Ecos do Passado
Miguel levantou-se da cama lentamente, os músculos ainda pesados da agitação da noite anterior. O suor escorria pela testa, e ele sentia o pijama úmido colado ao corpo. Com um suspiro cansado, caminhou até o banheiro e ligou o chuveiro, deixando a água fria bater em seu rosto. Ele ficou ali por alguns minutos, tentando organizar os pensamentos. Aquele sonho o atormentava há meses, sempre voltando de forma quase idêntica. Era como se estivesse preso em uma memória distante, mas que ele não conseguia acessar totalmente. Depois do banho, Miguel saiu do banheiro, secando o cabelo com uma toalha. Abriu o armário e escolheu um belo paletó azul-escuro, acompanhado de uma camisa branca impecável e uma gravata cinza clara. Vestiu-se com a precisão que a rotina havia lhe ensinado, mas sua mente ainda estava distraída, presa na sensação que o sonho havia deixado. Pegou a chave do carro e a pasta com documentos importantes sobre a reunião que teria mais tarde. Ao descer as escadas, encontrou a mãe, Isabel Alencar, sentada na cozinha, com seus cabelos grisalhos presos em um coque e os olhos atentos como sempre. — Não vai tomar café, meu filho? — perguntou Isabel, enquanto ajeitava os óculos sobre o nariz. — Não, mãe. Estou sem fome. — Miguel respondeu, colocando a chave do carro sobre o balcão. Isabel o observou com aquele olhar maternal que conhecia cada detalhe do filho. — Quer tomar um café comigo, então? — ela sugeriu, com um sorriso leve nos lábios. Miguel hesitou por um segundo, mas depois sorriu. — Tá bom... Só uma xícara. Ele se sentou à mesa enquanto Isabel enchia duas xícaras com café fresco. A cozinha tinha um cheiro acolhedor, e o silêncio confortável entre eles foi preenchido apenas pelo tilintar das colheres nas xícaras. — O que aconteceu, Miguel? — Isabel perguntou, estreitando os olhos enquanto o observava de perto. — Você está suado. Miguel suspirou e passou a mão pelo cabelo, ainda sentindo o resquício da tensão da noite anterior. — Mãe, eu tive aquele sonho de novo. Isabel colocou a xícara de café sobre a mesa e inclinou-se um pouco para mais perto, curiosa e preocupada. — A mesma garota? — ela perguntou. Miguel assentiu, pensativo. — Sim, é como se eu tivesse 13 anos de idade na escola. No sonho, tem uns meninos tentando bater em uma garota. Eu vou defendê-la, mas eles acabam me batendo. Ele fez uma pausa, mexendo a colher no café de forma distraída. — É aquele mesmo sonho de sempre... Parece tão real. Isabel permaneceu em silêncio por um momento, como se estivesse escolhendo as palavras com cuidado. — Você lembra quem é essa garota? — perguntou, cautelosa. Miguel balançou a cabeça. — Não. É estranho, mãe. Eu sinto que a conheço, mas não consigo lembrar. — Ele suspirou, frustrado. — É como se fosse um déjà vu, como se fosse uma memória perdida que insiste em voltar. Isabel apertou os lábios, mas não disse nada. Apenas tocou de leve a mão do filho, transmitindo um conforto silencioso. — Talvez você só precise de tempo para entender. — ela sugeriu, com aquele tom materno que era ao mesmo tempo tranquilizador e evasivo. Miguel deu um leve sorriso e tomou um gole do café, apreciando a presença dela por um momento. Por mais que a inquietação do sonho ainda estivesse presente, havia algo reconfortante na simplicidade daquele momento entre mãe e filho. — Obrigado pelo café, mãe. — ele disse, levantando-se e pegando a chave do carro novamente. Isabel sorriu de volta, vendo-o sair pela porta. — Cuide-se, meu filho. Miguel deu um leve aceno e saiu, mas o sonho ainda pesava em sua mente. Havia algo escondido naquele déjà vu, e ele sabia que não poderia ignorar por muito mais tempo. Miguel terminou o café e se levantou da mesa. Pegou a pasta com os documentos e a chave do carro sobre o balcão, pronto para sair. Sua mãe, Isabel, o observava com o olhar de quem vê algo além do que é dito, mas Miguel estava distante demais para perceber. Ele não a olhou antes de ir em direção à porta. — Tchau, mãe. — ele disse, quase sem pensar, a voz baixa e apressada. Isabel, por um momento, ficou ali, esperando que ele se virasse. Talvez ele lhe desse um sorriso, ou fizesse como fazia quando criança, pedindo a bênção com um olhar cúmplice. Mas ele não olhou para trás. Apenas fechou a porta, deixando-a sozinha na cozinha. O silêncio tomou conta do espaço, e Isabel soltou um suspiro profundo, colocando a xícara vazia sobre a mesa com cuidado. Ela passou a mão pelos cabelos grisalhos e ficou olhando para a porta por mais alguns instantes. — Uma hora você vai se lembrar, meu filho. — ela sussurrou para si mesma, com uma certeza tranquila na voz. Ela sabia que não poderia forçar as coisas, mas acreditava que, quando o momento certo chegasse, Miguel entenderia tudo o que estava escondido naquelas memórias. Miguel entrou no edifício moderno da Alencar Holding, a empresa que ele liderava com eficiência implacável. O prédio, com suas enormes paredes de vidro e arquitetura contemporânea, refletia a grandiosidade do império que ele herdara. Atravessou o saguão com passos firmes, cumprimentando funcionários com acenos rápidos e um sorriso formal. Ele entrou no elevador, ajustando o paletó e respirando fundo. O espelho nas paredes de aço refletia seu rosto sério e concentrado, mas os pensamentos sobre o sonho ainda o perseguiam, como sombras insistentes que ele não conseguia dissipar. Assim que chegou ao último andar, onde ficava seu escritório particular, Miguel saiu do elevador e passou pela secretária, que o saudou com um "bom dia". Ele apenas assentiu, mantendo o foco. Abriu a porta de sua sala, fechando-a atrás de si com um leve clique. O espaço era impecável, decorado com tons neutros e móveis elegantes. Miguel colocou a pasta sobre a mesa de mogno e organizou os documentos para a reunião que aconteceria em poucos minutos. Sentou-se na cadeira de couro, endireitando o paletó enquanto lançava um rápido olhar para a janela, onde a cidade se estendia imponente. Ele respirou fundo e passou a mão pelo rosto. Ainda sentia o peso daquele sonho, como uma memória perdida insistindo em voltar. Tentou afastar os pensamentos e focar no trabalho, mas a sensação era difícil de ignorar. Aquela garota do sonho. Por que ela parecia tão familiar? Por que parecia que aquilo não era apenas um sonho, mas algo que ele precisava lembrar? Miguel olhou para os papéis à sua frente, ajustou a gravata e se preparou para a reunião. Mas, no fundo, ele sabia: aquela lembrança ainda não tinha terminado com ele.Encontros SilenciososO café estava movimentado naquela manhã. Clara Moretti caminhava pelo centro da cidade grande com passos decididos, uma cidade que ela havia jurado nunca mais voltar. Mas desta vez, Valentina, sua irmã mais velha, havia insistido em se encontrar pessoalmente. O motivo? A exposição de Clara seria uma das principais atrações da galeria que Valentina gerenciava. E, embora relutante, Clara sabia que não podia continuar fugindo do passado para sempre.Ela apertou a mão de Luna, sua filha de 6 anos, que andava ao seu lado. A menina estava animada e curiosa, observando cada detalhe ao redor. Para ela, tudo na cidade era novidade — diferente da vila tranquila onde sempre viveram.Assim que chegaram ao café, Clara parou por um instante na entrada. Uma sensação estranha percorreu seu corpo, como se tivesse cruzado um portal invisível para um momento perdido no tempo. E foi quando ela o viu.Miguel Alencar estava diante dela. Ele segurava um copo de café e ajeitava o paletó
Eu à vi nos meus Sonhos – Encontro InevitávelA galeria de Valentina Moretti estava cheia. Obras de arte cuidadosamente selecionadas adornavam as paredes, atraindo a atenção de empresários, curadores e amantes da arte. Clara estava ali, movendo-se entre os convidados com um misto de nervosismo e serenidade. Embora a exposição fosse dela, sua mente estava longe, presa ao breve encontro com Miguel no café.E então, ela o viu.Miguel entrou pela porta principal da galeria, e ao seu lado estava Cecília Monteiro, rindo e segurando o braço dele de maneira possessiva. Cecília vestia um vestido vermelho marcante, roubando a atenção por onde passava.Clara sentiu o estômago afundar. Ver Miguel novamente já era difícil por si só, mas vê-lo ao lado de outra mulher, em um gesto tão íntimo e familiar, foi como levar um golpe que não esperava.Ela desviou o olhar rapidamente, tentando se recompor, mas o impacto foi profundo. Tudo o que ela havia tentado enterrar, todo o amor e a dor, voltou como um
Decisões IrrevogáveisQuando o carro parou na frente da casa dos Alencar, Miguel desceu e entrou sem falar com ninguém. Ele subiu direto para o quarto, ignorando o jantar que estava sendo preparado. Aquele banho era mais do que necessário. O peso da noite, das lembranças e do estranho sonho ainda o perseguia.Ele se despiu, entrou no banheiro e ficou sob o chuveiro por alguns minutos, deixando a água quente escorrer por seus ombros. Tentava organizar os pensamentos, mas quanto mais pensava na foto e no sonho, mais confuso se sentia.Depois do banho, vestiu uma camiseta leve e calça de pijama, deitou-se na cama e fechou os olhos, tentando afastar o turbilhão de emoções.Pouco depois, ele ouviu uma batida suave na porta e sua mãe, Isabel, entrou silenciosamente no quarto.— Não vai descer para jantar, meu filho? — ela perguntou, com um tom doce e familiar.Miguel abriu os olhos lentamente e olhou para a mãe.— Não, mãe. Tô sem fome. — ele respondeu, a voz baixa e cansada.Isabel perman
Silêncios InconscientesMiguel chegou cedo ao hangar privado, o céu ainda estava escuro e tingido por nuvens densas de outono. O jatinho particular já o esperava com motores prontos, o piloto acenando enquanto o chefe de bordo carregava sua mala de mão.Ele subiu as escadas sem cerimônia, jogando-se em uma das poltronas de couro enquanto tentava deixar a tensão dos últimos dias para trás. Londres o aguardava, e com ela, uma série de reuniões críticas. Esta viagem não poderia falhar; ele precisava estar focado. Esquecer sonhos estranhos e fotografias desconcertantes era uma necessidade, e o trabalho era sua melhor válvula de escape.Horas depois, o jatinho tocava o solo frio de Londres, e Miguel já estava pronto para mergulhar na agenda apertada. Seu motorista o aguardava no aeroporto, e ele seguiu diretamente para o escritório da filial da Alencar Holding. A cidade cinzenta e o clima frio pareciam um reflexo perfeito do estado de espírito dele — apático e focado apenas no trabalho.O
Negócios Fechados e Silêncios InternosO salão da festa em Londres era impressionante. Candelabros de cristal pendiam do teto, e uma banda de jazz tocava suavemente ao fundo, criando um ambiente elegante e intimidador. Magnatas e investidores poderosos circulavam pelo espaço, segurando taças de champanhe e rindo com confiança, como se o mundo estivesse sob o controle deles.Miguel Alencar caminhava pelo salão, cumprimentando algumas pessoas com acenos formais. A festa era o ponto culminante de sua viagem, e ele sabia que tudo o que ele precisava resolver terminaria naquela noite. Os acordos mais importantes não eram fechados nas reuniões oficiais, mas nas conversas discretas e privadas, longe dos olhares atentos.Um garçom se aproximou com uma bandeja cheia de bebidas. Miguel pegou uma taça de champanhe, mas não tomou um gole. Nunca foi um grande apreciador de álcool; seu verdadeiro prazer estava em ganhar — resolver problemas, fechar negócios, manter o controle absoluto.— Alencar,
Onde Nasce a AmizadeO pátio da escola estava cheio naquele final de manhã, como de costume. Crianças e pré-adolescentes corriam de um lado para o outro, rindo, brincando, ou simplesmente tentando sobreviver ao caos do recreio. Miguel Alencar, com 13 anos, observava tudo de longe, sentado em um dos bancos de concreto perto da quadra. Ele era um garoto quieto, nunca se envolvia em confusão. Preferia os livros de história e os jogos de estratégia aos campeonatos de futebol que dominavam as conversas dos colegas.Foi quando ele ouviu. As vozes.— Ei, Moretti! Você acha que é melhor que a gente, é? — um dos garotos gritou.Miguel virou a cabeça na direção do tumulto. No meio da roda de meninos maiores, estava Clara Moretti, com seus cabelos castanhos escorridos sobre os ombros, vestindo o uniforme da escola e com a testa franzida em desafio. Ela segurava com força a alça da mochila, apertando-a contra o corpo, enquanto três garotos a cercavam.— Acha que pode mandar na gente só porque é f