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Fúria das Águas
Fúria das Águas
Por: Eder B. Jr.
1. Uma Morte nas Águas

A água, que é o símbolo da vida e que compõe a maior parte do nosso corpo, pode nos salvar em um deserto escaldante, mas pode nos destruir, deixar sem ar, nos afogar. Tudo que existe nesse mundo, ou em qualquer outro mundo que ainda desconhecemos, possui duas faces tênues entre si, desde as moléculas mais básicas até os equipamentos mais complexos. Do oxigênio à bomba atômica. Tudo pode ser para o bem e para o mal. E também pode ser relativo, para o bem de uns e o mal de outros, dependendo do ponto de vista.

Mas, o que determina a forma como a fonte da vida será utilizada para a morte é o movimento dentro de uma interminável lei de ação e reação. Tudo que fazemos de errado retorna invariavelmente contra nós um dia. Mas repare que o sujeito “nós” é a representação de uma coletividade completamente interdependente e mesmo que você aja da forma mais correta possível, de acordo com os preceitos da sua consciência, a ação de outra pessoa pode se voltar contra você. Ou a ação combinada de pessoas. Ou a inação.

Então, ao olhar nos meus olhos, que já conquistaram muitas pessoas, alguém poderia perceber que a cor que reflete a esperança, já não espera mais nada da vida.

Desolada, já sem lágrimas no rosto, a fome se misturando com a sede e a vontade de não existir mais, tentando parar de sentir qualquer coisa, eu caminhava pelas ruas sem destino, sem saber por que ou para onde ir.

Deparei-me com uma ambulância e muitos socorristas trazendo um empresário desfalecido de dentro de um prédio enorme. Pela movimentação dos funcionários, tratava-se de alguém importante. Senti uma sensação estranha como se aquela vida estivesse se esvaindo na minha frente e mesmo depois de tantas perdas recentes que tive, aquilo me tocou. Não sei se foi a constatação de que mesmo o dinheiro, a fama ou a força de vontade dos entes queridos não conseguem impedir a morte.

Um rapaz jovem acompanhava aquele senhor e pude notar que a relação parecia ser entre pai e filho. Antes deles entrarem na ambulância eu percebi algo que me impressionou mais ainda: o olhar daquele rapaz cruzou com o meu, cheio de lágrimas, perdido, mas não era como o meu. Eu me sentia perdida no sentido de não querer mais ir por caminho nenhum, mas ele queria desesperadamente ir, só não sabia para onde. Pedi a Deus, se ele existisse mesmo, que os acompanhasse, pois se a mim não tivesse salvado, quem sabe a eles...

Para mim não existia mais saída. O único caminho pareceu ser o mar! O mesmo mar que levou, naquele acidente de barco, meus pais, irmãos, marido e filhos e que me cuspiu viva para a areia, completamente sozinha, sem mais ninguém com quem contar, por quem ainda ficar. Esse mar, dessa vez, vai ter que me levar.

A cada passo que dou me aprofundando nas águas, sentindo as ondas me empurrando contra minha decisão, ou a maré, me puxando a favor, era como se as mãos do meu amor fossem tocando meu corpo, subindo pelas minhas pernas, me agarrando, me possuindo aos poucos, com carinho, mas de um jeito tão intenso.

Como ele me faz falta, como sinto saudade da forma como ele me olhava, de como me fazia sorrir com seu sorriso, de como me dava paz com seu peito me acolhendo e como me tirava do eixo com o jeito que me desejava.

Lembrando dele, nem sinto o gelado da água, nem percebo ela chegando ao meu pescoço, as ondas já quebrando acima da minha altura e eu começando a engasgar.

Lembro dos meus filhos brincando na areia, correndo em torno da gente... a verdadeira felicidade, era a alegria e a pureza nos olhos deles.

Engulo mais água e apago por alguns momentos, não consigo precisar quanto, quando recupero a consciência, ouço gritos, pessoas querendo me salvar, tento afundar mais, ir mais longe, mas já não tenho forças para nada, só quero morrer logo, antes que alguém consiga evitar minhas intenções.

E, finalmente, não sinto mais nada, nem o frio, nem dor, nem o som das pessoas, nada, tudo se tornou escuridão.

É o fim!

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