentiu pior, porque não fizeram sexo, caso contrário a decepção com ele e consigo mesma seria ainda maior.

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