—Mamãe fez. Sabemos que são os seus preferidos.
Zair pega um. Eu me sento no meu lugar e o observo comer. Ele o deixa de lado e toma um gole de café.—Gostou? —Pergunto com um sorriso.—Eles ficaram ótimos, mas eu não gosto de canela.Bem, ao menos ele é sincero.—Não posso esquecer de colocar isso na minha lista de boa esposa. —Digo debochada.Meu pai tenta me dar um chute, mas erra e acerta o príncipe que olha debaixo da mesa.—Desculpe-me. —Meu pai diz sem graça.Eu baixo o rosto para não rir e bebo meu café. Quando ergo o rosto observo Zair com os olhos fixos de mim. Mantenho meus olhos nos dele, observo enquanto sua expressão endurece, seus olhos se tornam tão frios que eu não consigo mais mantê-los nos dele e abaixo meus olhos.Mas que droga! Já me sinto dominada por esse homem.Aproveito para reparar na extravagante mesa que mamãe juntamente com a orientação da nossa expert cozinheira, arrumou. Ela caprichou realmente. Está impecável em decoração como nos quitutes distribuídos, mas sei que isso não deve impressionar o príncipe. Ele deve estar acostumado a mesas melhores, maiores, e com tudo que há de bom.Mamãe se junta a nós e logo em seguida surge minha irmã com carinha de sonhadora, olhando o príncipe, demonstrando seu encantamento. Ela se senta obediente ao meu lado. Comemos em silêncio.O ambiente na mesa aos poucos vai ficando pesado. O silêncio faz isso quando não se tem intimidade com uma pessoa. Ele se torna até opressivo. Intranquila eu olho de soslaio para meu futuro esposo. Ele é tão arrogante, penso enquanto o observo erguer a xícara e tomar o café árabe. Mas ao mesmo tempo, Zair é instigante, charmoso e exala sensualidade e testosterona por todos os poros.Meu pai parece desconfortável também. Mas nossos costumes não permitem conversas quando estamos ao redor da mesa. Comer é um ato sagrado.Mamãe finalmente o quebra, oferecendo um quitute a ele. Zair educadamente sorri para ela, mas vejo ali um sorriso enfadado, ele o pega como se estivesse cumprindo um protocolo.—Está uma delícia. —Com voz controlada ele elogia, carregado de sotaque. O mesmo sotaque que meu pai carrega. Já minha mãe, eu e minha irmã falamos o inglês perfeitamente bem.Quando finalizamos o café fomos todos para a sala, minha mãe se juntou a nós, Layla se sentou calada ao lado dela. Papai e Zair começam a conversar a respeito do casamento. Fica acertado então que o casamento será daqui a quinze dias em Doha e que todos nós iremos para lá uma semana antes. Eu não quero surtar na frente desse homem, mas está cada vez mais difícil me manter equilibrada.Tudo acertado os homens apertam as mãos e o príncipe se levanta.E eu que pensei que o príncipe não ia me querer. Passei esses anos todos despreocupada, achando que meu pai era um sonhador. Culpa da minha mãe. Ela sempre nos contava histórias de príncipes na hora de dormir. Acho que por isso achei que aquilo tudo estava só nos livros. Jamais pude imaginar que isso realmente iria acontecer.Tudo que eles fizeram para o meu pai será pago em troca de sua primogênita, além de meu casamento garantir o futuro da família.Zair então olha para mim com a expressão séria.—E você, Aysha, na semana que antecede o casamento ficará com minha mãe. Ela te orientará como ser uma boa esposa, como você deve se portar ao meu lado. As roupas que usará, etc. Ela te dará todas as orientações necessárias.Eu assinto sem nada dizer.Adianta?Ele então se levanta.— Bem, preciso ir.—Claro, majestade. Eu o acompanho até a porta.Zair me lança um último olhar e, se virando, segue com meu pai até a saída. A expressão de minha mãe dá nos nervos, ela os acompanha, com os olhos, com aquela cara sonhadora.—Filha! Que sorte grande você tem. Que belo homem Zair se tornou. Quando o conheci, ele era apenas um garoto introspectivo, muito quietinho. Tinha uns nove anos de idade, eu estava grávida de você. —Ela disse tudo naquele estado de êxtase.Papai entra com um sorriso no rosto.—Tudo certo. Daqui a quinze dias partiremos para Doha.—Minha Aysha, uma princesa! —Mamãe diz, emotiva.Laya puxa o vestido de mamãe.—Mãe, eu quero ser uma princesa como Aysha!— Um dia você será, meu amor.Isso tudo está me dando nos nervos!Um arrepio atravessa meu corpo. Allah! Por que não consigo me alegrar com isso? Sei que parece uma loucura para os de fora pensar que acho essa realidade desagradável, afinal o homem é bonito.Não! Bonito é pouco para ele. O homem é lindo de morrer, mas eu sinto que de uma maneira ou outra ele não me fará feliz.Ele parece tão frio, tão arrogante, tão.... tão...Allah! Mas minha negativa seria uma sentença de desgraça para a minha família. Como negar a eles todo esse luxo que os cerca, do qual eles estão acostumados?Meu destino: Aceitar Zair para a felicidade da família.—Bem, como agora está tudo acertado, vou para o meu quarto. —Falo amarga, segurando meu choro por causa de minha irmã. Não quero assustá-la, tirar o encanto dessa carinha, mesmo porque, não nos veremos com frequência e não quero que ela tenha a imagem que estou infeliz. Eu me levanto do sofá.— Não tem curiosidade de saber mais de seu noivo?—O que o senhor pode me dizer que eu não saiba? Ele é rico, futuro sheik de Doha. Único filho homem do soberano sheik Omar e tem uma irmã. Tem mais alguma coisa?—Sim.Eu engulo em seco.—Sim? —Pergunto com medo da resposta, pois pela cara de meu pai, não parece nada bom o que ele me dirá.Ele olha para Layla.—Vai para o seu quarto!—Por quê?—Não questione. Depois o baba vai conversar com você.Ela respira fundo e se levanta com cara de choro. Sei que ela daria de tudo para estar no meu lugar.Quando ela some no corredor, papai me encara e fala baixo:—O dia que combinei tudo com o pai de Zair, o Sheik supremo; ficou acordado que você seria a segunda opção caso ele se casasse e sua esposa não engravidasse ou não lhe desse um filho "homem". Mas caso ela gerasse um menino, o acordo estaria desfeito.Eu empalideço. Meus lábios tremem.—Como? Baba! Então eu serei então a segunda opção?Meu pai sorri.—Não, habibi. O destino trabalhou ao seu favor.—Trabalhou ao meu favor? Não acredito que o senhor concordou com uma coisa dessas!Meu baba me olha com aquele orgulho árabe.—E eu não admito que fale assim comigo! Eu sei o que é melhor para você. E agora, você deveria beijar meus pés. Está se casando com um homem excelente. Nunca te faltará nada, além disso o destino colaborou com você, Amina morreu e você será a primeira esposa.—Allah! Que tragédia! E... o senhor nunca me falou isso!Meu solta o ar, com certeza exercitando sua paciência comigo.—Verdade, eu te preparei independente do que o destino iria traçar para a sua vida. Acho que, no fundo sempre achei que você seria a futura esposa de Zair, de uma maneira ou outra. É a realização de um sonho, meu e de sua mãe.—Quanto tempo ela morreu? —Pergunto tentando entender tudo isso.—Há seis meses.Eu fico com raiva.—Rahmatullah! (miserircórdia) Só isso? Esse homem não deve ter sentimentos, morreu a esposa e já quer colocar outra no lugar. Ela só estava ao lado dele para conceber?Meu pai me dá um olhar cuidadoso:— Na verdade quem quer esse casamento é o Sheik Omar Salim El Mustafá. Ele não vê a hora que esse casamento aconteça. Quer que a alegria volte ao rosto do príncipe Zair. E que isso fique entre nós: As pessoas estão comentando pois ele tem cultuado a morte da esposa por muito tempo e como sabe é haran(pecado).Um nó se forma na minha garganta com essa revelação.—Allah Ele, então, sofre por ela? Quanto tempo eles estavam casados? Ela morreu de quê? — Pergunto elevando minha voz, impaciente.—Calma Aysha. Eles estavam casados há um ano e alguns meses. Ela morreu no parto.—Parto?Meu pai funga.—Sim.—Então ele é pai de um bebê de seis meses?—Sim, uma menina, ela recebeu o nome de Samira.Afasto os olhos do meu pai e encaro minha mamãe por um tempo. Ela ouve tudo calada. Sua expressão não é de espanto.Sim, ela já sabia de tudo.Na verdade, eles estão felizes por eu me casar com o príncipe e também pelo destino me tornar a primeira esposa.Dúvidas se levantam e apertam o meu coração:—E o casamento com a falecida Amina? Como foi? Arranjado como o meu?Meu pai acena um não com a cabeça.—Não.—Não? — Isso é ruim, muito ruim...—Pelo jeito ele amava a esposa.—Filha, isso não importa!—Não? Pai, ele ainda chora pela mulher morta. E a filha deve fazê-lo lembrar mais e mais dela.—Não pense assim. Você tem tudo para conquistar o coração do príncipe.—E o meu coração? Você pensou nisso?Meu pai fica sem falas e eu me levanto do sofá.—Baba, tudo bem. Farei meu papel de noiva obediente para o bem de todos, farei o que esperam de mim. É só isso que tem a me dizer?Meu pai funga alto.—Só.—Então, vou para o meu quarto. Vou gozar meus últimos dias sendo eu mesma e não a sombra de meu marido.Quinze dias depois... Palácio CalifaBastou uma das empregadas anunciar que Zair estaria aqui daqui há alguns minutos para conversar comigo para que meu coração se agitasse no peito.Desde que cheguei, há uma semana atrás, temos nos falado esse horário. Poucas coisas para a minha frustração.Zair tem sido introspectivo. Às vezes acho que ele vem aqui só para deixar seus familiares felizes. Cumprindo um protocolo. Ou apenas para nos acostumarmos um com o outro.A mãe dele está animada com o casamento. Ela gostou de mim logo de cara. Todos os dias eu fui até os aposentos de Zafira para conversarmos. Ela é uma senhora muito educada, sagaz. Falamos de tudo um pouco, e claro, que não faltou conselhos de como me portar como esposa do príncipe. Mas que não vem ao caso pensar sobre isso agora.Foi difícil no começo entender algu
Meu casamento foi um grande acontecimento. Durou três dias, com todo o seu ritual, cheio de dança e animação dentro dos costumes muçulmanos.Um casamento onde pouparei lágrimas e distribuirei sorrisos, segurarei minhas verdadeiras emoções, não me permitindo sentir.No primeiro dia tivemos as trocas de alianças e eu recebi pela primeira vez o beijo casto de meu noivo, um singelo beijo na testa. Eu me senti carimbada do tipo "é minha"No dia seguinte me produziram: hena, limpeza de pele e cuidado com meus cabelos. Eu me senti como um carneiro, sendo bem tratado para ir ao matadouro. Hoje, no terceiro dia me maquiaram e dentro de um lindo e rico vestido, composto de renda com pedraria bordadas. Com gola canoa, manga ¾ e modelagem sereia, com uma linda cauda arredondada, eu me transformei numa linda princesa. Mas o dia para eu brilhar, estou triste.O palácio, cheio de con
—Nosso casamento é de conveniência, mas isso não significa que eu não irei cumprir meu papel de marido. Vou cuidar de seu bem-estar, então, pare de besteira e se sente aqui.—Como você consegue? Fica apegado a rituais que expressam sentimentos, mas ao mesmo tempo os deixa de fora?Ele parece irritado:—Não questione e se sente aqui! Estamos casados, então cumpriremos todo o ritual.Eu aperto meus lábios e faço uma mesura para ele, ironizando seu jeito mandão e caminho até o local indicado. Respirando fundo, eu me sento. Zair pega a bacia e a jarra de água e as coloca no chão.—Erga o vestido. —Ele pede impaciente.Eu faço como ele me pediu. Ele então pega o meu pé direito e retira o meu sapato e lava o meu pé. Faz o mesmo gesto com o outro. Coloca então uma toalha no colo e enquanto os sec
ZairAllah! Eu me senti um crápula quando ela chorou e ela tem sido mestre em me fazer sentir assim ultimamente. O sentimentalismo é uma fraqueza que há muito eu deixei para trás. Agora há em mim a determinação, a coragem, a firmeza. Qualidades que um homem de negócios precisa ter. Hoje me fortaleci com esses sentimentos. A realidade precisa ser enfrentada, por isso hoje sou comedido, pois conheço as consequências da entrega.—Mas que Diabos! Eu não deveria ter me casado com essa mulher!Allah! Forçar uma situação não faz parte do meu carácter.Vou até a escrivaninha que está num canto do quarto e abro a gaveta. Pego uma adaga e erguendo meu kandoora, corto o interior da minha coxa direita, a ardência só aumenta minha frustração por não fazer imperar minha vontade. Tampo o corte com o le
AyshaEntro no quarto, ele está todo escuro. Só a luz do luar entra pela janela. Fico na soleira da porta até eu me acostumar com a escuridão.Aos poucos vou reconhecendo as formas das coisas na penumbra. Consigo ver Zair também.Allah! A cama é king size, enorme, e mesmo assim ele consegue se espalhar nela de modo que fica só um pequeno espaço para eu me deitar. Eu já vi que vou ter uma péssima noite de sono.Caminho lentamente e me deito ao lado dele tentando não movimentar muito o colchão. Mas o colchão é dos bons, conforme me ajeito ele nem se move, ele é firme e ao mesmo tempo macio. Bocejando, me cubro, tomando cuidado para não me encostar nele.Sempre dormi abraçada a um travesseiro. Então pego um, dos dois que ficam na cama e o envolvo com meus braços. Fecho os olhos. Estou tão cansada que, aos poucos, minha re
ZairOlho para os jardins do palácio e vejo o espetáculo de flores de todas as cores. Flores que a víbora da Amina adorava. A lembrança de como fui enganado por sua fragilidade, docilidade e beleza, de como entrei no conto mais velho do mundo, ainda me transtorna. Quem é Aysha para que eu confie nela? Amina me enganou da pior forma que se pode imaginar. Ela me envolveu em suas teias de inocência e sedução. Aquela garota que convivi minha adolescência inteira, na verdade queria o titulo de princesa. Uma vida perdida.Sonhos desfeitos.Ela mentiu com suas palavras, com seu jogo de sedução, ela mentiu com seu corpo, com seus gemidos, com seus sussurros de amor. Nem sei se a menina que ela pariu é minha filha. Samira pode ser fruto de seu adultério. Até hoje não peguei a criança nos braços, até hoje não co
AyshaMeia hora depois fizemos uma aterrissagem tranquila na rica cidade de Muharraq. Catar e Bahrein são países quase vizinhos, é só atravessar alguns quilômetros do Golfo Pérsico que fica entre eles.Momentos depois estamos dentro de um carro de luxo sendo levados para, sei lá onde. Desde que saímos, Zair está quieto em seu canto. Não chega a ser um silêncio opressor. A verdade que estou meio cansada, então estou um pouco anestesiada com tudo que estou vivendo. Agora, nesse momento, me sinto como uma marionete, levada pelo seu dono.Observo tudo pela janela do carro também quieta, com certeza onde ficaremos deve ser um lugar espetacular.Allah! Tudo é muito lindo, e luxuoso. O país é riquíssimo. Minutos depois passamos por grandes portões e percorremos a propriedade arborizada até o palácio. Quando o carro estaciona e
AyshaQuando Zair sai do quarto, eu desmorono na cama, minhas pernas bambas, parecem geleiasRecomposta, vou até o banheiro e me tranco nele. Tenho que ficar esperta. Eu deveria ter tomado essa atitude com a porta do quarto.Tomo um banho rápido e coloco um caftan verde-escuro. Faço uma maquiagem leve e tento me lembrar do caminho até a sala.A encontro logo. Zair está no sofá, seu semblante pensativo. Quando ele me vê, aponta com o dedo um lugar ao seu lado. Relutantemente eu me sento.—O Sheik Koul veio aqui. Vou precisar trabalhar em campo. Acho que dois dias resolvo tudo.—Bem, é isso? Irá amanhã? —Eu digo, com um sorriso doce.—Sim. —Zair diz com aquele sorriso que não gosto.—Bom trabalho. Pode deixar que fico quietinha no palácio, bancando a boa esposa.—Quem disse que ficará? Você