CAPÍTULO 04 Desirée

— Você está bem? — Marcela pergunta, levanto a cabeça e a vejo fechando a porta com as mãos cheias de sacolas.

Hoje faz uma semana que enterrei meu pai. Eu não consigo entrar no quarto dele, não consigo dormir à noite, simplesmente não consigo fazer mais nada. O vazio parece me engolir a cada dia que passa.

E, para piorar a situação, minha genitora ligou dizendo que eu tenho que vender o apartamento e ir morar com ela. Ela ainda teve a audácia de afirmar que metade da venda é dela, já que na época em que esse apartamento foi comprado, ela estava com meu pai. Eu a odeio, e não é pouco.

— Estou bem. — minto, forçando um sorriso.

— Pergunta estúpida. — Marcela diz, colocando as sacolas em cima do balcão. — Resposta errada. Decidiu o que vai fazer em relação à sua mãe?

— Ela não é minha mãe.

Marcela suspira, como se tentasse encontrar uma saída para a situação. — Desirée, você precisa dar um jeito nisso.

— Eu vou voltar a trabalhar hoje, amanhã vou me matricular na faculdade e, assim que receber, vou vender este apartamento, passar a parte dela e me livrar dela de uma vez por todas.

— E você vai viver aonde? Vai pagar aluguel? O dinheiro que você ganha não dá para viver direito. Você bem poderia morar comigo e minha mãe.

— Nem pensar.

— Desirée?

— Já disse que não. Já tenho tudo organizado. Eu dou conta, sempre dei. Não irei morrer agora.

Marcela parece preocupada, e eu sinto um aperto no coração. É difícil para ela entender a profundidade do meu desespero. Não é só sobre o dinheiro ou a casa; é sobre o que meu pai significava para mim e como essa perda me deixou sem chão.

— E se você não conseguir? — ela pergunta, a preocupação evidente em seu tom.

— Eu vou conseguir. — afirmo, a determinação se fortalecendo na minha voz. — Preciso fazer isso. Preciso honrar a memória do meu pai, e a única maneira que vejo é seguindo em frente.

Marcela me observa, mas não diz mais nada. Ela parece entender que não há nada que possa dizer para mudar minha mente. No fundo, sei que estou em um caminho solitário, mas é o único que sinto que posso seguir.

— Certo. Então me avise se precisar de algo, está bem? — ela diz, suavizando a expressão.

— Com certeza. — respondo, tentando transmitir um pouco de esperança.

Enquanto ela começa a abrir as sacolas e preparar algo para comer, eu me perco em pensamentos sobre o futuro. Não sei o que vem a seguir, mas uma coisa é certa: não vou deixar que minha mãe ou qualquer outra pessoa controle meu destino. Vou lutar pelo que é meu e, mais importante, pelo que meu pai sempre desejou para mim.

(๑๑⁠˙⁠❥⁠˙⁠๑๑⁠˙⁠❥⁠˙⁠๑๑⁠˙⁠❥⁠˙⁠๑๑⁠˙⁠❥⁠˙⁠๑๑˙⁠❥⁠˙⁠๑๑⁠)✍️

— Desiree, mesa seis. — reviro os olhos e murmuro meu mantra: paciência, paciência.

Caminho até a mesa seis, mas não encaro Otávio; olho para o chão, não estou interessada em receber flertes de ninguém hoje.

— Seu pedido, por favor. — digo, tentando manter a voz neutra.

Ele não diz nada enquanto continuo olhando para o bloco de anotações. O silêncio se estende e, após alguns instantes, resolvo ceder e olhar para ele.

Otávio está diferente. Há algo estranho em sua expressão.

— Você está bem? — pergunta, e a preocupação na voz dele me surpreende.

Franzo a testa. — Por que a pergunta? — questiono, tentando esconder a vulnerabilidade.

— Seus olhos estão inchados e vermelhos. — Ele cruza os braços, se encostando na cadeira.

— Perdi uma pessoa muito importante para mim há pouco dias. Enfim, qual seria o seu pedido? — Tento desviar o foco dele de mim.

Vejo seus olhos mudarem para algo que não consigo ler. É como se ele estivesse ponderando sobre o que eu disse.

— O de sempre. — ele finalmente responde, mas sua voz carrega uma nota de preocupação que não costumava ver.

Saio imediatamente, tentando afastar a sensação estranha que se formou no ar. Ele está diferente hoje ou sou eu que estou? Tento focar minha mente em outra coisa que não seja Otávio e a dor da perda do meu pai.

Na cozinha, lavo pratos e tento me distrair com as conversas das outras funcionárias, mas a imagem de Otávio não sai da minha cabeça. O jeito como ele olhou para mim, a preocupação que soava em sua voz, tudo isso me faz questionar. O que ele realmente sabe sobre dor?

Quando volto para a mesa, vejo que ele ainda me observa, mas não consigo manter o olhar. Sinto uma mistura de frustração e confusão, e me pergunto se devo abrir espaço para essa conexão. O que isso significaria para mim?

— Aqui está seu pedido. — coloco o prato na mesa e antes que ele possa fazer mais perguntas me preparo para sair.

— Obrigado. — responde, mas sua voz tem um tom que parece pesar, como se ele quisesse me confortar.

— De nada. — murmuro, já me afastando.

— Espere. — Ele diz, e paro na mesma hora.

Otávio tira um cartão do bolso e me entrega.

— Você disse que já pensou em sair daqui? Deseja trabalhar em algo melhor? — assinto, curiosa, enquanto ele estendo a mão com um cartão — Envie seu currículo para este e-mail. Talvez você consiga algo que realmente te ajude no futuro.Essas oportunidades nem sempre surgem, e eu vejo potencial em você.

Pego o cartão com "GRAN HOTEL" escrito em letras elegantes, junto com a foto de alguns dos hotéis mais lindos de Nova York. Fico confusa; nunca imaginei que poderia trabalhar em um lugar assim. Viro o cartão e vejo o e-mail e o telefone, com algumas informações sobre o hotel.

— Desculpe, mas eu nunca conseguiria trabalhar em um lugar como este. — digo, tentando devolver o cartão.

Ele recusa. — Apenas faça o que digo.

Otávio se concentra em seu prato, me deixando imóvel, olhando para ele. A maneira como ele se nega a me olhar é quase irritante, mas ao mesmo tempo, sinto uma curiosidade crescente. Por que ele se importa tanto? O que ele espera de mim?

Acabo pegando o cartão novamente e saio, sem saber o que pensar. Não posso discutir com ele aqui dentro, mas o dia em que encontrá-lo lá fora será um assunto diferente. A ideia de trabalhar em um hotel tão renomado me assusta, mas também me intriga. Será que eu teria coragem de dar esse passo?

Caminho até a cozinha, onde a atmosfera é mais leve, e tento deixar a conversa com Otávio para trás. Mas a imagem dele, o jeito como se importou, permanece em minha mente. O que exatamente ele vê em mim que eu mesma não consigo enxergar?

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