CAPITULO 4

- Droga! - Exclamo frustrada pela quinta vez.

Desde que eu comecei com essa bendita jornada estou a quase um dia inteiro caminhando. O sol está em seu ponto mais alto, então presumo já ser meio-dia ou mais conhecido como horário de almoço e eu ainda não parei para comer. Acho que por causa da adrenalina de estar em uma missão, até esse momento não sinto fome, mas sinto dor.

 -Aí! - grito ao sentir uma pedra solta ralar a minha mãe e me fazer perder o equilíbrio. Sinto o impacto de cada pedra contra o meu corpo, com certeza ficarei roxa.

- Merda! - Xingo revoltada enquanto observo com desgosto o caminho que terei que percorrer novamente.

Olho para o meu corpo e vejo que minha calça já está rasgada por causa das diversas vezes que rolei nessa montanha de pedras. Meus braços estão protegidos pela minha jaqueta de couro super resistente, mas mesmo assim meus músculos sentem o impacto da queda e tudo o que veio depois. Conto até dez mentalmente e respiro fundo, meu corpo treme pela dor e minhas mãos ardem pelos cortes abertos.

Junto toda a força que me resta e começo mais uma vez a escalar a montanha. Não tenho equipamentos de escala, na verdade eu não sei se tenho, pois ainda não tive coragem de abrir a pesada mochila preparada por minha mãe. Tentando tomar ainda mais cuidado do que da última vez começo minha escalada.

Primeiro acho um apoio para minhas mãos e logo posiciono meus pés assim começando a subir.

Santa lua! Estou quase lá, só falta mais um pouco e logo eu acabo com essa droga de escalada que vai me deixar hematomas.

Feliz da vida por finalmente está chegando ao topo da montanha, porém  mais uma vez uma pedra escapa quando tento apoiar meu pé nela e sustentar meu peso e então outras também começam a sair de seus lugares e meu coração começa a bombear tão rápido que sinto meu peito doer. 

Tento a qualquer custo me segurar em algo, mas quanto mais eu me movo e tento me apoiar, mais as pedras caem. Olho pra baixo e sei que se eu cair dessa altura provavelmente irei morrer soterrada pelas pedras. Ótimo, que humilhante morrer sem ao menos chegar na bendita alcateia. 

- Merda! Droga! - Xingo, ou tento pois, em minha voz parece mais com uma súplica do que um xingamento de raiva.

Sinto uma mãe grande, forte e calejada pegar na minha e me puxar para cima tirando-me de meus devaneios.

Tento olhar para o rosto de quem salvou a minha vida, mas não consigo enxergar pois a claridade do sol me cega e só consigo identificar seus cabelos: Negros e ondulados, parecem macios, dá até vontade de passa a mão e puxa-los para ver se são se verdades.

 Estou tão distraída admirando seus cabelos que só volto à realidade ao ouvir uma voz grave, rouca me fazendo arrepiar até meus pelos da perna.

- Você por um acaso é louca, garota!? - Ele grita exasperado - Tem merda no lugar do cérebro?

- Oi? O que? - Falo desorientada. Estou confusa pela sensação que essa voz grave está causando em mim.

- Como você tenta escalar essa montanha sem os equipamentos necessários? Ainda mais nessa floresta que é cheia de animais selvagens? Você por acaso não sabe os perigos? Não tem medo de morrer? Você… - ele começa a me bombardear de perguntas, isso me deixa ainda mais tonta - Você está bem? 

Consigo piscar meus olhos e me acostumar com aquela claridade e então posso ver nitidamente o rosto de meu salvador. O meu coração falha uma batida ao me deparar com a intensidade desse olhar azul.

Esses olhos...

Posso ficar o dia todo olhando para as profundezas daqueles lindos olhos azuis como nunca vi em nada na vida. Tranquilo e tão misterioso.

  Saio de meus devaneios ao sentir ser chacoalhada pelos ombros.

- Desculpe, o que dizia? - Tento disfarçar que estava quase babando por esse ser a minha frente.

- Dizia que você era louca por tentar subir essa montanha sem os equipamentos necessários - ele aponta.

- Você tem razão! - Digo para encerrar o assunto - Bom, obrigada você salvou minha vida e serei eternamente grata, senhor...

- Deniel, e quem é você? - ele pergunta me olhando fixamente, que homem bonito. Devo estar apenas emocionada por ser o primeiro homem que vejo, mas ele é um belo exemplar, deu até um calor.

Para, Renata, sua safada! - acusa a minha mente. Não imaginei que me sentiria assim com o primeiro homem que apareceu na minha vida. Literalmente.

Tento me levantar do chão, mas as minhas pernas fraquejam e antes que eu sinta o impacto da queda em minhas costas, sinto braços grandes e musculosos em voltar de minha cintura, olho mais uma vez para seus olhos e ficamos nos encarando por alguns segundos.

- Venha! Você precisa de ajuda - ele afirma me pegando em seu braços, um vai por debaixo de minhas pernas e o outro se apoia em minhas costas, e essa proximidade me deixa arrepiada.

 Não digo nada pois sinto o meu corpo exausto e minhas mãos ardem. Minhas pernas, tronco e braços doem muito. Descanso minha cabeça em seu peito que pelo o que eu pude perceber é enorme. E sinto que ele fica tenso nesse momento, então me sentindo confortável e protegida, fecho meus olhos e me entrego ao cansaço.

 Instantes mais tarde abro os meus olhos mas a minha visão está embaçada, os fecho novamente e com as costas das mãos esfrego os mesmos, quando sinto que eles já estão preparados os abro e a primeira coisa que vejo é: Um teto de madeira.

 Olho ao meu redor e me vejo em um quarto simples onde se encontra um guarda-roupa de quatro portas, ao lado da cama tem um criado mudo com alguns livros. Respiro fundo, encho meus pulmões com o máximo de ar que minhas narinas permitem. Quando me sinto pronta tento levantar da cama mas, acho que foi rápido demais pois sou atingida por uma tontura que se não fosse pelos braços de alguém provavelmente teria caído de cara com o chão. A pessoa me ajuda a sentar na cama, mas eu não consigo enxergar seu rosto pelo fato de está com a visão embaçada por causa da tontura.

Quando minha visão volta ao normal levanto meu olhar e me perco com o céu azul que está à minha frente. Prendo minha respiração e sinto minhas mãos tremerem.

 Merda! O que está acontecendo comigo?

- Você está melhor? - Ele questiona preocupado.

- Eu...Eu é.. bem… Eu...- Pronto já nem lembro o que foi que ele me  perguntou - Pode repetir? - Peço sem graça.

- Percebo que você tem problema de audição - sorri de lado, e que sorriso, que boca.

- Não, eu não tenho! - Digo brava, ele nem me conhece e já vai afirmando algo assim, espera… ele não me conhece e nem eu conheço ele, droga!

- Quem é você? Onde eu estou?  E como eu vim parar aqui? - Pergunto logo de uma vez.

- Muitas perguntas para alguém que acabou de acordar de um longo período de hibernação.

- Como assim? - Eu indago confusa.

- Você dormiu por um dia e meio.

 Arregalo meus olhos, por que eu dormi tanto tempo? Pensei que foi apenas algumas horas. O que aconteceu nesse tempo em que fiquei dormindo?

- Você ainda não respondeu às minhas perguntas! - acuso.

- Certo irei responder - dá de ombros.

- Estou esperando.

 O estranho sai da minha frente e caminha até uma cadeira junto a um porta que agora percebo ser a saída do quarto, traz a cadeira até junto da cama e a coloca em minha frente e olhando dentro de meus olhos ele começa a falar:

- Bom, como havia me apresentado outrora me chamo Deniel, você está em minha casa que fica no topo da montanha que você estava tentando se suicidar. 

- Eu não estava tentando me suicidar, que coisa idiota! - me defendo.

- Essa é a única explicação plausível para alguém frágil que nem você subir essa montanha completamente desprovida de equipamentos. 

- Eu não…

- Eu te trouxe para cá porque estava muito machucada e desmaiou quando estava em meus braços. Ah! E antes que você pergunte, sim!

- Sim o quê? - Pergunto com uma das sobrancelhas erguidas.

- Foi eu quem te deu banho, trocou suas roupas e cuidou de suas feridas.

Processando suas palavras olho para o meu corpo e vejo que me encontro em uma camisola, a reconheço e sei que minha pois a ganhei ano passado em meu aniversário. Sinto minhas bochechas queimarem e sei que elas estão vermelhas, estou sem coragem de olhar para ele pois a única pessoa que já me viu sem roupas foi eu e minha mãe.

-Então você...

- Não precisa me fazer uma pergunta da qual você já sabe a resposta -  ele me interrompe de forma ríspida.

Hergo a minha cabeça e sem deixar me abater pela grosseria que ele me fez, olho dentro dos olhos dele e me concentro ao máximo para não me distrair com a imensidão do olhar dele, que parece perfurar a minha pele.

-Por que fez isso? - pergunto desconfiada sem desviar o olhar.

- Porque eu quis e também porque eu não podia te deixar morrer. Seria um desperdício.- Diz me olhando de cima a baixo. Ao entender o duplo sentido, sinto que meu rosto vai explodir por tamanha quentura.

- Obrigada pela hospitalidade, Deniel - saboreio pronunciar o seu nome.

- Certo, venha irei preparar algo para você comer, deve está faminta -  ele se levanta e me convida com a mão.

Não o respondo pois o meu amado estômago me faz esse favor soltando um longo e alto ronco me deixando com mais vergonha. Deniel me estende a mão e eu fico alguns segundos a encarando.

- Não se preocupe, eu não mordo, apenas se você pedir - ele diz com uma voz sedutora e pisca um olho. Assanhado! 

  Até parece que eu irei pedir isso, quem é idiota que quer ser mordido? Seguro a vontade de revirar os olhos.

Seguro em sua mão e levanto da cama, ele me guia para fora do quarto seguindo por um pequeno corredor e descemos uma pequena escada que dá direito a uma sala onde vejo um sofá de três lugares, uma mesa de centro, uma tv pequena e uma estante de livros, da sala seguimos para a cozinha.

A cozinha é simples, um armário pequeno, uma mesa no meio da cozinha redonda, uma pia presa em uma das paredes e um fogão que se não me engano é de lenha.

Ele me puxar até a mesa e me coloca sentada. Ela vai até o armário na parede e tira de dentro uma lata. O observo caminhar até o fogão, ele agacha e pega algumas lenhas e j**a na boca do fogão… não vejo como ele fez para acender o fogo e nem de onde ele tirou a panela e a colher, os meus olhos ficaram fixos nas costas dele e sem conseguir controlar a curiosidade (pois essa é a primeira vez que vejo um corpo masculino sem ser em livros) meu olhar desde até o bumbum. E nossa! É bem maior que o meu! As pernas são grossas e bem torneadas…

Para, Renata! - meu subconsciente me repreende. Desvio meu olhar e fico encarando a mesa,  depois de não sei quantos minutos ele tira a lata do fogo e a coloca em cima da pia, me recuso a olhar cada movimento dele, só volto a ergue a cabeça quando ele coloca o prato cheio com o que antes tinha na lata no campo de visão sobre a mesa. 

- Desculpe, mas no momento só tenho isso - ele diz, mas não sinto que ele se sinta culpado por só ter ‘isso’ para oferecer.

-Tudo bem, obrigada - falo educada, a minha mãe soube dar bons modos e ser humilde com as pessoas, mesmo eu nunca tendo estado entre outras pessoas além dela. Ela me ensinava tudo através de histórias na hora de dormir.

  Olho para o prato e sei que se trata de uma sopa, muito horrorosa mas, não farei desfeita com ele.

 Respirando fundo pego a colher preenchida com a sopa e a levo até minha boca, fecho os olhos esperando pelo pior gosto do mundo, mas ele não vem. Abro meus olhos e começo a comer que nem uma louca faminta.

- Calma, a sopa não vai sair de seu prato não - diz risonho.

- Está muito gostosa - digo com a boca cheia de sopa.

  Termino de comer a maravilhosa sopa e Deniel leva o prato para a pia.

- Bom, eu já te disse o meu nome. Qual o seu?

-Ah! Claro, o meu nome é Renata, prazer em conhecê-lo - estendo minha mão e ele aperta.

- Satisfação, prazer apenas na cama - ele diz e eu quase engasgo com essa frase, soltamos nossas mãos. Ele está mesmo dando em cima de mim? EU já li livros de romance, e sempre imaginei que um dia eu viveria uma história de amor, mas nunca pensei que alguém teria coragem de realmente dizer esses tipos de coisa na vida real. - Bom, ali - Deniel aponta para uma portinha no canto da cozinha - Tem um banheiro caso queira tomar banho e sua mochila está na sala.

- Certo, mas só irei trocar de roupa e voltarei a seguir viagem.

- Não acho uma boa ideia.

- Por quê?

- Já é noite, durma e descanse um pouco mais e volte a seguir viagem amanhã pela manhã.

- Certo -  digo vencida, não deveria confiar tanto nesse homem, mas eu sinto que posso confiar nele.

Sem dizer mais nada, vou até a sala e vejo minha mochila no sofá, abro e pego minha calça jeans preta, minha regata preta e minhas peças íntimas também pretas, a maioria das minhas roupas são pretas. Acho essa cor perfeita.

- Você gosta de usar um preto, não ? - Deniel observa.

Quase deixo minhas roupas caírem pelo susto.

- Quer me matar? - falo com a mão no coração.

- Não de susto - sussurra, mas consigo ouvir e de novo sinto o meu rosto esquentar ao entender que ou envez de matar de susto, ele quer me matar de prazer. 

Sigo para o banheiro, tomo um banho que congela tudo em mim, água gelada do cão!

Esqueci de pegar uma toalha, então me visto molhada mesmo, saio do banheiro e vou para sala, guardo minha roupa suja e me sento no sofá.

Olho ao redor e não me controlo vou até a estante de livros, passo os dedos pelos livros e não sei o porquê, mas me sinto arrepiar.

- Você se interessa por leitura? - Deniel pergunta interessado enquanto entra na sala.

-Sim, apesar de nunca ter muito tempo de sobra gosto muito de ler - justifico.

 Seu braço passa por cima de mim e seu cheiro amadeirado adentra minhas narinas e um suspiro nunca antes dado por mim sai de minha boca, Daniel retira um livro da prateleira e eu me viro ficando de frente para ele.

- Do que mais gosta de ler?

- De tudo um pouco, gosto do conhecimento - dou de ombros.

-Tome, leve esse livro como uma lembrança de mim -  ele diz segurando o livro em minha direção, arqueio uma sobrancelha.

Pego o livro de sua mão e olho para a capa e vejo uma casal abraçados, olho para o título e vejo o nome: Adeus a humanidade.

- Obrigada.

- Não seja por isso.

 Não digo mais nada, apenas sigo em direção ao caminho que gravei que vai para o quarto. Deito na cama e fico alisando a capa do livro. Começo a ler e não sei quanto tempo fico nisso, mas quando dou por mim o dia já está amanhecendo.

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