O queixo dele estremeceu com o choro que o arrebentava por dentro. A vontade de dizer a verdade foi enorme, mas ele não devia. Olhou para cima e respirou fundo, apertando as mãos dela. Beijou a sua testa e a soltou, levantando-se. Sem dizer nem uma palavra, foi embora, mas não antes de parar na porta por alguns instantes e olhá-la mais uma vez. Barbara ainda estava sentada sobre os calcanhares, ombros baixos, mãos sobre as coxas, olhos fechados e face molhada. Então, ele se foi.Ela abriu os olhos ao mesmo tempo que ouviu a porta da sala se fechar em um baque. Ele não estava mais ali. Barbara se aninhou no centro da cama em posição fetal e abraçou um dos travesseiros, chorando copiosamente. Ele estava mentindo. Não era a diferença de classe social, cultural ou a cor da pele deles. Era algo mais, algo maior que ele não queria dividir. Pensou que talvez porque não confiasse nela o suficiente, ou porque a verdade fosse ser demais para ela. No fim, só sabia que Matheus havia desistido sem
Barbara estava sentada na cama do quarto onde a hospedaram. Encarava a única foto que tinha com Matheus. Uma que eles tiraram no encontro na praia. Ele não queria, mas ela registrou o momento mesmo assim. Não postou nas redes sociais que pouco usava. Detestava a ideia de estranhos observando à distância todos os seus passos do dia, cada refeição, cada roupa vestida. Era futilidade demais para ela. Por isso as fofocas nunca falavam muito no seu nome, somente quando alguma amiga fazia merda e de certa forma isso refletia sobre ela. Tentava se manter o mais longe possível dos holofotes. Ser o mais anônima que conseguia.Uma batida soou atrás da porta. Ela se levantou e foi até lá, abrindo-a.— Está pronta? — perguntou Edgar.— Para o tal luau?Ele assentiu, escorando-se no batente.— Não, não estou a fim.— Então vamos descer para o jantar, já está servido.Ela saiu e fechou a porta atrás de si. O jantar havia sido servido na sala de jantar dentro da casa. Lá fora o vento era frio, apesa
Enquanto andava entre as pessoas que se acumulavam ao redor da fogueira, ela terminou a sua cerveja. Parou e ficou observando a ponta do fogo alto crepitar com o céu escuro ao fundo.— Barbara?! — Alguém a chamou, incerto.Ela virou-se para trás.— Oi, Isabela.— Meu Deus! Eu não te vejo a um tempão — disse a garota ao se aproximar. — Você está sumida. Foi embora e nunca mais voltou. Até disseram que vocês se mudaram porque o seu pai tinha falido. — A garota riu com um humor que Barbara não entendeu e para o qual não tinha paciência para lidar no momento.— Te garanto que não estamos falidos. Foi apenas uma mudança.— Ainda bem. — Riu outra vez, se segurando no braço da Barbara. A menina já parecia estar um tanto alcoolizada. — Já pensou ser pobre? — falou com nojo. — Credo! Não sei como aguenta o Rio de Janeiro. Muito pobre por metro quadrado. — Gargalhou, cambaleando para trás.— O que tem de engraçado nisso? — Barbara perguntou com uma das sobrancelhas arqueada e um tom sério. No f
— Não sei o que ela tem! Não fiz nada. Acho que a sua amiga bebeu demais, só isso. Estava tentando cuidar dela. — Gustavo andou alguns passos para trás e parou colocando as mãos na cintura.— Ah, claro! Vou acreditar em você. — Foi irônico, usando de um tom bem irritado. — Essa daqui não, Guto. Já devia saber!Edgar pegou Barbara nos braços e a levou para o seu carro, colocando-a sentada no banco passageiro da frente.— Ela está bem? — perguntou a menina com quem ele estava minutos atrás.— Sim. Foi mal, tenho que levar ela para casa.— Me liga. — Sorriu para ele e deu uma última olhada para Barbara.— Claro. — Voltou e fechou a porta.A garota que ele não recordava o nome se foi. Olhou para trás à procura de Gustavo, queria ter a oportunidade de xingá-lo, mas não o viu mais. Edgar sabia que aquilo não era excesso de cerveja. Já havia visto outras garotas ficarem mal daquele jeito em festas onde o seu amigo de infância estava presente.Entrou no carro e ligou o motor. Dirigiu de volt
Matheus acordou cedo naquele domingo. Sentou-se na cozinha e olhou a sua foto com Barbara. Desde o dia que a deixou, nunca mais havia falado com ela ou a visto. Ele se sentia um grande cretino pelo que fez. Sentia o coração latejar de saudade dela. Sentia a alma doer toda vez que pensava nela e no fato de que não podiam ficar juntos. Ou seja, a todo instante.Como podia uma escolha de anos atrás afetar tanto o seu futuro com a pessoa por quem está apaixonado? Barbara logo tinha que ser filha do chefe do tráfico? Quão caro ele pagaria se decidisse quebrar as regras e a promessa de ficar longe dela? O que lhe custaria deixar o crime, afinal? Iriam atrás dele até do outro lado do mundo? Pensava nisso o tempo todo. No fundo, mesmo que inconscientemente, ele não havia desistido da Barbara. Às vezes, se pegava pensando em uma solução ou jeitinho que fosse funcional.Abriu o aplicativo de mensagem e tocou no nome dela. Olhou para as últimas conversas. De repente, viu que ela estava online. A
Mais tarde, após voltarem de um jantar na cidade onde o seu pai bebeu mais do que devia, Barbara se preparava para dormir quando escutou um grito vindo do andar debaixo. Ela se assustou e abriu a porta correndo em direção à escada.— Pare com isso! — escutou a sua mãe dizer.— Cale a maldita boca! — gritou o seu pai.Barbara desceu às pressas, mas antes que pudesse alcançar a mãe que estava perigosamente perto demais do Carlos, ele desferiu um soco contra o rosto de Ângela, que caiu no chão.— O que está fazendo? — ela gritou para o pai, abaixando-se ao lado da mãe. — Você a machucou! — disse ao ver a maçã do rosto dela inchada.— Se acalme, Carlos! — pediu Cássio, entrando no caminho entre Ângela e ele.— Ela acha que pode se meter nos meus negócios, mas não pode! — gritou.Barbara olhou com olhos cheios de lágrimas para o pai. Desde que tinha dez anos, nunca mais o viu agredir a sua mãe, embora soubesse que ainda fazia. Carlos viu a feição da filha. Uma mistura de reprovação e trist
Na manhã seguinte, Carlos já estava de malas prontas quando a mulher e a filha acordaram. Cássio tentou o convencer de ficar um pouco mais para virada de ano, mas ele estava irredutível. Dizia que a esposa não merecia isso e que lugar de gente que não sabe se comportar é trancada em casa. Mas, no fundo, a verdade é que Carlos estava envergonhado pela ação da noite anterior. Não envergonhado por ter agredido alguém, mas por outras pessoas terem visto.Ele agradeceu a hospitalidade e seguiram para pequena pista de voo onde o mesmo jatinho que os trouxeram, aguardava por eles. Os três embarcaram e seguiram para casa. No caminho, houve discussão onde Carlos culpou Ângela por ele ter se comportado daquela forma. Barbara tentou dizer que ele não poderia estar mais errado, mas ele mandou que ela calasse a maldita boca. Mas uma vez ela se surpreendeu com seu comportamento.Ao chegarem, Barbara pegou a sua mala e caminhou em direção à saída, sem se despedir dos pais.— Espera! Aonde vai? — per
Já passava das onze quando bateram na porta do Matheus. Estava apenas ele e a mãe em casa, sentados no sofá, assistindo à programação da TV para aquela noite. Naquele momento passava o rotineiro show do cantor Roberto Carlos. A sua mãe amava. Ele se levantou e foi até a porta, abrindo-a.— E ae? O chefe tá te chamando.— São onze da noite. Está só eu e a minha mãe em casa.O homem à sua frente esgueirou a cabeça para espiar dentro da casa. Viu a mulher acomodada na sala vendo TV. Ele bufou e revirou os olhos.— Cola lá. Eu fico de olho na velha pra tu.— Beleza.Ele passou pelo homem que todos na comunidade chamavam de Flecha, e subiu mais o morro em direção à Boca 1. Ao entrar, encontrou Bodão sentado no sofá velho que ficava no canto do cômodo. Ele tinha duas mulheres abraçadas a ele.— Qualé... — disse Matheus, parando à frente dele.— Tô precisando de você, Matheusinho. Tá a fim de ir a uma festa? — perguntou com um sorriso marcando o canto da sua boca, enquanto a garota à sua dir